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Escrevendo além das distinções

Resumo

A pesquisa jurídica vem se movendo cada vez mais além das distinções tradicionais entre pensamento sócio-jurídico e pensamento jurídico crítico; texto seco da lei e análise do contexto jurídico; direito “prático” e justiça “teórica”; modos de escrita “objetivo” e “subjetivo” e assim por diante. Grande parte da nova pesquisa jurídica se move em direção a um entendimento localizado, corporificado e material do direito, que trata tanto da própria lei quanto de seu contexto teórico e social. Neste capítulo, argumento que esse movimento também deve se refletir não apenas no que escrevemos, mas também no modo como escrevemos. Ofereço algumas observações sobre por que essas distinções já se tornaram obsoletas na prática jurídica da escrita, apesar de ainda serem inconscientemente praticadas pela maioria de nós. Sugiro, então, algumas maneiras pelas quais a escrita jurídica pode avançar ainda mais nessa direção teoricamente rica, ainda que inserida e contextualizada. Algumas das etapas mais importantes são: repensar o ensaio como verdadeiramente um ensaio (ou seja, tentativa, experimento); correr riscos, não buscando a consistência acima de tudo, mas permitindo que o texto se desdobre como um corpo em si mesmo e como um agente jurídico; reservar uma posição de destaque para o “eu” em sua presença afetiva e múltipla; e abraçar o desejo coletivo de um direito mais justo. Concluo resumindo as distinções mais importantes que precisamos superar e revisitando talvez a distinção derradeira entre direito e justiça.

Palavras-chave:
Ensaio; Escrita jurídica; Pesquisa jurídica; Corpo e materialidades; Cenário jurídico. (inseridas pelos tradutores)

Abstract

Legal research is increasingly moving beyond traditional distinctions between socio-legal and critical legal thinking, black letter law and legal context analysis, “practical” law and “theoretical” justice, “objective” and “subjective” modes of writing and so on. Large parts of new legal research are moving towards an emplaced, embodied and material understanding of law that is both about the law itself and its theoretical and social context. In this chapter, I argue that this move should also be reflected not just in what we write but also in the way we write. I offer some observations on why these distinctions have already become obsolete in legal writing practice, despite the fact that they are unconsciously still practiced by most of us. I then suggest a few ways in which legal writing can move further in this theoretically rich yet emplaced and contextualised direction. Some of the most important steps are: to rethink of the essay as truly an essay (i.e., trial, experiment); to take risks by not striving for consistence above all but by allowing the text to unfold as a body in itself and a legal agent; to reserve a prominent position for the “I” in its affective, multiple presence; and to embrace the collective urge towards a more just law. I conclude by summing up the most important distinctions that we need to overcome, and by revisiting perhaps the ultimate distinction between law and justice.

Keywords:
Essay; Legal writing; Legal research; Body and materialities; Lawscape. (included by translators)

1. Como escrever além das distinções? * * Este texto é uma tradução a partir do original “Writing beyond distinctions” de Andreas Philippopoulos-Mihalopoulos que foi publicado em um capítulo do “Routledge Handbook of Socio-Legal Theory and Methods”, editado por Naomi Creutzfeldt; Marc Mason e Kirsten McConnachie em 2019. O autor destaca que este texto é uma versão parcialmente extraída do texto de 2018 “To Have To Do With The Law: An Essay” – uma escrita consciente sobre o processo da escrita e sua primeira tentativa etnográfica.

Escrever é sobre distinguir, o que incluir e o que deixar de fora. Portanto, este capítulo não trata do ato de escrever sem distinções, mas de tomar consciência das distinções que habitualmente empregamos ao escrever sobre o direito1 1 Nota dos Tradutores (NT): a tradição da literatura jurídica brasileira consagra uma divisão entre a grafia de Direito com “d” maiúsculo, que designaria o direito objetivo, isto é, o sistema jurídico, e o direito com “d” minúsculo, que designaria o direito subjetivo. Entretanto, o presente texto não faz essa distinção ao entender o direito como matéria, um espectro normativo que está além da cisão entre “objetivo” e “subjetivo”. Portanto, mantivemos a grafia de direito com “d” minúsculo, que possui um sentido próprio – ao mesmo tempo em que banaliza a ideia de direito – e que se desenvolve ao longo do texto e obra de Andreas Philippopoulos-Mihalopoulos. e, em seguida, fazer um esforço para ir além delas. A seguir, pedirei aos leitores que deixem para trás pelo menos algumas distinções. A primeira, de natureza mais formal, é aquela entre escrita sócio-jurídica e jurídico crítica. A segunda, referindo-se mais à substância, é a distinção entre texto e contexto, ou, de maneira um pouco diferente, entre direito e matéria (e com ela outras disciplinas, espaço, corpos humanos e não humanos, objetos e até ideias).

