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Frame, Política Pública e Transversalidade de Gênero: uma Análise da Política de Cuidado Infantil Brasileira durante o Giro à Esquerda (2003-2016)

Resumo

O Brasil foi um dos países que integrou o giro à esquerda latino-americano, conjuntura na qual políticas sociais tornaram-se centrais. Durante os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Vana Rousseff (2003-2016), ambos do Partido dos Trabalhadores (PT), foram criadas condições institucionais para a transversalidade de gênero em políticas públicas, o que incluiu a problemática da divisão sexual do trabalho. Mas isso significou uma substantiva reorientação da política de cuidado infantil por perspectivas de igualdade de gênero? Este artigo reflete sobre reorientação da política de cuidado infantil por perspectivas de igualdade de gênero neste contexto, ancorando-se no conceito de transversalidade de gênero, compreendido como um processo de incorporação de perspectivas feministas no frame de políticas públicas, para a (re)definição do problema público e do curso da ação estatal. Para tanto, realizamos uma investigação qualitativa da transversalidade de gênero na política de cuidado infantil (creches e licenças), enfocando discursos oficiais, principalmente por meio de análise documental. Evidenciamos a coexistência, no curso da ação estatal, de dois frames: “Direito à educação e ao cuidado infantil” e “Promoção da autonomia econômica das mulheres”. Como o primeiro prevaleceu, concluímos que a transversalidade de gênero na política de cuidado infantil foi marginal durante o período analisado.

gênero; feminismo, política pública; frame; política de cuidado infantil

Abstract

Brazil was one of the countries that integrated Latin America’s left turn, a period in which social policies have become central. During the Labor Party’s Government (Partido dos Trabalhadores) (2013-2016), were developed institutional conditions to mainstream gender in public policies, which embraced the issue of the sexual division of labor. However, did it mean an effective reorientation of the childcare policy towards gender equality perspectives? This article aims to reflect upon this question, drawing on the gender mainstreaming concept. It is understood as a process of incorporation of feminist perspectives into the public policy framing, regarding the (re)definition of both the public problem and the course of state action. To do so, we carried out a qualitative study of gender mainstreaming on childcare policy (daycare centers and leaves), focusing on official discourses, mainly through documentary analysis. Based on the results analyzed, we identified the coexistence of two frames: “education and childcare rights” and “promotion of women's economic autonomy”. Since the first one has prevailed, we conclude that gender mainstreaming was marginal in the childcare policy, during the analyzed period.

Gender; Feminism, Public Policy; Frame; Childcare policy

Introdução

Na virada do século XX para o século XXI, cerca de dois terços da população latino-americana foram governados por coalizões de esquerda (Filgueira & Martínez Franzoni, 2017; Weyland, Madrid, & Hunter, 2010;). Esse fenômeno, que arrefeceu nos últimos anos, emergiu como um contraponto à hegemonia neoliberal que se impusera na região na década de 1990. A despeito das diferenças entre os governos de esquerda em cada país, todos compartilharam a defesa da atuação estatal para efetivação de projetos políticos de redistribuição de renda, ampliação de direitos e justiça social.

A ampliação e a inovação de políticas sociais tornaram-se centrais nesses projetos políticos (Huber & Stephens, 2012), o que não significou, contudo, que a totalidade das questões sociais tenha sido incorporada aos projetos de esquerda e que, quando incorporadas, o resultado tenha sido homogêneo. No que diz respeito às desigualdades de gênero, ainda que o giro à esquerda na América Latina tenha propiciado um ambiente favorável para políticas voltadas ao enfrentamento da problemática, os resultados foram diversos. A priorização da agenda política para a igualdade de gênero não foi um denominador comum desses governos na região (Blofield, Ewig, & Episcopo, 2017). Especificamente em relação às políticas voltadas à autonomia econômica das mulheres e à articulação entre trabalho e responsabilidades familiares, houve variações notáveis entre países, sobretudo em relação à reorganização da provisão do cuidado para o enfrentamento da divisão sexual do trabalho ( Blofield et al., 2017Blofield, Merike, Ewig, Christina, Piscopo, Jennifer M. (2017). The reactive left: gender equality and the Latin American Pink Tide. Social Politics: International Studies in Gender, State & Society , 24 (4), 345-369. doi:10.1093/sp/jxx016
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; Filgueira & Martínez Franzoni, 2017).

O Brasil integrou o giro à esquerda. No país, o Partido dos Trabalhadores (PT) esteve à frente do Governo Federal de 2003 a 20161 1 . Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007; 2007-2011); Dilma Rousseff (2011-2015; 2015-2016). O segundo governo Dilma foi interrompido em 2016, em um evento que parte do país denomina de golpe, parte, de impeachment. . Parte dos movimentos feministas brasileiros participou da coalizão de sujeitos políticos que levou o partido a ser eleito e, inclusive, a trajetória de muitas militantes feministas no país foi marcada, desde a redemocratização, pela “dupla militância”, permitindo que atuassem nos movimentos, mas também nos partidos e sindicatos ( Alvarez et al., 2003Alvarez, Sonia E., Friedman, Elizabeth J., Beckman, Ericka, Blackwell, Maylei, Chinchilla, Norma S., Lebon, Nathalie . . . Tobar, Marcela R. (2003). Encontrando os feminismos latino-americanos e caribenhos. Revista Estudos Feministas , 11 (2), 541-575. doi:10.1590/S0104-026X2003000200013
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; Silva, 2016Silva, Carmen S. M. (2016). Feminismo popular e luta antissistêmicas . Recife, PE: SOS Corpo. ; Souza-Lobo, 1991Souza-Lobo, Elizabeth. (1991). A classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência . 2 ed. São Paulo, SP: Fundação Perseu Abramo. ). Durante os governos petistas, foram instituídas políticas para as mulheres, com a criação da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), no âmbito da Presidência da República, com estatuto de ministério ( Bandeira, 2005Bandeira, Lourdes M. (2005). Fortalecimento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres: avançar na transversalidade da perspectiva de Gênero nas Políticas Públicas . Brasília, DF: Cepal; SPM. ). Coube à SPM a coordenação de ações governamentais voltadas para as mulheres, a exemplo das previstas nas três edições do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres (PNPM), nas quais a transversalidade de gênero foi afirmada como estratégia de gestão ( Brasil, 2006Brasil. (2006). Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres . Brasília, DF: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. , 2008aBrasil. (2008a). Lei n. 11.770, de 09 de setembro de 2008 . Brasília, DF: Diário Oficial da União. , 2013aBrasil. (2013a). Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres 2013-2015 . Brasília, DF: Secretaria de Políticas para as Mulheres. ). O PNPM foi elaborado tomando como base as diretrizes emanadas nas Conferências Nacionais de Políticas para as Mulheres (CNPM) que, em uma única edição, chegava a envolver cerca de 200 mil mulheres no processo, desde as etapas locais até a nacional (Brasil, 2008b).

A construção da divisão sexual do trabalho como um problema público que demanda a corresponsabilização estatal por meio de políticas públicas fez parte dessa trajetória histórica de luta dos movimentos feministas e de mulheres no país ( Silva, 2016Silva, Carmen S. M. (2016). Feminismo popular e luta antissistêmicas . Recife, PE: SOS Corpo. ; Souza-Lobo, 1991Souza-Lobo, Elizabeth. (1991). A classe operária tem dois sexos: trabalho, dominação e resistência . 2 ed. São Paulo, SP: Fundação Perseu Abramo. ). Ademais, medidas como creches e licenças foram reivindicadas pelos movimentos durante as CNPM e foram incorporadas como ações dos PNPM visando à promoção da autonomia econômica das mulheres e da igualdade no mundo do trabalho. Entretanto, como a política de cuidado infantil não era de responsabilidade direta da SPM, ela deveria, de forma transversal, ser reorientada por perspectivas de igualdade de gênero, o que era expressamente previsto nos PNPM. Mas, afinal, isso ocorreu?

Neste artigo, refletimos sobre essa pergunta, analisando a transversalidade de gênero na política de cuidado infantil (creches e licenças) no Brasil, durante os governos petistas, considerando as disputas e as resistências à incorporação de perspectivas de igualdade de gênero a essa política ( Marcondes, 2019Marcondes, Mariana M. (2019). Transversalidade de gênero em políticas de cuidado: uma análise comparada das políticas de cuidado infantil no Brasil, Argentina e Uruguai durante o giro à esquerda (Tese de doutorado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ; Marcondes, Farah & Alves, 2019). Para tanto, mobilizamos elementos de umas das vertentes interpretativa da análise de políticas públicas, que é a de frame analysis ( Braun, 2015Braun, Kathrin. (2015). Between representation and narration: analyzing policy frames. In F. Fischer, D. Torgerson, A. Durnová, & M. Orsini (Eds.), Handbook of Critical Policy Studies (pp. 441-461). Cheltenham: Edward Elgar Publishing. doi:10.4337/9781783472352.00033
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; Fischer, 2003Fischer, Frank. (2003). Reframing Public Policy . Oxford: Oxford University Press. ; Rein & Schön, 1993), articulados ao conceito de transversalidade de gênero ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Papa, 2012Papa, Fernanda C. (2012). Transversalidade e políticas públicas para mulheres no Brasil: percursos de uma pré-política (Dissertação de mestrado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ; Verloo & Lombardo, 2007). Partindo desta articulação teórica, analisamos os discursos oficiais da política (re)instituída, depreendidos, principalmente, de documentos, complementados por entrevistas.

