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O Ministério Público Federal: de defensor de direitos a combatente da corrupção (1988-2018)

THE BRAZILIAN FEDERAL PUBLIC PROSECUTOR’S OFFICE: FROM DEFENDER OF RIGHTS TO ANTICORRUPTION FIGHTER (1988-2018)

EL MINISTERIO PÚBLICO FEDERAL: DE DEFENSOR DE DERECHOS A COMBATIENTE DE LA CORRUPCIÓN (1988-2018)

Resumo

Este artigo trata da mudança institucional do Ministério Público Federal (MPF) de instituição defensora de direitos para combatente da corrupção. Têm-se dois objetivos: o primeiro é empírico: demonstrar que os constituintes não tinham a corrupção como uma preocupação relevante, mas que, a despeito disso, a atuação do MPF priorizou o combate à corrupção nos anos 2000 em detrimento de outras atribuições igualmente relevantes. O segundo objetivo é analítico: analisar e discutir as mudanças institucionais incrementais depois de 2003 que explicam o MPF como combatente da corrupção. Para tanto, realiza-se análise de conteúdo de documentos oficiais da Assembleia Nacional Constituinte, dos resultados de dois surveys com membros do MPF, aplicados em 1996 e em 2016, e dos dados das atividades extrajudicial e judicial do MPF entre 2012 e 2018. Conclui-se que uma combinação de fatores exógenos e endógenos facilitou a mudança institucional, no entanto, existe um modelo institucional que permite mais autonomia e discricionariedade, que, em determinado contexto, pode ser utilizado, por exemplo, contra o sistema político.

Palavras-chave
Institucionalismo histórico; incrementalismo; Ministério Público Federal; accountability; discricionariedade

Abstract

This article deals with the institutional change of the Brazilian Federal Public Prosecutor’s Office (MPF) from a rights-defending institution to an anticorruption fighter. It has two goals: the first one is empirical: to demonstrate that the constituents did not have corruption as a relevant concern, but that, despite this, the action of the MPF prioritized the fight against corruption in the 2000s over other equally relevant attributions. The second goal is analytical: to analyze and discuss the incremental institutional changes after 2003 that explain the MPF as a corruption fighter. To this end, the content of official documents of the National Constituent Assembly, the results of two surveys with members of the MPF, applied in 1996 and 2016, and data from the extrajudicial and judicial activities of the MPF between 2012 and 2018 are analyzed. We conclude that a combination of exogenous and endogenous factors facilitated institutional change, however there is an institutional model that allows more autonomy and discretion, which, in a given context, can be used, for example, against the political system.

Keywords
Historical institutionalism; change; incrementalism; Brazilian Public Prosecutor’s Office; accountability; discretion

Resumen

Este artículo trata sobre el cambio institucional del Ministerio Público Federal (MPF) de una institución defensora de derechos a un luchador contra la corrupción. Tiene dos objetivos: el primero es empírico: demostrar que los constituyentes no tenían la corrupción como una preocupación relevante, sino que, a pesar de esto, el trabajo del MPF priorizó la lucha contra la corrupción en la década de 2000 sobre otras atribuciones igualmente relevantes. El segundo es analítico: analizar y discutir los cambios institucionales incrementales después de 2003 que explican al MPF como un luchador contra la corrupción. Para eso, se realiza el análisis de los documentos oficiales de la Asamblea Nacional Constituyente, de los resultados de dos encuestas con miembros del MPF, aplicadas en 1996 y 2016, y de los datos sobre las actividades extrajudiciales y judiciales del MPF entre 2012 y 2018. Se concluye que una combinación de factores exógenos y endógenos facilitó el cambio institucional, sin embargo, existe un modelo institucional que permite más autonomía y discreción, que, en un contexto dado, puede ser utilizado, por ejemplo, contra el sistema político.

Palabras clave
Institucionalismo histórico; incrementalismo; Fiscal; accountability; discreción

Introdução

A Constituição Federal de 1988 (CF/88) é um marco significativo para o Ministério Público (MP), a ponto de se justificar a adjetivação de “novo” ao MP que se formou. Foi a combinação de autonomia, instrumentos de poder e constitucionalização de direitos que transformou os promotores em atores políticos relevantes desde a promulgação da CF/88. Instrumentos de ação, como a ação civil pública, o inquérito civil, a ação penal pública, entre outros, sem autonomia diante dos interesses mais conjunturais de políticos e partidos, manteriam o MP como um órgão do Poder Executivo que exerce suas atividades sob a orientação dos políticos. Instrumentos legais sem autonomia relegariam os promotores a um papel burocrático e mais secundarizado do ponto de vista político.

Durante os anos 1990, os MPs, especialmente os de alguns estados, foram fundamentais para a construção do padrão de “inclusão pela via dos direitos” exercido pelo sistema de justiça como um todo (Marona; Barbosa, 2018MARONA, Marjorie; BARBOSA, Leon Queiroz. Protagonismo judicial no Brasil: do que estamos falando? In: MARONA, Marjorie; DEL RIO, Andrés (orgs.). Justiça no Brasil: às margens da democracia. Belo Horizonte: Arraes, 2018. p. 128-150.). Promotores espalhados pelo país judicializavam, em especial pela via da ação civil pública, o que entendiam ser desrespeito aos direitos e às políticas públicas previstos na Constituição, confrontando governantes e buscando limitar a discricionariedade daqueles que receberam mandatos por meio de eleições. O MP, embora com diferenças no grau de ativismo entre estados e, inclusive, entre promotores da mesma estrutura, exercia suas atribuições de buscar assegurar a observância de direitos e políticas públicas como planejado pelos constituintes.

A partir dos anos 2000, contudo, esse padrão de atuação começa a mudar. No lugar da defesa de direitos e de políticas públicas, o “padrão accountability” ganha força no MP (Marona; Barbosa, 2018MARONA, Marjorie; BARBOSA, Leon Queiroz. Protagonismo judicial no Brasil: do que estamos falando? In: MARONA, Marjorie; DEL RIO, Andrés (orgs.). Justiça no Brasil: às margens da democracia. Belo Horizonte: Arraes, 2018. p. 128-150.). O MPF e o Poder Judiciário passaram a se ocupar do combate à corrupção de forma crescente, atraindo expressivo interesse da imprensa e grande visibilidade na opinião pública. O MP, em especial o Federal, passou a ser reconhecido, após 2003, mais pelo seu papel de combate à corrupção do que pela sua atuação como defensor de direitos coletivos e de políticas públicas. Perdeu espaço o processo contra o fechamento de uma escola decidida por um prefeito, e entraram os grandes escândalos de corrupção, como o Mensalão e a Lava Jato.

Este artigo tem dois objetivos. O primeiro, de caráter empírico, é demonstrar que os constituintes não tinham a corrupção como uma preocupação relevante, mas que, a despeito disso, a atuação do MP, em especial o Federal, passa a priorizar o combate à corrupção nos anos 2000, renunciando em parte suas outras atribuições igualmente relevantes. O segundo objetivo é analítico: discutir as mudanças institucionais incrementais surgidas após 2003 e explicar a mudança do Ministério Público Federal (MPF) em um combatente da corrupção.

