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Base Nacional Comum Curricular: impacto sobre a cultura profissional e a forma escolar

The National Common Curriculum Base: impacts on the professional culture and the school framework

Base Nacional Curricular Común: impacto en la cultura profesional y la forma escolar

Resumo:

A Base Nacional Comum Curricular (BNCC) na educação infantil e no ensino fundamental é certamente uma das mais importantes novidades da política educacional brasileira. A motivação da BNCC está associada ao enfrentamento de aspectos crônicos da desigualdade escolar, por meio da delimitação de um conjunto de competências e habilidades capazes de lastrear a organização de currículos e de políticas curriculares orientadas para a valorização da centralidade do estudante e de seu direito à aprendizagem. O artigo pretende analisar empiricamente a incidência da BNCC sobre a cultura profissional, em especial a dos professores, bem como sobre a forma escolar. Para tanto, parte de um diálogo entre a sociologia da educação e a literatura especializada em políticas públicas, explorando questões relacionadas às teorias da resistência à mudança. O estudo mobiliza inédita pesquisa, realizada em escala nacional, com 48 mil profissionais e cerca de 35 mil estudantes de 5º e 9º anos das redes públicas. Apesar de a análise dos dados apontar para uma recepção positiva da BNCC por parte dos profissionais da educação, o padrão de respostas dos estudantes sugere níveis mais profundos de resistência, o que remete ao caráter tendencialmente inercial da forma escolar.

Palavras-chave:
BNCC; política educacional; cultura profissional; forma escolar

Abstract:

The National Common Curriculum Base (BNCC) in early childhood and primary education is certainly one of the most important innovations in Brazilian educational policy. Its motivation is associated with tackling chronic aspects of school inequality, through the delimitation of a set of skills and abilities capable of upholding the organization of curricula and curriculum policies aimed at valuing the centrality of students and their right to learning. This study intends to empirically analyze the impact of the BNCC on professional culture, in particular of teachers, as well as on school structuring. In this sense, it stems from a dialogue between the sociology of education and the literature specialized in public policy, exploring issues related to theories of resistance to change. The study mobilizes unprecedented research, carried out on a national scale, with 48,000 professionals and nearly 35,000 5th and 9th grade students from public schools. Despite data analysis pointing to a positive reception of the BNCC by education professionals, the students' response pattern suggests deeper levels of resistance, which refers to a trending inertial character of the school framework.

Keywords:
BNCC; educational policy; professional culture; school framework

Resumen:

La Base Nacional Curricular Común (BNCC) en la educación infantil y educación primaria es, sin duda, una de las innovaciones más importantes de la política educativa brasileña. La motivación está asociada al abordaje de aspectos crónicos de la desigualdad escolar, a través de la delimitación de un conjunto de competencias y habilidades capaces de ampliar la organización de currículos y políticas curriculares tendientes a valorar la centralidad del estudiante y su derecho a aprender. El artículo pretende analizar empíricamente el impacto de la BNCC en la cultura profesional, especialmente de los profesores, así como en la forma escolar. Para ello, parte de un diálogo entre la sociología de la educación y la literatura especializada en políticas públicas, explorando cuestiones relacionadas con las teorías de la resistencia al cambio. El estudio moviliza una investigación inédita, realizada a escala nacional, con 48.000 profesionales y cerca de 35.000 estudiantes de 5º y 9º grados de escuelas públicas. Aunque el análisis de los datos apunta a una recepción positiva de la BNCC por parte de los profesionales de la educación, el patrón de respuestas de los estudiantes sugiere niveles más profundos de resistencia, lo que se refiere al carácter tendencialmente inercial de la forma escolar.

Palabras clave:
BNCC; política educativa; cultura profesional; forma escolar

Introdução

O processo que leva à Base Nacional Comum Curricular (BNCC)BRASIL. Ministério da Educação (MEC). Base Nacional Comum Curricular: educação é a base. Brasília, DF: MEC, 2018. deve ser compreendido sob a moldura do federalismo da educação brasileira, estabelecido em 1988 e consolidado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), de 1996. Com a LDB de 1996, toma impulso um reformismo curricular por parte dos estados e municípios e uma crescente preocupação da União com a definição de parâmetros e diretrizes capazes de garantir alguma unidade ao ensino básico. Disso resultam esforços como os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), de 1997, e as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), cuja última versão data de 2013. Paralelamente, a União também estabelece formas de regulação da qualidade do ensino, com a implantação de um sistema nacional de avaliação, do qual resulta, entre outros instrumentos, o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb).

Nesse quadro de consolidação do modelo federalista em matéria de educação, o II Plano Nacional de Educação (PNE), Lei nº 13.005, de 2014BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jun. 2014. Seção 1, p. 1. Edição extra., formula a Meta 7, que trata da “qualidade da educação básica em todas as etapas e modalidades” (Brasil, 2014BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jun. 2014. Seção 1, p. 1. Edição extra.), definindo como sua “primeira estratégia”:

[...] estabelecer e implantar, mediante pactuação interfederativa, diretrizes pedagógicas para a educação básica e a base nacional comum dos currículos, com direitos e objetivos de aprendizagem e desenvolvimento dos(as) alunos(as) para cada ano do ensino fundamental e médio, respeitada a diversidade regional, estadual e local. (Brasil, 2014BRASIL. Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação - PNE e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 26 jun. 2014. Seção 1, p. 1. Edição extra., Estratégia 7.1, grifo nosso).

Essa orientação normativa determina os aspectos fundamentais da BNCC, trazendo para o centro do debate educacional o tema da gestão do currículo, ao realçar aspectos como pactuação interfederativa, centralidade dos direitos e objetivos de aprendizagem e respeito à diversidade regional e local. Com a Lei do II PNE, o governo federal se vê chamado a implementar a BNCC, o que começa a ocorrer em 2015, com a instalação pelo Ministério da Educação (MEC) de uma comissão de especialistas, encarregada de iniciar a redação preliminar de uma versão que delimitasse com nitidez as competências e habilidades que deveriam estar presentes em todas as etapas de ensino. Essa primeira versão é submetida a amplo escrutínio público ao longo de 2015, mas o contexto político impactado pelo processo de impeachment de Dilma Rousseff, no ano seguinte, acaba por comprometer esse esforço de escuta. Com isso, somente após muitas idas e vindas e já em fins de 2017, sob o governo de Michel Temer, o MEC aprova uma versão consolidada da Base para a educação infantil (EI) e o ensino fundamental (EF).

A título de introdução ao tema, é importante destacar dois aspectos a respeito da BNCC. O primeiro se refere ao seu processo de implementação, que depende de uma ampla mobilização e articulação interfederativa das redes de educação e de seus profissionais. O segundo concerne à ambição pedagógica da Base, decorrente de uma concepção de educação integral voltada à “construção intencional de processos educativos que promovam aprendizagens sintonizadas com as necessidades, as possibilidades e os interesses dos estudantes e, também, com os desafios da sociedade contemporânea” (Brasil. MEC, 2018 VI Doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC - Rio). Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC - Rio) Rio de Janeiro Rio de Janeiro Brazil , p. 14). Para alcançar esses objetivos, a Base acrescenta aos componentes curriculares propostos para todas as etapas do ensino básico um conjunto de dez competências gerais, as quais postulam que os currículos devem ser capazes de valorizar o conhecimento, a ciência, o pensamento crítico, o repertório cultural, a comunicação e a cultura digital; além disso, devem estimular nos estudantes a compreensão sobre o trabalho e o projeto de vida, a capacidade de argumentação, a empatia e a cooperação, a responsabilidade e a cidadania.

