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‘Não há missão mais nobre para um cientista social do que aproveitar espaços para tentar melhorar a vida das pessoas’: Entrevista com Ignacio Cano

2018 é um ano que não acabou no Brasil. Em fevereiro, o governo federal da ocasião decretou uma intervenção militar na segurança pública do Rio de Janeiro, despossando provisoriamente o governador fluminense de sua ascendência sobre as polícias Civil e Militar, o Corpo de Bombeiros, a Secretaria de Segurança Pública e o sistema penitenciário estadual. A responsabilidade sobre a área passou para o então comandante militar do Leste, o general do exército Walter Braga Neto, hoje ministro de Estado. Isso marcou a retomada do protagonismo de militares na política nacional, algo que ganharia contornos mais nítidos nos anos seguintes. Um mês após o início da intervenção, em 14 de março, a vereadora Marielle Franco (PSOL) foi assassinada no Rio de Janeiro em um atentado brutal, cujas razões não foram ainda esclarecidas pela Justiça brasileira. Em abril, o ex-presidente Lula da Silva (PT) foi condenado, preso e impedido de participar do pleito presidencial como resultado da Operação Lava Jato, que passa agora por um processo de revisão judicial na Suprema Corte do país. Cinco meses depois, em outubro do mesmo ano, o então deputado federal Jair Messias Bolsonaro, vítima de uma agressão a faca durante a campanha eleitoral, foi eleito presidente da República com mais de 57 milhões de votos. Amante da tortura e da brutalidade, seu governo tem se caracterizado pela rotinização dos arroubos golpistas, da instabilidade institucional, de toda sorte de incompetências e de um volume sem precedentes de mortes evitáveis de milhares de brasileiros. Os episódios que marcaram aquele ano seguem repercutindo intensamente na vida nacional.

Quando 2018 chegava formalmente ao fim, o sociólogo Ignacio Cano, um espanhol de Andaluzia radicado no Brasil, foi sabatinado no concurso para professor titular da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Alguns dias depois de alcançar o teto da carreira universitária brasileira, se licenciou do cargo e partiu para viver seu exílio — um exílio voluntário de um país onde não nasceu. À época, ele me dizia ainda atônito: “É impensável para mim entrar em um ônibus e pensar que 60% dali votou no Bolsonaro, no [Wilson] Witzel”.

Ignacio Cano, 59 anos, é doutor em sociologia pela Universidad Complutense de Madrid (1991) e fez estágios pós-doutorais nos EUA (1994 e 1996) e na Inglaterra (2008). Nos últimos 30 anos, desenvolveu inúmeros trabalhos sobre violência, direitos humanos, organizações policiais e políticas públicas em segurança, além de incursões em outros campos de pesquisa, como metodologia científica, educação e mercado de trabalho. Atuou igualmente como pesquisador e consultor em diversas organizações da sociedade civil, no Brasil e no exterior, e colaborou com governos e instituições nos temas da segurança pública e da justiça criminal. Há alguns anos é um dos principais intelectuais públicos da área em atividade no país.

Ignacio foi também meu professor de metodologia e de técnica de pesquisa na Uerj e, entre 2013 e 2015, eu fui um dos jovens pesquisadores do Laboratório de Análise da Violência (LAV/Uerj), cofundado por ele. O tempo de convívio, o gosto pela divergência e o amor pelo Botafogo fizeram florescer uma espécie de amizade entre nós. Quando Ignacio retornou ao Brasil pela primeira vez após sua partida, em agosto de 2019, disse a ele que gostaria de gravar um bate-papo sobre seu trabalho e sua atuação política. Ele aceitou de pronto, mas não sem antes dizer, com a ironia que lhe é peculiar, que eu me preparava para sua morte.

Realizamos a primeira parte desta entrevista no dia seguinte. A segunda metade foi gravada meses depois, em dezembro de 2019. Nos dois encontros, Ignacio falou em detalhes sobre o problema da letalidade policial no Rio de Janeiro, os dilemas da relação entre a academia e as políticas públicas e as discussões metodológicas na sociologia. Trata-se de um depoimento franco, em tom de avaliação, que reconstrói os caminhos e descaminhos da segurança pública fluminense, ao mesmo tempo que acena para as possibilidades e os limites do papel dos sociólogos na construção de uma sociedade democrática e civilizada no Brasil.

Quase três anos depois da realização das entrevistas, o teor e o tom das respostas se mantêm bastante atuais. Sua divulgação neste momento busca transformar as reflexões aqui presentes em insumos para todos aqueles que buscam compreender o longo ano de 2018 para o Brasil. A envergadura do problema exige a combinação de rigor e perspicácia, dois atributos de que Ignacio Cano dispõe de sobra.

Como você lida com o rótulo de ‘policiólogo’?

Quando eu cheguei ao Brasil, em 1996, ainda não havia esse termo. Mas surgiu na medida em que cientistas sociais começaram a entrar nessa área de segurança. Eu fui trabalhar no Iser [Instituto de Estudos da Religião]1 1 O Iser é uma organização da sociedade civil com larga tradição de estudos e ações no campo dos direitos humanos. Para saber mais, ver (on-line): https://www.iser.org.br/sobre/ , tinha o Luiz Eduardo Soares, tinha a Jaqueline Muniz, tinha algumas pessoas que não estão mais no Brasil. O João Trajano tinha trabalhado lá também2 2 Luiz Eduardo Soares, João Trajano e Jaqueline Muniz são cientistas sociais que desenvolvem pesquisas na área da segurança pública há muitas décadas. Os dois últimos foram alunos e orientandos do primeiro no doutorado. . Tinha um grupo de cientistas sociais que começaram a se debruçar sobre a questão da segurança pública, juntando certa militância de esquerda com um olhar mais técnico, mais científico, mais de analisar dados. A área de segurança na época era um absoluto deserto. Não havia informação nenhuma, não havia dados, tinha toda a herança da ditadura, uma herança militar.