Entre os principais resultados, são reforçadas as afirmações teóricas de que a combinação de fatores exógenos e endógenos facilita mudanças institucionais. Todavia, salientamos que existe um modelo institucional que pode permitir mais autonomia e discricionariedade, que, em determinado contexto, podem ser utilizadas, por exemplo, contra o sistema político. Essas são as nossas principais contribuições para a literatura sobre o assunto.

O artigo está dividido do seguinte modo: esta introdução é seguida dos aspectos teóricos e metodológicos; na sequência, os resultados são apresentados em duas seções e, depois, discutidos; por fim, são apresentadas as conclusões.

1. Aspectos teóricos

A CF/88 é um marco da passagem do período autoritário inaugurado pelo Golpe Militar de 1964 para a democracia da “Nova República”. A Carta Constitucional, a terceira mais longa em número de palavras em perspectiva comparada (Mariani; Almeida, 2016MARIANI, Daniel; ALMEIDA, Rodolfo. As características das Constituições pelo mundo. Nexo, 25 set. 2016. Disponível em: Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/grafico/2016/09/26/As-caracter%C3%Adsticas-das-Constitui%C3%A7%C3%B5es-pelo-mundo . Acesso em: 2 mar. 2023.
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), não se restringiu à tradicional previsão dos “princípios fundamentais”, que é a característica das constituições de outras democracias (Arantes; Couto, 2006ARANTES, Rogério Bastos; COUTO, Cláudio Gonçalves. Construção democrática e modelos de constituição. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 21, n. 61, p. 41-62, 2006.).

Os constituintes brasileiros de 1987-1988 incluíram, além desses princípios tradicionais, diversas políticas públicas e direitos sociais e coletivos em seus artigos, constitucionalizando temas que geralmente são deixados para a discricionariedade dos políticos. Uma das possíveis explicações do porquê dessa opção pode ser creditada às incertezas quanto ao futuro do país e da democracia que estava sendo construída.

Transformar políticas públicas e direitos coletivos em matéria constitucional, diminuindo a discricionariedade dos governos e dos legisladores, funcionaria como uma “apólice de seguro” (Dixon; Ginsburg, 2017DIXON, Rosalind; GINSBURG, Tom. The Forms and Limits of Constitutions as Political Insurance. International Journal of Constitutional Law, [s.l.], v. 15, n. 4, p. 988-1012, 2017.) para buscar minimizar eventuais revezes nas administrações futuras. Porém, na tentativa de constranger futuros governos, isso poderia não ser suficiente, ainda mais diante de uma sociedade hipossuficiente, incapaz de defender seus direitos por conta própria (Arantes, 2002ARANTES, Rogério Bastos. Ministério Público e política no Brasil. São Paulo: Educ: Sumaré: Fapesp, 2002.).

A lei, por si só, não tem capacidade de moldar e tornar previsível o comportamento dos políticos quando não está acompanhada de outros instrumentos institucionais. Uma medida complementar, mantendo a lógica de que governos futuros devem ter sua discricionariedade limitada, foi a previsão de um órgão estatal autônomo em relação aos políticos, protegido de alternâncias político-partidárias, que se responsabilizasse pelo acompanhamento da implementação desses direitos e dessas políticas previstos na Constituição.

O novo MP definido pelos constituintes, com autonomia em relação às mudanças de governo e formalmente protegido das ingerências político-partidárias, foi desenhado para aumentar as chances e assegurar maior previsibilidade de que as políticas públicas e os direitos coletivos previstos na nova Constituição fossem observados. Se as eleições e a alternância de poder levam imprevisibilidade, o que é inerente à democracia (Przeworski, 1984PRZEWORSKI, Adam. Ama a incerteza e serás democrático. Novos Estudos, [s.l.], v. 9, n. 2, p. 36-46, jul. 1984.), o MP seria uma das organizações que asseguraria algum grau de previsibilidade.

No lugar de se criar uma estrutura, os constituintes adaptaram um órgão já existente. Os MPs dos estados e o Federal mantiveram o nome e a clássica função do monopólio da ação penal pública. Para além disso, viram reforçada a atribuição de ser o principal ator autorizado a utilizar a recém-criada ação civil pública e a deter o monopólio do inquérito civil, justamente os principais instrumentos para a defesa pela via judicial das políticas públicas e dos direitos coletivos previstos na CF/88 (Cambi; Vasconcelos, 2016CAMBI, Eduardo; VASCONCELOS, João Paulo. Desjudicialização de políticas públicas e o Novo Código de Processo Civil: Contributo do Ministério Público e da advocacia pública à solução extrajudicial de conflitos. Revista de Direito Administrativo & Constitucional, Belo Horizonte, v. 16, n. 64, p. 225-251, abr./jun. 2016.; Rothenburg, 2021ROTHENBURG, Walter Claudius. Direitos sociais são direitos fundamentais: simples assim. São Paulo: Juspodivm, 2021.; Viegas et al., 2022VIEGAS, Rafael Rodrigues et al. O espaço formal de ação do Ministério Público entre 1989 e 2016: mudanças incrementais e ativação estratégica. Revista Direito Público, Brasília, v. 19, n. 101, p. 428-449, jan./mar. 2022.).

O papel de defensor dos interesses do Governo Federal, que exige lações de subordinação com o Poder Executivo, antes atribuição do MPF, ficou sob responsabilidade da Advocacia-Geral da União, formada, inicialmente, por procuradores federais que escolhessem fazer parte dessa nova e adaptada estrutura.

O MP desligado da subordinação do governo e defensor dos direitos e das políticas públicas previstos na CF/88 é uma das maiores - senão a maior - inovações organizacionais da nova institucionalidade criada na CF/88. O órgão, que era ligado ao Poder Executivo, como é comum às agências responsáveis pela ação penal pública nas democracias (Kerche, 2018KERCHE, Fábio. Independência, Poder Judiciário e Ministério Público. Caderno CRH, Salvador, v. 31, n. 84, p. 567-580, set./dez. 2018.), tornou-se independente de todos os Poderes de Estado, diminuindo as chances de interferência político-partidária.

A Constituição que pontuou a passagem da ditadura para a democracia no Brasil é, portanto, um marco para o MP e um ponto de partida para se entender como os promotores e os procuradores tornaram-se atores políticos tão relevantes, extrapolando seu papel jurídico stricto sensu. A constituinte foi para o MP uma “conjuntura crítica” (critical juncture) (Pierson, 2000PIERSON, Paul. Increasing Returns, Path Dependence, and the Study of Politics. The American Political Science Review, [s.l.], v. 94, n. 2, p. 251-267, jun. 2000.), em que eventos e decisões tomados no passado, geralmente concentrados em um período relativamente curto, têm impacto nos resultados posteriores (Capoccia, 2016CAPOCCIA, Giovanni. Critical Junctures. In: FIORETOS, Orfeo; FALLETI, Tulia G.; SHEINGATE, Adam (eds.). The Oxford Handbook of Historical Institutionalism. Oxford: Oxford University Press, 2016. p. 89-106.).