Com base nos dados analisados, argumentamos que, durante os governos petistas, houve avanços nas condições institucionais para estruturar um processo da transversalidade de gênero com a criação da SPM, a edição do PNPM e a realização das CNPM. A política de cuidado infantil foi abrangida por esse processo, o que a colocou em uma disputa entre dois frames : “Direito à educação e ao cuidado infantil” e “Promoção da autonomia econômica das mulheres”. Em torno de cada um deles, diferentes sujeitos e pontos de vista se aglutinaram. Ambos os frames foram assumidos pelo discurso governamental oficial, mas prevaleceu o “Direito à educação e ao cuidado infantil”, o que tornou a transversalidade de gênero na política de cuidado infantil marginal ( Shaw, 2002Shaw, Jo. (2002). The European Union and gender mainstreaming: constitutionally embedded or comprehensively marginalised? Feminist Legal Studies , 10 , 213-226. doi:10.1023/A:1021271711517
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). Nossa análise mostra que a estruturação do frame que prevaleceu apresentou traços patriarcais, tanto por estarem incrustados na ação estatal quanto por serem compartilhados por atores que o mobilizaram. Esse resultado reflete as estruturas de poder e de dominação que caracterizam as relações de gênero, interseccionadas com outras relações produtoras de desigualdades. Além disso, as defensoras do frame “Promoção da autonomia econômica das mulheres” não lograram construir uma narrativa abrangente que respondesse, em sua totalidade, à relação de gênero ou à relação de cuidado, limitando-se à “questão das mulheres”. Isso também contribuiu para sua marginalidade.

Este artigo está organizado em cinco partes, incluindo a introdução. Na segunda delas, delineamos o referencial teórico, em seguida, detalhamos o percurso metodológico. A quarta seção é dedicada aos resultados e, por fim, nas considerações finais, apresentamos uma síntese e apontamos algumas limitações e possíveis contribuições deste trabalho.

Transversalidade de gênero na política de cuidado

Frame de política pública e transversalidade de gênero

O reconhecimento de que ideias e argumentos são centrais nos estudos de política pública é uma tendência desde a década de 1990 ( Farah, 2018Farah, Marta F. S. (2018). Abordagens teóricas no campo de política pública no Brasil e no exterior: do fato à complexidade. Revista do Serviço Público , 69 , 53-84. doi:10.21874/rsp.v69i0.3583
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; Faria, 2003Faria, Carlos Aurélio P. (2003). Ideias, conhecimento e políticas públicas: um inventário sucinto das principais vertentes analíticas recentes. Revista brasileira de Ciências Sociais , 18 (51), 21-30. doi:10.1590/S0102-69092003000100004
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; Muller, 2000Muller, Pierre. (2000). L’analyse cognitive des politiques publiques: vers une sociologie politique de l’action publique. Revue Française de Science Politique , 50 (2), 189-208. ). Uma das abordagens sobre o tema é a da virada argumentativa, que se propõe a incorporar aos estudos desse campo as contribuições da virada linguística da filosofia ocidental ( Fischer & Forester, 1993Fischer, Frank, Forester, John. (Eds.). (1993). The argumentative turn in policy analysis and planning . Durham: Duke University Press. ), abrangendo uma multiplicidade de enfoques teóricos e metodológicos, dos quais um é a policy frame analysis .

A análise de frames surgiu com os estudos microssociológicos de Goffman (1974)Goffman, Erving. (1974). Frame analysis: an essay on the organization of experience . Cambridge: Harvard University Press. , que enfatizavam o frame como uma forma de representação de identidades. Em anos posteriores, os estudos de movimentos sociais passaram a usá-la para compreender a agência de movimentos sociais enquanto capacidade de “enquadrar” problemas e soluções por meio de estratégias que mobilizam crenças e valores ( Alves, 2014Alves, Mário A. (2014). Social accountability as an innovative frame in civic action: the case of Rede Nossa São Paulo. Voluntas: International Journal of Voluntary and Nonprofit Organizations , 25 (3), 818-838. doi:10.1007/s11266-013-9365-6
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; Rosa & Mendonça, 2011Rosa, Alexandre R., Mendonça, Patrícia. (2011). Movimentos sociais e análise organizacional: explorando possibilidades a partir da teoria de frames e a de oportunidades políticas. Organizações & Sociedade , 18 (59), 643-660. doi:10.1590/S1984-92302011000400005
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; Snow & Benford, 1988Snow, David A., Benford, Robert D. (1988) Ideology, Frame Resonance and Participant Mobilization. In B. Klandermans, H. Kriesi, & S. Tarrow (Orgs.), From structure to action: comparing social movement across cultures (pp. 197-218). London: JAI Press. ; Snow, Rochford Jr., Worden, & Benford, 1986). Estudiosos do discurso político, como Van Dijk (1985), trabalharam a análise de frames em um nível cognitivo mais profundo, sobre o qual a capacidade de intervenção individual é muito pequena. É na fronteira entre capacidade de agência plena ou limitada que os estudos de política pública incorporaram a análise de frames ( Braun, 2015Braun, Kathrin. (2015). Between representation and narration: analyzing policy frames. In F. Fischer, D. Torgerson, A. Durnová, & M. Orsini (Eds.), Handbook of Critical Policy Studies (pp. 441-461). Cheltenham: Edward Elgar Publishing. doi:10.4337/9781783472352.00033
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; Fischer, 2003Fischer, Frank. (2003). Reframing Public Policy . Oxford: Oxford University Press. ; Rein & Schön, 1993).

Nos estudos de política pública, a análise de frames foi empregada para dar visibilidade a valores, expectativas e crenças que conformam políticas públicas, congregando distintas abordagens, como observa Braun (2015)Braun, Kathrin. (2015). Between representation and narration: analyzing policy frames. In F. Fischer, D. Torgerson, A. Durnová, & M. Orsini (Eds.), Handbook of Critical Policy Studies (pp. 441-461). Cheltenham: Edward Elgar Publishing. doi:10.4337/9781783472352.00033
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. Entre elas, há aquela que empregamos neste estudo, que, em conexão com uma postura interseccional de gênero, valoriza a relação entre frames, ideologias e discursos, conferindo centralidade às relações de poder, exclusão social e dominação em sua análise.

Nesses termos, por frames entendemos narrativas estruturadas acerca de problemas públicos e do curso da ação estatal, que se ancoram em padrões de significação ideológicos e que fundamentam interações contextuais entre sujeitos em uma dinâmica de disputas e alianças sobre esses significados, podendo contribuir para estabelecer e legitimar relações de poder e de dominação, mas também para contestá-las e transformá-las . Essas narrativas estruturadas, produzidas e mobilizadas pelos sujeitos abrangem tanto a construção social do problema público ( diagnóstico ), quanto propostas sobre qual deveria ser a ação estatal para responder a ele ( prognóstico ) ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Rosa & Mendonça, 2011Rosa, Alexandre R., Mendonça, Patrícia. (2011). Movimentos sociais e análise organizacional: explorando possibilidades a partir da teoria de frames e a de oportunidades políticas. Organizações & Sociedade , 18 (59), 643-660. doi:10.1590/S1984-92302011000400005
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; Snow et al., 1986Snow, David A., Rochford Jr., Burke, Worden, Steven K., & Benford, Robert D. (1986). Frame alignment processes, micromobilization and movement participation. American Sociological Review , 51 (4), 464-481. doi:10.2307/2095581
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; Snow & Benford, 1988Snow, David A., Benford, Robert D. (1988) Ideology, Frame Resonance and Participant Mobilization. In B. Klandermans, H. Kriesi, & S. Tarrow (Orgs.), From structure to action: comparing social movement across cultures (pp. 197-218). London: JAI Press. ; Verloo & Lombardo, 2007).

A definição de frames que adotamos confere centralidade às relações de poder e de dominação, construindo pontes entre estudos feministas e de política pública. Essas pontes vêm sendo explorados por pesquisadoras feministas, a exemplo de seu emprego para a análise da transversalidade de gênero ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Lombardo & Meier, 2008; Verloo & Lombardo, 2007). A transversalidade de gênero ( gender mainstreaming ) tornou-se uma estratégia para implantação de políticas de igualdade de gênero bastante difundida desde a IV Conferência Mundial de Mulheres, realizada em Pequim, em 1995 ( Bandeira, 2005Bandeira, Lourdes M. (2005). Fortalecimento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres: avançar na transversalidade da perspectiva de Gênero nas Políticas Públicas . Brasília, DF: Cepal; SPM. ; Papa, 2012Papa, Fernanda C. (2012). Transversalidade e políticas públicas para mulheres no Brasil: percursos de uma pré-política (Dissertação de mestrado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ; Walby, 2005)Walby, Silvia. (2005). Gender mainstreaming: productive tensions in theory and practice. Social Politics , 12 (3), 321-343. doi 10.1093/sp/jxi018
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. Por meio de sua incorporação ao curso da ação estatal, tem-se como objetivo produzir políticas que sejam comprometidas com a igualdade de gênero, além de reorientar as políticas existentes pelo mesmo compromisso.

A transversalidade de gênero inclui um processo de disputa ideológica acerca da narrativa que estrutura a definição de problemas públicos e do curso da ação estatal, em uma perspectiva feminista ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Lombardo & Meier, 2008). Nesse sentido, e partindo da literatura mencionada, nós a definimos como um processo de estruturação de políticas de igualdade de gênero, no qual perspectivas feministas (ou de igualdade de gênero) são incorporadas aos frames de políticas públicas, tanto na construção do problema público quanto na definição do curso da ação estatal .