Correndo o risco de ignorar o bom conselho de Margaret Atwood (“Escrever em si já é ruim o suficiente, mas escrever sobre escrever é certamente pior no departamento de futilidade”. 2002: xvi), este capítulo é sobre escrever. A ideia é explorar maneiras pelas quais podemos abrir nossas práticas de escrita além das distinções formais de quem é o quê, ou distinções substantivas do direito de um lado, e todas as outras coisas do outro. Ficamos condicionados por muito tempo a pensar, escrever e agir de acordo com as divisões de terrenos. Essas são práticas insidiosas, empregadas em nossos escritos de uma maneira muitas vezes impensada e incorporada na escolha dos autores que lemos, nas conferências em que assistimos, nas faculdades de Direito em que procuramos emprego. Mesmo os mais progressistas de nós regularmente instruímos nossos alunos a partir de tais distinções.

Este capítulo, no entanto, não se trata apenas do escrever. A pesquisa jurídica nunca pode ser “apenas” um ato de escrita. Sempre existe um horizonte jurídico, político, social em termos gerais, e todos somos orientados por ele. Suponho aqui que todos os leitores deste volume compartilhem um horizonte mais amplo: o desejo de um direito mais justo. Ao estabelecer artificialmente fronteiras entre, digamos, crítico e sócio-jurídico, enfoques interdisciplinares e disciplinares, ou análises etnográficas pessoais e “objetivas” do direito (mesmo em contexto), debilitamos a possibilidade de uma frente unida que precisamos apresentar em vista de todos os desafios, bastante extremos, com os que lidamos atualmente como estudiosos. Esses desafios são bem conhecidos e aparecem igualmente em um nível micro (gerencialismo nas universidades, mercantilização das pesquisas, quantificação do ensino) e macro (desrespeito global ao direito, novos equilíbrios geopolíticos, natureza insular do cenário político global em termos de assistência, meio ambiente e refugiados, degradação ecológica e assim por diante).

Nas duas seções a seguir, analiso as distinções acima e os motivos pelos quais elas devem ser consideradas obsoletas. A seguir, (seção 4), aponto para a nossa frequente relutância em deixar para trás métodos tradicionais e passar para o que Adorno chamou da lei do ensaio, ou seja, uma maneira de escrever que permita que elementos previamente invisibilizados apareçam. Para fazer isso, defendo que precisamos resistir ao impulso de resolução (seção 5) e, como alternativa, tratarmos o ensaio como um corpo com sua própria agência jurídica (seção 6). Uma maneira de fazer isso é insistindo em usar o “eu” como uma semântica de responsabilidade pessoal, mas também como uma indicação de uma coletividade (seção 7). Outra maneira é permitir que o texto se desdobre - na verdade, precisamos “ouvi-lo”, em vez de sempre tentar impor a ele uma formatação (seção 8). Na seção 9, resumo nossas responsabilidades como estudiosos e escritores do direito e concluo com o devaneio de uma lista (seção 10) e um lembrete do que é, assim espero, o motivo mais importante pelo qual escrevemos: permitir o surgimento de um direito mais justo.

2. Nós nunca fomos críticos?

Deixe-me começar com a primeira distinção, entre sócio-jurídico e crítico. Meu argumento é que a manutenção da distinção faz um desserviço tanto à escrita crítica quanto à sócio-jurídica (tradicionalmente entendida). Essa distinção implica que a escrita sócio-jurídica não pode ser crítica, ou seja, teoricamente informada com fortes inclinações críticas e potencialmente até uma visão do horizonte que abrace o futuro; e, respectivamente, que o crítico não pode ser sócio-jurídico, ou seja, pragmaticamente contextualizado, em contato com uma sociedade em constante transformação, cujo estudo frequentemente requer uma abordagem que, em termos gerais, intitulamos de empírica. Não há dúvida, que várias publicações teóricas prestam pouca atenção em como a teoria é traduzida em prática e como, de maneira mais ampla, a teoria pode fazer a diferença; da mesma forma, uma quantidade considerável de pesquisa aplicada não está interessada nos benefícios que uma teorização mais extensa traz em termos de pensamento diagonal, criativo e perturbador. Mas as coisas estão mudando rapidamente: um número crescente de estudiosos na última década resistiu a essas linhas duras e produziu um trabalho que teoriza a prática e aplica a teoria, se não na mesma medida, pelo menos sem cair em um binarismo antiquado (para além de uma vasta bibliografia, ver indicativamente Perry-Kessaris, 2017Perry-Kessaris, Amanda, ‘The pop-up museum of legal objects project: an experiment in “sociolegal design”, Northern Ireland Legal Quarterly, ISSN 0029-3105, 2017; Grabham, 2016; Bottomley e Wong, 2009Bottomley, Anne and Wong, Simone (eds) Changing Contours of Domestic Life, Family and Law: Caring and Sharing, Oxford: Hart Publishing, 2009.).