Essa interpretação, entretanto, não é unânime. Arantes (2002ARANTES, Rogério Bastos. Ministério Público e política no Brasil. São Paulo: Educ: Sumaré: Fapesp, 2002.) entende que a nova Constituição foi mais um avanço do MP em uma estratégia de “dois passos para a frente e nenhum para trás” que se inicia ainda no período autoritário. Isso porque a ação civil pública se transformou em lei ainda em 1985. O autor não considera fundamental em seu seminal trabalho, contudo, que o que podia ser judicializado pela ação civil pública durante a ditadura militar é consideravelmente ampliado pela CF/88 (Kerche, 2009KERCHE, Fábio. Virtude e limites: autonomia e discricionariedade do Ministério Público no Brasil. São Paulo: Edusp, 2009.; Rodrigues; Oliveira, 2022RODRIGUES, Rayane Vieira; OLIVEIRA, Vanessa Elias de. Ministério Público, judicialização e atuação extrajudicial em saúde. Revista Direito GV, São Paulo, v. 18, n. 3, e2231, set./dez. 2022.). Além disso, quando se observa o quadro de maneira mais ampla, a ação civil pública, assim como o inquérito civil, ganha maior relevância e singularidade porque passa a ser utilizada por promotores independentes dos governos.

Um promotor processar uma fábrica poluente seguindo as orientações do governo de plantão é condizente com o papel de enforcement da lei atribuída ao Poder Executivo, o modelo mais comum em perspectiva comparada. A novidade da CF/88 é que a decisão de processar ou não é tomada por um ator que não responde, formalmente, aos políticos e, no limite, à própria sociedade. Essa independência em relação aos políticos, em que promotores com ampla autonomia e instrumentos de ação podem atuar com enorme liberdade, é a inovação que impacta a atuação do MP e a política brasileira. A ocorrência de mudanças não incrementais em uma situação de conjuntura crítica não significa que não se guarde um elemento histórico na nova configuração ou que seja uma total ruptura com o passado (North, 1990NORTH, Douglass C. Institutions, Institutional Change, and Economic Performance. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.; Capoccia, 2016CAPOCCIA, Giovanni. Critical Junctures. In: FIORETOS, Orfeo; FALLETI, Tulia G.; SHEINGATE, Adam (eds.). The Oxford Handbook of Historical Institutionalism. Oxford: Oxford University Press, 2016. p. 89-106.).

Ademais, a literatura institucionalista salienta que uma combinação de fatores exógenos e endógenos facilita mudanças institucionais (Mahoney; Thelen, 2010MAHONEY, James; THELEN, Kathleen (eds.). Explaining Institutional Change: Ambiguity, Agency, and Power. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.). Essa mesma literatura aduz que há diferentes tipos de mudança institucional endógena: displacement, quando novas regras substituem as velhas; layering, a introdução de novas regras a par ou ao lado das regras existentes; drift, mudanças de regras que se tornam obsoletas devido a mudanças no contexto que envolve a instituição; e conversion, a alteração de regras existentes em razão de uma redefinição estratégica de sua aplicação (Mahoney; Thelen, 2010MAHONEY, James; THELEN, Kathleen (eds.). Explaining Institutional Change: Ambiguity, Agency, and Power. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.). A probabilidade de ocorrência desses tipos específicos de mudança depende dos atributos das regras institucionais vigentes e do contexto político.

Nosso ponto é: existe um modelo institucional de MP que permite mais autonomia e discricionariedade? Se a resposta for positiva, devemos lidar também com a questão de que os agentes que integram essa instituição fazem escolhas, o que em certos contextos e conjunturas críticas tornam-se mais relevantes e evidentes, como se observou no caso dos membros do MP na Assembleia Nacional Constituinte e na esteira da agenda anticorrupção na última década (Kerche, 2009KERCHE, Fábio. Virtude e limites: autonomia e discricionariedade do Ministério Público no Brasil. São Paulo: Edusp, 2009.; Marona; Kerche, 2021MARONA, Marjorie; KERCHE, Fábio. From the Banestado Case to Operation Car Wash: Building an Anti-Corruption Institutional Framework in Brazil. Dados, Rio de Janeiro, v. 64, n. 3, e20190240, 2021.; Viegas, 2023VIEGAS, Rafael Rodrigues. Caminhos da política no Ministério Público Federal. São Paulo: Amanuense, 2023.).

Se a matriz institucional favorece mais autonomia e discricionariedade, mudanças em certas práticas, inclusive a conformação de uma agenda anticorrupção, podem ser mais bem entendidas se também for considerada a análise da ação dos agentes eventualmente organizados e, sobretudo, situados historicamente. Considerar a combinação de fatores exógenos e endógenos e como os agentes fazem escolhas é importante para entender como um modelo institucional que favorece autonomia e discricionariedade pode ser utilizado em determinado contexto para mudanças com efeitos sobre a democracia e o funcionamento do Estado.

2. Métodos e fontes de dados

A metodologia empregada neste artigo é predominantemente qualitativa. Na análise de conteúdo de documentos realizada nas duas seções deste artigo, orientando-nos a teoria e as perguntas de pesquisa, valemo-nos da combinação de dois tipos procedimentos específicos: redução e estruturação (Viegas; Loureiro; Abrucio, 2022VIEGAS, Rafael Rodrigues; LOUREIRO, Maria Rita Garcia; ABRUCIO, Fernando. Do controle externo à simbiose com o sistema de justiça: a ação normativa do CNJ e do CNMP. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 37, n. 110, e3711005, jan. 2022.). Diante de enorme quantidade de documentos (atas das comissões e relatórios), realizamos a redução do material, preservando o conteúdo essencial. Em seguida, filtramos aspectos específicos e fizemos cortes para avaliar o material e formular a codificação. O resultado da avaliação e da codificação encontra-se em quadros, que sintetizam o conteúdo e possibilitam a comparação das propostas que tramitaram nas subcomissões e comissões da Assembleia Constituinte ao texto que foi aprovado e promulgado.

Na seção 3.1, realizamos a análise de conteúdo das atas das comissões instaladas para discussão sobre o MP na Assembleia Nacional Constituinte, o que previamente havia sido organizado e analisado por Kerche (2009KERCHE, Fábio. Virtude e limites: autonomia e discricionariedade do Ministério Público no Brasil. São Paulo: Edusp, 2009.). O material é de domínio público e encontra-se disponível no site do Senado. Nesse material, buscamos identificar como a instituição apareceu nos debates dos constituintes em cada uma das etapas da Assembleia Nacional Constituinte e as transformações das propostas que se seguiram até o desenho final previsto na CF/88.

Na seção 3.2, comparamos os resultados dos surveys desenvolvidos por Sadek (1996SADEK, Maria Tereza Aina (org.). O Ministério Público e a Justiça no Brasil. São Paulo: Sumaré, 1997.) e Lemgruber et al. (2016LEMGRUBER, Julita et al. Ministério Público: guardião da democracia brasileira? Rio de Janeiro: CESeC, 2016.), que mapearam o perfil dos membros do MP, incluindo a autopercepção deles em relação às atividades que desenvolvem. Como entre esses dois estudos há considerável lapso temporal, 20 anos, ambos os ensaios representam, aqui, um indicador das prioridades dos membros do MP e sobre como isso se alterou ao longo do tempo. Na mesma seção, analisamos os resultados da atuação prática dos integrantes do MPF. Partimos da análise realizada por Sampaio e Viegas (2019SAMPAIO, Mariana; VIEGAS, Rafael Rodrigues. Ministério Público: de fiscal a elaborador de políticas públicas. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 43., 2019, Caxambu. Anais [...]. São Paulo: [s.n.], 2019.) a respeito da atuação extrajudicial do MP entre 2015 e 2017; ampliamos o período, entre 2012 e 2018, e analisamos também dados sobre a atuação judicial do MPF de 2016 a 2018.