A mobilização interfederativa das redes educacionais e de seus profissionais e a ambição propriamente pedagógica da BNCC fazem dela uma política pública bem mais abrangente do que simplesmente um conjunto de competências e habilidades para servirem de referência aos currículos. Por certo, um processo como esse não se realiza sem uma intensa disputa em torno de seus objetivos, procedimentos de deliberação, participação e decisão. É o que nos mostra Frossard (2020FROSSARD, M. Raízes epistemológicas dos discursos sobre a Base Nacional Comum Curricular. 2020. 219 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - Instituto de Ciências Sociais, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2020.), ao revelar que o processo de concepção da Base foi bastante conflituoso, marcado pela falta de consenso e pela polifonia de diferentes grupos e atores.

Ainda que os seus objetivos não tenham sido até o momento plenamente alcançados, e sequer sabemos se isso de fato ocorrerá, pois são muitos os problemas e percalços para a sua implementação, incluindo os efeitos decorrentes do longo interregno da pandemia, é inegável que a BNCC pretende significar uma grande virada na relação das redes educacionais com os currículos, os quais passam a ter maior centralidade na garantia dos direitos à aprendizagem dos estudantes.

Neste artigo, pretende-se analisar mais especificamente a maneira como a implementação da BNCC para a EI e o EF incide sobre a cultura profissional, em especial dos professores, bem como sobre a forma escolar. Para tanto, mobilizamos dados de uma pesquisa inédita realizada pelo Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação da Universidade Federal de Juiz de Fora (CAEd/UFJF), sob convênio com a Secretaria de Educação Básica do Ministério da Educação (SEB/MEC), com profissionais e estudantes das redes estaduais e municipais de ensino. Por meio de uma amostra composta de 250 municípios de todas as regiões do País e com incidência em 1.490 escolas, a pesquisa reúne dados de duas aplicações, realizadas de modo on-line em 2021 e 20221 1 A primeira aplicação dos instrumentos com os profissionais ocorreu de forma digital, entre 17 de junho e 16 de julho de 2021, por meio de uma plataforma. Nela, das 2.001 escolas selecionadas, participaram 1.395, distribuídas nas 27 unidades da Federação e em 217 municípios, sendo 597 escolas estaduais e 798 municipais. A amostra adotada para a segunda aplicação foi a mesma utilizada na primeira, ou seja, 250 municípios e 2.001 escolas. A aplicação dos instrumentos também ocorreu de forma digital, por meio da plataforma, entre maio e junho de 2022. Na segunda aplicação, a pesquisa alcançou um número maior de escolas e municípios: participaram profissionais de 1.490 escolas, localizadas em 222 municípios, sendo 521 estaduais e 969 municipais. As duas aplicações contaram com a participação de uma equipe de campo, composta por coordenadores estaduais, municipais e de escolas, responsáveis pela mobilização e pelo apoio técnico aos participantes. , alcançando em cada caso cerca de 24 mil profissionais de educação, incluindo cerca de 18 mil professores em cada aplicação, conforme demonstra a Tabela 1. A investigação também conta com dados oriundos de questionários aplicados presencialmente a 35.535 estudantes de EF, no primeiro semestre de 2022, 18.756 (53%) do 5º ano e 16.779 (47%) do 9º ano. Adicionalmente, a pesquisa reúne um banco de entrevistas, feitas remotamente no início de 2021, com 23 secretários ou dirigentes estaduais e 139 secretários ou dirigentes municipais, a respeito da implementação da BNCC em suas redes2 2 As entrevistas ocorreram entre 14 de abril e 21 de julho de 2021, por meio do Google Meet. Destaca-se aqui o apoio fundamental do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) para a sua realização. Para o tratamento das entrevistas com os dirigentes estaduais, foi inicialmente feita a transcrição, para posterior análise. Já para os dirigentes municipais, foi feita uma memória para cada entrevista. Os trechos dessas memórias foram posteriormente analisados pelos conjuntos formados a partir de categorias escolhidas. Para formação desses conjuntos e auxílio nas análises, foi utilizado o software R. .

Tabela 1
Profissionais participantes nas duas aplicações dos instrumentos quantitativos da pesquisa - 2021-2022

Serão priorizados os dados sobre a participação dos profissionais nas atividades relacionadas à implementação da BNCC; a percepção deles a respeito do impacto sobre a gestão educacional e escolar e sobre a centralidade do currículo; bem como os dados concernentes ao grau de exposição dos estudantes às atividades da BNCC. Para refletir acerca dessas informações, vamos trabalhar com duas ordens de questões, ambas ligadas à sociologia do currículo: a primeira, associada ao debate sobre a implementação de políticas públicas educacionais e como ela interage com a maior ou menor adesão dos profissionais, em especial daqueles que estão no “nível da rua”; a segunda, tocante ao modo pelo qual a Base estabelece pontos de tensão com a forma escolar, na medida em que pretende induzir mudanças na maneira pela qual a escola tradicionalmente se relaciona com os estudantes.

As evidências empíricas reunidas na pesquisa apontam para uma recepção positiva da BNCC por parte dos profissionais da educação, inclusive professores. No entanto, os dados oriundos das respostas dos estudantes apontam para níveis mais profundos de resistência, sugerindo que a realização da dimensão mais inovadora da Base, ou seja, aquela que realmente pretende transformar o trabalho escolar por meio do currículo, demandará muito mais debate e investimentos do que os empreendidos até o momento.

Cultura profissional, forma escolar e resistência à mudança

Uma hipótese recorrente às teorias da resistência à mudança é a de que as categorias profissionais tendem a ser mais impermeáveis a iniciativas propostas “de cima”, em um modelo top-down. Não menos recorrente é a hipótese de que, dependendo do contexto, as mudanças pretendidas de tipo bottom-up frequentemente não teriam força suficiente para de fato modificarem comportamentos. Diante desse tipo de dilema, a literatura que trabalha com políticas sociais e educacionais vem propondo há algum tempo abordagens que combinam as duas lógicas, conciliando impulsos transformadores vindos de cima, com um maior controle e apropriação de processos de envolvimento, participação e resistência ativa por parte dos profissionais dos diferentes níveis da cadeia organizacional (Segatto, 2012SEGATTO, C. I. Análise da implementação de políticas públicas: o Programa de Alfabetização na Idade Certa em dois municípios cearenses. Temas de Administração Pública, [S. l.], v. 4, n. 7, p. 1-16, 2012.; Lotta, 2015LOTTA, G. S. Burocracia e implementação de políticas de saúde: os agentes comunitários na estratégia Saúde da Família. Rio de Janeiro: Fiocruz, 2015.; Louzano et al., 2018LOUZANO, P. et al. Implementação de políticas educacionais: elementos para o debate e contribuições para o campo. Cadernos Cenpec, São Paulo, v. 8, n. 2, p. 102-133, jul./dez. 2018.).