Para que o processo de transversalidade de gênero se materialize, é necessário que sejam constituídas condições institucionais no Estado, para que haja aderência de políticas públicas às agendas políticas feministas, tendo em vista as demandas e as propostas forjadas pelas atrizes feministas ( Farah, 2004Farah, Marta F. S. (2004). Gênero e políticas públicas. Revista Estudos Feministas , 12 (1), 47-71. doi:10.1590/S0104-026X2004000100004
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; Fujiwara, 2002Fujiwara, Luís M. (2002). Governo: substantivo feminino? Gênero e políticas públicas em governos subnacionais (Dissertação de mestrado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ). Essas condições institucionais podem combinar um conjunto de instâncias e mecanismos de gestão e de participação social, a exemplo de organismos de políticas para as mulheres, planos de políticas públicas, conselhos, conferências e audiência públicas.

Ainda que haja compromisso governamental com a igualdade de gênero, expresso por meio do desenvolvimento de condições institucionais para que a transversalidade de gênero ocorra, há limites estruturais para que esse compromisso se materialize. Isso porque a transversalidade de gênero incide sobre as raízes das relações de poder e de dominação que constituem a realidade social, e, por conseguinte, sua efetivação tende a ser não linear e marcada por contradições e nuances ( Walby, 2005Walby, Silvia. (2005). Gender mainstreaming: productive tensions in theory and practice. Social Politics , 12 (3), 321-343. doi 10.1093/sp/jxi018
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). Com efeito, ela pode variar entre, de um lado, uma incorporação mais central e transformadora e, de outro, um resultado mais marginal, como observa Shaw (2002)Shaw, Jo. (2002). The European Union and gender mainstreaming: constitutionally embedded or comprehensively marginalised? Feminist Legal Studies , 10 , 213-226. doi:10.1023/A:1021271711517
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. Essa gradação reflete o alto grau de conflito envolvido na transversalidade à medida que esse processo se contrapõe a concepções patriarcais cristalizadas no curso da ação estatal e àquelas mobilizadas pelos sujeitos no cotidiano das políticas públicas.

Compreender a transversalidade de gênero como um processo marcado por contradições e nuances é reconhecer a complexidade e a multiplicidade de instituições, atores e atrizes envolvidos no curso da ação estatal, como observam Morgan e Orloff (2014). Para os autores, uma boa metáfora para simbolizar o Estado é a de Kali, a deusa hindu de múltiplos braços, a transversalidade implica uma disputa em torno de cada um deles, mas que não necessariamente consegue reorientar todos.

Transversalidade de gênero na política de cuidado

Ainda que o conceito de transversalidade de gênero possa ser utilizado para discutir o conjunto das políticas públicas ( Bandeira, 2005Bandeira, Lourdes M. (2005). Fortalecimento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres: avançar na transversalidade da perspectiva de Gênero nas Políticas Públicas . Brasília, DF: Cepal; SPM. ; Farah, 2004Farah, Marta F. S. (2004). Gênero e políticas públicas. Revista Estudos Feministas , 12 (1), 47-71. doi:10.1590/S0104-026X2004000100004
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), é também possível empregá-lo para investigar políticas específicas ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Verloo & Lombardo, 2007). Uma dessas modalidades de políticas é a de cuidado, que entendemos como um tipo de política social cuja finalidade é garantir condições para prover necessidades sociais por meio de interações face a face entre quem cuida e quem é cuidado, articulando trabalho, emoções e padrões éticos de conduta ( Aguirre, 2009Aguirre, Rosario. (2009). Uso del tiempo y desigualdades de género en el trabajo no remunerado. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 23-46). Montevideo: Unifem. ; Guimarães, Hirata, & Sugita, 2011).

Em um primeiro olhar, política de cuidado beneficia quem precisa ter suas necessidades atendidas, a exemplo das crianças, pessoas idosas e deficientes. Entretanto, quando consideramos que, historicamente, as mulheres foram construídas socialmente como responsáveis por essa provisão em decorrência da divisão sexual do trabalho, essas políticas também podem ter efeitos sobre as relações de gênero. Assim, a despeito de se tratar de uma política cuja relação com o feminismo não é evidente, a exemplo de políticas como as de enfrentamento à violência ou de garantia de direitos sexuais e reprodutivos, ao aportarmos uma perspectiva de igualdade de gênero, essas interconexões evidenciam-se. Trata-se, portanto, de uma modalidade de política social que pode corresponsabilizar o Estado pela reprodução social da vida humana e, ainda, pelo enfrentamento do problema da divisão sexual do trabalho.

O interesse dos estudos de gênero pela política de cuidado justifica-se pelo fato de serem majoritariamente as mulheres que cuidam, de forma remunerada (cuidado profissional) e não remunerada (cuidado familiar), sendo esse um efeito da divisão sexual do trabalho ( Batthyány, 2009Batthyány, Karina. (2009). Cuidado de personas dependientes y género. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 87-123). Montevideo: Unifem Uruguay. ; Martínez Franzoni, 2005; Guimarães et al., 2011Guimarães, Nadya A., Hirata, Helena S., Sugita, Kurumi. (2011). Cuidado e cuidadoras: o trabalho de care no Brasil, França e Japão. Sociologia & Antropologia , 1 (1), 151-179. doi:10.1590/2238-38752011v117
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; Tronto, 2009Tronto, Joan C. (2009). Moral boundaries: a political argument for an ethic of care . New York: Routledge. ). Por conseguinte, a democratização das relações de cuidado e a corresponsabilização do Estado é um desafio fundamental para a igualdade de gênero no mundo do trabalho.

Esse cenário ganhou novos contornos com o recrudescimento daquilo que algumas teóricas feministas denominaram de “déficit de cuidado” ( Aguirre, 2009Aguirre, Rosario. (2009). Uso del tiempo y desigualdades de género en el trabajo no remunerado. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 23-46). Montevideo: Unifem. ; Batthyány, 2009Batthyány, Karina. (2009). Cuidado de personas dependientes y género. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 87-123). Montevideo: Unifem Uruguay. ), que é resultante do aumento da demanda por cuidados (a exemplo da problemática do envelhecimento populacional), aliado à diminuição da disponibilidade de quem cuida (mulheres, expressivamente inseridas no mercado de trabalho). Em resposta, a adoção de política de cuidado pode propiciar melhorias das condições de vida para quem é cuidado, mas também para quem tradicionalmente cuida ( Pautassi, 2007Pautassi, Laura. (2007). El cuidado como cuestión social desde un enfoque de derechos . Santiago: CEPAL. ; Tronto, 2009Tronto, Joan C. (2009). Moral boundaries: a political argument for an ethic of care . New York: Routledge. ). Ainda segundo Aguirre (2009)Aguirre, Rosario. (2009). Uso del tiempo y desigualdades de género en el trabajo no remunerado. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 23-46). Montevideo: Unifem. e Batthyány (2009)Batthyány, Karina. (2009). Cuidado de personas dependientes y género. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 87-123). Montevideo: Unifem Uruguay. , em relação às crianças, essa reorganização das responsabilidades sociais pode contribuir para reverter a tendência de queda da taxa de fecundidade, que também compõe o déficit de cuidado. Um dos efeitos desejados da adoção dessas políticas é a diminuição da sobrecarga do exercício da maternidade sobre as mulheres.

Uma estratégia de transversalidade de gênero na política de cuidado, em um primeiro movimento, aponta que a provisão de serviços para atendimento de necessidades sociais fundamenta-se em uma ideologia patriarcal hegemônica, ancorada no familismo e no maternalismo ( Aguirre, 2009Aguirre, Rosario. (2009). Uso del tiempo y desigualdades de género en el trabajo no remunerado. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 23-46). Montevideo: Unifem. ; Martínez Franzoni, 2005). Nesses termos críticos, compreende-se a construção social da ideia de “cuidado” como uma responsabilidade principal das famílias, sendo a ação estatal subsidiária, o que o projeta como uma questão privada, não como um problema público. Como resultado, as mulheres são desproporcionalmente responsabilizadas por sua provisão dentro das famílias, o que decorre da sua associação com a maternidade.

Para além da denúncia da existência de elementos patriarcais em políticas públicas, a transversalidade de gênero busca, em um segundo movimento, propositivo e transformativo, ressignificar o cuidado como um problema público, atribuindo ao Estado e aos homens a corresponsabilidade por ele, tanto para atender às necessidades de quem é cuidado quanto para fomentar a igualdade em relação a quem cuida ( Aguirre, 2009Aguirre, Rosario. (2009). Uso del tiempo y desigualdades de género en el trabajo no remunerado. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 23-46). Montevideo: Unifem. ; Pautassi, 2007Pautassi, Laura. (2007). El cuidado como cuestión social desde un enfoque de derechos . Santiago: CEPAL. ; Tronto, 2009Tronto, Joan C. (2009). Moral boundaries: a political argument for an ethic of care . New York: Routledge. ). Entretanto, como vimos anteriormente, o processo de transversalidade é marcado por contradições e nuances, o que significa que “os braços de Kali” (Morgan & Orloff, 2014) sobre o cuidado podem mover-se em sentidos diversos (e até mesmo conflitivos).

