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Distúrbios motores conseqüentes a alterações da sensibilidade: Estudo clínico de um caso com hemissíndrome sensitiva e perda da iniciativa motora

Distúrbios motores conseqüentes a alterações da sensibilidade. Estudo clínico de um caso com hemissíndrome sensitiva e perda da iniciativa motora

Oswaldo Lange; J. M. Taques Bittencourt

Assistentes de Clínica Neurológica na Fac. Med. Univ. S. Paulos

RESUMO

Os AA. relatam um caso clínico de inércia motora, falta de utilização do membro superior esquerdo e desinteresse cinético por êsse membro, em um moço que apresentava déficit de sensibilidades complexas (barestesia, localização e discriminação táctil, hilo, morfo e estereogno-.sia) e da artrestesia, após um período da hemiparesia esquerda que regrediu totalmente. Incluem o caso entre as alterações da somatognosia e o comparam com o caso de Garcin, Varey e Hadji-Dimo publicado em 1938, e os casos de anosognosia de Babinski, forma dolorosa de van Bo-gaert. Tecem comentários a respeito das correlações sensitivo-motoras e sobre a gnosia corporal. No decorrer do trabalho, analisam os distúrbios motores que resultam de perturbações puramente sensitivas.

SUMMARY

The AA. refer the clinicai Observation of a young man presenting a deficit of the arthresthesia and of the complex sensibilities (baresthesia, tactile descrimination and localization, hilo, morpho and stereognosis) as well as motor inertia, non utilization and cinematic desinterest for the upper left limb, this clinical picture having developed after left hemi-paresis from which the patient had completely recovered. The A A. include the case among the alterations of the somatognosis and compare it to that of Garcin, Varey and Hadji-Dimo (1938), and to those cases of anosognosia of Babinski (Van Bogaert's painful form). The AA. make comments on the sensitivo-motor correlations, the bodily gnosia and the motor disturbances consequent to purely sensitive alterations.

Nos doentes com alterações da sensibilidade é afetada, não sòmente a percepção do mundo exterior e do próprio corpo, como também a motricidade. Ato motor nada mais é, em última instância, senão a sistematização de movimentos simples, realizada sob o controle da sensibilidade; as sensações coordenam, regulam, corrigem os movimentos e os dispõem em série capaz de constituir um ato e realizar um fim. A alteração da sensibilidade, qualquer que seja a localização da lesão, desde os receptores aos centros corticais, acarreta, pois, paralelamente ao déficit sensitivo, uma alteração da motricidade.

No sistema nervoso periférico, a lesão das vias sensitivas, cortando a via aferente, abole o arco reflexo elementar e determina alterações motoras: arrefletividade, A interrupção das vias longas ascendentes que conduzem, na medula, a sensibilidade profunda consciente, determina ataxia sensitiva que é, também, um distúrbio motor. A incoordenação resulta do desconhecimento da posição dos segmentos do membro antes e durante o movimento. E', porisso, uma ataxia sobretudo inicial. Falta ao movimento a direção e a orientação intencionais, mas o paciente é capaz de regular sem grandes erros a amplitude, a velocidade do movimento, assim como coordenar os sucessivos movimentos componentes do ato.

As lesões que afetam os feixes de Flechsig e Gowers ou as lesões cerebelares, determinam a ataxia cerebelar. Nestas condições, o cerebelo não recebe ou não percebe a noção de contração dos agonistas, do estiramento dos antagonistas, as rupturas incessantes de equilíbrio nem tampouco as indicações de mudança de posição da cabeça e do corpo conduzidas pelo sistema labiríntico e pelo aparelho motor do globo ocular. Assim, as correções necessárias, quer para opor-se às rupturas de equilíbrio, quer para assegurar a sustentação tônica e garantir a sinergia clô-nico-tônica. elaboradas pelo cerebelo normal, não se fazem e, conseqüentemente, não podem ser transmitidas pela via tetospinhal. Disto resulta um movimento sem orientação intencional (dismetria), anárquico (anisostenia), sem coordenação no espaço (assinergia) e no tempo (adiadococinesia) e ainda, sem harmonia nas suas componentes tônico-clônicas (tremor).