Desde os anos de 1990, o Brasil vem passando por reformas educacionais que, com variadas características, têm em comum a busca da melhoria dos resultados escolares, mensurados por instrumentos de avaliação externa e indicadores de desempenho (Dusi, 2017DUSI, C. S. C. O. Os efeitos da gestão para resultados na educação: uma análise das políticas públicas educacionais de sete estados brasileiros. 2017. 274 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - Departamento de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.). Tais reformas colocam em cena a discussão sobre a resistência à mudança na cultura profissional no âmbito da gestão escolar e da gestão de sistemas educacionais, que são domínios especialmente complexos, com diferentes tipos de atores, os quais contam com graus variáveis de autonomia e discricionariedade (Oliveira; Peixoto, 2021OLIVEIRA, B. R.; PEIXOTO, M. C. L. Street-level bureaucracy and public policies: analyzing educational policy implementation from the perspective of schools and teachers. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 37, e219212, 2021.). Por isso, no domínio da educação, ganha especial relevância a construção de políticas capazes de articular aspectos do tipo top-down com outros do tipo bottom-up, contrapondo desenhos de políticas concebidas desde o vértice de uma burocracia, e que emprestam maior importância à decisão de seus formuladores, às políticas concebidas como um processo que pressupõe uma retroalimentação contínua entre o que é decidido e o que é efetivamente realizado por aqueles que estão na base de uma cadeia de comando, a street-level bureaucracy, para utilizar a conhecida expressão de Lipsky (1969LIPSKY, M. Toward a theory of street-level bureaucracy. Madison: University of Wisconsin, 1969.).

Parte da literatura especializada no assunto chama a atenção para o fato de que políticas de tipo top-down até podem conseguir resultados mais rápidos na área da educação, mas dificilmente serão sustentáveis, se não conseguirem transitar para um modelo mais bottom-up. Como afirma Hopkins (2010HOPKINS, D. Every school a great school: realising the potential of system leadership. In: HARGREAVES, A. et al. (Org.). Second international handbook of educational change . [Dordrecht]: Springer, 2010. p. 741-764.), as reformas de larga escala têm insistido em mudanças a partir do vértice e usam os resultados de avaliação externa como seu espelho, sem alterarem mais profundamente o sistema. Na direção oposta, o autor destaca a importância de se desenvolver a capacidade profissional no nível da escola, o que pressupõe intensiva mobilização e participação, como forma de se assegurar maior sustentabilidade da melhoria dos resultados.

Em outro artigo, apontamos indícios de que, contemporaneamente, estaria ganhando força uma corrente que denominamos “pós-gerencialista”, voltada para conciliar reformas educacionais de larga escala com uma abordagem capaz de orientar o processo de mudança mediante o envolvimento dos profissionais que atuam no “nível da rua”, buscando, para tanto, novas formas de equilíbrio entre as abordagens top-down e bottom-up (Burgos; Bellato, 2019BURGOS, M.; BELLATO, C. Gerencialismo e pós-gerencialismo: em busca de uma nova imaginação para as políticas educacionais no Brasil. Sociologia & Antropologia, Rio de Janeiro, v. 9, n. 3, p. 919-943, set./dez. 2019.). De um lado, essa tendência pós-gerencialista se mostraria muito preocupada em não perder de vista que, mesmo abrindo espaço para a discricionariedade, processos de reforma educacional precisam ser conduzidos de modo sistêmico (Fullan, 2010FULLAN, M. Positive pressure. In: HARGREAVES, A. et al. (Org.). Second international handbook of educational change. [Dordrecht]: Springer, 2010. p. 119-130. (Springer International Handbooks of Education, 23).). De outro lado, autores como Hargreaves (2009HARGREAVES, A. The fourth way of change: towards an age of inspiration and sustainability. In: HARGREAVES, A.; FULLAN, M. (Ed.). Change wars. Bloomington: Hawker Brownlow Education, 2009. p. 11-44.) observam que cada vez menos são as intervenções e as políticas governamentais que sustentam mudanças na área da Educação, mas sim pessoas trabalhando juntas como uma equipe em torno de propósitos comuns e objetivos claros que tenham um sentido real para elas. O desafio atual para os projetos de reforma seria, portanto, fazer com que diferentes pessoas trabalhem cooperativa e efetivamente por uma causa comum, animadas por uma ética de responsabilidade profissional.

Mobilizar esse debate bibliográfico para pensar a implementação da BNCC parece muito oportuno, porque estamos diante de uma política que reúne um amplo conjunto de atores e de processos, o que torna especialmente complexa a sua coordenação (Torres; Camelo; Castro, 2019TORRES, H. G.; CAMELO, R.; CASTRO, M. H. G. Dificuldades de coordenação e políticas educacionais no Brasil: o caso do ensino fundamental. Dados, Rio de Janeiro, v. 62, n. 4, e20170226, 2019.). A Base envolve os três entes da Federação; as instâncias organizacionais que procuram facilitar regimes de cooperação, como o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e a União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime); as secretarias de educação, com as suas burocracias frequentemente organizadas em três níveis; as escolas, com sua gestão relativamente autônoma; os professores e a sala de aula, com seu ambiente específico; e finalmente as comunidades escolares. Também gravitam em torno dessa cadeia organizacional sindicatos dos profissionais da educação, movimentos estudantis, organizações não governamentais parceiras das redes que, não raro, atuam como advocacy em prol de reformas educacionais, grupos de interesse com motivações políticas e ideológicas, além de interesses econômicos diversos (Frossard, 2020FROSSARD, M. Raízes epistemológicas dos discursos sobre a Base Nacional Comum Curricular. 2020. 219 f. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) - Instituto de Ciências Sociais, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2020.).

Na medida em que propõe assegurar o direito de aprendizagem de determinadas competências e habilidades comuns a todos os estudantes, a Base exige que as redes e as escolas se organizem de modo a assegurarem a equidade no acesso à aprendizagem. Um empreendimento dessa monta implica repensar a formação de professores e gestores, o tipo e as formas de uso dos materiais didáticos, as estratégias de avaliação e a gestão do currículo na escola. E implica, sobretudo, um deslocamento copernicano na relação da escola com os estudantes, porque agora está em jogo colocá-los de fato no centro do processo educacional.

Como argumentamos neste artigo, ao exigir que a escola valorize a participação dos estudantes, levando em conta sua realidade concreta, e preste atenção na diversidade do alunado e nas diferentes capacidades para o aprendizado, a BNCC obriga a efetivação de profundas mudanças na forma escolar, indo além do que se caracteriza como cultura profissional no sentido mais estrito. Por isso, nossa hipótese é a de que, no caso dos profissionais da educação, em especial dos professores, a resistência à mudança não pode ser lida apenas com fundamento no impacto que uma determinada política tem sobre suas motivações e práticas, mas também em como essa resistência se relaciona com formas institucionais amplamente consolidadas e, de certo modo, cristalizadas.

Com efeito, a exploração sociológica do debate em torno da forma escolar deveria ser incorporada como dimensão fundamental da teoria da resistência à mudança. Isso fica evidente ao considerarmos, por exemplo, a linhagem proposta por Bourdieu, a respeito do processo de introjeção de uma determinada forma institucional sobre seus profissionais e seu público; ou então a proposta teórica de Vincent, que se afasta da matriz durkheimiana na qual bebe Bourdieu, preferindo pensar a forma segundo uma premissa fenomenológica, valorizando as representações sobre as formas como base para processos específicos de socialização.