Curiosamente, os militares — especialmente no Brasil, mas não só — foram muito eficientes no combate ao inimigo político. Eles tinham uma inteligência muito boa. Eles acabaram com a insurgência armada, e foram bem eficientes nisso. Mas na área de segurança pública o combate à criminalidade era muito mais tosco, era muito menos eficiente. Não tinha inteligência. Era uma coisa muito marginal do ponto de vista das prioridades do Estado e da capacidade de articular, digamos, uma política pública sobre isso. A entrada dos cientistas sociais, dos especialistas, gerou certa comoção, sobretudo porque a imprensa começou a chamar esses especialistas para dar depoimentos, para comentar decisões do governo. E aí tinha esse contraponto entre os números oficiais e os acadêmicos.

Na época em que eu cheguei [no Brasil] existia a “premiação faroeste”3 3 Na década de 1990, durante o governo de Marcelo Alencar, policiais militares fluminenses recebiam gratificações financeiras com base no número de civis mortos em operações policiais. A política ficou conhecida como “premiação faroeste”. : os policiais recebiam complemento salarial para matar pessoas. A contraposição entre os direitos humanos e o aparato do Estado era muito forte, e aí o atrito era bem intenso. Nós acabamos assumindo esse papel de contraponto ao Estado na área de segurança. Depois de certo tempo eles cunharam esse termo, policiólogo, com o objetivo de dizer: “Olha, vocês estão entrando em uma área que não é de vocês”. Eu estive em inúmeros debates, entrevistas, no rádio etc., onde era patente a irritação [dos policiais]. Eu me lembro de um coronel, que estava sendo entrevistado simultaneamente comigo em um rádio, que falou: “Eu queria dizer, antes de qualquer coisa, que eu não reconheço o professor Ignacio Cano como um especialista em segurança”. Eu falei: “Não me intitulo como tal, mas o fato de ser policial também não garante que você seja especialista em segurança”. É claro que para eles isso é uma intromissão, um bando de pessoas que politicamente eram muito diferentes da agenda deles. Depois da primeira pesquisa que fizemos sobre letalidade da ação policial eu fui a um debate do Bom Dia Rio, da TV Globo, junto com o assessor do secretário de Segurança, um coronel apelidado de Coxinha de Pombo. Ele levou um fuzil para o estúdio e, enquanto eu apresentava os dados, ele pegou o fuzil e começou a agitar em cima da cabeça dele, muito perto de mim, dizendo: “Essa é a realidade da criminalidade do Rio de Janeiro, não esses números aí”.

Ele disse isso ao vivo?

Ao vivo. A sensação deles era: “O que esses caras tão fazendo aqui? Eles têm outro objetivo político e não sabem nada do que teoricamente deveria ser sabido”. No fundo, quando a segurança pública funciona bem você não precisa necessariamente desse bando de cientista social se debruçando sobre isso. É o que a gente chama de “modelo do bombeiro”, algo injusto com os bombeiros, porque hoje eles têm uma abordagem preventiva. As pessoas imaginam que o bombeiro é um cara que está em um lugar esperando algo ocorrer e recebe uma ligação de emergência, sai correndo, apaga o fogo e depois volta para aquele lugar, joga baralho e espera a próxima ligação. Quando você tem taxas de criminalidade muito baixas, um sistema social relativamente estável e legítimo, ocorre um problema — os que as pessoas chamam de caso de polícia —, você vai para a polícia e tem algum encaminhamento. E como é muito raro, ninguém se preocupa muito com isso. É assim até hoje em alguns países, países de primeiro mundo, onde as taxas de criminalidade são baixíssimas. Quando você começa a ter uma epidemia é que você precisa ter uma abordagem diferente, de prevenção. Não pode ficar esperando a “chamada”. Talvez a “chamada” nunca chegue porque o sistema não tem credibilidade, e mesmo quando chega você não alcança todas as chamadas ao mesmo tempo, não consegue distribuir a atenção.

O Brasil viveu um momento de taxas de criminalidade violenta muito fortes nos anos 1980, paralelamente à democratização, o que também comporta um risco muito grande para o sistema político e para a legitimidade da democracia. É muito fácil as pessoas dizerem — como diziam na Espanha também quando eu era jovem — que na ditadura era tudo melhor, que na ditadura não aconteciam essas coisas. É claro que a ditadura controla informação de forma que você não fica sabendo o que acontece, tanto em termos de violência, mas, sobretudo, em termos de corrupção. Há todo um aparato que impede as coisas de saírem. A percepção que as pessoas têm é que na ditadura não havia corrupção nem violência. A democratização contribui fortemente para deslegitimar a democracia, e isso eu vi também na América Central, na Europa e no Brasil.