Por fim, a transversalidade de gênero, por seu caráter processual, comporta não apenas nuances, mas também possibilidades para múltiplas perspectivas feministas ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Verloo & Lombardo, 2007). Dessa forma, a transversalidade na política de cuidado pode enfocar: mulheres e/ou a relação de gênero; quem cuida, quem é cuidado e/ou a relação de cuidado (considerando todos os sujeitos dessa relação); a relação de gênero e/ou a intersecção dela com outras formas de desigualdades (como de classe, racial ou geracional); a autonomia econômica das mulheres, a proteção à maternidade e/ou a corresponsabilização masculina ( Aguirre, 2009Aguirre, Rosario. (2009). Uso del tiempo y desigualdades de género en el trabajo no remunerado. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 23-46). Montevideo: Unifem. ; Batthyány, 2009Batthyány, Karina. (2009). Cuidado de personas dependientes y género. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 87-123). Montevideo: Unifem Uruguay. ; Martínez Franzoni, 2005; Guimarães et al., 2011Guimarães, Nadya A., Hirata, Helena S., Sugita, Kurumi. (2011). Cuidado e cuidadoras: o trabalho de care no Brasil, França e Japão. Sociologia & Antropologia , 1 (1), 151-179. doi:10.1590/2238-38752011v117
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; Pautassi, 2007)Pautassi, Laura. (2007). El cuidado como cuestión social desde un enfoque de derechos . Santiago: CEPAL. .

É a partir desse arcabouço teórico que construímos nosso percurso metodológico.

Percurso metodológico

Este artigo apresenta parte dos resultados de uma pesquisa sobre a transversalidade de gênero na política de cuidado infantil no Brasil, na Argentina e no Uruguai durante o giro à esquerda, ocorrido no início do século XXI ( Marcondes, 2019Marcondes, Mariana M. (2019). Transversalidade de gênero em políticas de cuidado: uma análise comparada das políticas de cuidado infantil no Brasil, Argentina e Uruguai durante o giro à esquerda (Tese de doutorado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ). Para a realização da pesquisa, lançamos mão da estratégia de estudo de casos qualitativo ( Gerring, 2010Gerring, John (2010). Case selection for case-study analysis: qualitative and quantitative techniques. In J. M. Box-Steffensmeier, H. Brady, D. Collier. The Oxford handbook of political methodology (pp. 645-684). Oxford: Oxford University Press. doi:10.1093/oxfordhb/9780199286546.003.0028
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; Stake, 1998Stake, Robert. (1998). Case Studies. In N. K. Denzin, Y. S. Lincoln (Coords.). Strategies of qualitative inquiry (pp. 445-454). California: Sage Publications. ), o que permitiu a realização de uma pluralidade de observações em profundidade, de forma contextual e complexa, propiciando o refinamento do arcabouço teórico que desenvolvemos na integração entre estudos de gênero e de política pública.

Neste trabalho, enfocamos a parte dos resultados da pesquisa referente ao caso brasileiro e às gestões petistas no governo federal (2003-2016). Nesse período, não apenas expandiu-se, mas transformou-se a política de cuidado infantil. Com efeito, regras do regime de licença maternidade e paternidade foram modificadas (Brasil, 2008a, 2016a) e a política de creches foi integralmente reorganizada na esteira da transição de seu financiamento da assistência social para a educação ( Cruz, 2017Cruz, Maria do Carmo M. T. (2017). A implementação da política de creches nos municípios brasileiros após 1988: avanços e desafios nas relações intergovernamentais e intersetoriais (Tese de doutorado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ; Marcondes, 2013Marcondes, Mariana M. (2013). A corresponsabilização do Estado pelo cuidado: uma análise sobre a política de creches do PAC-2 na perspectiva da divisão sexual do trabalho (Dissertação de mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, DF. ).

Por outro lado, a partir de 2003, políticas para as mulheres foram instituídas no governo federal com a criação da SPM, que se encarregou da coordenação da instituição dessas políticas ( Bandeira, 2005Bandeira, Lourdes M. (2005). Fortalecimento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres: avançar na transversalidade da perspectiva de Gênero nas Políticas Públicas . Brasília, DF: Cepal; SPM. ). Para isso, a SPM assumiu, como estratégia, a transversalidade de gênero com participação social. Isso se materializou por meio de iniciativas como a elaboração de três edições do PNPM que, por sua vez, parte de diretrizes pactuadas com os movimentos feministas, por meio das CNPM. O PNPM reunia ações que responsabilizavam os órgãos governamentais pelas políticas para as mulheres e sua gestão era realizada pelo Comitê de Articulação e Monitoramento do PNPM ( Brasil, 2006Brasil. (2006). Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres . Brasília, DF: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. , 2008aBrasil. (2008a). Lei n. 11.770, de 09 de setembro de 2008 . Brasília, DF: Diário Oficial da União. , 2013aBrasil. (2013a). Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres 2013-2015 . Brasília, DF: Secretaria de Políticas para as Mulheres. ). Nesses planos, creches e licenças foram assumidas como ações para a promoção da autonomia econômica das mulheres e igualdade no mundo do trabalho.

Em relação à política analisada, escolhemos iniciativas voltadas ao cuidado de crianças de zero a três anos. No Brasil, desde o processo de redemocratização, a reivindicação por essas políticas integrou as agendas tanto dos movimentos feministas e de mulheres, quanto de defesa de direitos das crianças, o que contribuiu decisivamente para que creches e licenças fossem previstas como direitos na Constituição Federal (Brasil, 1988) ( Marcondes, 2013Marcondes, Mariana M. (2013). A corresponsabilização do Estado pelo cuidado: uma análise sobre a política de creches do PAC-2 na perspectiva da divisão sexual do trabalho (Dissertação de mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, DF. ; Rosemberg, 1984Rosemberg, Fúlvia. (1984). O movimento de mulheres e a abertura política no Brasil: o caso da creche. Cadernos de Pesquisa , (51), 73-79. ). Além disso, essa faixa etária envolve alto grau de demanda por cuidado, considerando o nível de dependência das crianças dessa idade em relação a quem cuida delas. É, ainda, essa etapa a que conta com menor aceitação social para que sua provisão seja efetuada fora das famílias e por pessoas que não a mãe ( Batthyány, 2009Batthyány, Karina. (2009). Cuidado de personas dependientes y género. In R. Aguirre (Ed.), Las bases invisibles del bienestar social: el trabajo no remunerado en el Uruguay (pp. 87-123). Montevideo: Unifem Uruguay. ). A forte carga de gênero na construção das visões e pontos de vista sobre cuidado de crianças pequenas enriquece a discussão acerca da transversalidade na política de cuidado.

Desta investigação, focalizamos duas iniciativas: política de creches (serviços de educação e cuidado de crianças de zero a três anos) e licenças remuneradas por nascimento (maternidade, paternidade e parental). As creches permitem refletir sobre a (des)familização por meio da corresponsabilização estatal (Martínez Franzoni, 2005; Pautassi, 2007Pautassi, Laura. (2007). El cuidado como cuestión social desde un enfoque de derechos . Santiago: CEPAL. ), enquanto as licenças estimulam proteção ao cuidado exercido pelas famílias ( Pautassi, 2007Pautassi, Laura. (2007). El cuidado como cuestión social desde un enfoque de derechos . Santiago: CEPAL. ). É também válido destacar que as licenças podem significar garantia de direitos e proteção à maternidade, mas também reproduzir a lógica maternalista do cuidar, em se tratando da licença maternidade. Já as licenças paternidade e parental podem contribuir para a maior corresponsabilização masculina2 2 . Licença parental é uma modalidade que pode ser usufruída por qualquer uma das pessoas responsáveis pela criança (mães ou pais, o que inclui famílias LGBTQ+). Ela pode ser exercida em regime de revezamento (parte do período usufruída por um dos membros do casal, parte pelo outro), e, ainda, pode ser de tempo integral (um período integralmente afastado do posto de trabalho) ou de tempo parcial (meia jornada de trabalho e meia de cuidado familiar) ( Pautassi, 2007 ). . A escolha dessas duas iniciativas permitiu, ainda, discutir tanto a provisão (direta ou indireta) quanto a regulação e a transferência de recursos públicos.

A construção do corpus analisado enfocou o discurso oficial em relação à política (re)instituída, baseando-se na análise documental de: atos normativos vinculativos (leis e decretos) e não vinculativos (pareceres); propostas de atos normativos (projeto de lei); e registros oficiais (notas taquigráficas). Essa análise foi complementada por duas entrevistas com representantes governamentais.

Para a análise dos dados, adaptamos a metodologia desenvolvida pelo projeto de pesquisa Mainstreaming Gender Equality in Europe (MAGEEQ), que investigou a transversalidade de gênero no frame de políticas públicas no âmbito da União Europeia ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ; Verloo & Lombardo, 2007)3 3 . O projeto, desenvolvido por investigadoras feministas de distintos países europeus, analisou a transversalidade de gênero no frame de políticas da União Europeia, considerando três temas (violência de gênero, conciliação da vida laboral e familiar e inserção das mulheres na política) ( Bacchi, 2005 ). . Esse referencial teórico-metodológico foi combinado com as contribuições da Análise do Discurso (AD). Por discurso, entendemos as interações contextuais de sujeitos que, por meio da linguagem (falada e escrita), (re)constroem representações de mundo, (re)produzindo efeitos de sentido ( Fairclough, 1989Fairclough, Norman L. (1989). Language and power . New York: Longman. ; Orlandi, 2000)Orlandi, Eni. (2000). Análise do discurso: princípios e procedimentos . Campinas, SP: Pontes. . Essas representações de mundo são permeadas por ideologias que conferem padrões de significação para essas interações, nesse sentido, uma análise de frames é, em grande medida, uma análise de discursos e de ideologias (Van Dijk, 1985).