Em relação à atuação extrajudicial e judicial, o banco de dados foi organizado com base nas informações fornecidas pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) nos relatórios anuais das atividades. Os dados do CNMP sobre atuação em improbidade administrativa e patrimônio público foram por nós agregados, seguindo a sugestão de Sampaio e Viegas (2019SAMPAIO, Mariana; VIEGAS, Rafael Rodrigues. Ministério Público: de fiscal a elaborador de políticas públicas. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 43., 2019, Caxambu. Anais [...]. São Paulo: [s.n.], 2019.). Então, foi utilizada a estatística descritiva para analisar e gerar representações gráficas (frequência) (Patton, 2015PATTON, Michael Quinn. Qualitative Research and Evaluation Methods. 5. ed. Thousand Oaks: Sage Publications Inc., 2015.), possibilitando a comparação do combate à corrupção a outras áreas de atuação do MPF no mesmo período.

3. Resultados

3.1. A Assembleia Constituinte de 1987-1988 e o novo MP

Foram 583 dias de trabalho na Assembleia Constituinte para se chegar à nova Constituição, “o mais longo processo constituinte que se tem notícia” (Rocha, 2013ROCHA, Antônio Sérgio. Genealogia da Constituinte: do autoritarismo à democratização. Lua Nova, São Paulo, v. 88, p. 29-87, 2013., p. 69). A Assembleia era composta por 559 parlamentares constituintes, entre senadores e deputados, distribuídos por 13 partidos políticos e sem ter um projeto inicial para balizar os debates. A Comissão de Sistematização era encarregada de agrupar e redigir a proposta levada ao Plenário, a partir dos trabalhos de 24 subcomissões que se agrupavam em torno de oito comissões temáticas (Guram, 1988GURAN, Milton (org.). O Processo Constituinte 1987-1988: documentação fotográfica [sobre] a nova Constituição. Brasília: Agil-UnB, 1988.).

De um ponto de vista do posicionamento político dos constituintes, havia uma preponderância de parlamentares “progressistas”. Isso se refletia no controle da maior parte das relatorias das subcomissões e comissões, posições consideradas centrais no processo (Praça; Noronha, 2012PRAÇA, Sérgio; NORONHA, Lincoln. Políticas públicas e a descentralização da Assembleia Nacional Constituinte Brasileira. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 27, n. 78, p. 131-147, 2012.). O descontentamento dos parlamentares mais “conservadores” na Assembleia Constituinte ante essa predominância dos constituintes progressistas, que controlavam inclusive a Comissão de Sistematização, gerou uma mudança significativa nas regras do jogo em janeiro de 1988.

O grupo conservador que agrupava parlamentares mais à direita no espectro político, conhecido como “Centrão”, conseguiu diminuir o peso da Comissão de Sistematização, mudando as regras do processo constituinte. Essa mudança permitiu que fosse apresentado pelo Centrão um projeto alternativo ao da Comissão de Sistematização para a votação no Plenário, o que também aumentou a possibilidade de se apresentar emendas. Com o novo Regimento Interno criado a partir do Centrão, “foi possível levar todos os dispositivos elaborados nas comissões, sob maior influência dos progressistas, para nova votação em plenário” (Praça; Noronha, 2012PRAÇA, Sérgio; NORONHA, Lincoln. Políticas públicas e a descentralização da Assembleia Nacional Constituinte Brasileira. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 27, n. 78, p. 131-147, 2012., p. 132). Tudo isso diminui o peso do relator da Comissão de Sistematização (Coelho, 1999COELHO, Ricardo Corrêa. Partidos políticos, maiorias parlamentares e tomada de decisão na Constituinte. 1999. 285 f. Tese (Doutorado em Ciência Política) - Programa de Pós-Graduação em Ciência Política, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999.), embora haja certo consenso de que a Constituição poderia ser ainda mais progressista caso não houvesse a reação dos conservadores. Entretanto, não resultou em efeitos substantivos, porque

em apenas 32% dos casos a palavra final foi do plenário, seja inovando, seja dando redação definitiva a dispositivos criados em fases anteriores. Há ainda 4% de dispositivos “recuperados das comissões”. São casos em que a Comissão de Sistematização excluiu ou modificou dispositivos oriundos das comissões, porém suas redações originais foram restabelecidas em plenário (Praça; Noronha, 2012PRAÇA, Sérgio; NORONHA, Lincoln. Políticas públicas e a descentralização da Assembleia Nacional Constituinte Brasileira. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 27, n. 78, p. 131-147, 2012., p. 135).

O novo MP confirma esses achados, embora uma das mudanças advindas com o Centrão, a forma de indicação do procurador-geral da República, tenha tido importância decisiva sobre o combate à corrupção reforçado nos anos 2000. O projeto defendido especialmente pelos promotores pode ser considerado vitorioso. Das solicitações sugeridas pelo lobby da organização, o MP conseguiu autonomia, discricionariedade em relação às matérias cíveis e diversos instrumentos de poder (ação civil pública, inquérito civil, ação penal pública, etc.). Embora com variações de redação, todos esses pontos já estavam previstos desde 1987 ainda na Subcomissão do Poder Judiciário e do MP.

A não subordinação do MP ao Poder Executivo, modelo que rompeu com o que vigorou durante toda a República, foi inicialmente prevista pelos constituintes como um capítulo da Constituição e, em um segundo momento, como seção de um capítulo. Na essência, contudo, o que foi decidido desde o início dos trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte é que o MP não seria subordinado ao governo.

Fenômeno semelhante se deu em relação ao inquérito civil e à ação civil pública. Mesmo com variações na redação, em todos os projetos que tramitaram ao longo da Assembleia Nacional Constituinte havia a previsão de que os instrumentos serviriam principalmente para zelar pelo patrimônio público e social, pelo meio ambiente e pelos interesses difusos e coletivos, como pode ser observado no Quadro 1. As derrotas encontradas pelo lobby do MP foram a menor discricionariedade em relação à ação penal, a não autorização para a condução do inquérito criminal independentemente da Polícia e a indicação do procurador-geral não prever a lista tríplice votada pelos próprios procuradores federais, esta sim uma mudança de posição surgida após a mudança do Regimento Interno promovida pelo Centrão.

Cabe ressaltar que os integrantes do MP não foram autorizados a conduzir investigação criminal pela Assembleia Nacional Constituinte. Os promotores, ao receberem o inquérito policial, podem requerer o arquivamento ou oferecer denúncia para dar início à ação penal; de todo modo, é obrigatório o controle pelo Judiciário. Esse princípio da legalidade é diferente do adotado em outros modelos de promotorias. Em diferentes democracias, o promotor pode escolher quais casos devem ser julgados pelo juiz, funcionando como gatekeeper do sistema. Esse modelo regido pelo princípio da oportunidade assegura maior discricionariedade aos encarregados da ação penal. Como veremos adiante, todos esses aspectos foram revertidos a partir de 2003.