Em textos escritos entre 1967 e 1970, Bourdieu (1992BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1992. (Coleção Estudos, 20).) sustenta a importância do papel específico da forma escolar no desenvolvimento de lógicas próprias de pensamento, que forjam nos diferentes grupos sociais habitus comuns; a escola como uma espécie de engrenagem que difunde um habitus de uma determinada classe ou grupo social na sociedade como um todo, em um processo que, como ele afirma, “impõe de modo bem mais sutil a legitimidade de seus produtos e de suas hierarquias” (Bourdieu, 1992BOURDIEU, P. A economia das trocas simbólicas. São Paulo: Perspectiva, 1992. (Coleção Estudos, 20)., p. 311). Enquanto Bourdieu insiste na relação entre a forma escolar e a estrutura social e sua reprodução, autores como Vincent, Lahire e Thin (2001VINCENT, G.; LAHIRE, B.; THIN, D. Sobre a história e a teoria da forma escolar. Educação em Revista , Belo Horizonte, n. 33, p. 7-47, jun. 2001.) nos lembram dos vínculos profundos entre a forma escolar, desenhada e consolidada entre os séculos 18 e 19, e a organização do Estado moderno com suas formas próprias de controle social. Para esses três autores, a escola produz uma forma de socialização que é difundida e apropriada por diferentes áreas da sociedade, em uma espécie de escolarização da sociedade.

A esse respeito, o próprio Vincent (2008VINCENT, G. La socialisation démocratique contra la forme scolaire. Education et francophonie, [S. l.], v. 36, n. 2, p. 47-62, 2008.), em outro trabalho, realiza uma interessante reflexão sobre como a forma escolar pode guardar fortes contradições com a cultura democrática. Invocando Habermas, Vincent (2008) assume que a forma específica da socialização democrática pressupõe o preparo para a argumentação e a indeterminação prévia dos seus resultados. O autor reserva o uso do termo “forma escolar” às dinâmicas de aprendizagem caracterizadas pelo silêncio do aluno, pela memorização e pela submissão alcançada por meio de constrangimento a regras impessoais. A essa escola, cuja origem remonta ao século 18, mas que permanece atual, ele opõe a escola em que os alunos falam, têm a palavra, discutem para encontrar as razões e as justificativas. No entanto, Vincent (2008VINCENT, G. La socialisation démocratique contra la forme scolaire. Education et francophonie, [S. l.], v. 36, n. 2, p. 47-62, 2008.) argumenta que, se a socialização democrática se estendesse plenamente à transmissão escolar, poderia levá-la à destruição, o que também explicaria o fato de seus profissionais tenderem a adotar uma postura de resistência diante do risco da submissão da escola às exigências da democracia.

Em síntese, enquanto em Bourdieu a cristalização da forma escolar produz uma cultura, convertida em habitus (por isso mesmo mais impermeável à mudança), que tende a reproduzir formas institucionais, em Vincent, Lahire e Thin (2001VINCENT, G.; LAHIRE, B.; THIN, D. Sobre a história e a teoria da forma escolar. Educação em Revista , Belo Horizonte, n. 33, p. 7-47, jun. 2001.), a resistência à mudança está relacionada a escolhas que, no entanto, não são feitas como fruto de deliberações resultantes de cálculos individuais ou coletivos animados por racionalidade voltada a fins ou valores (para usar terminologia weberiana), mas sim como efeito das clivagens que se estabelecem entre diferentes formas de socialização, das quais a escolar é uma das mais proeminentes. Portanto, para ambas as correntes teóricas, a forma escolar tende a se afirmar como fonte de resistência à mudança.

Essa ligeira incursão no debate teórico pretende apenas mostrar o quão complexa é a questão da mudança da forma escolar, que, na ácida crítica de Roldão (2001ROLDÃO, M. C. A mudança anunciada da escola ou um paradigma de escola em ruptura. In: ALARCÃO, I. (Org.). Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre : Artmed, 2001. p. 115-134., p. 130), ainda estaria organizada por “sequencialidade orientada não para uma lógica de apropriação progressiva de aprendizagens dos alunos, mas para o cumprimento sequencial de normativos programáticos”; ou seja, uma escola mais governada por formas do que pela ação dos sujeitos. Não à toa, autoras que pensam a sua mudança, como Alarcão (2001ALARCÃO, I. A escola reflexiva. In: ALARCÃO, I. (Org.). Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001. p. 15-30., p. 26), acabam por enfatizar a valorização do sujeito e da ação, insistindo que “seus membros não podem ser treinados para executar decisões tomadas por outrem” e não podem ser moldados para a “passividade e o conformismo”. Ao contrário, “devem ser incentivados e mobilizados para a participação, a coconstrução, o diálogo, a reflexão, a iniciativa e a experimentação” (Alarcão, 2001ROLDÃO, M. C. A mudança anunciada da escola ou um paradigma de escola em ruptura. In: ALARCÃO, I. (Org.). Escola reflexiva e nova racionalidade. Porto Alegre : Artmed, 2001. p. 115-134., p. 26). A questão é saber, como adverte Vincent, o quanto os próprios sujeitos estariam dispostos a protagonizar essa mudança.

Em um certo sentido, é com esse conjunto de questões e contradições que a BNCC se defronta quando interpela a forma escolar de duas maneiras críticas: exigindo uma escola menos disciplinar e seriada, na medida em que valoriza uma maior articulação entre as séries e etapas, bem como entre os componentes curriculares e suas respectivas áreas de conhecimento; e estabelecendo um conjunto de competências gerais que, para serem implementadas, demandam uma escola menos centrada na sala de aula e na figura do professor especialista.

Os dados empíricos produzidos pela pesquisa apresentada na seção a seguir deixam evidente que a Base tem sido bem recebida pelos profissionais. No entanto, conforme demonstram as informações dos estudantes, suas principais inovações exigem mudanças mais profundas da forma escolar para se realizarem.

As medidas de recepção da Base por parte dos profissionais

As entrevistas realizadas com secretários e/ou dirigentes das secretarias estaduais e municipais de educação indicam que o processo de implementação da BNCC contou e vem contando com significativa mobilização de profissionais dos diferentes níveis das secretarias estaduais e municipais. Além disso, a percepção dos dirigentes é a de que o processo de implementação da Base valorizou a diversidade local3 3 Relatórios de pesquisa disponíveis na Plataforma BNCC (CAEd/MEC). . Os relatos dão conta de que as redes promoveram processos de consultas e audiências públicas, eventos de mobilização das escolas, como o Dia D da Base, e plataformas para participação on-line, organizando e se beneficiando das formas de colaboração, muitas vezes já estruturadas no estado, com intensa participação do Consed e da Undime. Também são mencionadas a União Nacional dos Conselhos Municipais de Educação (Uncme), a Federação dos Prefeitos e os Conselhos Estaduais de Educação, que, em algumas unidades da Federação (UFs), desempenham maior protagonismo nos processos de mobilização e deliberação pública.

Esse esforço de diálogo entre estados e municípios e entre profissionais de diferentes segmentos e níveis de gestão também teria permitido uma maior flexibilidade do documento curricular, a fim de torná-lo aberto a uma complementação com a inclusão de habilidades mais afeitas às especificidades regionais ou locais. Mesmo para os municípios que não possuem sistema próprio e que, por isso mesmo, aderiram às diretrizes curriculares estaduais, nota-se uma preocupação com a identidade curricular e com a especificidade da cidade e da região.

Conforme sugerem as entrevistas com os gestores, ao contrário do que, a princípio, muitos críticos temiam, mais do que uma homogeneização curricular, a Base estaria realçando a diversidade da vida estadual/municipal, mesmo quando isso se manifesta apenas pelo esforço de apropriação e/ou adequação do currículo estadual, ou ainda na definição de estratégias pedagógicas próprias4 4 É interessante notar que, de acordo com levantamento feito pela rede Movimento pela Base (MPB, 2024), para a grande maioria dos municípios (4.386, o equivalente a 78,8% do total), a mobilização em torno da construção do currículo levou a uma adesão total do referencial curricular estadual; para 1.095 municípios (19,1%), a um trabalho de adaptação do referencial curricular; e para 81 (1,5%), ao desenvolvimento de currículo próprio. .