Com base na adaptação da metodologia do MAGEEQ à nossa pesquisa, reconstruímos as narrativas estruturadas das políticas selecionadas para análise. Para isso, definimos um roteiro de perguntas orientadoras, relativas ao diagnóstico do problema e o prognóstico do curso da ação estatal, considerando as perspectivas de gênero mobilizadas ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ), além de sua interseccionalidade com outras dimensões (re)produtoras de desigualdades, como classe e raça (Collins, 2015). Cada uma das variáveis contida nas perguntas foi transformada em um código. A tabela a seguir identifica cada um dos dez códigos utilizados nessa etapa.

Tabela 1
: Códigos de diagnóstico e prognóstico construídos para análise de frames

Mobilizando esses códigos, analisamos o corpus selecionado por meio do Atlas.ti, software de pesquisa qualitativa. A partir da leitura dos textos na íntegra, foram selecionados fragmentos (“subtextos”) cujos significados de gênero foram explicitados (“supertextos”) pelo uso dos referidos códigos (Verloo & Lombardo, 2007). A associação de blocos de supertextos viabilizou a reconstrução dos frames. Na apresentação dos resultados da análise, reproduzimos alguns desses fragmentos in natura , fazendo jus à tradição da AD.

Em nossa investigação, enfocamos frames que mobilizaram perspectivas de gênero em disputa (patriarcais e feministas). Com isso, restringimo-nos aos elementos que se ancoram nos dados, o que não significa que outros frames não pudessem, no período, estar presentes na realidade brasileira.

Análise

Contextualização

A definição de creches e licenças como direitos tem, na Constituição Federal ( Brasil, 1988Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 . (1988). Brasília, DF. Recuperado de https://bit.ly/2RkGvX6
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), um importante marco, tendo sido um efeito da luta da sociedade civil organizada, a exemplo dos movimentos feministas e de mulheres em defesa das crianças e da educação ( Marcondes, 2013Marcondes, Mariana M. (2013). A corresponsabilização do Estado pelo cuidado: uma análise sobre a política de creches do PAC-2 na perspectiva da divisão sexual do trabalho (Dissertação de mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, DF. ; Rosemberg, 1984Rosemberg, Fúlvia. (1984). O movimento de mulheres e a abertura política no Brasil: o caso da creche. Cadernos de Pesquisa , (51), 73-79. ). As creches foram previstas na Constituição para garantir o direito ao trabalho e à educação infantil, assim como as licenças remuneradas por nascimento, que adquiriram estatuto constitucional, abrangendo os setores público e privado, urbano e rural, totalizando 120 dias para a maternidade e cinco dias para a paternidade.

Apesar de o texto constitucional representar avanços, também teve limites. As licenças são emblemáticas pois possuem alcance restrito, uma vez que abrangem, sobretudo, o setor formal4 4 . A licença paternidade é um direito do trabalhador (público e privado) e, por isso, apenas o setor formal de trabalho é elegível. No caso da licença maternidade, por haver um benefício previdenciário atrelado a ela (o salário maternidade), a situação é diversa. Isso acontece porque são elegíveis para gozar do benefício previdenciário categorias do setor informal, no entanto, em regra, é exigida a contribuição para o sistema previdenciário, o que é um fator de exclusão. A exceção é a licença que beneficia algumas categorias, como as trabalhadoras rurais, que não exige comprovação de um número mínimo de contribuições, mas de tempo de trabalho, para a proteção previdenciária. . É importante assinalar, ainda, a notável discrepância do tempo garantido em cada uma dessas duas modalidades (maternidade e paternidade), no marco da Constituição Federal ( Brasil, 1988Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 . (1988). Brasília, DF. Recuperado de https://bit.ly/2RkGvX6
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). Ademais, a efetivação do texto constitucional encontrou obstáculos na década subsequente e, no caso das creches, elas seguiram atreladas à política de assistência social, principalmente por meio de seu financiamento.

Durante os governos petistas, houve mudanças nas creches e nas licenças. As creches foram plenamente incorporadas ao sistema educacional com a instituição do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). Além disso, o governo federal criou iniciativas para ampliar o financiamento das creches, etapa do ensino de responsabilidade municipal, a exemplo da inclusão da rede de educação infantil na segunda edição do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC-2) e da criação do Brasil Carinhoso (BC) ( Cruz, 2017Cruz, Maria do Carmo M. T. (2017). A implementação da política de creches nos municípios brasileiros após 1988: avanços e desafios nas relações intergovernamentais e intersetoriais (Tese de doutorado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ; Marcondes, 2013Marcondes, Mariana M. (2013). A corresponsabilização do Estado pelo cuidado: uma análise sobre a política de creches do PAC-2 na perspectiva da divisão sexual do trabalho (Dissertação de mestrado). Universidade de Brasília, Brasília, DF. ). Por meio da inclusão da rede de educação infantil no PAC-2, garantiu-se financiamento para obras de expansão da rede municipal pública e compra de mobiliários. O BC, por sua vez, previu a suplementação de recursos do Fundeb como uma forma de estímulo para que crianças de famílias de baixa renda, beneficiárias do Programa Bolsa Família, fossem matriculadas em creches públicas municipais (incluindo rede conveniada)5 5 . O BC, que integrava o Brasil Sem Miséria, previa ações intersetoriais para a educação, saúde e transferência de renda, com foco em crianças pobres de zero a 48 meses (quatro anos) ( Cruz, 2017 ). .

No processo de incorporação das creches à educação formal, sua identidade foi debatida pelo Conselho Nacional da Educação (CNE). Vinculado ao Ministério da Educação (MEC), o CNE é responsável pela regulamentação da Política Nacional da Educação, abrangendo, em sua composição, especialistas da área educacional. Coube ao CNE definir diretrizes gerais para o funcionamento das creches ( Brasil, 2009Brasil. Ministério da Educação. (2009). Resolução n. 5, de 17 de dezembro de 2009 . Brasília, DF: Diário Oficial da União. ), além de resolver questões específicas, como o período de funcionamento do serviço durante o ano (Brasil, 2013b) e a idade de crianças atendidas (Brasil, 2016c).

A principal alteração no regime de licenças restringiu-se a setores laborais de alta formalização (Brasil, 2008a, 2016a), visto que as principais mudanças legais ocorridas no período garantiram a extensão de licenças (maternidade e paternidade), beneficiando categorias do serviço público e de emprego formal em empresas de grande porte6 6 . Isso porque, no caso do setor privado, apenas as empresas que adotam o regime tributário de lucro líquido são elegíveis, o que exclui, por exemplo, pequenas e médias empresas. Além disso, as empresas elegíveis devem optar pela inscrição no Empresa Cidadã, que garante uma compensação tributária para custear a extensão de licenças (maternidade e paternidade) (Brasil, 2008a; 2016a; Tominaga, 2015 ). . Para a maternidade, foi prevista a extensão para 180 dias, fruto do advocacy da Sociedade Brasileira de Pediatria ( Tominaga, 2015Tominaga, Paulo. (2015). Conciliação família e trabalho: o processo de formulação de política de licença maternidade no Brasil (Dissertação de mestrado). Instituto Legislativo Brasileiro, Brasília, DF. ). Para a paternidade, no âmbito do “Marco Legal para a Primeira Infância”, a licença foi ampliada para 20 dias. De autoria multipartidária, esse projeto foi articulado pela Frente Parlamentar da Primeira Infância, integrada por mais de 200 parlamentares, em diálogo com representações governamentais e da sociedade civil, especialmente da área da infância, como a Fundação Maria Cecília Souto Vidigal (Brasil, 2016a).

Creches e licenças foram também previstas na política para as mulheres. Ambas eram ações que compunham o PNPM, que, como vimos, foi elaborado a partir das resoluções da CNPM. A gestão transversal do PNPM era coordenada pela SPM, contando, para tanto, com instâncias de articulação e acompanhamento como o Comitê de Articulação e Monitoramento do PNPM, que reunia órgãos governamentais responsáveis pela implementação das ações do Plano, além de representantes do Conselho Nacional de Direito da Mulher (CNDM) ( Brasil, 2006Brasil. (2006). Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres . Brasília, DF: Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres. , 2008aBrasil. (2008a). Lei n. 11.770, de 09 de setembro de 2008 . Brasília, DF: Diário Oficial da União. , 2013aBrasil. (2013a). Plano Nacional de Políticas Públicas para as Mulheres 2013-2015 . Brasília, DF: Secretaria de Políticas para as Mulheres. ). Com efeito, os órgãos então responsáveis pelas políticas de educação, desenvolvimento social e trabalho compunham o referido Comitê (MEC, Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – MDS e Ministério do Trabalho e Emprego – MTE).

Nesse contexto, emergiram dois principais frames para significar essa política sob uma perspectiva de gênero. De um lado, o que denominamos de “Direito à educação e ao cuidado infantil”, compartilhado, sobretudo, por organizações da sociedade civil de defesa dos direitos das crianças, parlamentares, representantes do governo e de setores educacionais e membros do CNE; de outro, o que com ele coexistiu no curso da ação estatal, que intitulamos “Promoção da autonomia econômica das mulheres”, mobilizado por representantes governamentais da SPM e por movimentos feministas e de mulheres, atuantes na CNPM e no CNDM. Nas próximas páginas, apresentamos a narrativa subjacente a cada um deles.