[Então] a situação é essa, nós fizemos esse contraponto [ao Estado]. Quando acaba o governo Marcelo Alencar e entra, posteriormente, o governo [Anthony] Garotinho, o Luiz Eduardo Soares vai para o governo. Aos poucos também o governo federal da época, o governo Fernando Henrique Cardoso, tinha o Zé Gregori como secretário de Direitos Humanos e, embora não fosse uma visão muito aberta, tinha um olhar que reconhecia abusos no aparato do Estado, que esses abusos ainda eram um resquício da ditadura e que isso precisava mudar4 4 José Gregori é um jurista brasileiro que foi secretário Nacional de Direitos Humanos e ministro da Justiça ao longo dos dois governos de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002). . Havia um consenso de que, apesar dos percalços, a direção seria de uma maior institucionalidade, de um maior respeito às leis, aos direitos humanos, e aí nós fomos ganhando peso no debate público.

Outra coisa importante foi que muitos policiais começaram a estudar na universidade. Quando a gente fez pesquisa (em que você participou, inclusive), o percentual de policiais que tinha ido cursar alguma coisa na universidade era muito elevado. Há um aumento de escolaridade geral na sociedade brasileira. O policial não quer ser um sujeito tosco, ele também quer estudar, quer ter tecnologia, sobretudo tecnologia — algo que atrai muito as pessoas da área de segurança. Os policiais entraram na universidade, estudaram mestrado, doutorado, em várias áreas. Isso reforçou nossa legitimidade, porque várias pessoas que estudaram conosco passaram a atingir posições de comando na estrutura da segurança pública, o que foi muito bom. Isso melhorou muito o diálogo e a interlocução.

De repente nós estamos vivendo esse refluxo completo. Eu não duvido que o termo policiólogo, ou outros, volte a ser usado para [nos] caracterizar. Como os governos agora têm essa visão autoritária e exclusivista da segurança pública, não sei se eles vão precisar dessas ferramentas retóricas ou, como o Witzel está fazendo, apenas mudem as composições e pronto5 5 Em janeiro de 2019, nos primeiros dias do seu governo, Wilson Witzel modificou por decreto a composição do Conselho de Segurança Pública do Rio de Janeiro. . A reação que ele teve essa semana, dizendo que os mortos pela violência estão no colo dos defensores dos direitos humanos e não no dele, indica que o embate vai continuar6 6 Em agosto de 2019, após seis jovens serem mortos em ações da polícia no Rio de Janeiro no período de cinco dias, o então governador disse a jornalistas que “os cadáveres desses jovens estão no colo dos direitos humanos”, porque à época os defensores de direitos humanos criticavam as falas do governador sobre “abater” criminosos que portassem fuzis (BOECKEL, 16/08/2019). , até porque esse projeto político autoritário precisa de um inimigo. Um projeto fascista ou parafascista não se constrói sem inimigo: ele precisa dizer que a culpa é nossa, senão o fracasso deles não tem justificativa. Enquanto eles puderem dizer que somos nós que impedimos a polícia de fazer o seu trabalho, eles ficam relativamente protegidos em relação ao fracasso de suas políticas. Então talvez esse tempo, de sermos acusados de intrusos, volte.

A participação de especialistas e acadêmicos no governo de Anthony Garotinho é lembrada em geral em uma chave positiva, especialmente na área de segurança pública. Mas de alguma forma vocês apostaram alto em um projeto político nebuloso. Como você avalia isso? Você ocupou algum cargo no governo? Qual papel você desempenhou?

Eu não tive qualquer papel maior, eu fiquei de observador. O grupo do Luiz Eduardo entrou com muita força. O Luiz Eduardo foi coordenador de Segurança, um cargo novo, com certa influência política, mas não operacional. Ele teve um papel na seleção dos comandos das polícias civil e militar.

Antes do governo — o que foi marcante para entender depois o que aconteceu —, o Garotinho fez um livro sobre segurança. Acho que o Garotinho realmente foi muito bem-sucedido retoricamente, porque ele era do PDT [Partido Democrático Trabalhista] do Brizola e o Brizola era associado com o fracasso da segurança pública no Rio. Qualquer policial a quem você perguntava dizia: “A situação fugiu ao controle porque o Brizola não deixava a gente subir em favela”. A explicação era extremamente simplista, e injusta também, mas isso era ponto pacífico nas polícias e em parte da mídia. A fraqueza da candidatura Garotinho era justamente a segurança pública. Então ele chama o Luiz Eduardo, vai a alguns congressos (ele não era nenhum especialista, obviamente, e nem nunca seria) e consegue transformar fraqueza em fortaleza, ajudado pelo fato de que isso aqui era um deserto. Nenhum outro candidato tinha lido sobre segurança pública, nenhum candidato tinha um esforço de reflexão e um programa de segurança. Ele entra em um campo abandonado, faz o livro e diz: “Eu sou especialista de segurança”. Teve sucesso, foi eleito. Aos poucos ele se revela um político oportunista, que certamente não estava disposto a enfrentar as resistências que tinham nessa área. O livro do Luiz Eduardo conta um pouco isso7 7 Cano faz referência aqui ao livro de memórias de Soares (2000), em que ele narra sua experiência no governo de Anthony Garotinho. . No início, o Garotinho entra em uma favela para pedir perdão pelas operações da polícia. A reação da polícia a isso foi extremamente negativa, inclusive alguns policiais ameaçaram jogar corpos na frente da casa do Luiz Eduardo e da do governador. Ele acaba recuando e fazendo um pacto lá, e o Luiz Eduardo sai.

A equipe do Luiz Eduardo, incluindo Julita [Lemgruber], Silvia Ramos, Jaqueline Muniz e de forma um pouco mais distante o João Trajano, que participa no livro, mas não no governo, fez parte desse projeto. Mas eu não fazia parte do grupo do Luiz Eduardo. Eu tinha uma boa relação com ele, de muito respeito, mas eu tenho um trabalho mais autônomo. Eu participei como observador, mas não tive qualquer papel e nem muita interlocução. A gente estava também com expectativas para ver o que acontecia, não queria fazer um ataque frontal até ver o que os nossos colegas lá dentro iriam fazer, como eles iriam se manifestar. O meu papel foi relativamente reservado.