Em linhas gerais, os dados obtidos mediante a pesquisa quantitativa corroboram as percepções dos dirigentes educacionais. A princípio, pelo fato de a comparação entre as duas aplicações realizadas, a primeira em 2021 e a segunda em 2022 (ambas on-line), indicar uma participação crescente nas atividades relacionadas à BNCC. A esse respeito, cabe informar que foram medidos os graus de participação dos profissionais da educação em atividades relacionadas: à construção do currículo; à formação continuada; à avaliação interna e externa; à gestão do currículo nas escolas; e aos materiais didáticos. Em todos os casos, as assertivas faziam menção à BNCC, e se solicitava que o respondente considerasse como referência o ano de 2018. Esse marco temporal é importante porque permite mitigar, ao menos em parte, o efeito da pandemia sobre as respostas, o que foi de especial relevância principalmente para a primeira aplicação, ainda em contexto pandêmico.

Os Gráficos 1 e 2 apontam que entre a primeira e a segunda aplicação houve uma evolução positiva da participação dos profissionais nas atividades consideradas. Para facilitar a exposição, os dados são apresentados em dois grupos, que tratam dos três profissionais que atuam na esfera da secretaria e dos três que atuam na esfera da escola. No Gráfico 1, observa-se que o percentual de todos os sujeitos nas faixas média alta e alta expandiu, sendo o mais significativo o dos técnicos da secretaria municipal, que aumentou de 35% para 50%. No Gráfico 2, o maior salto é verificado entre os diretores, com 56% nas faixas média alta e alta (contra 46% na aplicação anterior). Mas não se pode deixar de destacar que os professores têm uma participação média e alta de 42% na primeira aplicação e de 43% na segunda5 5 Para a construção das escalas de participação, adotamos o seguinte procedimento: atribuímos a pontuação de 0 a 3 para as diferentes categorias de respostas de um mesmo bloco do questionário: “nunca participei” - 0; “participei uma vez” - 1; “participei duas vezes” - 2; “participei três vezes ou mais” - 3. Em seguida, realizamos o somatório de cada um dos blocos de itens classificando os valores encontrados de acordo com a seguinte escala: participação baixa (0 a 3); participação média baixa (4 a 7); participação média alta (8 a 11); participação alta (12 a 15). Para mais detalhes, consultar os relatórios da pesquisa disponíveis na Plataforma Plataforma BNCC (CAEd/MEC). .

Gráfico 1
Escala de participação nas atividades de implementação da BNCC na esfera da secretaria

Gráfico 2
Escala de participação nas atividades de implementação da BNCC na esfera da escola

Também foi medido o grau de percepção dos profissionais perante os efeitos da Base sobre as atividades da gestão educacional e da rotina escolar. Especificamente, procurou-se medir a percepção dos profissionais sobre: o processo de construção do currículo; a gestão do currículo nas escolas; a avaliação interna e externa; os materiais didáticos; e as atividades de formação continuada. Os Gráficos 3 e 4 indicam ser alta a percepção de que a Base estaria produzindo um impacto positivo e que isso vale não apenas para os profissionais da esfera da secretaria, mas também para os da escola. Aqui, o resultado referente aos professores merece destaque: 72% na primeira e 69% na segunda aplicação têm uma percepção média alta e alta dos efeitos da Base6 6 A exemplo do procedimento adotado para as escalas de participação, realizamos os seguintes passos para a construção das escalas de percepção: atribuímos a pontuação de 0 a 3 para as diferentes categorias de respostas de um mesmo bloco do questionário: “não concordo” - 0; “concordo pouco” - 1; “concordo” - 2; “concordo muito” - 3. Em seguida, realizamos o somatório de cada um dos blocos de itens classificando os valores encontrados de acordo com a seguinte escala: percepção baixa (0 a 3); percepção média baixa (4 a 7); percepção média alta (8 a 11); percepção alta (12 a 15). .

Gráfico 3
Escala de percepção dos efeitos da Base sobre diferentes dimensões da gestão educacional na esfera da secretaria

Gráfico 4
Escala de percepção dos efeitos da Base sobre diferentes dimensões da gestão educacional na esfera da escola

Para explicar a ligeira queda na percepção positiva por parte dos professores, uma possível hipótese seria a de que na primeira aplicação a percepção docente ainda estivesse difusamente impactada pelo processo de mobilização das redes em torno da construção do novo currículo, bem como pelo investimento na divulgação da novidade representada pela Base. De fato, a correlação entre participação e percepção se mantém constante para todos os profissionais, exceto para técnicos da secretaria estadual e para professores. Ao menos para estes últimos, a hipótese foi confirmada, indicando que a percepção do docente sobre os efeitos da Base tende a depender mais do seu grau de envolvimento nas atividades relacionadas à sua implementação7 7 A fim de verificar a correlação entre a participação e a percepção dos diferentes sujeitos da pesquisa, elaboramos os gráficos de dispersão e calculamos o coeficiente de correlação. Em seguida, para verificar se as diferenças encontradas entre as aplicações dos instrumentos eram estatisticamente relevantes, utilizamos a direção e relevância estatística do coeficiente da interação entre a participação e a aplicação do modelo linear ajustado (o qual considerou a percepção como variável dependente e como variáveis independentes a participação, a aplicação e a interação entre a participação e a percepção). Feito tal procedimento, constatamos uma constância da correlação entre participação e percepção para todos os sujeitos, exceto para o professor e o técnico da secretaria estadual, para os quais se observa um aumento nessa correlação. Para mais detalhes, consultar os relatórios da pesquisa disponíveis na Plataforma BNCC (CAEd/MEC). .

Em outra seção do questionário aplicado aos profissionais, investigaram-se os efeitos da Base sobre a percepção a respeito da centralidade do currículo. Os resultados demonstram que todos os profissionais têm uma percepção positiva, sendo especialmente relevante frisar que 70% dos professores nas duas aplicações se encontram nos níveis médio alto e alto dessa escala. Por fim, submeteu-se exclusivamente aos professores uma bateria que indagava sobre os efeitos da Base em sua prática profissional. O Gráfico 5 assinala uma resposta muito assertiva dos docentes, ficando a percepção média alta e alta próxima de 80% nas duas aplicações.

Gráfico 5
Escala de percepção dos professores sobre os efeitos da BNCC nas atitudes relacionadas a sua prática docente

Enfim, os dados elencados até aqui sugerem uma participação crescente dos profissionais em atividades atinentes à BNCC e uma percepção positiva sobre seus efeitos. Destaque especial deve ser dado aos professores que, além de tudo, têm uma percepção muito positiva sobre o impacto da Base em suas práticas profissionais. Se os dados de percepção podem ser encarados como uma boa aproximação do grau de compreensão e comprometimento dos profissionais acerca dos processos e objetivos de uma determinada política, a pesquisa permite afirmar que a resistência às mudanças trazidas pela BNCC, ao menos em seus contornos e suas consequências mais gerais, estaria sendo vencida. Igualmente significativo é o fato de os resultados da segunda aplicação indicarem que, ao menos para os professores, a percepção sobre a Base tende a ser cada vez mais dependente da participação nas atividades de sua cadeia de operações, sugerindo a importância de manter os profissionais mobilizados em torno da sua implementação. Esse achado parece confirmar a proposição mais geral da literatura especializada quando aponta que o caminho mais promissor para o êxito de políticas públicas complexas, que envolvem diferentes atores, como é o caso da BNCC, seria o da articulação entre formas top-down de implementação com procedimentos de mobilização de tipo bottom-up.