Essa distinção (e outras na linha da “alta teoria” versus pensamento fundamentado, concretude versus abstração, utopia versus pragmatismo, e assim por diante) deixaram de ter utilidade, sua relevância agora só se faz útil como uma ferramenta para demarcação dos terrenos do conhecimento. Talvez esteja na hora de entender que existe um pensamento jurídico de qualidade que está ciente de seu potencial efeito sobre a realidade e trabalha nisso para orientar seu desenvolvimento teórico; e portanto, não existe um pensamento jurídico de tanta qualidade que permaneça desconectado da realidade e deliberadamente ignore seu próprio potencial transformador. A menos que amplamente entendido através da contextualização, do engajamento afetivo e do envolvimento pessoal, nem os estudos empíricos nem o mero trabalho teórico têm o monopólio da realidade.

Em resposta a isso, tentei esboçar o conceito de pesquisa “sócio-jurídica crítica” (2015) e, mais recentemente, a prática de “direito e teoria” (2018) como formas de ir além das distinções. Este texto é uma continuação do mesmo projeto. É minha esperança, no entanto, que cada vez mais, qualquer necessidade de criar uma categoria para o tipo de pesquisa que estamos realizando, tanto neste volume quanto cada vez mais na academia, se tornará obsoleta.

3. Qual é o contexto do direito?

Considerando os leitores deste volume, não há necessidade de enfatizar como um foco doutrinário na letra seca da lei falha em entender o que é o direito. O contexto do direito não é o que o brócolis é para o bife de tofu - os pedaços verdes opcionais. Em vez disso, o contexto do direito cria o texto da lei, confere-lhe relevância, vincula-o à realidade, reveste-o da matéria, cria um corpo e o posiciona no espaço e no tempo. Contexto é texto, e a distinção entre os dois está se tornando cada vez mais desatualizada, tanto faz se falamos em pesquisa sócio-jurídica, crítica e/ou interdisciplinar. A questão relevante agora é: qual a melhor forma de incluir o contexto ao escrever sobre o direito.

A questão tem gravidade considerável: tornou-se cada vez mais o principal desafio e responsabilidade de um pesquisador do direito. A aprovação ética do trabalho empírico se trata precisamente da filtragem cuidadosa do contexto apresentado no texto. Da mesma forma, a questão de qual teoria escolher e como aplicá-la é cada vez mais importante, não apenas em termos de referencial teórico no nível de doutorado, mas ainda mais cedo em termos de trabalhos de graduação que pretendem se envolver com a vida contemporânea. A teoria precisa estar presente, não apenas porque fortalece o argumento jurídico, mas também porque o enriquece e o abre a potenciais conflitos que o direito habitualmente exclui. Por fim, outras disciplinas entram no pensamento jurídico na forma de economia, gênero, política ou talvez menos tradicionalmente em termos de espaço, tempo, corporeidade e assim por diante.

A infinidade dessas considerações e a urgência particular em que elas emergem (especialmente questões políticas, geopolíticas e ambientais) nos deixam com duas opções: ou continuamos lamentando a perda de (uma fantasia de) soberania disciplinar do direito, e resistimos à maré, insistindo em restabelecer os limites do direito de acordo com as linhas tradicionais; ou aceitamos que o direito esteja mudando de acordo com a realidade, com a teoria e outras disciplinas, e se torne ainda mais rico por isso. Na realidade, só vejo uma opção aqui.

No entanto, há uma condição: a função do direito permanece distinta de outras disciplinas. Por mais que gostemos do envolvimento do direito com, por exemplo, a antropologia, também estamos cientes do fato de que a pesquisa jurídica não é antropologia. Em vez disso, pode aspirar a se tornar uma espécie de antropologia jurídica. Isso significa que o texto (neste caso, a lei) ressurge de dentro do contexto: o texto e o contexto, embora de muitas maneiras idênticos, não se tornam um. A função social do direito de vincular expectativas em termos do que é permitido e do que não é, é importante. Embora sem dúvida, em um continuum com considerações normativas (culturais, antropológicas e sociológicas), o direito (o modo como é entendido nas escolas de Direito) ainda é reconhecível e ainda pode ser diferenciado de outros tipos de normas. Não nos tornemos arrogantes: este é um espectro, e o direito é apenas uma forma de intensificação do normativo, muitas vezes auxiliado por condições espaciais (digamos, em um tribunal) e temporais (digamos, em tempos de alerta âmbar terrorista). O que é considerado “meramente” cultural, muitas vezes acaba se tornando um direito “sólido” e vice-versa.