A gente tinha acusado o Brasil na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Eu trabalhava no Iser, que na época se juntou ao Cejil [Centro pela Justiça e Direito Internacional]8 8 ONG formada por defensores de direitos humanos que atua principalmente no âmbito do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH). Para saber mais, ver (on-line): https://cejil.org/pt-br/quem-somos/ e fez uma ação contra o Brasil pelos massacres de Nova Brasília9 9 O Estado brasileiro foi sentenciado, em fevereiro de 2017, na Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), pela violação do direito à justa investigação no chamado Caso Favela Nova Brasília, quando duas incursões policiais nessa favela, em 1994 e 1995, resultaram na morte de 26 homens e em atos de violência sexual contra três mulheres. A sentença é um marco institucional na área, pois elenca diversas diretrizes para o aprimoramento do controle externo da atividade policial e do sistema de justiça no Brasil. . O procurador-geral de Justiça no governo Garotinho, José Muñoz Filho, foi para Washington defender o Brasil, e eu fui para acusar. Tivemos um embate lá. Nesse sentido, tivemos algumas interlocuções e alguns atritos, mas não era uma coisa tão destacada como tinha sido antes. No governo Marcello Alencar, com a chefia de polícia por parte do general [Nilton] Cerqueira e principalmente depois que a gente lançou o relatório sobre letalidade policial, eu me converti em um inimigo público do governo. Meu amigo à época, que trabalhava na Humans Right Watch10 10 ONG internacional que desenvolve pesquisas e intervenções políticos no campo dos direitos humanos. Para saber mais, ver (on-line): https://www.hrw.org/pt , o James Cavallaro, era o inimigo público número um e eu me tornei quase que o inimigo público número dois. O general disse que eu tinha que ir para Espanha estudar o ETA [Euskadi Ta Askatasuna, ou Pátria Basca e Liberdade, em português]11 11 Extinta em 2018, a ETA era uma organização armada que lutava pela separação e independência da região conhecida como País Basco da Espanha e da França. , que eu não tinha nada o que fazer aqui no Brasil. Quando o James foi embora, eu tive uma posição de muita contraposição, de muito atrito com o governo; meu telefone foi grampeado, enfim.

Posteriormente, o secretário de Segurança do Garotinho, Josias Quental, disse para a imprensa que era um absurdo alguém como eu, “que não falava português direito”, ter um trabalho como aquele no Iser, na área de segurança. Eu fiquei muito ofendido porque tinha lido muitos documentos da polícia e o português era horrível. Atacar o meu português quando o português das forças de segurança era realmente deficiente? [risos]. Tivemos esses embates, esses atritos, mas eu certamente não tive participação direta no governo. Eu era muito amigo da Julita Lemgruber, por exemplo, que era ouvidora [de polícia]. Apoiei no que pude, mas nunca assumi uma posição na gestão Garotinho, nem mesmo de apoio público.

Você comentou sobre os policiais que buscaram a universidade e formaram posteriormente um grupo importante de policiais críticos ao padrão da política de segurança pública do Rio. Por outro lado, no mesmo período, muitos policiais foram para a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e para o Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (IBMEC), por exemplo, fazer MBA em políticas públicas, em gestão e planejamento etc., e deram um caráter mais racionalizado aos processos violentos das polícias no estado.

Tanto na área de segurança nacional quanto na área de segurança pública, em geral, o que gera menos resistência [nos policiais] são dois temas: tecnologia e gestão. Na Espanha, quando houve o golpe de Estado de 1981, o que o governo fez à época foi colocar o Exército dentro da Otan [Organização do Tratado do Atlântico Norte], fazer cursos de formação, entregar tecnologia, colocá-los em cooperação — e funcionou. É a ideia segundo a qual a gente não vai convencê-los ideologicamente, mas se eles tiverem “brinquedinhos”, como as pessoas diziam, isto é, tecnologia e gestão, eles ficarão tranquilos. Na área de segurança pública também acontece muito isso. Mesmo os setores mais duros ideologicamente, que tem uma visão mais tradicional de combate, valorizam muito a gestão, que se converteu quase que em um mantra, e a tecnologia. Isso eles aprovam, gostam. Todo mundo quer ter um título de mestrado, de doutorado. Eu acho isso positivo porque, mesmo com todas as suas limitações, é muito melhor do que aqueles grupos fechados da ditadura.

Outro elemento importante é que, mesmo que seja em uma área tecnológica, a ida de policiais em postos de comando na segurança pública para as universidades, para a sociedade, abre uma instituição que tem uma herança da ditadura militar forte e uma herança de fechamento. A estrutura militar se caracteriza por ser isolada do resto da sociedade como um mecanismo de defesa de influência externa e para reforçar o compromisso em relação ao país, e não a outras coisas. Mesmo quando essas pós-graduações e formações ficam na área de gestão e de tecnologia eu acho isso positivo. Mas é claro que se eles forem além disso, eles vão encontrar muita crítica, muitos questionamentos ao papel deles. Tem pessoas que avançaram muito nesse sentido. É interessante pensar que o coronel Carlos Magno Nazareth Cerqueira era um cara muito avançado, tão avançado que não pode colocar muitas coisas em prática12 12 Oficial da polícia militar, o coronel Cerqueira foi comandante-geral da instituição nos governos de Leonel Brizola no Rio de Janeiro, entre 1983 e 1987 e 1991 e 1995. Foi assassinado em 1999 e a motivação do crime nunca foi esclarecida. . Era um cara que já tinha pensado boa parte disso tudo. Nada estava sendo inventado. A questão era tentar fortalecer essa visão dentro das corporações.