Frame predominante: direito à educação e ao cuidado infantil

Introduzimos o diagnóstico do problema desse frame por um fragmento extraído do pronunciamento de um parlamentar durante o debate sobre o “Marco Legal para a Primeira Infância”:

(1) Hoje, sabemos, todas as competências básicas, as habilidades, a inteligência, a habilidade socioemocional, o controle do impulso, o comportamento pacífico ou, ao contrário, o comportamento violento, são gestados e moldados nos primeiro dois ou três anos de vida. Depois, o ser humano vai trabalhar com isso o resto da vida. O padrão do estresse, a maneira como a pessoa vai reagir diante das dificuldades, a ansiedade e as dificuldades que virão a ter, pessoais, emocionais, nos momentos em que sofre algum revés, o padrão que ela terá de reação em relação a isso é montado e organizado nos primeiros dois anos de vida, em cima da relação que ela tem com o cuidador, da maneira como ela é atendida nas suas necessidades. ( Brasil, 2014Brasil. (2014). Pronunciamento do deputado federal Osmar Terra, referente ao Marco Legal da Primeira Infância, de 10 de fevereiro de 2014 . Notas taquigráficas. Brasília, DF. , p. 1)

Do excerto, depreende-se que, nos primeiros anos de vida, é moldado um conjunto amplo de faculdades cognitivas e emocionais. Até mesmo comportamentos violentos na idade adulta podem ser reflexos de práticas de cuidado incompatíveis com a complexa trama de necessidades dos primeiros anos de vida. A primeira infância constitui-se, portanto, em uma fase crítica do tornar-se humano, que pode se converter em um problema, com efeitos deletérios para todo o ciclo de vida. O ponto crítico, para tanto, é a relação que a criança “tem com o cuidador, da maneira como ela é atendida nas suas necessidades”. Sobre essa relação, o parecer do CNE que analisa a idade de atendimento das crianças em creches explicita que:

(2) A defesa da matrícula imediata normalmente se fundamenta no impedimento da mãe da criança para exercer seu trabalho, já que não tem com quem deixar seu filho em segurança. Todos aspiram garantir às crianças os cuidados necessários para o seu pleno desenvolvimento. Este desejo, entretanto, revela um grande paradoxo do cotidiano das pessoas necessitadas. De um lado, existe o dever jurídico e moral dos pais, no sentido de prover o sustento dos seus filhos, em segurança e em condições de pleno desenvolvimento. De outro lado, lhes é imposta a obrigação de não os deixar com estranhos, ou mesmo em situação de abandono. (Brasil, 2016c, p. 6)

O segundo excerto identifica um conflito, no qual as “mães” não conseguem se inserir no mercado de trabalho por não terem disponível um arranjo que permita o cuidado seguro das crianças. Com isso, coloca-se um paradoxo entre o dever de provedor e de cuidador “dos pais”. Em outras palavras, o que torna essa fase crítica é a forma que se cuida e as condições concretas para fazê-lo. Isso nos remete à investigação de quais foram as causas atribuídas à produção desse problema na construção desse frame. O pronunciamento de uma deputada, na discussão sobre o marco da primeira infância, nos introduz a elas:

(3) A modernidade, que exige de todos os membros das famílias e falo aqui, especialmente, das mulheres um empenho, muitas vezes, sobre-humano pela sobrevivência, cobra seu preço. As mulheres assumem novos papéis a cada dia, inseridas que estão no mercado de trabalho. Os filhos, entretanto, continuam necessitando de cuidados. Há de se conciliarem demandas aparentemente opostas. ( Corrêa, 2014Corrêa, Aline. (2014). Pronunciamento, Sessão: 217.4.54.O . Brasília, DF: Câmara dos Deputados. , p. 1)

Os novos papéis exercidos pelas mulheres (como a inserção no mercado de trabalho) são traços da modernidade, entretanto, não alteram o fato de que crianças necessitam de cuidados, o que demarca uma tensão entre demandas opostas (crianças e cuidado versus mulheres e trabalho). Essa tensão é central a essa narrativa:

(4) A empresa não pode abrir mão do trabalho feminino cuja contribuição é tão importante e, ao mesmo tempo, deve levar em conta que sendo o papel natural da mulher o de gerar filhos, esse papel deve ser respeitado e apoiado para a felicidade e o bem-estar de todos. ( Brasil, 2007Brasil. (2007). Projeto de Lei n, 2.513-B, de 2007 . Brasília, DF: Câmara dos Deputados. , p. 2)

O quarto trecho foi extraído do pronunciamento de uma deputada, na discussão sobre a licença maternidade. Nele, foi identificado um conflito entre a contribuição do trabalho feminino remunerado e o papel natural de “genitora”, sendo deste último que a felicidade e o bem-estar de todos depende. Há, segundo esse argumento, um conflito materno-infantil, cuja conciliação cabe à mulher. Seria legítimo indagar qual o papel que o Estado desempenha na resolução desse conflito, o que nos remete ao seguinte fragmento:

(5) Em primeiro lugar, o Estado necessita assumir sua responsabilidade na educação coletiva das crianças, complementando a ação das famílias. Em segundo lugar, creches e pré-escolas constituem-se em estratégia de promoção de igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, uma vez que permitem às mulheres sua realização para além do contexto doméstico. ( Brasil, 2009Brasil. Ministério da Educação. (2009). Resolução n. 5, de 17 de dezembro de 2009 . Brasília, DF: Diário Oficial da União. , p. 5)

Os objetivos da ação estatal são hierarquizados. Em primeiro lugar, a educação infantil, em segundo, a promoção da igualdade de oportunidade entre mulheres e homens, para que elas possam se realizar para além das fronteiras domésticas. Importante notar que a família é identificada como principal agente da educação coletiva de crianças, cabendo ao Estado a sua complementação, não a corresponsabilização.

A compreensão da responsabilidade estatal como complementar, perseguindo objetivos hierarquizados, formata a lógica de funcionamento dos serviços de creches. É o que se depreende da discussão relativa a horário e períodos de funcionamento. Com efeito, o CNE foi provocado a analisar a questão, uma vez que os serviços haviam sido questionados por fecharem aos finais de semana, feriados e recessos escolares, o que não seria condizente com as necessidades das famílias. Segundo o Conselho:

(6) Considera-se que muitas famílias necessitam de atendimento para as crianças em períodos e horários que não coincidem com os de funcionamento regular dessas instituições educacionais, como o horário noturno, finais de semana e em períodos de férias e recesso. Contudo, esse tipo de atendimento, que responde a uma demanda legítima da população, enquadra-se no âmbito de “Políticas para a Infância”, devendo ser financiado, orientado e supervisionado por outras áreas, como assistência social, saúde, cultura, esportes e proteção social. (Brasil, 2013b, p. 4)

O discurso depreendido do Trecho 6 não deixa de reconhecer como legítimas as demandas das famílias. Seu atendimento, entretanto, seria escopo de outra política (a da infância), que não está estruturada no país para prestar tal atendimento. Apenas excepcionalmente admitiu-se a utilização do espaço físico das creches (Brasil, 2013b). Esse argumento implica uma obliteração, no prognóstico, do reconhecimento dos paradoxos das práticas sociais de cuidado como um problema, para qual não se oferece uma solução. Há, portanto, uma desarticulação entre diagnóstico e prognóstico na estruturação dessa narrativa.

A significação, nesse frame, realiza-se em camadas. O cuidado, associado à educação, é assumido como um direito, hipótese em que há uma desfamilização parcial e legítima. É a função educacional que define as fronteiras entre o cuidado que deve ser exercido pelas famílias e o que cabe ao Estado, de forma complementar. Dito de outra forma, educar e cuidar são indissociáveis, mas o segundo só é reconhecido como parte da esfera de atuação legítima do Estado quando o primeiro também o for. Para além das fronteiras do educar, o cuidar não compete ao Estado, assim, sobre o que está além dessas fronteiras, esse frame “silencia”, o que também é uma forma de produzir significados ( Orlandi, 2000Orlandi, Eni. (2000). Análise do discurso: princípios e procedimentos . Campinas, SP: Pontes. ), visto que o silêncio acaba reforçando a atribuição do papel do cuidado às famílias e, dentro delas, às mulheres. Consequentemente, o silêncio limita a potencialidade da transversalidade de gênero, que, em sua plenitude, implica a corresponsabilização estatal com o cuidado, assumindo-se uma postura ativa em relação à questão.

O fragmento a seguir agrega mais uma camada a essa textura:

(7) “Esses intervalos permitem às crianças, conforme imposição constitucional (art. 227), a convivência familiar e comunitária. Por isso, é dever dos pais assistir, criar e educar os filhos” (Brasil, 2013b, p. 3).

Segundo o Trecho 7, o intervalo de prestação do serviço é condição para que mães e pais exerçam seus deveres, impostos pela Constituição, de assistir, criar e educar, além de conviverem com as crianças. Esse trecho nos introduz aos postulados implícitos dessa política, que possuem traços da ideologia patriarcal, em articulação com outras formas de desigualdades. Supõe-se que as famílias estão disponíveis, nesses intervalos, para conviver com as crianças, independente das condições materiais de sobrevivência de cada unidade familiar. Isso decorreria, inclusive, de uma obrigação constitucional. Há, aqui, uma segunda obliteração, referente à não efetivação de direitos consagrados na Constituição Federal ( Brasil, 1988Brasil. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 . (1988). Brasília, DF. Recuperado de https://bit.ly/2RkGvX6
https://bit.ly/2RkGvX6...
) (de quem cuida, ao trabalho), ou seja, não se atende satisfatoriamente os direitos ao trabalho e à educação, por meio das creches, mas exigem-se as obrigações familiares correlatas.