As diversas sensações somáticas, conduzidas pela fita de Reil, pelo feixe espinho-talâmico e pela via cerebelo-rubro-talâmica, chegam ao tálamo onde se superpõem nías não se fundem, guardando uma representação espacial rigorosamente localizada (Fulton). A lesão talâmica, além da anestesia dolorosa, acarreta uma ataxia, sintoma motor duma alteração sensitiva. Mais interessantes, porem, sob o ponto de vista da regulação sensitivo-motora são a acinesia e a amimia por lesão talâmica. Os sistemas motores - piramidal e extrapiramidal - não têm atividade dinamogênica própria; para que um ato motor seja executado, é necessário que ele seja querido, desejado, que exista, em suma, uma tendência afetiva. Êste "primum movens" afetivo, ao qual Jarkowski deu o nome de protoenergia, é necessário para as reações afetivo-motoras e mesmo para os atos automáticos ou semi-automáticos, sôbre os quais a córtex intervém só para iniciar, inibir ou corrigir. O tálamo atua como um estádio inferior de correlação sensitivo-motora, regulando a vida automática e af etivo-motora. Na moléstia de Parkinson, a lesão, localizada predominantemente no sistema palidal, impede a ação afetiva originada no tálamo. Assim, nessa síndrome extrapiramidal, ao lado da abolição da motricidade automática e exageração do tono de postura, há abolição dessa protoenergia da qual advém a falta de iniciativa motora. Uma sensação, quando carregada dum potencial afetivo considerável, é percebida, primeira e principalmente, ao nível do tálamo. Esta percepção talâmica, pouco precisa mas violenta, difunde-se larga e rapidamente para o aparelho estriado, centro motor automático, o qual envia as incitações da motricidade espontânea aos núcleos motores do neurônio motor periférico. A lesão palidal acarreta, por isso, perda da mímica e acinesia.

Na cortiça cerebral, as sensibilidades se dispõem na área parietal, não mais agrupadas e superpostas, porém estendidas em superfície e de tal maneira sistematizadas, que se tornou possível distinguir diversas áreas de complexidade crescente. As sensibilidades somáticas elementares se dispõem nos bordos do sulco central, de maneira análoga à disposição das células motoras na frontal ascendente e, como nesta, a superfície receptora é proporcional não à superfície do corpo mas à densidade de sua inervação sensitiva. A falta de sensibilidade elementar por uma lesão da área pós-central anterior, zona de recepção ou sômato-sensitiva de Tilney e Riley, traduz-se por hemianestesia ou anestesia parcial da parte do corpo correspondente à zona afetada; o doente não poderá executar movimentos com a dextreza que lhe era habitual; é, ainda aqui, uma forma de ataxia sensitiva.

Nas percepções diferenciais de intensidade e extensão já intervém a atividade crítica do lobo parietal, que se exerce nas partes situadas mais posteriormente. O estudo dos pacientes com lesões com esta localização mostra que há uma dissociação entre os analisadores de intensidade e os analisadores espaciais, do que resulta dificuldade na diferenciação dos materiais (hilognosia), das formas (morfognosia) ou dos pesos (barognosia). Um doente pode responder corretamente a uma excitação táctil e não ser capaz de diferençar duas intensidades tácteis1 1 . Delay, J. - Les agnosies táctiles. Ann. de Méd. 42:148 (junho) 1937. . A percepção da extensão das sensações ou das relações espaciais corporais é a síntese de diversas sensações elementares. Assim são a locali-sação espacial (autotopognosia), a discriminação espacial (sentido de Weber), as qualidades espaciais da cinestesia, o sentido das atitudes (estatognosia de Pieron). Em todos estes processos há atividade crítica e discriminativa. Esta faculdade de síntese é alterada nas lesões da zona pós-central intermédia, zona de percepção ou sômato-psíquica de Tilney e Riley.

Uma vez o objeto sentido e percebido nas suas diferentes qualidades,, deve ser identificado; trata-se de uma operação intelectual, a tactognosia. Evidentemente um indivíduo com hemianestesia cortical do tipo Déjerine (perda das sensações elementares) ou do tipo Head (perda da síntese perceptiva) não reconhece os objetos. Existem, porém, doentes que efetuam perfeitamente estas operações elementares, descrevem o objeto (e às vezes tão bem que, refletindo, conseguem chegar a um reconhecimento, sem contudo ter certeza da sua exatidão) mas são incapazes de o reconhecer: trata-se de agnosia táctil, astereognosia. Não é possível explicar essa agnosia táctil por uma alteração da síntese: é uma alteração do reconhecimento imediato, mas não do reconhecimento mediato (agnosia semântica). Esta agnosia é causada por uma lesão na região parietal posterior, no campo pós-central posterior e, talvez, no giro angular, chamada zona de identificação ou área tactognóstica de Tilney e Riley.

A sistematização descrita para as sensibilidades gerais pode ser feita para as demais sensações. Para a vista, audição, equilíbrio e noção espacial existem, também, áreas elementares dé recepção, áreas dec. coordenação e percepção e áreas gnósticas. Todas elas se aproximam, tendendo para a dobra curva e o giro angular. Para essa região encaminham-se, também, as impressões sensitivas e sensoriais que aí se integram, constituindo a noção inconsciente do nosso corpo, gnosia corporal ou soma-tognosia. A perda da somatognosia determina alterações motoras que se traduzem pela perda da iniciativa motora no membro ou segmento de membro correspondente à parte afetada.