Esse movimento de abertura das polícias também foi importante para a sociedade civil e para as organizações de direitos humanos. E aí nós temos a briga do nosso lado. Nós fomos muito criticados por alguns setores por fazer interlocuções com a polícia, você sabe disso. O lançamento do nosso livro [Cano et al., 2012CANO, Ignacio; BORGES, Doriam; RIBEIRO, Eduardo (orgs). Os donos do morro: Uma avaliação exploratória do impacto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) no Rio de Janeiro. São Paulo; Rio de Janeiro: FBSP; LAV/Uerj, 2012.] foi impedido13 13 Em 2014, o evento de lançamento do livro de Cano e colaboradores sobre a política de pacificação de favelas no Rio de Janeiro, Os donos do morro (Cano et al., 2012), foi interrompido por organizações de esquerda, boa parte delas formada por estudantes universitários, segundo os quais a obra consentiria com “violência de Estado contra as favelas e periferias”. . Tem muita gente do lado de movimentos comunitários, direitos humanos, que acha que a polícia é inimiga e tem que ser combatida. Mas não tem como combater a polícia, não é? Isso dificulta criar uma relação que possa ajudar a melhorar a política pública.

Também acho que alguns setores da esquerda tradicional são muito deficientes nesse sentido. Não vou dizer nomes, mas eu já participei de debates onde professores renomados — do direito, sobretudo — diziam: “Você acha que essas medidas que vocês estão propondo para reduzir letalidade policial podem ter qualquer impacto na sociedade capitalista e opressora?”. O debate era muito duro porque eu dizia: “Olha, se você mora no Leblon realmente não faz diferença, mas se você mora no [Complexo do] Alemão e, em vez de morrerem 40 pessoas [pela ação da polícia], morrem 20, são 20 famílias que vão ter uma vida muito diferente”. Me parece uma insensibilidade de classe dizer isso [que reformas não geram impacto]. Na Argentina, onde a repressão da ditadura militar foi muito mais intensa do que no Brasil (morreram 30 mil pessoas lá), boa parte da academia é completamente refratária à polícia. Eu já ouvi em congressos professores argentinos dizendo “polícia, quanto menos melhor”. Você não pode ir a uma favela, onde as pessoas se sentem inseguras, com um discurso desses. Se você mora em um bairro de classe média alta, onde as coisas são relativamente tranquilas, talvez sim; mas em áreas onde a insegurança é muito grande você não pode chegar com esse discurso.

No Brasil, houve em muitos espaços essa capacidade de interlocução para gerar melhoria na política pública, com certa aproximação dos dois lados: do lado dos policiais, que começaram a estudar, participar e criticar o que eles próprios faziam, e do lado da academia e de parte do movimento dos direitos humanos, que começou a ver que não se pode mudar a polícia sem contar com ela. Você não pode chegar e dizer: “A partir de amanhã a polícia vai fazer isso”. Isso não existe. A polícia certamente tem milhões de formas de boicotar tudo o que você quiser impor em cima dela, então você tem que contar com alianças internas, tem que tentar transformar de dentro e de fora ao mesmo tempo. Isso abriu espaços muito interessantes, que avançaram em algumas coisas — é difícil de acreditar nesse cenário atual, mas enfim. E o Brasil acabou se tornando um laboratório para a América Latina. Em outros países não havia essa interlocução, e o Brasil tem um tamanho e uma quantidade de experiências tais que é incomparável com qualquer outro lugar da região. Cada estado brasileiro começou a ter sua própria experiência: a de Pernambuco, a do Rio, a de São Paulo etc. Exemplos de políticas que poderiam ser formuladas com base no diálogo entre as corporações, a academia e os movimentos. Isso foi uma escola para toda a região, coisa que infelizmente agora está comprometida.

Acho que isso foi importante inclusive para nós, militantes dos direitos humanos. Os setores mais duros sempre nos criticam, mas eles têm tem razão em parte quando dizem: “Ah, é muito fácil você, lá de cima do seu escritório, dizer que a polícia é isso e isso e tem que fazer isso e aquilo”. Quando você está mais próximo da prática, você percebe que realmente existem dificuldades e problemas. Às vezes, quando você ouve parte do movimento dos direitos humanos, parece que a polícia é um bando de gente que veio em uma nave espacial de algum outro planeta, chegou aqui e está fazendo barbaridades contra a população. É óbvio que o que a polícia faz responde a várias dinâmicas. Uma delas são as demandas da própria população — que a gente esqueceu e que acabou votando no Jair Bolsonaro. “Bandido bom é bandido morto”, em uma pesquisa que nós fizemos, tinha apoio de 37% da população e a gente muitas vezes esqueceu disso. Combatemos o Estado como se o Estado fosse o único responsável.