4. Por que nós todos falhamos?

A seguir, eu gostaria de dar atenção à escrita, especialmente a escrita ensaística no campo do direito, e as maneiras pelas quais ela pode ir além das distinções acima. Refiro-me aqui predominantemente à arte da escrita ensaística acadêmica, o tipo de escrita com que todos nós nos envolvemos ao ler ou contribuir para volumes como este. É claro que existem outros tipos de escrita jurídica: comentários de casos, relatórios, livros didáticos, submissão para “bolsas de estudos” e até solicitações de financiamento. O tipo de ensaio em que estou pensando, no entanto, não se limita à compreensão formal de um ensaio, seja qual for, mas inclui potencialmente até os tipos de escrita acima e se estende a qualquer forma de escrita que analise o direito e seu contexto. Nesse sentido, toda escrita é ensaística – um esforço ou uma tentativa tanto de forma quanto de conteúdo.

Esse terreno, no entanto, é desconfortável, uma vez que perturba a maioria das ideias que temos sobre o que é ou deveria ser um ensaio jurídico e, consequentemente, nos deixa um pouco à deriva, um tanto quanto desajeitados, dada a forma com que conhecíamos e na qual confiávamos. A falta de forma, no entanto, tem sido tradicionalmente considerada uma característica integrante da escrita ensaística, desde que Michel de Montaigne inventou o termo e, em certa medida, a lógica do “ensaio” (essai, muitas vezes traduzido como “tentativa”). Advogado por formação, Montaigne lutou contra o direito com veemência característica. Embora suas ideias sobre o direito tenham sido convincentes em muitos aspectos, é nosso desafio lutar contra algumas dessas distinções também. Em particular, Montaigne sustentou que o direito não pode gerar justiça (“mesmo nosso sistema de direito, dizem, apoia a verdade de sua justiça em ficções jurídicas” Montaigne, 1991Montaigne, Michel de, The Complete Essays, trans. M. A. Screech, London: Penguin, 1991.: 603) se mantiver uma distinção entre direito e justiça. E, embora existam diferentes tipos de justiça, e nem todo tipo provém do direito, também deveríamos aceitar que existem diferentes tipos de direito, e que a conexão entre justiça e direito precisa ser estabelecida.

Para restabelecer essa conexão, como espero fazer no final deste ensaio, precisamos pensar mais amplamente. O filósofo alemão Theodor Adorno (2003: 45) conclui “The Essay as Form” com estas palavras:

É por isso que a lei formal mais profunda do ensaio é a heresia. Apenas a infração à ortodoxia do pensamento torna visível, na coisa, aquilo que a finalidade objetiva da ortodoxia procurava, secretamente, manter invisível.2 2 NT: Optamos nesta tradução por priorizar, quando disponível, as traduções já consagradas para o português dos textos de livros citados. Quando não houver menção dos tradutores em relação às citações é porque não há edição do livro em português e, portanto, realizamos uma tradução livre. No caso da presente citação existe tradução para o português, cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p.45.

Em outras palavras, a ortodoxia do pensamento mantém as coisas invisíveis (presumivelmente por um desejo de manter o status quo e as linhas disciplinares), enquanto a heresia, a lei do ensaio, as coloca em um primeiro plano de visibilidade. Mas é assim que pensamos a nossa escrita? A lei do ensaio realmente se aplica a ensaios sobre o direito? Realmente escrevemos ensaios (etimologicamente, tentativas e experimentos) ou, às vezes, sentimos como se estivéssemos preenchendo documentos pré-formulados em Word (eu sinto)?

Sem querer desafiar indevidamente nossos editores desse volume (embora eu gostaria de desafiá-los um pouco), todos os colaboradores receberam, em tempo hábil, um esboço muito detalhado de como os capítulos individuais deveriam ser formatados. Não estou falando sobre o estilo de referência, etc., mas sobre as questões a partir das quais cada contribuição deveria ser ponderada, bem separadas em seções fáceis de seguir (um exemplo: a Seção II de cada contribuição é “Análise de um ou mais aspectos de sua experiência na aplicação dessa teoria/método sócio-jurídico... Nós incentivamos os colaboradores a adotar uma abordagem refletida e reflexiva, considerando, por exemplo: Qual foi seu projeto e como você usou essa abordagem teórico-metodológica? Como você usou essa teoria/Como suas escolhas e resultados de pesquisa foram moldados por aspectos como sua localização como pesquisador e implicações/escolhas éticas? Quais são as implicações de seu trabalho para o desenvolvimento dessa teoria/método?”) Esta é sem dúvida uma tentativa de edição especializada para facilitar a nossa vida (dos colaboradores) e a sua (dos editores), além de alcançar uma consistência muito valiosa dos resultados da escrita. No entanto, descaradamente, meu texto é uma tentativa ingrata de dificultar tanto a minha escrita quanto a sua edição. Não sigo o formato sugerido, respondo indiretamente apenas a algumas dessas perguntas e acabo ignorando outras. Espero não ser mal interpretado como um arrogante criador de problemas: as perguntas acima são excelentes. De fato, os editores pedem posicionamento pessoal e textual, projeções futuras, fatos orientados a partir da prática - eles pedem que estejamos presentes no que escrevemos. Mas, ao mesmo tempo, apesar de declararem explicitamente que “não desejam ser prescritivos sobre o conteúdo”, eles falham, ainda que eu acredite em sua boa fé.