O estudo das alterações do esquema corporal tem grande interesse porquanto a integridade dessa função gnóstica é indispensável para a motricidade. Se a lesão da zona de recepção sensitiva condiciona ataxia e a lesão da zona de percepção acarreta erros mais sutis na realização dos atos, as lesões que atingem a vizinhança do giro angular, à direita sobretudo, lesando a unidade do modelopostural, acarretam grandes transtornos motores2 2 . Schilder, P. F. - The image and appearence of the human body (studies on the constructive energies of the psyche). Psyche Monographs n.° 4, 1 volume, Paul Kegan, Londres, 1935. . A concomitância de lesões talâmicas ou das vias talamo-corticais confere às alterações da imagem corporal uma nuance penosa e estranha, ao passo que às lesões puramente corticais engendram alterações limitadas da consciência de si e limitativas da ação (van Bogaert). As lesões dessetipo determinam erros na localização das impressões sensitivas (aloestesia ou aloquiria) e ocasionam, quando acompanhadas de distúrbios da sensibilidade artrestésica, graves alterações no reconhecimento dos lados direito e esquerdo, isto é, alterações do sentido de espaço do próprio corpo; conseqüentemente, dificultam a realização de atos nos quais devam intervir os dois lados. As alterações da autotopognosia (Pick) são responsáveis por esta desorientação na realização de atos simétricos; a desordem motora é desproporcionadamente intensa em relação à pequena alteração da percepção. Em certos casos de auto-topoagnosia, a desorientação no espaço proprioceptivo produzida pela alteração do modelo postural, determina alteração motora semelhante à apraxia, que se evidencia nos atos em que é exigida a cooperação dos dos dois lados. Lhermitte e Trelles3 3 . Lhermitte, J. e Trelles, J. O. - Sur l'apraxie pure construtive. Encéphale 28:413, 1933. descreveram um caso de apraxia construtiva pura, explicado por distúrbio da gnosia corporal. A percepção do próprio corpo tem, pois, um valor dinâmico, indispensável às ações motoras exteriores. Foix4 4. Foix, Ch. H. (Rev. Neurologique 1:283, 1916) e Morlaas (Tese, Paris, 1928) citados por Pirisi, B. - II problema dello schema corpóreo. Arch. Gen. di Neurol., Psiquit. i psicoanal. 19:137, 1938. , Morlaas4 4. Foix, Ch. H. (Rev. Neurologique 1:283, 1916) e Morlaas (Tese, Paris, 1928) citados por Pirisi, B. - II problema dello schema corpóreo. Arch. Gen. di Neurol., Psiquit. i psicoanal. 19:137, 1938. e Marcos Victoria5 5 . Victoria, M. - La gnosia corporal. Rev. Neurol, de Buenos Aires 4:179, 1941. Teoría de las apraxias. 1 volume, Editora El Ateneo, Buenos Aires, 1941. estudando as apraxias, consideraram como base dessa síndrome a perturbação da somatognosia. Tanto a apraxia ideatória e principalmente a ideo-motora, descrita por Morlaas como discinesia espacial, são conseqüência da perda do esquema corporal.

Uma alteração limitada do esquema corporal e que mostra, de maneira muito clara, a importância dessa gnosia sobre a ação, é a chamada agnosia digital (Gerstmann),6 6 . Gerstmann, J. - Syndrome of finger agnosia, disorientation for right and left, agraphia and acalculia. Local diagnostic value. Arch. Neurol, a. Psychiat. 44:398 (agôsto), 1940. que consiste na disabilidade primária e eletiva em reconhecer, nomear, selecionar, diferençar e indicar os dedos da mão do próprio paciente e de outros. Esta perturbação pode ser acompanhada ou não do reconhecimento dos lados direito e esquerdo em relação ao próprio corpo; nunca, porém, há distúrbio em relação ao mundo espacial. Agrafia e acalculia integram, em alguns casos, a síndrome, fato este muito interessante, porquanto vem mostrar a importância e o papel que os dedos representam no ato de escrever e contar.

Êstes fatos nos aproximam da anosognosia de Babinski7 7 . Babinski - Sur l'anosognosie. Rev. Neurologique 1:845, 1914 e 2 ;365, 1918. . Pacientes afetados de hemiparesia esquerda, alguns sem grandes alterações da sensibilidade profunda, que é contudo condição necessária ao fenômeno, não realizavam qualquer ação espontânea ou provocada. Após estudar esses casos, van Bogaert8 8 . van Bogaert, L. - Sur la pathologie de l'image de soi. Ann. Médico-psychol. 2:520-759 (novembro-dezembro) 1934. dividiu a síndrome em duas ordens: 1 - Anosognosia dolorosa, na qual a metade do corpo é percebida, mas praticamente não é interessada na harmonia cinética inconsciente que é a nossa vida cotidiana e a percepção desse déficit é desagradável para o doente. 2 - Anosognosia verdadeira ou muda, na qual metade do corpo não é percebida pelo doente e a ação fica inteiramente prejudicada.

O caso que relataremos ofereceu particularidades interessantes. Revendo a literatura, encontramos duas observações mais ou menos semelhantes que, rapidamente, recordaremos.