Quadro 1 -
Ação civil pública e inquérito civil nos projetos da Assembleia Nacional Constituinte e na Constituição Federal

Acerca da ação penal e da discricionariedade dos promotores para matérias criminais, fica evidente, já a partir do projeto da Comissão de Sistematização, que a condução do inquérito penal é uma atribuição da Polícia, e não de promotores e procuradores. De acordo com o que foi decidido, os promotores somente podem solicitar informações ao responsável pelo inquérito e são obrigados a consultar um juiz mesmo quando convencidos da inocência do acusado. Diferentemente da ação civil pública, o MP seria menos discricionário quando o assunto fosse matéria criminal, como pode ser observado no Quadro 2, a seguir.

Quadro 2 -
Aspectos relativos à relação entre o MP e a Polícia nos projetos da Assembleia Nacional Constituinte e na Constituição Federal

A terceira derrota foi em relação à indicação do procurador-geral da República. Até a mudança do Regimento Interno forçada pelo Centrão, a previsão era assegurar que os próprios membros do MP da União formassem uma lista tríplice para a escolha do presidente e aprovação do Senado, semelhante à que foi aprovada para os procuradores-gerais de Justiça dos MPs dos estados. Pelo modelo final adotado na Constituição, como pode ser visto no Quadro 3, o chefe do Executivo tem liberdade para apontar um integrante do MP para aprovação do Senado, diminuindo a autonomia do procurador-geral diante do presidente e dos políticos.

Quadro 3 -
Indicação e destituição dos procuradores-gerais nos projetos da Assembleia Nacional Constituinte e na Constituição Federal

Como esperado, todos os lobbies de órgãos públicos durante a constituinte demandaram mais autonomia e discricionariedade. O surpreendente seria o contrário. A pergunta relevante é por qual razão alguns conseguiram e outros não. Em relação ao MP, a resposta é porque os constituintes queriam, ante as incertezas, um defensor de direitos e políticas públicas distante dos interesses político-partidários conjunturais. A preocupação principal, naquele momento, não era o combate à corrupção.

O debate sobre corrupção, na verdade, foi marginal na Constituinte e a presença do tema beira a irrelevância. Considerando a frequência das palavras nas atas examinadas, na Subcomissão do Poder Judiciário e do MP, em que boa parte das inovações organizacionais foi decidida, a palavra “corrupção” foi proferida em apenas oito oportunidades. Mesmo nessas vezes, foi associada à corrupção no próprio Poder Judiciário ou em cartórios e não em relação a outros poderes e atores públicos.

A mesma situação ocorreu na busca pelas palavras “improbidade” e “roubalheira”, ambas sem um registro na Subcomissão do Poder Judiciário e do MP. “Desvio” foi dita sete vezes pelos constituintes e seus convidados, mas sem se relacionar à corrupção. “Direito”, por sua vez, foi utilizada 787 vezes, mas para se referir também à área de conhecimento, o “Direito”. Já “direitos”, associada às liberdades civis, foi dita 189 vezes. Outra forma de identificarmos isso é por meio da análise qualitativa/quantitativa, construindo-se uma nuvem de palavras (Figura 1), em que é possível perceber a força do debate quanto a diversos temas, mas a inexistência da questão da “corrupção”.

Figura 1 -
Nuvem de palavras

Em termos substanciais, ou seja, acerca do conteúdo, essa ausência do debate sobre corrupção se refletiu, por conseguinte, na própria Constituição. Novamente, considerando a frequência, “corrupção” aparece uma única vez no art. 14, que trata de cargos eletivos. A palavra “improbidade” aparece seis vezes, sendo quatro delas por emendas dos anos 2000. “Direitos”, por sua vez, aparece entre a redação original e suas emendas 98 vezes; dessas 98, 77 têm relação com os direitos civis, coletivos e políticos. Na seção da Constituição destinada ao MP, as palavras “corrupção” e “improbidade” não aparecem. A palavra “direitos” aparece uma vez a respeito dos direitos que constam na Constituição e outra em relação aos indígenas.

3.2. O MP como agência de combate à corrupção

O MP ganha autonomia e discricionariedade na CF/88 para atuar como um defensor de direitos. Seus principais instrumentos de poder, como a ação civil pública, encaixam-se perfeitamente nessa missão que foi desenhada pelos constituintes. E foi esse o tipo de atuação que marcou a nova organização nos anos 1990, embora essa nunca tenha sido a prioridade dos promotores e procuradores. Segundo surveys entre integrantes do MP, o “desejo sincero” da maioria era combater a corrupção.

Em 1996, 60% dos entrevistados, quando perguntados sobre suas prioridades, apontavam o combate à corrupção no topo da lista (Sadek, 1996SADEK, Maria Tereza Aina (org.). O Ministério Público e a Justiça no Brasil. São Paulo: Sumaré, 1997.). Vinte anos depois, deparados com pergunta semelhante, os integrantes do MP posicionaram-se no mesmo sentido: 62% dos entrevistados afirmaram que o combate à corrupção seria a grande prioridade, e a distância em relação a outros temas aumentou (Lemgruber et al., 2016LEMGRUBER, Julita et al. Ministério Público: guardião da democracia brasileira? Rio de Janeiro: CESeC, 2016.). Assuntos relativos aos direitos sociais e coletivos perderam espaço, como podemos notar ao analisar a Tabela 1.

Tabela 1 -
Prioridades declaradas dos integrantes do MP

A despeito da vontade do constituinte, o MP, em particular o Federal, conseguiu transformar as prioridades de seus integrantes identificadas nos surveys de 1996 e 2016 em uma política institucional mais ou menos organizada. No lugar de um órgão de defesa de direitos sociais e coletivos, assistimos à mudança paulatina do MPF em uma agência de accountability. Há uma diferença, contudo, de mais de duas décadas entre o desejo inicial dos integrantes do MP de transformar o combate à corrupção em prioridade e tornar isso efetivo, ao menos para o MPF. As razões disso serão discutidas na próxima seção.

Cabe agora demonstrar que associar o MPF ao combate à corrupção nos anos 2000 não é apenas uma impressão derivada da evidência que o assunto ganhou. Na verdade, há indicadores de que houve, ao menos até o início do Governo Bolsonaro (2019), uma substituição de prioridades, colocando o combate à corrupção no principal foco dos procuradores federais.

Em relação à atuação extrajudicial, foram instaurados mais de 500 mil inquéritos civis e procedimentos administrativos pelo MPF entre 2012 e 2018. Os dados apontam para uma atuação concentrada no combate à corrupção, sendo as outras duas temáticas mais frequentes: saúde e educação. Isso ratifica a tendência de priorizar o combate à corrupção, como identificada por Sampaio e Viegas (2019SAMPAIO, Mariana; VIEGAS, Rafael Rodrigues. Ministério Público: de fiscal a elaborador de políticas públicas. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 43., 2019, Caxambu. Anais [...]. São Paulo: [s.n.], 2019.). O Gráfico 1 sintetiza essas informações.