Mas todos nós falhamos. Voltemos a algo ainda mais básico: a escrita de nossos alunos. Embora a ênfase do meu texto aqui não seja a escrita do aluno, eu a emprego como uma indicação inequívoca do que mais ou menos impomos a nós mesmos (assim como a nossos alunos) como a maneira “apropriada” de escrever. Então, para recordar Adorno e a lei do ensaio: encorajamos ou pelo menos toleramos a heresia? Trabalhei em vários ensaios de alunos do primeiro ano, cujo objetivo explícito não é tanto o tema escolhido, mas o próprio processo da escrita, pesquisa e expressão, enfim, um primeiro mergulho no mundo da escrita acadêmica. Ano após ano, eles são convidados a escolher entre uma lista de tópicos (papel do julgador, lei e moralidade, interpretação legal e assim por diante), e todos os anos a maioria absoluta escolhe o tópico dos julgadores. A maioria dentre essa maioria formata seu tópico de acordo com as linhas da pergunta de seminário que consta em seu manual: “Quais são as vantagens e desvantagens do sistema de jurados? Identifique 2 ou 3 pontos em cada lado do debate”. O manual, reconhecidamente bem produzido (não por mim), fornece uma orientação clara sobre a escrita. Para a introdução, por exemplo, o principal requisito é “definir sua abordagem para responder à pergunta, mencionando brevemente os problemas que você abordará. Se você não consegue fazer isso, é porque não tem certeza de como abordará a resposta à pergunta. Volte para a pergunta”. Em seguida, “no início de cada parágrafo, indique qual é o problema”. E quanto à conclusão, enfaticamente “não introduza ideias novas!”. Uma das instruções orais para os alunos, sobre as quais tenho um debate prolongado todos os anos com o responsável pelo programa, é não usar o pronome pessoal da primeira pessoa. Voz passiva, construções impessoais (“é submetido”) ou, na pior das hipóteses, “nós” é preferível.

Alunos (nós!) geralmente seguem as diretrizes - os bons alunos, ao menos, que pensamos ser nós, em nossos melhores dias, - e produzem ensaios equilibrados, com argumentos razoáveis, embora compreensivelmente muitas vezes hesitantes e um pouco formalistas sobre os jurados. O que é preocupante, porém, é que eles costumam não tomar qualquer posição com relação aos dois ou três tópicos escolhidos e quase sempre terminam com uma conclusão (e um texto inteiro, diga-se de passagem, para esse assunto) que não introduz novas ideias (ponto de exclamação). Imagino que o argumento que rege essa lógica de escrita seja semelhante ao argumento que diz que você deve ser capaz de dominar a pintura figurativa primeiro para passar à abstração. Estou certo de que isso não é mais considerado válido, pelo menos nas escolas de arte mais em voga, mas há algo neste argumento que não é de todo pouco atraente. Você deve primeiro aprender o básico e só depois voar. E, obviamente, eu também estou ciente dos problemas da escrita incipiente e, muitas vezes, me vejo aconselhando estudantes, mas também a colegas de início de carreira, à escrita habitual de ensaio como se fosse a única verdade.

Mas então, o que sacrificamos quando desejamos que um ensaio seja meramente um esforço e não uma verdadeira tentativa? Uma tentativa de erro e de bravata, talvez, mas também uma tentativa de julgamento, de exposição pessoal e de assunção de riscos? O que perdemos quando incentivamos apenas a consistência bem formada e organizada por seções?