A exposição dos estudantes à Base

Vejamos o que dizem os dados levantados com os estudantes. Aqui, o questionário busca medir o envolvimento dos estudantes em atividades consideradas centrais para a efetiva implementação das inovações propostas, em especial naquelas relativas aos principais objetivos curriculares da Base, como o uso criativo de materiais didáticos, a exposição a projetos escolares transversais, o desenvolvimento de competências socioemocionais e digitais, o estímulo à autonomia dos estudantes e a participação destes em atividades escolares que valorizam a sua escuta e a sua opinião. Importa ressaltar que, como o período de aplicação coincidiu com a volta gradual das aulas presenciais nas redes educacionais de ensino fundamental, considerou-se oportuno identificar a situação escolar do estudante durante a pandemia, bem como sua atitude diante da volta às aulas presenciais. Apesar de serem muito importantes, optamos por não considerar esses dados no presente artigo.

Vale relembrar que a pesquisa com estudantes teve um amplo alcance, tendo sido entrevistados 35.535 estudantes de 5º e 9º anos (53% e 47%, respectivamente)8 8 Para mitigar os eventuais riscos metodológicos de submeter estudantes de 5º e 9º ano ao mesmo questionário, foi realizado um pré-teste, com cerca de 300 estudantes de cada etapa, que nos permitiu alcançar uma linguagem e um grau de complexidade adequados às duas faixas etárias. . Diversamente da pesquisa com os profissionais, a aplicação dos questionários dos estudantes foi feita presencialmente, no primeiro semestre de 2022, quando as escolas já tinham voltado a funcionar com relativa normalidade9 9 Para a aplicação presencial dos questionários dos estudantes, foram selecionadas 1.427 escolas, dentre as 2.001 previstas inicialmente na amostra. Obteve-se ao menos uma resposta em 1.287 escolas, o que representa uma cobertura de aproximadamente 90% das inicialmente previstas. As 27 UFs e 207 municípios foram contemplados na amostra. Importa observar que, entre as escolas participantes da pesquisa, 582 são estaduais (98% do total previsto) e 705 são municipais (85% do total); 594 ofertam somente o 5º ano, 418 apenas o 9º ano e 415 ambos os anos. A regra estabelecida para aplicação foi de 25 questionários por escola, por série/ano avaliado. . A análise a seguir irá se basear em seis escalas com medidas de participação em atividades relativas à implementação da BNCC: atividades escolares de inovação pedagógica relacionadas à BNCC; atividades de avaliação alinhadas à BNCC; atividades escolares relacionadas ao protagonismo estudantil; atividades escolares relacionadas à autonomia do estudante na realização de atividades escolares; atividades relacionadas ao desenvolvimento de competências socioemocionais; e atividades escolares relacionadas ao desenvolvimento de competências digitais.

De modo geral, o resultado encontrado demonstra uma exposição modesta a essas atividades, ainda menor entre os estudantes de 9º ano. Considerando que a implementação da BNCC na EI e no EF nas escolas começa, de fato, em 2019 e que logo é atravessada pelas consequências da pandemia de covid-19, a partir de março de 2020, o baixo percentual de participação não chega a ser surpreendente. Ainda assim, os dados quantitativos apontam que um segmento de 10% a 20% dos estudantes estaria sendo mais exposto às atividades relacionadas à BNCC. Isso indica que, apesar de tudo, essas atividades estariam chegando à sala de aula, levando a crer que talvez o maior desafio nesse momento seja o de fazer com que o acesso às inovações trazidas pela BNCC se torne mais equitativo.

A medida de exposição dos estudantes reflete inevitavelmente o que a escola e os professores levam para o cotidiano. Aqui, dois aspectos devem ser salientados. O primeiro diz respeito às diferenças significativas entre o padrão de resposta dos estudantes do 5º e do 9º ano do EF. Entre as seis escalas, o grau de exposição dos estudantes do 5º ano só é inferior naquela referente à participação em atividades relacionadas ao desenvolvimento das competências digitais (mas, nesse caso, a exposição é destacadamente baixa para ambos os grupos). Diferentes fatores podem explicar essa configuração, entre os quais a maior complexidade da própria faixa etária do estudante do 9º ano. Mesmo assim, o achado não deixa de indicar que a capacidade da escola para fazer a Base acontecer com os estudantes tende a ser maior nos anos iniciais.

O segundo aspecto se refere às diferenças encontradas no padrão de respostas perante cada uma das escalas, apresentadas no Gráfico 6. Se podemos assumir que o menor grau de exposição dos estudantes às atividades relacionadas à Base delineia uma espécie de mapa das áreas nas quais a resistência à mudança seria maior, então os resultados encontrados na investigação indicam o seguinte cenário:

A exposição dos estudantes é destacadamente baixa em atividades relacionadas à competência digital (somente 26% estariam nos padrões de participação média alta [17%] e alta [9%]), cabendo lembrar que uma das competências gerais da Base trata especificamente desse aspecto. Os itens dessa seção indagavam sobre a participação dos estudantes em atividades de orientação sobre o uso de diferentes tipos de ferramentas digitais, de sites a aplicativos e games.

O segundo tipo de atividade com menor grau de exposição contempla aquelas que deveriam favorecer o protagonismo estudantil. Nesse caso, a escala foi elaborada com base em itens que indagavam os estudantes sobre atividades nas quais eles e seus colegas teriam sido ouvidos pelos diretores e professores da escola. Trata-se de uma dimensão fundamental para a BNCC, na medida em que favorece a maior centralidade do estudante no processo de aprendizagem. Somente 35% tiveram participação média alta (21%) e alta (14%).

A participação em atividades voltadas para o desenvolvimento de competências socioemocionais, tão importantes para um conjunto de competências gerais da Base, mostra-se igualmente modesta. Apenas 39% dos estudantes estariam nas faixas média alta (21%) e alta (18%). Os itens dessa seção indagavam sobre a participação dos estudantes em atividades que os fizessem pensar a respeito de seu comportamento e de suas emoções e naquelas voltadas ao incentivo à cooperação, à empatia e ao diálogo.

Igualmente modesto é o grau de participação dos estudantes em formas de avaliação condizentes com as inovações propostas pela Base e muito importantes para assegurar o caráter mais integrado do processo de aprendizagem, bem como de atividades de avaliação que estimulam o pensamento crítico, para além de decorar matérias. Nesse caso, não mais que 40% dos estudantes ficam nas faixas médias alta (21%) e alta (19%).

Dos seis conjuntos, os estudantes foram um pouco mais expostos às atividades de apenas dois deles:

O que diz respeito a inovações pedagógicas relacionadas à BNCC, que contempla itens como a participação dos estudantes em atividades em grupo, conversas e debates; em atividades com uso de recursos tecnológicos; em atividades práticas e de pesquisa; em atividades que mobilizam a criatividade; que tratam dos direitos e deveres dos cidadãos; dos problemas e questões locais, entre outros temas caros à BNCC. Nesse caso, 45% ficam nas faixas média alta (28%) e alta (17%).