Por exemplo, na área de uso da força, uma área que eu trabalhei muito desde sempre, a possibilidade de exercer o uso da força tem que ser tratada como um risco profissional. Se você é mineiro, pode acabar com silicose. Existem profissões que têm riscos profissionais e a possibilidade de usar a força de forma excessiva é o risco profissional do policial. Não é porque o policial seja perverso, nem necessariamente porque ele esteja desenvolvendo um mandato opressor a mando das elites ou de outros grupos — o que também pode acontecer. As perseguições [policiais] são um caso clássico e ilustrativo disso. Quando a polícia persegue alguém ou um veículo, a adrenalina do policial vai para cima, o policial está arriscando a vida, dirigindo a 120 km/h, essas coisas. Quando pega o cara, a vontade de bater nele é clara e provavelmente muitos de nós, se estivéssemos na mesma situação, teríamos essa vontade também. Você tem que trabalhar isso como um risco inerente à profissão, e eu acho que a esquerda tradicional e os movimentos de direitos humanos não foram suficientemente sensíveis a essa realidade. Essa aproximação ajudou que a gente visse o outro lado. Na pesquisa que a Terine Husek [Coelho] fez sobre vitimização policial, nas áreas de mais confronto o cara tinha um colega morto, passava a noite no velório, não tinha nenhum descanso e no dia seguinte ia trabalhar no mesmo lugar e lavava o sangue do companheiro [Coelho, 2015COELHO, Terine Husek. Medindo força: Vitimização policial no Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.]. Que condições psicológicas esse cara tem para sair à rua e dar uma atenção respeitosa para as pessoas? Zero! Esse cara pode fazer uma barbaridade como muita facilidade. A gente também tem que entender essa situação e esses mecanismos. Essa aproximação ajudou a melhorar a sensibilidade dos dois lados.

Você dedicou à Marielle Franco o seu memorial do concurso para professor titular da Uerj. A morte dela caiu como uma bomba na sua vida, assim como na de muitas outras pessoas.

A morte da Marielle foi uma coisa assim... Não foi a primeira pessoa do meu círculo de militância que... Eu trabalhei durante meses com um bispo guatemalteco em um relatório de direitos humanos durante a guerra na Guatemala e depois, quando voltei para o Brasil... (Na verdade, a minha vida estava encaminhada para a América Central, mas conheci uma brasileira e acabei vindo para cá). Esse bispo foi morto poucos dias depois do lançamento do relatório dos abusos cometidos na guerra. Isso também foi um baque pessoal muito forte.

A morte da Marielle é algo impensável porque em geral, diferentemente do que ocorre em outros países, as pessoas no Brasil não se matam pelas ideias, se matam por outros tipos de conflitos ou pelo interesse pessoal. Nós denunciamos muita gente no trabalho que fizemos aqui, mas sem mencionar nome e sobrenome, com a única exceção dos procuradores de Justiça. Esse foi o único caso em que a gente deu nome e sobrenome a pessoas que tinham tomado decisões que haviam favorecido a impunidade. E a ideia foi sempre: “Bom, contanto que eu não diga o nome das pessoas, ninguém vai vir me matar só porque fica incomodado com o que eu falo”. Nesse sentido, a morte da Marielle foi uma coisa completamente inesperada. Ela inclusive tinha um perfil pessoal muito delicado, no sentido de que ela era uma pessoa muito combativa, mas não era uma pessoa agressiva, não era uma pessoa que causasse irritação. Curiosamente, depois da morte da Marielle, entrevistaram esse major [da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro] que é comentarista da Globo, o Pimentel, e ele falou para o Valor Econômico: “A morte da Marielle não foi para mandar uma mensagem contra a intervenção federal14 14 A intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro foi decretada em 2018 pelo então presidente da República Michel Temer. Para saber mais, ver decreto no 9288/2018 (BRASIL, 2018). , porque se fosse teriam matado o Marcelo Freixo ou o Luiz Eduardo Soares, ou Jean Wyllys ou o Ignacio Cano” e mais um nome — eram cinco nomes, entre eles o meu. Foi muito inesperada a morte dela. Era uma pessoa que não tinha carregado ódios dessa intensidade que pudessem justificar isso. Para mim é uma tristeza muito profunda, é uma companheira que foi morta. É como se eu fosse soldado no exército e mataram minha companheira. Ela se tornou agora uma figura global, mas para mim... Eu fui com ela inúmeras vezes para o Conselho [Estadual] de [Defesa dos] Direitos Humanos. A gente brigou, discutiu, se apoiou, trabalhou junto, fomos a favelas para ver casos de abuso contra os moradores. Acho importante que ela tenha virado uma figura pública, acho importante ter isso, mas eu sinto também uma perda muito pessoal. Mataram a minha companheira de militância e isso é uma coisa que eu não vou perdoar.

Quem acompanha suas publicações pode perceber um esforço militante e ao mesmo tempo acadêmico de responder as perguntas mais urgentes. Não sei se é algo totalmente consciente, mas isso fica claro para mim quando lembro que em 2008 você já havia publicado uma pesquisa sobre milícia.

A gente se pensa como um Batalhão de Operações Especiais das ciências sociais. Quando o tema é muito difícil e muito urgente, a gente acaba tentando se debruçar sobre ele. Nesse caso também tem uma seleção também: “Quem entraria em um negócio como esse? Ah, chama esses caras lá”. Na pesquisa sobre as milícias nós fomos chamados para entrar nesse campo, com um financiamento bastante modesto, mas fomos chamados. Nós definitivamente entramos, achamos que era prioritário e acho que foi uma das pesquisas mais relevantes que nós fizemos. A mesma coisa aconteceu anos atrás com o tema da violência policial: a ONG em que eu trabalhava tinha uma pesquisa sobre policiais vitimados e outra sobre civis vitimados pela polícia. Encomendaram para mim a pesquisa sobre civis vitimados pela polícia e eu assumi. De fato, há uma mistura entre certa vocação para se debruçar sobre questões mais urgentes, mais caras, e uma seleção que vem de fora, com expectativas de que nós vamos encarar esse tipo de tema.