Em 1938, Garcin, Varey e Hadji-Dimo9 9 . Garcin, Varaty e Hadji-Dimo - Document, pour servir à l'étude des troubles du schéma corporel (sur quelques phénomènes moteurs, gnosiques et quelques troubles de l'utilisation des membres du coté gauche au cours d'un syndrome temporo-pariétal par tumeur envisagés dans leurs rapports avec l'anosognosie et les troubles du schéma corporal). Rev. Neurologique 69:498, 1938. publicaram interessante trabalho sobre um caso de hemiparesia esquerda, hemianopsia lateral homônima esquerda e alteração da sensibilidade articular por um glioblastoma localizado no giro angular, com curiosa síndrome agnóstica corporal. Êsse doente, que não era apráxico, apresentava inércia do braço esquerdo para a execução de ações espontâneas, ao passo que o mobilizava à ordem e o mostrava a pedido. O doente não usava espontaneamente o braço nos atos voluntários nem nos automáticos; assim, êle não se vestia, não acendia fósforos e não escrevia. O doente agia como se o hemi-corpo esquerdo não existisse; nos últimos tempos da sua vida, a moléstia evoluiu para uma síndrome próxima da anosognosia.

Antes dêsses autores, Alajouanine, Thurel e Ombredane10 10 . Alajouanine, Thurel e Ombredane - Somato-agnosie et apraxie du membre superieur gauche. Rev. Neurologique 1:695 (maio) 1934. , haviam publicado um caso bastante parecido, porém rotulado como apraxia. Tratava-se de um paciente que, após pródromos sensitivos - formigamentos do hemicorpo esquerdo - começou a escrever números acavalados uns sobre os outros e não era capaz de arrumar as folhas de um jornal; mais tarde tornou-se desorientado no tempo e no espaço e passou a não usar o membro superior esquerdo, como se tivesse perdido a noção da existência desse membro. O exame neurológico evidenciou reflexos tendinosos vivos, Babinski bilateral, hipotonia à esquerda e hipertonia à direita, pequeno déficit motor nos membros inferiores, hemianopsia lateral homônima esquerda e distúrbios sensitivos na localização táctil (alo-quiria).

Passamos agora a relatar o caso que observamos:

J.B.G. (S.N. 6.528) com 23 anos de idade, branco, solteiro, lavrador, brasileiro. Examinado em outubro de 1940.

Há 8 meses notou formigamento nos dedos da mão esquerda e diminuição da força muscular. Uns 20 dias depois, sentiu-se tonto, com sensação de que os objetos giravam em redor de si, da direita para a esquerda. Horas depois, à noite, teve novamente tontura, com escurecimento da vista, perda dos sentidos e queda. Recuperou logo os sentidos, mas continuou amaurótico por algum tempo. Logo depois, ao montar em um cavalo notou que a mão esquerda não tinha força para segurar o estribo; além da perda da fôrça, não conseguia mover ordenadamente e sentir com os dedos da mão esquerda. Esse distúrbio persistiu, agravando-se; uns 20 dias depois notou que a boca repuxava para o lado direito. Decorrido um mês notou que o membro inferior esquerdo estava sem firmeza e que ao andar arrastava o pé. A bôca ainda se apresentava desviada para a direita, o ombro esquerdo caído e o membro superior desse lado enfraquecido. A fala ficou um pouco atrapalhada, pois não conseguia articular bem as palavras e sentia cansaço ao falar. Com o tempo, estes sintomas foram melhorando. Mais pronta, a melhora do membro inferior esquerdo e a da articulação da palavra; pequena melhora no desvio da boca e menor ainda nos sintomas do membro superior.

Nos antecedentes familiais assinalava-se passado luético dos progenitores, ambos com reação de Wassermann positiva no sangue; sua mãe teve 4 abortamentos. Nos antecedentes pessoais nada de interesse. Nega passado venéreo-sifilítico.

O exame físico revelou tratar-se de indivíduo longilíneo, asténico. Estando o paciente de pé, em posição de sentido, o ombro esquerdo ficava em nível inferior ao direito. A cabeça sempre baixa, com uma expressão de alheiamento. Batimentos cardíacos íarrítimicos com algumas extrassítoles. Pressão arterial 120 e 70. Artérias elásticas, cheias, batendo 70 vezes por minuto. A marcha era regular, porém o braço esquerdo não apresentava os movimentos sincrónicos, ficando em ligeira abdução. Parado, quase sempre o doente segurava a mão esquerda com a direita, tendo consciência da sua moléstia e achando que essa mão não tinha a mesma precisão no executar os atos como anteriormente. Aapreensão era sumamente difícil; os dedos abriam-se demais, irregularmente, sem precisão, não seguravam firmes o objeto, que caía sempre. Êsses movimentos só eram executados sob ordens do examinador e com grande atenção do doente, que seguia todos os movimentos com os olhos. Quando nada se ordenava, e observava-se o doente, notava-se que o braço esquerdo caía pendente ao longo do corpo e não era utilizado. O mesmo se notava quando o doente recebia ordem para movimentos que exigiam a participação dos dois membros superiores; o doente movia com desembaraço o direito e esquecia o esquerdo, que ficava imóvel. Assim, ao escrever numa folha de papel, sobre a mesa, êle não a fixava com a mão esquerda, mesmo que a folha dançasse sob o lápis, sem firmeza. O mesmo acontecia quando queria desprender um papel dum bloco e, também, ao vestir-se.