Gráfico 1 -
Temas dos inquéritos civis e procedimentos preparatórios instaurados (2012-2018)

Chamamos atenção para o fato de que, no mesmo período do processo de impeachment de Dilma Rousseff (2016) e no período da Operação Lava Jato, as investigações no âmbito do MPF em matéria de combate à corrupção tiveram crescimento significativo. No ano de 2016, por exemplo, as investigações sobre esse assunto praticamente quadruplicaram em comparação ao ano anterior, 2015. Dito de outro modo, a instituição se voltou para o controle da administração pública federal nesse mesmo período. Em compensação, as áreas de saúde e educação, em que pese tenham recebido incremento em relação aos anos anteriores e figurado como a segunda e a terceira áreas de maior atuação, representaram apenas um quarto da atuação extrajudicial do MPF quando comparadas à temática de combate à corrupção (Gráfico 1).

A situação se repete quando analisamos os dados dos procedimentos administrativos instaurados pelo MPF. Nesse caso, somente foi possível levantar os números desses procedimentos no período entre 2016 e 2018.1 1 O CNMP não fornece dados sobre a atuação em procedimentos administrativos de anos anteriores que permitam a comparação entre os anos. Essa, por sinal, foi uma das dificuldades encontradas na realização desta pesquisa. Os relatórios do CNMP sofrem diversas mudanças, ano após ano, e não trazem as mesmas informações de um ano para o outro. Observamos, por exemplo, que os relatórios alteram a sistemática de apresentação dos dados, em um ano trazendo o agregado da atuação, em outro os temas estão esparsos, dificultando a análise por pesquisadores experientes. Todavia, ainda assim, identificamos uma situação semelhante à dos inquéritos civis, no mesmo sentido de Sampaio e Viegas (2019SAMPAIO, Mariana; VIEGAS, Rafael Rodrigues. Ministério Público: de fiscal a elaborador de políticas públicas. In: ENCONTRO ANUAL DA ANPOCS, 43., 2019, Caxambu. Anais [...]. São Paulo: [s.n.], 2019.), em que a área de combate à corrupção representa mais do que o dobro dos procedimentos instaurados sobre saúde e educação agregados, justamente as outras duas áreas com maior atuação. O Gráfico 2 sintetiza essas informações sobre os procedimentos administrativos.

Gráfico 2 -
Temas dos procedimentos administrativos instaurados (2016-2018)

No caso da atuação judicial do MPF, o quadro delineado em relação à atuação extrajudicial, e aqui ratificado, não se alterou, ao contrário. A maior parte das ações civis públicas ajuizadas pela instituição no período entre 2016 e 20182 2 O problema encontrado aqui e que impossibilitou a análise de anos anteriores é o mesmo em relação aos procedimentos administrativos, ou seja, a falta de informação pelo CNMP. concentrou-se no tema de combate à corrupção. Nesse aspecto, constatamos que a judicialização de temas de políticas públicas que foram mais frequentes, como saúde e educação, recebeu foco ainda menor do que na atuação extrajudicial.

Nos três anos, a atuação judicial agregada do MPF nas áreas de saúde e educação (soma dessas duas áreas) representou quase um terço do esforço de combate à corrupção materializado nas ações ajuizadas. O Gráfico 3 reúne informações sobre as ações civis públicas e os seus três principais temas.

Gráfico 3 -
Temas das ações civis públicas ajuizadas (2016-2018)

Podemos afirmar que, em relação tanto à atuação extrajudicial quanto à judicial, o MPF priorizou a temática do combate à corrupção entre 2012 e 2018, em detrimento de outros assuntos para os quais está igualmente habilitado a agir pelos estatutos legais, em especial a defesa de direitos coletivos. Acerca do conteúdo das investigações e das ações civis ajuizadas, a instituição atuou intensamente em áreas ligadas à̀ corrupção, como improbidade administrativa, licitações, patrimônio público, atos administrativos, etc., em sentido contrário ao de assuntos ligados à saúde pública, ao meio ambiente, à educação, à habitação e ao urbanismo. Muitos desses outros temas nem sequer aparecerem nos relatórios do CNMP, a exemplo do meio ambiente no ano de 2015, dada a baixa frequência da atuação do MPF nesses assuntos, aparentemente secundários quando comparados ao combate à corrupção.

4. O novo e o novíssimo MP: o que aconteceu?

A partir de 2003, no início do primeiro Governo Lula, várias mudanças ocorreram e contribuíram para um MP, em particular o Federal, que se distanciou daquele pensado pelo constituinte. Há dois tipos de mudança que ocorreram no período que se estende pelo menos até o final do Governo Dilma Rousseff (2011-2016): mudanças que podemos chamar de institucionais e externas ao MP e mudanças organizacionais e internas à organização. Essa distinção se baseia na ideia de que uma coisa são as mudanças nas regras do jogo, outra coisa são os efeitos dessas mudanças nos jogadores (North, 1990NORTH, Douglass C. Institutions, Institutional Change, and Economic Performance. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.).

As mudanças institucionais foram aquelas decididas pelo governo, Congresso e Supremo Tribunal Federal (STF), entendidas e interpretadas pelo próprio MPF, assegurando e ampliando os instrumentos e a autonomia necessários para atuar primordialmente no combate à corrupção, embora não tenha sido necessariamente o objetivo dessas mudanças (Kerche; Marona, 2018KERCHE, Fábio; MARONA, Marjorie. O Ministério Público na Operação Lava Jato: como eles chegaram até aqui? In: KERCHE, Fábio; FERES JR., João (coords.). Operação Lava Jato e a democracia Brasileira. São Paulo: Contracorrente, 2018. p. 69-100.). Foi esse quadro institucional, por exemplo, que faltou ao sistema de justiça nas primeiras tentativas de organizar grandes operações contra a corrupção, como a Banestado e a Satiagraha, que, embora com os mesmos órgãos envolvidos e até alguns atores em comum, tiveram resultados diversos da Operação Lava Jato (Marona; Kerche, 2021MARONA, Marjorie; KERCHE, Fábio. From the Banestado Case to Operation Car Wash: Building an Anti-Corruption Institutional Framework in Brazil. Dados, Rio de Janeiro, v. 64, n. 3, e20190240, 2021.). Em resumo, todas as derrotas do lobby do MP na constituinte foram revertidas a partir de 2003, assegurando ainda mais autonomia e maior discricionariedade especialmente aos procuradores federais. Senão, vejamos.

Como já indicamos, as derrotas do lobby do MP na Constituinte de 1987-1988 foram menor discricionariedade em matérias criminais, condução dos inquéritos criminais pela Polícia e indicação do procurador-geral da República sem passar pela consulta dos integrantes do MPF. Todas foram revertidas a partir de 2003, como sintetizamos no Quadro 4, a seguir.

Quadro 4 -
CF/88 e após 2003

A primeira mudança ocorreu na forma de indicação do procurador-geral da República em 2003. O presidente Lula, a despeito da previsão constitucional, passou a indicar o mais votado pelos procuradores federais da lista formada pela Associação Nacional dos Procuradores da República. Essa mudança aumentou a independência do órgão, já que o chefe do MPF, para ser reconduzido ao cargo ao término do seu mandato de dois anos, precisava agradar aos seus colegas e não mais ao presidente (Kerche; Marona, 2022KERCHE, Fábio; MARONA, Marjorie. A política no banco dos réus: a Operação Lava Jato e a erosão da democracia no Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 2022.). Há fortes indicadores de que a mudança na forma de indicação, que assegurou ainda mais autonomia ao MPF em relação aos políticos, permitiu uma atuação mais agressiva dos procuradores-gerais da República acerca do governo no que tange ao combate à corrupção (Londero, 2021LONDERO, Daiane. O desenvolvimento de capacidades institucionais do Ministério Público Federal no combate à corrupção (1988-2018). 2021. 354 f. Tese (Doutorado em Políticas Públicas) - Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2021.).