Além dos traços familistas, há elementos maternalistas nessa narrativa. As categorias abstratas “famílias”, “pais” e “quem cuida” referem-se, na verdade, às mulheres, que possuem o papel “natural” de gerar filhos (Trecho 4), devendo conciliar suas demandas de inserção no mercado de trabalho com as demandas das crianças por cuidado (Trecho 3). Apenas recentemente os pais foram incorporados como sujeitos, como enunciou uma deputada, na discussão do Marco Legal da Primeira Infância:

(8) Sr. Presidente, quero cumprimentar V.Exa. e todos os homens que ontem ganharam um presente excepcional. Com o Marco Legal da Primeira Infância, sancionado pela Presidente Dilma, vocês tiveram ampliado para 20 dias deveria ser mais o direito à licença paternidade, para ficarem com seus filhos. Essa é uma contribuição para que a paternidade seja assumida como algo de responsabilidade da sociedade e não apenas das mulheres. Parabéns aos homens, às mulheres e às crianças deste País! (Brasil, 2016b, p. 1)

A licença paternidade ampliada significou, para os homens, “ganhar” um “presente excepcional”. Por meio dela, foi legitimada a problemática da paternidade e a solução do compartilhamento, ainda que de forma limitada (“deveria ser mais”). A corresponsabilidade masculina nesse frame colocou-se, ainda que de forma secundária em relação ao padrão de significação maternalista.

É importante observar, ainda, que as medidas que dizem respeito às licenças, que, embora sejam discutidas como garantia de direitos em sentido genérico, são restritas a setores formalizados, uma vivência que é demarcada por relações de classe, gênero e raça. Como vimos, a extensão das licenças, no período, beneficiou apenas os setores mais formalizados do mercado de trabalho (serviço público e empresas de grande porte, sendo facultativa a efetivação para essas últimas). Nesses termos, toma-se como universal, na narrativa sobre essas políticas, condições específicas dos sujeitos, permeadas por desigualdades.

Já no caso da política de creches, depreende-se, de suas diretrizes e de seu diagnóstico, algum nível de preocupação com as desigualdades sociais (classe, gênero, raça e etnia) e territoriais (regionais, urbano/rural), por serem esses fatores que moldam as assimetrias de acesso e permanência no serviço ( Brasil, 2009Brasil. Ministério da Educação. (2009). Resolução n. 5, de 17 de dezembro de 2009 . Brasília, DF: Diário Oficial da União. ). Todavia, essas referências às desigualdades são, em regra, genéricas, não resultando em uma reorientação sistêmica desse frame, ainda que avanços pontuais tenham ocorrido, a exemplo do BC, que teve como objetivo beneficiar crianças pobres.

Em síntese, nesse frame, que predominou na construção dos significados da política de cuidado infantil do período, enfocou-se o direito das crianças à educação e ao cuidado. Há traços da ideologia patriarcal na construção dessa narrativa, combinando elementos familistas e maternalistas. Em grande medida, esses são elementos cristalizados no curso da ação estatal que o frame reproduz, reafirmando e legitimando a relação de poder e de dominação de gênero. Entretanto, essa ideologia não apenas se faz presente por uma reprodução de memória discursiva; ela é atualizada pelos sujeitos que a mobilizam discursivamente, perpassando posicionamentos políticos que congregam múltiplas filiações partidárias e organizacionais, além de vozes à esquerda e à direita.

Frame marginal: promoção da autonomia econômica das mulheres

Uma segunda narrativa sobre a política de cuidado infantil emergiu das políticas para as mulheres, e seus significados remetem à problemática do trabalho feminino. Com efeito, especialmente a partir da 2ª edição do PNPM (Brasil, 2008b), as creches e a licença maternidade foram incorporadas como ações do eixo dedicado à autonomia econômica das mulheres e igualdade no mundo do trabalho. Em sua 3ª edição (PNPM 2013-2015), foram previstas também as licenças paternidade e parental (Brasil, 2013a).

Fundamentalmente, o diagnóstico desse frame era de que:

(9) Apesar do aumento do nível de atividade das mulheres, ele ainda é bastante inferior àquele verificado para os homens [. . .] neste processo, os lugares ocupados pelas populações feminina e negra tendem a ser mais precários do que aqueles ocupados pela masculina e branca. (Brasil, 2008b, p. 32)

Nessa narrativa do problema, as mulheres estavam, em relação aos homens, menos presentes no mercado de trabalho (nível de atividade) e, ainda, em piores condições (posições precárias). A compreensão de quais seriam as causas para essa problemática pode ser extraída do trecho a seguir:

(10) A autonomia econômica e a igualdade entre mulheres e homens no mundo do trabalho estão fundamentadas em ações específicas que visam à eliminação da desigual divisão sexual do trabalho, com ênfase na erradicação da pobreza e na garantia de participação das mulheres no desenvolvimento do Brasil. (Brasil, 2013a, p. 14)

Assim, a causa das desigualdades entre mulheres e homens identificada nesse frame é a divisão sexual do trabalho, que separa e hierarquiza a vivência do mundo do trabalho segundo as relações de gênero ( Kergoat, 2009Kergoat, Danièle. (2009). Divisão sexual do trabalho e relações sociais de sexo. In H. Hirata, F. Laborie, H. Le Doaré, & D. Senotier (Org.), Dicionário crítico do feminismo (pp. 67-75). São Paulo, SP: Editora UNESP. ). Assim, as mulheres exercem funções menos valorizadas ou que não são reconhecidas como trabalho (a exemplo do trabalho doméstico não remunerado), enquanto os espaços ocupados pelos homens são mais valorizados. Promover a autonomia econômica das mulheres e a igualdade no mundo do trabalho implica atacar a divisão sexual do trabalho, inclusive para erradicar a pobreza e garantir que as mulheres integrem o desenvolvimento do país. Para isso, é necessária a

(11) “ampliação da oferta de equipamentos públicos e de políticas que favoreçam o aumento do tempo disponível das mulheres, promovendo a sua autonomia, inclusive para a sua inserção no mercado de trabalho” (Brasil, 2013a, p. 17).

A ampliação da oferta de equipamentos e políticas disponibilizando tempo livre para as mulheres, inclusive para inserção no mercado de trabalho, é condição para a promoção da autonomia econômica das mulheres, objetivo fundamental nesse frame. Há, aqui, uma distinção em relação ao frame anteriormente analisado. A inserção das mulheres no mercado de trabalho não é o que causa o problema do cuidado infantil, mas a desigual divisão sexual do trabalho, que as torna desproporcionalmente responsáveis pelo cuidar. A inserção no mercado de trabalho é, nessa segunda narrativa, parte da solução do problema. Esse frame mobiliza uma perspectiva específica de igualdade de gênero, na qual são enfocadas as mulheres, e não a relação de gênero ou de cuidado. É o que esclareceram as entrevistadas:

(12) [. . .] Porque discutir licença parental, “eu não quero, porque vai mexer com homem. A gente não mexe com homem aqui, né” [. . .] eu já escutei, algumas vezes, em reunião, essa coisa, assim. . . “a gente está aqui para discutir mais direito das mulheres, uma licença maternidade maior para as mulheres”. Acho que a Secretaria nunca foi uma Secretaria muito preocupada em mudar relações de gênero, no final das contas. A preocupação lá era: “vamos garantir direitos para as mulheres” [. . .]. (Entrevistada 2, 2017)

(13) Na SPM, no geral, existia uma crítica em relação a essa questão. Inclusive, se colocava bastante que o enfoque da SPM não eram as crianças. (Entrevistada 1, 2016)

A preocupação com as crianças não era negligenciada e a garantia de direito delas era um meio para garantir o direito das mulheres por meio de iniciativas como as creches. A prioridade era, no entanto, para o acesso das mulheres ao mercado formal de trabalho, superando a pobreza e exclusão social. A ênfase dessa perspectiva era, portanto, na autonomia econômica das mulheres. Embora essa tenha sido a perspectiva que predominou nesse frame, outras também despontaram, como podemos observar a partir de algumas ações do PNPM: (14) “Promover a valorização do trabalho doméstico não-remunerado e contribuir para a superação da atual divisão sexual do trabalho” (Brasil, 2008b, p. 39).

Além da importância da valorização do trabalho doméstico não remunerado, o II PNPM (2008- 2011) definiu como uma ação a ampliação da licença maternidade para seis meses, sem prever licença paternidade. Nesse sentido, ganhou relevância não apenas a autonomia econômica das mulheres, mas a proteção à maternidade. Embora essas perspectivas não sejam, necessariamente, contraditórias, elas possuem particularidades. No primeiro caso, valoriza-se a igualdade das mulheres em relação aos homens , na segunda, a valorização daquilo que as mulheres tradicionalmente fazem (cuidar).

Ainda de forma mais errática, outra perspectiva de igualdade de gênero despontou nesse frame, a partir do PNPM (2013-2015). É possível identificá-la a partir de um trecho do plano, cujo diagnóstico previu que:

(15) Diminuir o tempo das mulheres nos afazeres de casa é tarefa de políticas públicas para a autonomia econômica. Dessa forma, fazem parte desse plano ações que enfrentam esta desigualdade, com a criação de equipamentos públicos e um debate profundo sobre o compartilhamento do uso do tempo e a corresponsabilidade pelas tarefas domésticas (Brasil, 2013a, p. 14).

Em decorrência, foram previstas como ações do Plano: (16) “Promover a cultura de compartilhamento do trabalho doméstico entre mulheres e homens, por meio da realização de campanhas, ampliação da licença paternidade e o debate sobre a licença parental” (Brasil, 2013a, p. 18).