Psiquismo - Nenhuma alteração da sensopercepção. Atenção grandemente dispersa; o doente não se concentrava durante muito tempo, sendo necessário no exame " despertar-lhe a atenção" constantmente. O doente contava os fatos sem clareza e errava na seriação dos mesmos no tempo. Memória de fixação péssima e memória de evocação má. A medida do desenvolvimento da inteligência pelos testes de Binet-Simon concluiu por uma idade provável de 8 anos. Quanto às funções intelectuais superiores - exploração das conexões e integrações significativas e valorização substantiva - observava-se grande deficiência. Afetivi-dade conservada. Podemos concluir por uma atenção quase nula e dispersa, memória má, oligofrenia com individualidade, personalidade e iniciativa reduzidas.

Exame neurológico: Motricidade - O exame dos movimentos voluntários mostrou que todos eles são possíveis em qualquer segmento corpóreo e idênticos dos dois lados. A fôrça muscular estava conservada em todos os grupos musculares dos membros, quer superiores quer inferiores. Na prova dos braços estendidos, se o doente prestava atenção à prova (por repetidas solicitações nesse sentido) os braços permaneciam em posição. Se o doente não prestava atenção no que executava, o que acontecia comumente, o braço esquerdo sofria uma queda muito lenta. Se a prova era executada com os olhos fechados, observava-se queda mais rápida do membro superior esquerdo, sem que o doente tivesse disso conhecimento. Não tinha, igualmente, certeza de que o membro permanecia no mesmo plano, pois. se disséssemos que o braço se encontrava mais baixo, êle o elevava, mesmo que nossa informação fosse errônea. Nessa queda, que se processava de olhos fechados, não existia flexão do antebraço sobre o braço. Na prova de Raimiste, o doente abria desmesuradamente os dedos da mão esquerda, o que aliás acontecia sempre que fazia qualquer movimento com essa mão: se o incitássemos a prestar atenção à prova, os braços permaneciam em posição; se deixássemos o doente entregue a si próprio, dava-se queda do antebraço. Essa queda era, porém, pequena (diminuição de uns 5.° no ângulo formado pelo braço e antebraço). Na prova de Mingazzini, a perna esquerda caía, lentamente, sem oscilações, íletindo-se sobre a coxa, ao passo que esta, mais lentamente, separava-se da linha média em abdução. As provas de Barré e do pé de cadáver eram normais.

O estudo da harmonia do movimento pela prova do dedo-nariz demonstrou ligeiro tremor do braço esquerdo, quando a prova era realizada com os olhos fechados. Na prova dedo-dedo o doente agia da seguinte maneira: fixava o dedo esquerdo em determinada posição e aproximava o direito; se o dedo direito batia na mão esquerda, êle a seguia até o dedo. A prova calcanhar-joelho fazia-se coordenadamente para ambos os lados. O estudo dos movimentos compostos e dos gestos mostrou boa execução dos movimentos elementares (separar os dedos, enrugar a fronte, projetar os lábios), dos movimentos reflexivos (esfregar os clhos, assinalar a orelha ou o nariz), dos movimentos expressivos (lançar beijos com as mãos, fazer continência, o sinal da cruz). Reproduzia de memória atos voluntários como os que se faz para abrir uma porta, contar dinheiro; repetia bem Os movimentos que via executar, imitando-os. Notava-se que era necessário ordem enérgica para que se utilizasse da mão e membro superior esquerdo, e os movimentos então feitos eram anormais na sua composição. Tono muscular normal. Na marcha o braço esquerdo não executava os movimentos sincrônicos, permanecendo pendente e em leve abdução, a 3 cm. do corpo mais ou menos. Quase sempre a cabeça ficava em flexão sobre o peito, o rosto voltado para o chão. A fácies do doente revelava suas nuances emotivas. A mastigação, deglutição e respiração faziam-se normalmente. O estudo da palavra espontânea demonstrou não existir alteração na articulação dos vocábulos; não errava ao •dizer as palavras que conhecia; não substituía, não saltava ou interpunha sílabas; as frases eram regularmente constituídas. Ao ordenar-se a repetição de vocábulos, o doente não errava na articulação, não modificava as sílabas e sabia empregar os vocábulos quando os conhecia. Não existia surdez verbal (executava bem ao comando ordens simples ou complexas) ou afasia óptica (reconhecia os objetos e os nomeava). Estudando a escrita vimos que o doente reconhecia as palavras, as sílabas e as letras, assim como entendia as palavras e as frases. Reconhecia o valor das palavras escritas, executando ordens dadas por escrito. Compreendia bem tanto a escrita horizontal como a vertical, se bem que neste último caso errasse com mais facilidade.