A segunda mudança ocorreu em 2013 pela decisão do Governo Dilma e do Congresso como uma resposta às “jornadas de junho”, manifestações de rua com uma agenda difusa de críticas aos serviços e às políticas no Brasil (Alonso, 2017ALONSO, Angela. A política das ruas: protestos em São Paulo de Dilma a Temer. Novos Estudos, São Paulo, n. ju 2017, p. 49-58, 2017.). A Lei das Organizações Criminosas aumentou os instrumentos de poder e a discricionariedade dos procuradores ao permitir que estes negociassem delações premiadas com os acusados de crimes de forma bastante autônoma em relação ao Poder Judiciário, relativizando o princípio que obrigava que os integrantes do MP levassem todos os casos para a decisão do Poder Judiciário. Além disso, incentivou que o MP passasse a privilegiar a ação penal no lugar da ação civil pública para o combate à corrupção (Arantes, 2018ARANTES, Rogério Bastos. Mensalão: um crime sem autor? In: MARONA, Marjorie Correa; DEL RIO, Andrés (orgs.). Justiça no Brasil: às margens da democracia. Belo Horizonte: Arraes, 2018. p. 338-389.), instrumento que se mostrou mais efetivo judicialmente e, ao prever a prisão de políticos, simbolicamente mais expressivo no combate à corrupção.

Em 2015, o STF decidiu que o MP também poderia conduzir inquéritos penais, quebrando o monopólio da Polícia previsto pelos constituintes. Isso aumentou a discricionariedade dos promotores e procuradores, além de ter legalizado uma prática que muitos já faziam à revelia da lei (Kerche, 2014KERCHE, Fábio. O Ministério Público no Brasil: relevância, características e uma agenda para o futuro. Revista USP, São Paulo, n. 101, p. 113-120, 2014.). Essa autorização também aumenta a discricionariedade dos integrantes do MP. Em vez de aguardar o resultado das investigações da Polícia para, obrigatoriamente, apresentar o caso ao Poder Judiciário, diminuindo em tese a discricionariedade, os promotores podem atuar de maneira proativa e com maior independência da Polícia.

Por fim, mudanças promovidas pelo CNMP na expedição de resoluções reforçam a autonomia e o espaço de discricionariedade de procuradores e promotores, convergindo no mesmo sentido tanto das mudanças legislativas, em alguns casos antecipando-as, quanto da interpretação do STF (Viegas, 2022VIEGAS, Rafael Rodrigues. A face oculta do poder no Ministério Público Federal e o poder de agenda de suas lideranças. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 39, e260005, p. 1-32, 2022.; Viegas; Loureiro; Abrucio, 2022VIEGAS, Rafael Rodrigues; LOUREIRO, Maria Rita Garcia; ABRUCIO, Fernando. Do controle externo à simbiose com o sistema de justiça: a ação normativa do CNJ e do CNMP. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 37, n. 110, e3711005, jan. 2022.). Mencionam-se, por exemplo, os casos das resoluções do CNMP que regulamentam a atuação extrajudicial do MP nas esferas civil (Resolução n. 179/2017 [CNMP, 2017a]CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO (CNMP). Resolução n. 179, de 26 de julho de 2017. [2017a]. Disponível em: Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas-busca/norma/5275 . Acesso em: 10 jan. 2018.
https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-nor...
) e criminal (Resolução n. 181/2017 [CNMP, 2017b]CONSELHO NACIONAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO (CNMP). Resolução n. 181, de 7 de agosto de 2017. [2017b]. Disponível em: Disponível em: https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-normas-busca/norma/5277 . Acesso em: 10 jan. 2018.
https://www.cnmp.mp.br/portal/atos-e-nor...
), antes de esses temas serem tratados por lei no chamado “Pacote Anticrime”, uma das bandeiras “lavajatistas” e sobre os quais há pouco ou quase nenhum controle externo (atuação extrajudicial do MP).

Vale dizer que o CNMP tem uma maioria na sua composição de membros do MP, o que, por si só, reforça autonomia em detrimento do controle (Kerche; Oliveira; Couto, 2021KERCHE, Fábio; OLIVEIRA, Vanessa Elias de; COUTO, Cláudio Gonçalves. Os Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público no Brasil: instrumentos de accountability? Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 54, n. 5, p. 1334-1360, set./out. 2020.). Além disso, a presidência desse Conselho no período aqui em análise coube ao procurador-geral da República indicado com base na lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República, que registra passagem na direção dessa associação, ou seja, na defesa de interesses corporativos (Viegas, 2020VIEGAS, Rafael Rodrigues. Governabilidade e lógica de designações no Ministério Público Federal: os “procuradores políticos profissionais”. Revista Brasileira de Ciência Política, [s.l.], n. 33, e234299, p. 1-51, 2020., 2022).

À moldura institucional que ganhou novos contornos a partir de 2003 somam-se a apropriação e a interpretação dos próprios procuradores. Estes, como vimos na seção 3.2, entendem que seu papel prioritário deveria ser o combate à corrupção. Essa opinião referente a qual deveria ser a principal missão de cada procurador seria secundária se a estrutura fosse hierárquica e com pouco espaço para a discricionariedade de seus integrantes. Em uma estrutura organizacional hierárquica e pouco discricionária, a posição individual de cada um dos integrantes, em tese, tem um peso menor. Se cabe a um subordinado apenas aplicar uma decisão superior e esta é bastante específica, interessa menos saber se o funcionário concorda, se faria o mesmo se lhe coubesse decidir ou se ele é conservador ou progressista, ou qualquer outra coisa do gênero. Em um desenho como o do MP no Brasil, contudo, em que há autonomia diante das ingerências externas e em que a própria hierarquia é combinada a um amplo espaço de discricionariedade, a opinião individual pode se refletir mais intensamente na atuação do integrante do órgão. Ou seja, a agency no MP é mais importante do que seria, por exemplo, entre militares e sua estrutura altamente hierárquica.

Além disso, há sempre uma lacuna entre quem cria as regras e quem as deve aplicar. No caso do MPF, essa lacuna foi explorada em torno de projetos corporativos de poder, ou seja, por procuradores organizados em prol de objetivos comuns com relação à ampliação do espaço de discricionariedade (aprovação de leis, especialmente favoráveis à atuação dos procuradores em transações cíveis e criminais), maior orçamento e capacidade institucional de controle para o MPF, projetos esses desenvolvidos na esteira da agenda anticorrupção que ganhou força a partir de 2003 (Viegas, 2022VIEGAS, Rafael Rodrigues. A face oculta do poder no Ministério Público Federal e o poder de agenda de suas lideranças. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 39, e260005, p. 1-32, 2022.). Sem dúvida, há um espaço para que os atores reinterpretem essa institucionalidade em seu próprio interesse. Esse seria um elemento fundamental para entender mudanças institucionais (Mahoney; Thelen, 2010MAHONEY, James; THELEN, Kathleen (eds.). Explaining Institutional Change: Ambiguity, Agency, and Power. Cambridge: Cambridge University Press, 2010.). Os procuradores federais, portanto, ganharam ainda mais autonomia e instrumentos de poder para, baseados muitas vezes em suas concepções individuais ou nas de grupos políticos a que pertencem, que pudessem escolher e aplicar, quase sem constrangimentos,3 3 Nem mesmo o CNMP, criado em 2004, funciona efetivamente como um estímulo a uma atuação mais padronizada e previsível dos integrantes do MP. O CNMP é um órgão que reforçou a autonomia do MP; ele não incrementou os instrumentos de controle sobre os promotores e os procuradores, como se esperava (Kerche; Oliveira; Couto, 2021). aquilo que por diversas razões eles acreditam ser sua missão institucional, a despeito do que originalmente se pensou para o órgão.