Você termina o seu memorial para o cargo de professor titular da Uerj falando sobre as iniciativas que tentou conduzir de controle da atividade policial por meio de parcerias ou com o comando da tropa ou com o governo. Queria finalizar com uma avaliação desse processo.

Foi um processo bem interessante porque [antes] eu tive meu telefone grampeado várias vezes pelo Estado e fui ameaçado de que deveria sair do país por dois secretários de Segurança diferentes. O general Cerqueira disse que eu tinha que estudar o ETA na Espanha, não tinha nada para fazer aqui, e o Josias Quintal disse que não era possível que eu tivesse o trabalho que eu tinha e nem soubesse falar português direito. Quando fiz as pesquisas sobre violência policial, me tornei um dos inimigos públicos da polícia do Rio. O inimigo público número um era o James Cavalaro, ele foi embora e eu fiquei. Eu sentia a hostilidade muito manifesta de alguns policiais contra mim. Com o tempo, e com essa conjuntura histórica que se formou há dez anos mais ou menos, com as UPPs [Unidades de Polícia Pacificadora] e com a expectativa de que poderia haver uma abordagem de segurança pública menos violenta, mais respeitosa e horizontal, começaram a se abrir espaços. E aí começaram a me chamar. Tudo o que nós fazemos, como disse antes, é para melhorar a política pública e a vida das pessoas. Eu me recuso a me encastelar em uma condição de oposição permanente só para manter a minha posição. Se se abrem espaços, esses espaços têm que ser aproveitados.

Eu encontrei com o Robson Rodrigues, que era o coronel responsável pelas UPPs, em vários congressos, e ele começou a ver que eu não tinha chifres, nem mordia, nem comia criancinhas de noite, e começou a abrir espaços. Em determinado momento me chamou, junto com a Jaqueline Muniz, para sermos consultores do projeto das UPPs. Eu acho que a visão dele naquela época foi seguinte: a Jaqueline era percebida como mais próxima da polícia e eu era percebido como mais oposto à polícia, então [colocou] um de cada lado, para depois ninguém dizer que isso foi feito a favor ou contra. Abriram-se muitos espaços. Acho também que o poder público viu que o que a gente queria era melhorar a situação, que não tinha implicância com a ordem pública e que estávamos dispostos a colaborar — e a colaborar de graça, coisa que nem todos os acadêmicos estão dispostos a fazer. Fizemos, por exemplo, pesquisas sob encomenda sem nenhum financiamento.

O último espaço que se abriu, e o mais poderoso, foi a possibilidade de fazermos um sistema de controle do consumo de munição individual. Para a polícia, isso era uma forma de detectar os chamados psicopatas antes que gerassem escândalo. Para nós, era uma forma de gerar um incentivo geral para a instituição diminuir o uso da força. Foi um processo extremamente interessante, difícil, mas evidentemente as chances de sucesso em um processo como esse são muito limitadas, porque a resistência intra e fora da instituição é muito grande. O Flávio Bolsonaro, por exemplo, foi na Assembleia Legislativa [do Estado do Rio de Janeiro] falar contra mim — o que é uma honra no meu currículo, certamente um dos pontos altos do meu currículo.

No final, [o projeto] não vingou, mas só de termos feito esse processo, feito a metodologia... E, como diziam meus colegas filipinos em um congresso outro dia, algo que realmente me comoveu, eles diziam: “Nós não estamos fazendo isso agora para evitar um massacre porque isso seria impossível. Nós estamos fazendo isso agora para resgatar a memória das vítimas e para que um dia alguém reconstrua o que aconteceu e possa fazer diferente”. A experiência em si mesma já vale a pena nesse sentido. Eu espero que um dia a situação melhore e alguém diga: “Olha, lá trás fizeram isso aí. Por que a gente não olha aquilo para ver se tem alguma chance de a gente construir a partir daí?”.

Mesmo que a coisa não funcione, acho que é nossa obrigação moral e profissional, como acadêmicos e militantes, de aproveitar qualquer espaço que se abra para tentar melhorar. Eu tenho horror das pessoas que preferem repetir a denúncia, se manter em uma posição imaculada, do que tentar negociar e se engajar. É provável que você não vá conseguir tudo que queria, mas talvez possa ter um impacto na vida das pessoas. Acho que a gente tem que ocupar esses espaços sempre que possível, e foi o que a gente tentou fazer. Agora será preciso esperar outros momentos e outros espaços. Mas para mim não há missão mais nobre para um cientista social do que tentar aproveitar esses espaços para tentar melhorar a vida das pessoas.