Os reflexos osteotendinosos dos membros superiores e inferiores eram mais vivos à esquerda; reflexos cutâneos normais. Não existiam clono, trepidação, automatismos ou sincinesias.

Sensibilidade - Subjetivamente não havia queixa alguma. Ao exame objetivo, notava-se que as sensibilidades simples - tacto, temperatura, dor e óssea - estavam normais. As sensibilidades complexas apresentavam anormalidades de variados graus. A sensibilidade à pressão estava normal, porém apresentava erros quando se pedia confronto entre duas pressões: o doente errava no julgamento do peso posto em sua mão esquerda, estivesse esta apoiada ou não. Sensibilidade segmentar muito alterada; a noção da posição dos dedos, da mão, do antebraço e do braço esquerdo estava abolida; a discriminação do tacto fazia-se lelativamente bem, com alguns erros quanto à forma, direção e sentido da excitação. A localização táctil apresentava nesse membro um erro de mais ou menos 5 centímetros, sempre no sentido proximal. O reconhecimento da forma e do material constitutivos dum objeto colocado na mão esquerda não era feito. Havia astereognosia, assim como hilo e morfoagnosia.

Exames complementares;

Exame do liqüido céfalo-faqueano: Punção suboccipital em decúbito lateral direito; pressão inicial, 12 (manómetro de Claude); líquor límpido e incolor; 0,2 células por mm3; 0,10 gr. por litro de albuminas totais; reações de Pandy, do benjoim coloidal, de Takata-Ara e de Wassermann, negativas.

Reação de Wassermann no sangue: negativa.

Exame neuroftalmológico: Motilidade oculopalpebral normal. Pupilas nor-jnais, assim como os meios e fundos oculares. Acuidade visual OD = 1, OE = 2/3. Acomodação normal. Senso cromático, campos visuais periféricos e centrais normais, sem escotomas quer para branco, quer para cores. (D. Prado)

Exame otorrinolaringoneurológico: Provas estáto-cinéticas normais. Face bôca, língua, palato e faringe nada apresentando de interessante para o lado da motricidade, sensibilidade e sensório. Cocleares no limiar da normalidade em ambos os lados. Ausência de nistagmo espontâneo e de posição. Pesquisa instrumental: provas calórica e giratória normais. (Rezende Barbosa).

Como vemos, tratava-se de um moço que, após pequenos ictos seguidos de hemiparesia esquerda total que regrediu paulatinamente, apresentou uma síndrome motora rara, a qual consistia em inércia, em falta de utilização do membro superior esquerdo, em desinteresse cinético dêsse membro. Êsse desinteresse não se projetava na esfera afetiva. Bem pelo contrário, o doente vivia atormentado e obcecado pela inatividade de seu membro superior esquerdo. O exame neurológico não revelou déficit motor algum. Havia pequena ataxia sensitiva no braço esquerdo e ligeiro tremor nos dedos da mão esquerda quando adotavam alguma posição forçada. Algumas sensibilidades complexas estavam alteradas, como a artrestésica, a localização e discriminação do tacto, a barognosia, a hilo, morfo e estereognosia. Êstes distúrbios sensitivos, relativamente pequenos, eram acompanhados de graves perturbações motoras para o lado do membro superior esquerdo, que não realizava atos complexos que necessitassem da ação combinada dos dois braços, como vestir-se, escrever corretamente. Estes fatos chamando nossa atenção, nos levaram a um estudo mais acurado da motricidade, da sensibilidade e da gnosia corporal, estudo que passamos a relatar.

Iniciamos a pesquisa pela sensibilidade geral. Destas, as somáticas extero-ceptivas, quer epicríticas (tigmestesia, termestesia) como protopática (algesia) estavam conservadas. As proprioceptivas apresentavam alterações: a artrestesia estava completamente abolida em todo o membro superior esquerdo, a mioestesia nas suas componentes - sensação de tração, tensão e pressão profunda - estava conservada, só havendo erros quando se pedia uma comparação entre uma pressão e outra; a palestesia estava íntegra. As sensibilidades viscerais interoceptivas não apresentavam alterações, nada se notando de anormal à pressão dos órgãos e na noção que o paciente tinha de seu estado e funcionamento.

Ao pesquisarmos as sensibilidades complexas, nas quais já se faz necessária a intervenção dos analisadores da cortiça cerebral, notamos que as alterações eram bem maiores. Havia nítida dissociação entre os analisadores de intensidade e os espaciais, pois o doente não diferençava os materiais (hiloagnosia), as formas (morfoagnosia), os pesos (baroagnosia) dos objetos, os quais também não identificava (astereognosia). Apresentava erros evidentes na localização do tacto,, indicando a posição do estímulo sempre mais próximo da raiz do membro do que era na realidade, porém nunca o localizava no outro lado do corpo (aloquiria).