5. Por que os ensaios jurídicos devem ser decepcionantes?

Os ensaios que escrevemos sobre o direito têm uma escolha: eles podem se submeter à compulsão do direito de entregar uma resolução binária: sim/não, culpado/não culpado, legal/ilegal; ou podem fluir ao longo de uma outra perspectiva, talvez um aspecto mais honesto do direito que nunca decide completamente. Essa é a parte do direito (ou do ensaio) que está aguardando seu intérprete/leitor: como dissemos, o direito é inerte até ser lançado em um contexto que o anime e o torne realmente direito. Enquanto a primeira maneira de pensar sobre o direito é o grande espetáculo adversarial, no modo de julgamentos dramáticos e programas da netflix; a última é a maneira pela qual o direito tenta capturar o futuro sem, no entanto, ser capaz de ditá-lo. É o direito em todo o seu potencial: uma oportunidade para reinterpretar a realidade. Em outras palavras, a escolha do ensaio jurídico e de seu autor está entre: erigir uma fortaleza na forma de texto ao longo das linhas do julgamento de um tribunal (um espaço fechado, uma metáfora teológica, um testamento final3 3 “A sala de audiência não apenas simbolizava a independência entre o direito e o espaço político, comercial e social; mas servia para restringir o acesso, limitar o vandalismo, minimizar a interrupção do julgamento e, talvez acima de tudo, incentivar a deferência à administração da justiça em uma sociedade democrática perpetuamente preocupada com a autoridade da lei e dos advogados.” (Spaulding, 2012: 316). ); ou agenciar um texto semelhante a uma verdadeira tentativa4 4 NT: na língua inglesa há um jogo de palavras, intraduzível de forma direta para o português, entre “trial” como julgamento de um tribunal e “trial” como tentativa e ensaio. , uma experimentação com formatos, ideias, fatos, teorias e disciplinas. Em suma, um texto que assuma riscos.

Como um ensaio pode conseguir isso? Permitindo que a escrita respire. Isso significa potencialmente muitas coisas, mas para o pensamento jurídico especificamente, significa não estar voltado para a resolução, mas para o processo de desenvolvimento da escrita. Em outras palavras, significa apoiar novas formas de direito não adversariais, mas abertas, mediadas, discursivas, ligadas a práticas de justiça restaurativa e distributiva, ao invés dos ainda altamente usados modelos de retribuição; e ao fazer isso, tomar uma distância implícita, mas sonora, das estruturas patriarcais habituais que exigem uma postura autoral e outras ilusões de controle. Não basta pronunciar tais objetivos em nossos textos. Nossos textos precisam executá-los também: precisamos produzir textos menos “hierárquicos”, como Andrea Lunsford chama os textos que são “rigidamente estruturados, conduzidos por objetivos altamente especificados e realizados por pessoas que desempenham papéis claramente definidos e delimitados” (1990: 133).

Podemos nos inspirar nos ensaios de Montaigne, famosos por quase nunca culminarem em um encerramento, um grande final ou moral, ou seja, uma conclusão definitiva. Como Philip Lopate (2013Lopate, Philip, To Show and To Tell: The Craft of Literary Nonfiction, New York: Free Press, 2013.: 105) coloca:

A atração de Montaigne pela abertura ou “infinitude”, se você preferir, tem muito a ver com a busca de equilíbrio, esquadrinhando uma longa experiência e aceitando a imperfeição. Montaigne era um mestre do equilíbrio; e o equilíbrio que ele defendia não leva ao apocalipse ou ao fechamento de qualquer tipo... Ele escolheu o ensaio como a forma de desenvolver suas ideias, em parte, porque este lhe oferecia uma maneira de contornar resoluções muito apressadas.

Não é apenas uma questão de conclusão, mas de estrutura geral. Lopate (2013Lopate, Philip, To Show and To Tell: The Craft of Literary Nonfiction, New York: Free Press, 2013.: 211) novamente: “se você já sabe quais serão todos os seus pontos quando se senta para escrever, é provável que a peça pareça seca, morta à chegada”. Por que isso acontece? Porque, todo o foco estaria na resolução. E, frequentemente, confundimos o rigor acadêmico com essa necessidade de resolução. É impossível perambular e, portanto, assumir riscos de forma produtiva e criativa, se tudo for predeterminado. Direção, visões políticas e posições éticas, sim; mas a análise perfeitamente pré-planejada, ordenada e descritiva, não deve se tornar o destino da escrita acadêmica.

Um ensaio deve abrigar para o leitor surpresa, alegria e decepção, tudo ao mesmo tempo. Surpreenda com a escolha dos tópicos, a maneira como foram abordados, as novas conexões com as quais foram dotados. Delicie com o invariável, mas também com a virada das frases, com a escolha de metáfora ou metáforas orientadoras que permitirão que o ensaio fale em outras línguas disciplinares e com uma força bifurcada, uma frente comum formada por argumentação fundamentada e completude metafórica.