Notas

  • 1
    O Iser é uma organização da sociedade civil com larga tradição de estudos e ações no campo dos direitos humanos. Para saber mais, ver (on-line): https://www.iser.org.br/sobre/
  • 2
    Luiz Eduardo Soares, João Trajano e Jaqueline Muniz são cientistas sociais que desenvolvem pesquisas na área da segurança pública há muitas décadas. Os dois últimos foram alunos e orientandos do primeiro no doutorado.
  • 3
    Na década de 1990, durante o governo de Marcelo Alencar, policiais militares fluminenses recebiam gratificações financeiras com base no número de civis mortos em operações policiais. A política ficou conhecida como “premiação faroeste”.
  • 4
    José Gregori é um jurista brasileiro que foi secretário Nacional de Direitos Humanos e ministro da Justiça ao longo dos dois governos de Fernando Henrique Cardoso (1994-2002).
  • 5
    Em janeiro de 2019, nos primeiros dias do seu governo, Wilson Witzel modificou por decreto a composição do Conselho de Segurança Pública do Rio de Janeiro.
  • 6
    Em agosto de 2019, após seis jovens serem mortos em ações da polícia no Rio de Janeiro no período de cinco dias, o então governador disse a jornalistas que “os cadáveres desses jovens estão no colo dos direitos humanos”, porque à época os defensores de direitos humanos criticavam as falas do governador sobre “abater” criminosos que portassem fuzis (BOECKEL, 16/08/2019BOECKEL, Cristina. “‘Os cadáveres desses jovens estão no colo dos direitos humanos’, afirma Witzel: Governador voltou a defender o abate de quem porta fuzil ao inaugurar Nova Iguaçu Presente. ‘Não vamos ceder um milímetro’, emendou”. Portal G1, Rio de Janeiro, 16 ago. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/08/16/os-cadaveres-desses-jovens-estao-no-colo-dos-direitos-humanos-afirma-witzel.ghtml
    https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/n...
    ).
  • 7
    Cano faz referência aqui ao livro de memórias de Soares (2000)SOARES, Luiz Eduardo. Meu casaco de general: 500 dias no front da segurança pública do Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000., em que ele narra sua experiência no governo de Anthony Garotinho.
  • 8
    ONG formada por defensores de direitos humanos que atua principalmente no âmbito do Sistema Interamericano de Direitos Humanos (SIDH). Para saber mais, ver (on-line): https://cejil.org/pt-br/quem-somos/
  • 9
    O Estado brasileiro foi sentenciado, em fevereiro de 2017, na Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH), pela violação do direito à justa investigação no chamado Caso Favela Nova Brasília, quando duas incursões policiais nessa favela, em 1994 e 1995, resultaram na morte de 26 homens e em atos de violência sexual contra três mulheres. A sentença é um marco institucional na área, pois elenca diversas diretrizes para o aprimoramento do controle externo da atividade policial e do sistema de justiça no Brasil.
  • 10
    ONG internacional que desenvolve pesquisas e intervenções políticos no campo dos direitos humanos. Para saber mais, ver (on-line): https://www.hrw.org/pt
  • 11
    Extinta em 2018, a ETA era uma organização armada que lutava pela separação e independência da região conhecida como País Basco da Espanha e da França.
  • 12
    Oficial da polícia militar, o coronel Cerqueira foi comandante-geral da instituição nos governos de Leonel Brizola no Rio de Janeiro, entre 1983 e 1987 e 1991 e 1995. Foi assassinado em 1999 e a motivação do crime nunca foi esclarecida.
  • 13
    Em 2014, o evento de lançamento do livro de Cano e colaboradores sobre a política de pacificação de favelas no Rio de Janeiro, Os donos do morro (Cano et al., 2012CANO, Ignacio; DUARTE, Thais (2012) No Sapatinho. A evolução das milícias no Rio de Janeiro [2008-2011] Rio de Janeiro: Fundação Heinrich Böll, 2012.), foi interrompido por organizações de esquerda, boa parte delas formada por estudantes universitários, segundo os quais a obra consentiria com “violência de Estado contra as favelas e periferias”.
  • 14
    A intervenção federal na segurança pública do Rio de Janeiro foi decretada em 2018 pelo então presidente da República Michel Temer. Para saber mais, ver decreto no 9288/2018 (BRASIL, 2018BRASIL. Decreto no 9.288, de 16 de fevereiro de 2018: Decreta intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro com o objetivo de pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública. Brasília, DF: Presidência da República, 2018.).

Referências

  • BOECKEL, Cristina. “‘Os cadáveres desses jovens estão no colo dos direitos humanos’, afirma Witzel: Governador voltou a defender o abate de quem porta fuzil ao inaugurar Nova Iguaçu Presente. ‘Não vamos ceder um milímetro’, emendou”. Portal G1, Rio de Janeiro, 16 ago. 2019. Disponível em: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/08/16/os-cadaveres-desses-jovens-estao-no-colo-dos-direitos-humanos-afirma-witzel.ghtml
    » https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/08/16/os-cadaveres-desses-jovens-estao-no-colo-dos-direitos-humanos-afirma-witzel.ghtml
  • BRASIL. Decreto no 9.288, de 16 de fevereiro de 2018: Decreta intervenção federal no Estado do Rio de Janeiro com o objetivo de pôr termo ao grave comprometimento da ordem pública. Brasília, DF: Presidência da República, 2018.
  • CANO, Ignacio. Letalidade da ação policial no Rio de Janeiro Rio de Janeiro: Iser, 1997.
  • CANO, Ignacio; BORGES, Doriam; RIBEIRO, Eduardo (orgs). Os donos do morro: Uma avaliação exploratória do impacto das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) no Rio de Janeiro. São Paulo; Rio de Janeiro: FBSP; LAV/Uerj, 2012.
  • CANO, Ignacio; DUARTE, Thais (2012) No Sapatinho. A evolução das milícias no Rio de Janeiro [2008-2011] Rio de Janeiro: Fundação Heinrich Böll, 2012.
  • COELHO, Terine Husek. Medindo força: Vitimização policial no Rio de Janeiro. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) - Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2015.
  • SOARES, Luiz Eduardo. Meu casaco de general: 500 dias no front da segurança pública do Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    20 Set 2021
  • Aceito
    08 Nov 2021
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