O estudo da sensibilidade espacial mostrou que o paciente reconhecia, identificava, memorizava os sons; às vezes, os odores e as cores. Identificava a direção do som e da luz. Com as figuras o mesmo não sucedia. Olhando ou desenhando, o paciente errava quer nas figuras geométricas simples quer nas silhuetas do corpo humano. Neste caso reconhecia com dificuldade as partes ausentes em silhuetas e pudemos, ao fazer os testes de Binet- Simon, verificar que com maior dificuldade notava a falta dos braços que de outras partes do corpo. A noção de lateralidade estava conservada. O paciente não apresentava aloestesia, não confundia os lados de seu corpo (autotopoagnosia) nem os do espaço (planotopoagnosia) apontando certo e orientando-se bem no ambiente. Identificava seu membro superior esquerdo, tanto assim que o utilizava sob comando, se bem que com dificuldade.

Os movimentos elementares (abrir e fechar a mão, levantar e abaixar os braços) eram realizados corretamente sob comando.

Movimentos mais complexos e os que exigissem a participação dos dois lados do corpo (aproximar os dedos entre si, fazer um anel com o indicador e o polegar da mão esquerda) eram difíceis de realizar e feitos com grande indecisão.

Nos movimentos automáticos e espontâneos o doente nunca usava o membro superior esquerdo, que permanecia inerte. Na marcha o membro superior esquerdo não se movia sincronicamente com o direito, permanecendo imóvel ao lado do corpo.

Os atos expressivos eram realizados corretamente com o membro superior direito. Com o esquerdo, o paciente era capaz de fazer corretamente a saudação militar e o sinal da cruz, não havendo erro ou modificação na seqüência dos movimentos componentes do ato. Não havia ataxia. O mesmo se diga para os atos descritivos (simular o ato de pentear, de pegar uma mosca, de abrir uma porta com a chave) . Para que o paciente utilizasse seu braço esquerdo era necessário, porém, que se ordenasse com palavras e mesmo por gestos, indicando o membro que estava abandonado ao lado do corpo.

Os atos complexos que necessitam para sua execução da participação dos dois membros superiores, ou aquelas em que os hemicorpos devem agir coordenadamente, não se faziam bem. O paciente, ao escrever, segurava o lápis com a mão direita e ao lançá-lo sôbre o papel este dançava; a mão esquerda não era usada para fixar o papel sobre a mesa. Havia imensa dificuldade para acender fósforos, porquanto não segurava a caixa com a mão esquerda, Procurando fazer tudo com a mão direita. O mesmo sucedia ao dobrar uma folha de papel e colocá-la num envelope. No vestir-se e abotoar-se a mesma dificuldade se manifestava. Freqüentemente não enfiava a manga esquerda nesse braço e, não notando o erro, acreditava-se vestido, tentando abotoar o paletó. Posto a marchar sobre os quatro pés não utilizava o braço esquerdo, nem o firmava ao solo. Deitado, ao virar-se rapidamente sobre o eixo longitudinal do corpo da direita para a esquerda ou vice-versa, o braço esquerdo não entrava na eurritimia geral dos movimentos, ficando Preso sob o corpo e dificultando a realização dos movimentos.

Evolução - O paciente esteve internado de outubro de 1940 a janeiro de 1941. Foi instituída medicação tônica, vitamínica e radioterapia profunda. Durante esse período melhorou. Conseguiu aos poucos incluir parcialmente o membro superior na motilidade global do corpo. Quando pediu alta da enfermaria já conseguia, ao vestir-se, utilizar parcialmente o membro superior esquerdo, se bem que ainda apresentasse muita dificuldade na realização dos movimentos complexos que exigissem a participação harmônica das duas metades do corpo. Em março de 1941, já em sua residência, no interior do Estado, apresentou exantema pelo corpo, enantema, coriza, lacrimej amento e hipertermia (39°)- tendo sido diagnosticado sarampo. No dia seguinte o exantema havia desaparecido e no 4.° dia de moléstia apresentou uma convulsão localizada no hemicorpo esquerdo, após a qual permaneceu em acentuada indiferença ao meio. A pressão arterial era de 145. Na urina foram encontrados cilindros granulosos e no sangue 1,70 gr.% de uréia (Ambard) tendo falecido em 29 desse mês (Uremia e encefalopatia pós-sarampo). Estes dados nos foram fornecidos pelo Dr. M. Costa Neves que o assistiu durante esse período; ao médico assistente não foi possível colher material para exame anátomo-patológiço.