Acima de tudo, todo ensaio deve decepcionar: para ser uma tentativa, o ensaio precisa ser exatamente o oposto de um julgamento em um tribunal. Ele precisa permanecer incompleto e abraçar essa grande incompletude com orgulho. Isso ocorre porque “a objeção corrente contra ele, de que seria fragmentário e contingente, postula por si mesma a totalidade como algo dado, e com isso a identidade entre sujeito e objeto, agindo como se o todo estivesse a seu dispor”5 5 NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma (pp.15-45). In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p. 27. . (Adorno, 2003: 27). É importante que abandonemos a ideia de que nossos ensaios são pequenos pedaços da totalidade.

Portanto, para uma escrita além das distinções, é preciso seguir o desejo do ensaio. Fragmente, abra-se, recuse-se a julgar! Mas: tome posição, empurre a lateral do objeto para virá-lo, impregne-o com outras vozes, desmembre-o – e, no processo, também se fragmente.

6. O ensaio como corpo?

Um bom ensaio não é, obviamente, todo fragmentação e incompletude. Há algo emergindo dele, um corpo discreto de pensamento. Na contracapa de seu livro Essayism (2017), um livro que me inspirou a pensar o processo de escrita, Brian Dillon escreve:

Imagine um tipo de escrita tão difícil de definir que seu próprio nome significa tentativa, esforço ou experiência. Uma forma antiga com um olho no futuro, um gênero equilibrado entre tradição e experimento. O ensaio quer acima de tudo vagar, mas também chegar à simetria e à completude; nutre os impulsos concorrentes de integridade e desordem, afeto e fragmentação, confissão e invenção.

Essa esquizofrenia de objetivos claramente de aparência não jurídica é o cerne de um ensaio: antigo e futuro, completude errante, um corpo de integridade emergente em meio a sua própria fragmentação. Este é, portanto, outro passo em direção a um ensaio que vai além das distinções: o ensaio deve emergir como um agente. A partir de suas palavras e frases, um corpo material precisa ser montado. Colocando de uma outra forma, precisamos entender que nossa escrita vive além de nossas intenções. É propensa a diferentes leituras, apropriações e mesmo apropriações indevidas. Está em um processo contínuo de transformação - e tudo bem.

Adorno (2003: 31) novamente: “No ensaio, elementos discretamente separados entre si são reunidos em um todo legível; ele não constrói nenhum andaime ou estrutura. Mas, enquanto configuração, os elementos se cristalizam por seu movimento”6 6 NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma (pp.15-45). In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p. 31. . A configuração nada mais é do que a muito elogiada consistência. Para ser pensado como um corpo material e um agente que interage e afeta a maneira como outros agentes (sendo o direito um deles, mas também advogados, estudiosos, outras disciplinas e o planeta como um todo), o ensaio precisa ter uma forma, um esboço, tanto figurativamente como em termos ensaísticos. Um tipo de organização que, em certa medida, se inscreve na ordem da completude e talvez da simetria. Todo corpo tem um contorno – esquecemos, no entanto, que esse contorno pode ser fluido e em constante mudança.7 7 Quão jurídicos são todos os corpos do direito, o corpora juris que pulsa com “texto, território e terror” (Goodrich, 2006: 33), sempre canalizado através de seções e parágrafos. Goodrich nos mostrou repetidamente como o texto é corpo e como o que parece ser uma mera textualidade legal é uma explosão corporal. Afinal, a matéria é inescapável.

Um ensaio digno desse nome, tentativa, é um corpo distinto que, no entanto, também faz parte de um corpo maior, um esforço coletivo para pensar e tornar o direito mais justo. Para isso, o ensaio deve se envolver com o espaço e o tempo de seu objeto: “[o ensaio] se aproxima tanto do aqui e agora do objeto, que este é dissociado nos momentos que o fazem vivo, em vez de ser meramente um objeto”8 8 NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma (pp.15-45). In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p. 32. (Adorno, 2003: 32). Dê vida ao objeto, pulverizando-o em zilhões de partículas de materialidade que afirmam a vida. A vida entrará no corpo do ensaio trazendo sua matéria à tona, mesmo que isso implique na desmontagem desse corpo, e em vinculá-lo a outras correntes de pensamento e ideias que podem não ser obviamente contíguas. Isso significa: aprofundar-se nos aspectos técnicos legais e estudar a maneira como as minúcias do direito se depositam em todos os aspectos da vida em espaços e tempos particulares. Ao mesmo tempo, não perca de vista a tarefa maior que um ensaio se propõe a cumprir: expor o poder coercitivo da direito e abraçar seu potencial transformador, fazer o direito e viver o direito como parte de nossas vidas neste único planeta que temos.

7. Quantos “eus” sou “eu?

Devo ser eu quando estou escrevendo? A questão não é mais se a escrita da pesquisa é capaz de apresentar fatos/verdades objetivas (não), ou se a inserção do “eu” (em termos de pronome e assunto) torna a coisa toda subjetiva (e, portanto, irrelevante ou, na melhor das hipóteses, parcial) (sim, não, e daí). A questão também não é se o direito pode ser abordada do ponto de vista do “eu” (sim) ou se o “eu” deve sublimar-se à “pessoa comum” (o que é isso).