Conclusão

A Carta de 1988 constitucionalizou uma série de políticas públicas e direitos coletivos. Nesse rol, encontram-se direitos como saúde, educação, consumo, habitação e urbanismo, meio ambiente, infância e juventude, entre outros. Foi para a defesa desses pontos que os constituintes asseguraram um MP com altas doses de autonomia dos políticos de maneira geral e do governo em particular. O combate à corrupção, embora sempre tenha sido apontado como uma prioridade para os integrantes do MP, não mereceu a mesma preocupação por parte dos constituintes. O MP no Brasil ganhou autonomia e discricionariedade para ser um defensor de direitos, não para ser primordialmente uma agência de combate à corrupção.

O que os relatórios mais atuais de atividades do MPF registram até 2018, contudo, é que os temas primordiais para os constituintes se tornaram, aparentemente, secundários quando comparados ao combate à corrupção. Tão importante quanto isso, o MPF não apenas priorizou o combate à corrupção como faz, de maneira geral, em detrimento de outros temas sensíveis para a população. É possível identificar como foi intensificado o combate à corrupção em momentos específicos, como as vésperas das eleições em 2013, em um dos momentos mais críticos da história política do país e que culminou com o impeachment de Dilma Rousseff.

Essa priorização do combate à corrupção é fruto de uma série de mudanças graduais, nem todas previstas para essa finalidade, tanto na institucionalidade do sistema de justiça como um todo quanto na própria organização do MP, em especial o Federal. O nosso estudo reforça as afirmações teóricas de que a combinação de fatores exógenos e endógenos facilita mudanças institucionais. No entanto, existe um modelo institucional que pode permitir maior autonomia e discricionariedade, que, em determinado contexto, podem ser utilizadas, por exemplo, contra o sistema político, conforme se verificou na Lava Jato.

A partir de 2003 diversas medidas foram tomadas reforçando ainda mais a autonomia e a discricionariedade do MPF, facilitando as oportunidades para a guinada do órgão de uma agência da defesa de direitos para uma de combate à corrupção. A escolha do procurador-geral por lista tríplice, a autorização dada pelo STF para que integrantes do MP possam conduzir investigações criminais, a possibilidade de fechar acordos de delação premiada, entre outras, são iniciativas exógenas que impactaram e reforçaram sobremaneira a possibilidade de que procuradores pudessem impor sua agenda, independentemente dos atores eleitos.

Os estudos que captaram a opinião de integrantes do MP, segundo a qual a prioridade deve ser o combate à corrupção, sugerem indícios de como essa passagem tem sido possível do ponto de vista endógeno. Ou seja, valores e visão de mundo dos promotores e procuradores, sociabilizados de diferentes modos (dos bancos universitários aos grupos políticos internos do MP, passando pela origem de classe e racial), são pouco orientados e limitados por regras formais. Ao contrário: as regras formais moldam pouco os comportamentos, deixando espaço para que as prioridades sejam definidas pelo próprio órgão, distante da accountability normativamente indicada nas democracias.

Em pesquisas futuras, pode ser interessante investigar melhor como o MPF exerceu sua autonomia administrativa e financeira no mesmo período aqui analisado, a fim de entender como realizou a gestão de recursos (estrutura física, informatização, servidores, etc.), eventualmente priorizando a alocação de recursos em algumas áreas, em detrimento de outras igualmente relevantes. Ademais, conhecer melhor os dados sobre a movimentação na carreira, concursos públicos para membros e servidores, profissionalização de setores, como a comunicação institucional, pode ajudar a entender melhor a governança do MPF nos últimos anos, o que pode ser replicado, para fins de comparação, em relação aos MPs dos estados.

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  • VIEGAS, Rafael Rodrigues. A face oculta do poder no Ministério Público Federal e o poder de agenda de suas lideranças. Revista Brasileira de Ciência Política, n. 39, e260005, p. 1-32, 2022.
  • VIEGAS, Rafael Rodrigues. Governabilidade e lógica de designações no Ministério Público Federal: os “procuradores políticos profissionais”. Revista Brasileira de Ciência Política, [s.l.], n. 33, e234299, p. 1-51, 2020.
  • VIEGAS, Rafael Rodrigues et al O espaço formal de ação do Ministério Público entre 1989 e 2016: mudanças incrementais e ativação estratégica. Revista Direito Público, Brasília, v. 19, n. 101, p. 428-449, jan./mar. 2022.
  • VIEGAS, Rafael Rodrigues; LOUREIRO, Maria Rita Garcia; ABRUCIO, Fernando. Do controle externo à simbiose com o sistema de justiça: a ação normativa do CNJ e do CNMP. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 37, n. 110, e3711005, jan. 2022.
  • 1
    O CNMP não fornece dados sobre a atuação em procedimentos administrativos de anos anteriores que permitam a comparação entre os anos. Essa, por sinal, foi uma das dificuldades encontradas na realização desta pesquisa. Os relatórios do CNMP sofrem diversas mudanças, ano após ano, e não trazem as mesmas informações de um ano para o outro. Observamos, por exemplo, que os relatórios alteram a sistemática de apresentação dos dados, em um ano trazendo o agregado da atuação, em outro os temas estão esparsos, dificultando a análise por pesquisadores experientes.
  • 2
    O problema encontrado aqui e que impossibilitou a análise de anos anteriores é o mesmo em relação aos procedimentos administrativos, ou seja, a falta de informação pelo CNMP.
  • 3
    Nem mesmo o CNMP, criado em 2004, funciona efetivamente como um estímulo a uma atuação mais padronizada e previsível dos integrantes do MP. O CNMP é um órgão que reforçou a autonomia do MP; ele não incrementou os instrumentos de controle sobre os promotores e os procuradores, como se esperava (Kerche; Oliveira; Couto, 2021KERCHE, Fábio; OLIVEIRA, Vanessa Elias de; COUTO, Cláudio Gonçalves. Os Conselhos Nacionais de Justiça e do Ministério Público no Brasil: instrumentos de accountability? Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 54, n. 5, p. 1334-1360, set./out. 2020.).
  • Como citar este artigo

    KERCHE, Fábio; VIEGAS, Rafael Rodrigues. O Ministério Público Federal: de defensor de direitos a combatente da corrupção (1988-2018). Revista Direito GV, São Paulo, v. 20, e2408, 2024. https://doi.org/10.1590/2317-6172202408

Editado por

Editora responsável

Catarina Helena Cortada Barbieri (Editora-chefe)

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Abr 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    11 Mar 2023
  • Aceito
    10 Ago 2023
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