Assim, a partir do PNPM (2013-2015), a responsabilização masculina ganhou algum destaque em comparação com as edições anteriores, ainda que a previsão das ações fosse genérica (ampliar a licença paternidade sem propor um período de extensão, debater a parental etc.). Mesmo com essas limitações, nesse momento foram incorporados elementos que sinalizam uma preocupação não apenas com os direitos das mulheres, mas com a relação de gênero. Isso significa não apenas garantir que as mulheres tenham igualdade nas condições de inserção no mercado de trabalho ou que sejam valorizados os papeis sociais que elas tradicionalmente assumiram, mas que seja fomentado que os homens se engajem nessas relações de cuidado.

Em síntese, nesse frame, evidenciado em seu principal mecanismo de gestão da transversalidade (PNPM), priorizou-se as mulheres. Com efeito, essa foi uma escolha assumida para “transversalizar” gênero nas políticas, entendendo-se que, ao se garantir direitos e efetivar a inclusão social das mulheres, também seriam modificadas as relações de gênero ( Bandeira, 2005Bandeira, Lourdes M. (2005). Fortalecimento da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres: avançar na transversalidade da perspectiva de Gênero nas Políticas Públicas . Brasília, DF: Cepal; SPM. ; Farah, 2004Farah, Marta F. S. (2004). Gênero e políticas públicas. Revista Estudos Feministas , 12 (1), 47-71. doi:10.1590/S0104-026X2004000100004
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; Fujiwara, 2002Fujiwara, Luís M. (2002). Governo: substantivo feminino? Gênero e políticas públicas em governos subnacionais (Dissertação de mestrado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ). As nomenclaturas governamentais explicitam essa concepção: Secretaria de Políticas para as Mulheres , Plano Nacional de Políticas para as Mulheres etc. Ainda que essa escolha, por enfocar as mulheres (em vez da relação de gênero), possa ser importante, ela também carrega um fator limitador, especialmente em casos como o da política analisada neste artigo, que não diz respeito unicamente aos direitos e necessidades das mulheres.

Por fim, houve, ainda, alguns movimentos de intersecção da desigualdade de gênero com outras relações sociais, produtoras de desigualdades (Collins, 2015). O Trecho 9, extraído do II PNPM, é emblemático da atenção às mulheres negras no diagnóstico das desigualdades do mercado de trabalho. Nesse plano, ainda se explicitava a necessidade de considerar “as dimensões étnico-raciais, geracionais, regionais e de deficiência” (Brasil, 2008b, p. 39), entretanto, em regra, essa diretriz mais geral não se desdobrou em ações específicas em relação ao cuidado infantil. Ademais, a perspectiva de gênero adotada, nesse frame, foi marcada pela heteronormatividade, o que implica assumir as relações afetivas heterossexuais entre mulheres e homens como a regra, deixando de visibilizar outros arranjos, como os de famílias LGBTQ+.

Esse segundo frame compartilhou de alguns aspectos com o primeiro. Ambos mobilizaram uma gramática de garantia de direitos, por meio da qual enunciavam ações de garantia de melhorias nas condições de vida de sujeitos historicamente discriminados (crianças e mulheres), o que esteve em sintonia com o discurso de ampliação de políticas e direitos sociais e ganhou força durante o giro à esquerda. Entretanto, a centralidade que o primeiro frame conferiu às crianças e o segundo conferiu às mulheres dificultou a integração, inclusive pelas perspectivas de gênero subjacentes a cada um deles. Em ambos, houve, ainda, uma crescente preocupação com um terceiro personagem (o pai), mas que permaneceu como um figurante da relação de cuidado.

Dessa forma, não emergiu um frame mais abrangente ( Alves, 2014Alves, Mário A. (2014). Social accountability as an innovative frame in civic action: the case of Rede Nossa São Paulo. Voluntas: International Journal of Voluntary and Nonprofit Organizations , 25 (3), 818-838. doi:10.1007/s11266-013-9365-6
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; Rosa & Mendonça, 2011Rosa, Alexandre R., Mendonça, Patrícia. (2011). Movimentos sociais e análise organizacional: explorando possibilidades a partir da teoria de frames e a de oportunidades políticas. Organizações & Sociedade , 18 (59), 643-660. doi:10.1590/S1984-92302011000400005
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; Snow et al., 1986Snow, David A., Rochford Jr., Burke, Worden, Steven K., & Benford, Robert D. (1986). Frame alignment processes, micromobilization and movement participation. American Sociological Review , 51 (4), 464-481. doi:10.2307/2095581
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; Snow & Benford, 1988)Snow, David A., Benford, Robert D. (1988) Ideology, Frame Resonance and Participant Mobilization. In B. Klandermans, H. Kriesi, & S. Tarrow (Orgs.), From structure to action: comparing social movement across cultures (pp. 197-218). London: JAI Press. para abarcar a multiplicidade de sujeitos e pontos de vista que disputaram a significação da política de cuidado infantil. Para isso, seria necessário congregar as necessidades de quem tradicionalmente cuida (mulheres), de quem é cuidado (crianças) e de quem deveria cuidar (Estado e homens).

A opção por uma narrativa centrada nas mulheres no segundo frame pode ter contribuído para a marginalidade da transversalidade de gênero, entretanto, a principal razão para a marginalidade da transversalidade, como vimos, reside nos elementos ideológicos patriarcais que o frame que predominou mobilizou, reafirmando e atualizando a lógica familista e maternalista de provisão do cuidado. A tabela a seguir resume os resultados encontrado.

Tabela 2
: Síntese dos frames em disputa

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  • Weyland, Kurt, Madrid, Raúl L., & Hunter, Wendy. (2010). Leftist governments in Latin America: success and shortcomings . Cambridge: Cambridge University.

Notas

  • 1
    . Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2007; 2007-2011); Dilma Rousseff (2011-2015; 2015-2016). O segundo governo Dilma foi interrompido em 2016, em um evento que parte do país denomina de golpe, parte, de impeachment.
  • 2
    . Licença parental é uma modalidade que pode ser usufruída por qualquer uma das pessoas responsáveis pela criança (mães ou pais, o que inclui famílias LGBTQ+). Ela pode ser exercida em regime de revezamento (parte do período usufruída por um dos membros do casal, parte pelo outro), e, ainda, pode ser de tempo integral (um período integralmente afastado do posto de trabalho) ou de tempo parcial (meia jornada de trabalho e meia de cuidado familiar) ( Pautassi, 2007Pautassi, Laura. (2007). El cuidado como cuestión social desde un enfoque de derechos . Santiago: CEPAL. ).
  • 3
    . O projeto, desenvolvido por investigadoras feministas de distintos países europeus, analisou a transversalidade de gênero no frame de políticas da União Europeia, considerando três temas (violência de gênero, conciliação da vida laboral e familiar e inserção das mulheres na política) ( Bacchi, 2005Bacchi, Carol. (2005). The MAGGEQ project: identifying contesting meaning of “gender equality”. The Greek Review of Social Research , 117 , 221-234. ).
  • 4
    . A licença paternidade é um direito do trabalhador (público e privado) e, por isso, apenas o setor formal de trabalho é elegível. No caso da licença maternidade, por haver um benefício previdenciário atrelado a ela (o salário maternidade), a situação é diversa. Isso acontece porque são elegíveis para gozar do benefício previdenciário categorias do setor informal, no entanto, em regra, é exigida a contribuição para o sistema previdenciário, o que é um fator de exclusão. A exceção é a licença que beneficia algumas categorias, como as trabalhadoras rurais, que não exige comprovação de um número mínimo de contribuições, mas de tempo de trabalho, para a proteção previdenciária.
  • 5
    . O BC, que integrava o Brasil Sem Miséria, previa ações intersetoriais para a educação, saúde e transferência de renda, com foco em crianças pobres de zero a 48 meses (quatro anos) ( Cruz, 2017Cruz, Maria do Carmo M. T. (2017). A implementação da política de creches nos municípios brasileiros após 1988: avanços e desafios nas relações intergovernamentais e intersetoriais (Tese de doutorado). Fundação Getúlio Vargas, São Paulo, SP. ).
  • 6
    . Isso porque, no caso do setor privado, apenas as empresas que adotam o regime tributário de lucro líquido são elegíveis, o que exclui, por exemplo, pequenas e médias empresas. Além disso, as empresas elegíveis devem optar pela inscrição no Empresa Cidadã, que garante uma compensação tributária para custear a extensão de licenças (maternidade e paternidade) (Brasil, 2008a; 2016a; Tominaga, 2015Tominaga, Paulo. (2015). Conciliação família e trabalho: o processo de formulação de política de licença maternidade no Brasil (Dissertação de mestrado). Instituto Legislativo Brasileiro, Brasília, DF. ).
  • 7
    . A despeito das normas da American Psychological Association (APA), mantivemos os prenomes por extenso para dar visibilidade à produção feminina, em consonância com a inscrição do trabalho nos estudos feministas.
  • Verificação de plágio
    A O&S submete todos os documentos aprovados para a publicação à verificação de plágio, mediante o uso de ferramenta específica.
  • Disponibilidade de dados
    A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.
  • Financiamento: Agradecemos ao apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela concessão de bolsa de doutorado (Código de Financiamento 001), sem a qual esta pesquisa não seria possível.

Editado por

Editora Associada: Maria Elisabete Pereira dos Santos

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Out 2021
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2021

Histórico

  • Recebido
    18 Out 2019
  • Aceito
    19 Out 2020
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