O que diz respeito a atividades que favorecem a autonomia do estudante na realização de tarefas escolares, como pesquisas, vocalização de dúvidas ou opiniões, entre outras. Essa escala é a que apresenta uma maior participação dos estudantes, sendo a única em que a maioria (56%) tem participação média alta e alta (26% e 30%, respectivamente).

Gráfico 6
Escalas de participação dos estudantes em atividades escolares alinhadas à BNCC

Em síntese, os dados relativos aos estudantes sugerem que a forma escolar é, em primeiro lugar, mais impermeável à transição de uma cultura analógica para a digital, não cabendo neste artigo abrir um debate sobre o quanto essa resistência estaria relacionada à falta de estrutura e/ou de capacitação para propiciar essa transição ou o quanto ela reflete uma posição de maior prudência em relação a um mundo ainda pouco conhecido. A escola também se mostraria mais resistente ou teria maior dificuldade (o que, em resumo, dá no mesmo) em mais três das seis dimensões contempladas pela pesquisa: o protagonismo do estudante, o desenvolvimento de competências socioemocionais e as formas inovadoras de avaliação.

Esses seriam os pontos mais críticos para a implementação da BNCC, possivelmente porque interpelam o núcleo duro da forma escolar: seu caráter analógico, sua forma vertical e impessoal de lidar com o aluno e a forma disciplinar e codificada de lidar com o ensino, que se reflete nas estratégias de avaliação. Por conseguinte, os dados sugerem que o avanço nessas dimensões demandaria mudanças mais amplas na forma escolar, exigindo uma gama diversa de profissionais e de espaços de aprendizagem, para além da sala e dos professores de disciplinas.

Não por acaso, a escola parece ter avançado um pouco mais nas dimensões em que a Base afronta menos a forma escolar tradicional, como é o caso da valorização de inovações pedagógicas que, afinal, não são tão novas assim, embora ganhem com a BNCC uma renovada importância, como o trabalho em grupo, o uso do debate em sala de aula etc., assim como a valorização da autonomia do estudante para realizar atividades com as quais ele já está bem acostumado, porque são tipicamente escolares.

Considerações finais

A questão da resistência à mudança funciona como uma espécie de âncora ao debate sobre a implementação de políticas públicas voltadas para a reforma e a inovação, e, como procuramos demonstrar, suas premissas sociológicas remetem, em cada caso, à maior ou menor importância de lógicas sistêmicas e de ação individual. No que se refere aos sistemas de educação pública, o debate bibliográfico sugere que essas duas lógicas se sobrepõem de modo complexo, conformando variados desenhos nos quais as dimensões normativas e as lógicas de ação coletivas e individuais se combinam e estabelecem dinâmicas conflitantes e contraditórias. De fato, tanto a cultura dos profissionais da educação - que tende a ser em si mesma um ponto de resistência que se desdobra em comportamentos individuais e coletivos animados por sentimentos como medo ou prudência, ou ainda interesses corporativos - quanto a forma escolar, aqui entendida como expressão de um modo de organização institucional, podem e tendem a atuar como obstáculos à mudança.

No Brasil, esse quadro de complexidade é bastante aprofundado, de um lado, porque o sistema educacional se apoia em uma dinâmica interfederativa, que reúne diretrizes e políticas federais, e redes estaduais e municipais com graus variados de coordenação (Segatto; Abrucio, 2016SEGATTO, C. I.; ABRUCIO, F. L. A cooperação em uma federação heterogênea: o regime de colaboração na educação em seis estados brasileiros. Revista Brasileira de Educação, Rio de Janeiro, v. 21, n. 65, p. 411-429, abr./jun. 2016.; Torres; Camelo; Castro, 2019TORRES, H. G.; CAMELO, R.; CASTRO, M. H. G. Dificuldades de coordenação e políticas educacionais no Brasil: o caso do ensino fundamental. Dados, Rio de Janeiro, v. 62, n. 4, e20170226, 2019.); e, de outro, porque é atravessado por uma dualidade, na medida em que parte das crianças, dos adolescentes e dos jovens de classe média e alta não estuda na rede pública, tornando mais complicada a agenda da equidade no acesso à aprendizagem.

A BNCC é uma política pública abrangente e ambiciosa, que não pode prescindir da mobilização das redes estaduais e municipais em torno da construção de novos currículos e de programas de ação envolvendo formação, produção de novos materiais didáticos e desenvolvimento de novas formas de avaliação da aprendizagem e de organização escolar. Por isso, sua implementação, fatalmente, esbarra em resistências à mudança, que precisam ser mais bem compreendidas.

Com esse objetivo, neste artigo, resgatamos os dados gerados por estudo de larga escala realizado pelo CAEd/UFJF, como meio de aproximação diante dos pontos mais importantes de resistência. As entrevistas com gestores estaduais e municipais indicam que o processo de mobilização das redes, em especial para o alinhamento dos respectivos currículos à Base, teria sido um importante mecanismo de distensão da resistência às mudanças trazidas pela política pública, na medida em que consegue envolver amplos segmentos das redes de educação, abrindo possibilidades concretas de participação de diferentes atores e de valorização das especificidades regionais e locais. Essa impressão é confirmada pelos dados quantitativos obtidos por meio de questionários aplicados em larga escala a profissionais das secretarias e instâncias regionais, diretores, coordenadores pedagógicos e professores.

De fato, levando-se em conta a comparação entre as duas aplicações do instrumento realizadas pelo CAEd/UFJF, em 2021 e 2022, constata-se uma participação crescente dos profissionais em atividades relacionadas à implementação da Base, bem como uma percepção positiva sobre os efeitos dela na vida escolar, muito especialmente na forma pela qual ela confere maior centralidade ao currículo. Esses dados são especialmente significativos quando se considera a resposta dos professores. No caso dos docentes, a pesquisa também revela que a percepção deles sobre a Base tende a depender mais da participação nas atividades relacionadas à sua implementação. Ou seja, quanto mais o docente participa das atividades, mais tende a perceber positivamente os efeitos da Base.

Os achados produzidos por essas duas pesquisas, qualitativa e quantitativa, indicam que o esforço de mobilização em uma lógica mais bottom-up, para utilizarmos essa tipologia tão recorrente na literatura, tende a produzir efeitos positivos na percepção; e uma percepção positiva tende a ser um bom preditor de maior comprometimento dos profissionais com a política. No entanto, conforme procuramos argumentar, esse tipo de abordagem não consegue medir o efeito de resistência produzido pela forma escolar.