COMENTÁRIOS

Quem observasse J. B. G. teria sua atenção focalizada para o membro superior esquerdo desse doente, porquanto êle não o utilizava em movimento algum. Os resultados do exame neurológico, relatado acima com minúcias que se tornavam indispensáveis para a perfeita compreensão da sintomatologia, poderiam ser condensados nos seguintes itens: perda das sensibilidades complexas - hiloagnosia, morfoagnosia, baro-agnosia, estereoagnosia - diminuição da sensibilidade artrestésica e inércia motora nos atos tanto automáticos como voluntários espontâneos. Sob comando, o paciente realizava corretamente os atos, tanto por ordens verbais como pela gesticulação.

A história da moléstia - sucessivos ictos - e a sintomatologia - abolição seletiva de sensibilidades perceptivas à esquerda - nos levaram a localizar a lesão na córtex parietal direita. Uma localização frontal não poderia ser responsabilizada pela síndrome motora descrita, pois não se encontravam elementos das series piramidal ou extrapiramidal. Atendendo à correlação sensitivo-motora exposta no início destetrabalho, procuramos explicar os distúrbios motores pelos déficits sensitivos apresentados, os quais se aproximavam da síndrome de Head. Uma lesão limitada à zona de percepção ou sômato-psíquica ou mesmo à zona de identificação ou tactognóstica não é suficiente, em nosso entender, para a produção da síndrome motora apresentada. Uma lesão nessas zonas poderia produzir uma inabilidade ou disabilidade no manuseio e utilização de objetos, porém não a perda completa da motricidade espontânea de um segmento corpóreo. Para que tal .ocorresse seria necessária uma lesão mais ampla que, das zonas de percepção e identificação, avançasse posteriormente, afetando o giro angular, zona cuja lesão acarreta modificações no esquema corporal.

Às alterações do esquema corporal têm sido atribuídas várias síndromes, desde a ampla anosognosia de Babinski até a limitada agnosia digital de Gerstmann. O caso por nós relatado não apresentava sintomas gnósticos muito evidentes: não havia aloestesia, aloquiria, auto-topoagnosia, nem dificuldade em designar ou reconhecer parte do próprio corpo. Os distúrbios eram limitados ao membro superior esquerdo e o doente o movimentava quando a isto era instado imperativamente, designava e reconhecia como seu esse membro e não sentia no lado direito as sensações provocadas no esquerdo. Dessa forma, o caso se aproximava dos descritos por van Bogaert (loc. cit. 8) como anosognosia dolorosa, diferençando-se dêstes por serem menos extensos os distúrbios, localizados como eram só no membro superior esquerdo e não em todo o hemi-corpo. Quanto à intensidade, nosso caso se diferençava também dos de van Bogaert porquanto não havia desconhecimento do membro superior esquerdo mas somente falta de utilização de suas possibilidades cinéticas. Tudo ocorria como se o esquema corporal tivesse sido afetado só em parte, principalmente naquela relacionada com a motricidade, parecendo que o paciente ignorava as possibilidades motoras do membro afetado.

Talvez se pudesse dizer que o distúrbio não fôsse gnóstico pròpriamente dito, pois o doente nunca deixou de reconhecer seu membro superior esquerdo; seria antes uma alteração mnéstica. De fato êle perdera apenas a utilização motora dêsse membro na gesticulação espontânea, parecendo ter-se esquecido de suas possibilidades cinéticas. Essa alteração incompleta do esquema corporal talvez pudesse ser explicada, pela falta de distúrbio visual. A vista poderia, íntegra como estava, corrigir em parte a falta das sensibilidades complexas, diminuindo a intensidade das conseqüêhcias dos distúrbios gnósticos, que de outro modo figurariam neste caso como no descrito por Garcin (loc cit.9). As caraterísticas neurológicas aproximam os dois casos; eles se diferençam apenas porque no caso dos autores supracitados havia também hemianopsia homônima esquerda, distúrbio que não existia no doente que observamos.

J. B. G. era um moço de 23 anos de idade, com artérias elásticas, pressão arterial normal e reações serológicas negativas para lues, tendo sido negativas, também, as pesquisas feitas no liqüido céfalo-raquidiano. Se bem que a ausculta do coração permitisse ouvir extrassístoles, não cremos que a lesão cortical pudesse ser explicada por uma síndrome vascular arterial, arteriosclerótica ou luética. A evolução do caso em crises sucessivas, com agravamentos bruscos e lentas melhoras, nos levaram a pensar em neoplasia cerebral, possivelmente de tipo infiltrativo (glioma) e, possivelmente de grande malignidade, permitindo apenas sobrevida de pouco mais de um ano (glioblastoma multiforme?). E' de lamentar a falta do exame anatômico que elucidaria o caso, quer quanto à etiologia como quanto à localização da lesão. Acreditamos que estecaso seja idêntico quanto à anatomia patológica e topografia àquele relatado por Garcin, Varay e Hadji-Dimo (loc. cit.9), já que era idêntica a sintomatologia.

Recebido para publicação em 10 de agosto de 1944

Rua Correia Dias, 132 - São Paulo.

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      02 Mar 2015
    • Data do Fascículo
      Dez 1944
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