Por isso, abrimos uma segunda linha de reflexão, trazendo os contornos gerais do debate sobre a forma escolar, de como ela reage de modo contraditório a diferentes tipos de expectativas e pressões por mudança. Essa camada da análise se mostra necessária porque a implementação plena da Base pressupõe necessariamente mudanças na forma escolar. Aqui, um ponto teórico importante é justamente o de como a própria forma, mais do que propriamente os indivíduos, resiste à mudança. A raiz teórica dessa sociologia é sistêmica, com forte presença do legado dos estudos clássicos de Bourdieu na caracterização de como a escola é capaz de sublimar diferenças sociais, em benefício de uma lógica de difusão de hábitos de pensamento e de comportamento que ancora sociologicamente a reprodução social. Mas também tem raízes na fenomenologia com a qual Vincent, entre outros autores, assume que os indivíduos são sempre induzidos a enxergar e valorizar um conjunto de elementos perante outros, de acordo com a própria existência de diferentes padrões de socialização. Com isso, Vincent pretende evitar substantivar a noção de forma, preferindo valorizar as representações que ela encerra. Nessa controvérsia teórica, há um mundo de questões que vai muito além deste artigo. Portanto, a remissão a ela pretende apenas advertir para a necessidade de termos mais cautela quando se fala, por exemplo, em anacronismo da forma escolar, ou quando se acusam os profissionais da educação de resistirem à mudança por razões corporativistas ou tão somente por comodismo. A fim de aprofundarmos essa reflexão, assumimos que a pesquisa feita com os estudantes sobre o seu grau de exposição a atividades escolares atinentes à Base proporcionaria uma espécie de mapa dos pontos mais sensíveis da resistência oriunda da forma escolar. Nossa premissa, nesse caso, foi a de que as medidas produzidas pela pesquisa sobre o grau de exposição dos estudantes a seis tipos de atividades referentes às inovações propostas pela Base permitem que se identifique onde a forma escolar tende a se contrair, oferecendo maior resistência. Com esse procedimento, foi possível sofisticar a constatação, gerada pela investigação com os profissionais, de que a Base estaria encontrando baixa resistência entre eles. Mais especificamente, constatamos que a Base encontra especial resistência para alterar o caráter analógico da escola, sua impessoalidade e tendência a não escutar o estudante, bem como a resistência para organizar de modo mais integrado e menos disciplinar o processo de aprendizagem.

Em suma, o que a mais abrangente pesquisa realizada até o momento sobre a implementação da BNCC sugere é que, ao menos entre os profissionais da EI e do EF, ela encontra boa recepção, o que é muito importante para definir a sua sorte; no entanto, a sua realização plena, e talvez aquilo que realmente a justifique, que é afinal transformar a escola por meio da mudança do lugar do currículo, precisará de investimentos e estudos mais aprofundados, pois esbarra em uma lógica que não se pode vencer apenas com a mobilização dos profissionais e, tampouco, com boas normas e diretrizes, reclamando que se considerem os efeitos das formas institucionais sobre processos voltados para reformas. Esta é, também, a aposta teórica contida neste artigo: a de que a “sociologização” do estudo de políticas públicas educacionais como a da BNCC nos ajuda a compreender melhor processos que combinam diferentes lógicas de ação e que frequentemente são analisados mediante uma noção reducionista de cultura profissional.

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  • 1
    A primeira aplicação dos instrumentos com os profissionais ocorreu de forma digital, entre 17 de junho e 16 de julho de 2021, por meio de uma plataforma. Nela, das 2.001 escolas selecionadas, participaram 1.395, distribuídas nas 27 unidades da Federação e em 217 municípios, sendo 597 escolas estaduais e 798 municipais. A amostra adotada para a segunda aplicação foi a mesma utilizada na primeira, ou seja, 250 municípios e 2.001 escolas. A aplicação dos instrumentos também ocorreu de forma digital, por meio da plataforma, entre maio e junho de 2022. Na segunda aplicação, a pesquisa alcançou um número maior de escolas e municípios: participaram profissionais de 1.490 escolas, localizadas em 222 municípios, sendo 521 estaduais e 969 municipais. As duas aplicações contaram com a participação de uma equipe de campo, composta por coordenadores estaduais, municipais e de escolas, responsáveis pela mobilização e pelo apoio técnico aos participantes.
  • 2
    As entrevistas ocorreram entre 14 de abril e 21 de julho de 2021, por meio do Google Meet. Destaca-se aqui o apoio fundamental do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) e da União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) para a sua realização. Para o tratamento das entrevistas com os dirigentes estaduais, foi inicialmente feita a transcrição, para posterior análise. Já para os dirigentes municipais, foi feita uma memória para cada entrevista. Os trechos dessas memórias foram posteriormente analisados pelos conjuntos formados a partir de categorias escolhidas. Para formação desses conjuntos e auxílio nas análises, foi utilizado o software R.
  • 3
    Relatórios de pesquisa disponíveis na Plataforma BNCC (CAEd/MEC).
  • 4
    É interessante notar que, de acordo com levantamento feito pela rede Movimento pela Base (MPB, 2024), para a grande maioria dos municípios (4.386, o equivalente a 78,8% do total), a mobilização em torno da construção do currículo levou a uma adesão total do referencial curricular estadual; para 1.095 municípios (19,1%), a um trabalho de adaptação do referencial curricular; e para 81 (1,5%), ao desenvolvimento de currículo próprio.
  • 5
    Para a construção das escalas de participação, adotamos o seguinte procedimento: atribuímos a pontuação de 0 a 3 para as diferentes categorias de respostas de um mesmo bloco do questionário: “nunca participei” - 0; “participei uma vez” - 1; “participei duas vezes” - 2; “participei três vezes ou mais” - 3. Em seguida, realizamos o somatório de cada um dos blocos de itens classificando os valores encontrados de acordo com a seguinte escala: participação baixa (0 a 3); participação média baixa (4 a 7); participação média alta (8 a 11); participação alta (12 a 15). Para mais detalhes, consultar os relatórios da pesquisa disponíveis na Plataforma Plataforma BNCC (CAEd/MEC).
  • 6
    A exemplo do procedimento adotado para as escalas de participação, realizamos os seguintes passos para a construção das escalas de percepção: atribuímos a pontuação de 0 a 3 para as diferentes categorias de respostas de um mesmo bloco do questionário: “não concordo” - 0; “concordo pouco” - 1; “concordo” - 2; “concordo muito” - 3. Em seguida, realizamos o somatório de cada um dos blocos de itens classificando os valores encontrados de acordo com a seguinte escala: percepção baixa (0 a 3); percepção média baixa (4 a 7); percepção média alta (8 a 11); percepção alta (12 a 15).
  • 7
    A fim de verificar a correlação entre a participação e a percepção dos diferentes sujeitos da pesquisa, elaboramos os gráficos de dispersão e calculamos o coeficiente de correlação. Em seguida, para verificar se as diferenças encontradas entre as aplicações dos instrumentos eram estatisticamente relevantes, utilizamos a direção e relevância estatística do coeficiente da interação entre a participação e a aplicação do modelo linear ajustado (o qual considerou a percepção como variável dependente e como variáveis independentes a participação, a aplicação e a interação entre a participação e a percepção). Feito tal procedimento, constatamos uma constância da correlação entre participação e percepção para todos os sujeitos, exceto para o professor e o técnico da secretaria estadual, para os quais se observa um aumento nessa correlação. Para mais detalhes, consultar os relatórios da pesquisa disponíveis na Plataforma BNCC (CAEd/MEC).
  • 8
    Para mitigar os eventuais riscos metodológicos de submeter estudantes de 5º e 9º ano ao mesmo questionário, foi realizado um pré-teste, com cerca de 300 estudantes de cada etapa, que nos permitiu alcançar uma linguagem e um grau de complexidade adequados às duas faixas etárias.
  • 9
    Para a aplicação presencial dos questionários dos estudantes, foram selecionadas 1.427 escolas, dentre as 2.001 previstas inicialmente na amostra. Obteve-se ao menos uma resposta em 1.287 escolas, o que representa uma cobertura de aproximadamente 90% das inicialmente previstas. As 27 UFs e 207 municípios foram contemplados na amostra. Importa observar que, entre as escolas participantes da pesquisa, 582 são estaduais (98% do total previsto) e 705 são municipais (85% do total); 594 ofertam somente o 5º ano, 418 apenas o 9º ano e 415 ambos os anos. A regra estabelecida para aplicação foi de 25 questionários por escola, por série/ano avaliado.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    17 Jul 2023
  • Aceito
    04 Jan 2024
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