A questão é, em vez disso, se o “eu” pode se afastar da atmosfera das antigas distinções, ou seja, bolhas de isolamento que decretam afiliação, público leitor, base de referência e editoras de publicação; e mover-se em direção a um corpo coletivo (do qual o ensaio faz parte) que tem os mesmos desejos que o autor.

Mais uma vez, e correndo o risco de simplificar, eu diria que o desejo de um corpo sócio-jurídico crítico, em um sentido mais amplo, é tornar o direito mais justo, independentemente de afiliações e modos de escrever. Distinções antigas podem ser zonas de conforto, locais de familiaridade e terrenos já testados. Mas isso não é um ensaio/tentativa. É preciso sair e buscar a identidade do desejo através de todo o espectro. Este é o corpo coletivo que importa.

A única maneira de fazer isso é permanecer pessoal ao escrever (para relembrar nossas, sábias, afinal, sugestões dos editores: “Como suas escolhas e resultados de pesquisa foram moldados por aspectos como sua localização como pesquisador e implicações/escolhas éticas?”). Mas podemos ir além: o corpo do autor deve se tornar o texto. Pois o que é a lei senão uma encarnação? Como o direito pode ser entendido, senão através dos corpos que fazem e desfazem, interpretam, resistem e ignoram a lei? E qual a melhor maneira de comunicar o que queremos dizer, se não através da comunidade de nossos corpos? Este é o caminho para alcançar o corpo mais amplo de desejo por um direito mais justo.

O “eu” nunca está isolado, mas sempre faz parte de uma coletividade mais ampla. O “eu” é múltiplo. Internamente, “o 'eu' está tanto contido quanto provisório – tão importante quanto ele é disperso”. (Dillon, 2017Dillon, Brian, Essayism, London: Fitzcarraldo, 2017 Grabham, Emily, Brewing Legal Times: Things, Form and the Enactment of Law, Toronto: University of Toronto Press, 2016.: 18). Nunca somos apenas um corpo, operando em um único cenário jurídico9 9 NT: “Cenário jurídico” é a tradução que propomos para o termo “lawscape”, cunhado por Andreas Philippopoulos-Mihalopoulos, que seria a junção de “direito” com “cenário” ou “paisagem”. Para mais informações sobre o conceito de “lawscape”, cf.: PHILIPPOPOULOS-MIHALOPOULOS, Andreas. Spatial Justice: Body, Lawscape, Atmosphere. Routledge: London, 2015. No Brasil, chegamos a propor o termo “parangolei” como um correlato desdobrado/transformado da palavra “lawscape”, cf.: REPOLÊS, Maria Fernanda et al. Parangolei: como o espaço e o tempo revestem os sentidos de constituição, delineamentos de pesquisa (pp. 157-179). In: CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade et al (Orgs.). Corpos e a Produção do Sensível (Série Políticas da Performatividade). Belo Horizonte: Conhecimento Livraria e Distribuidora, 2019. , em algum tipo de ilusão de permanência. Sempre somos múltiplos e dispersos. Mas essa dispersão, aparentemente uma fraqueza, pode ser agenciada estrategicamente. Use sua dispersão, espalhe-se horizontalmente, assuma posições minoritárias e liberte-se do pensamento que permitiu que o direito se distanciasse de seu contexto. E siga a mesma estratégia também textualmente: pense na descrição espessa de Bruno Latour sobre o Conselho de Estado (2009) e em sua atração gravitacional por detalhes aparentemente não jurídicos e sem importância. Essa dispersão deliberada, esse foco distraído, aquelas curiosidades do centro do palco: geralmente uma maneira eficaz de encarnar o corpo do direito (ver, por exemplo, Carr, 2016Carr, Helen, ‘Legal technology in an age of austerity: Documentation, 'functional' incontinence and the problem of dignity’, in Cowan, David and Wincott, D (eds) Exploring the 'Legal' in Socio-Legal Studies, London: Palgrave Macmillan, 2016.).

8. O que vem primeiro, a ideia ou a escrita?

Momento de um pouco de escultura: um bom entalhador não tenta dar a um pedaço de madeira uma forma predeterminada. Em vez disso, ela segue as ondas da madeira, permitindo que a forma surja de dentro de sua matéria. Deleuze e Guattari escrevem:

trata-se de seguir a madeira, e de seguir na madeira, conectando operações e uma materialidade, em vez de impor uma forma a uma matéria: mais que a uma matéria submetida a leis, vai-se na direção de uma materialidade que possui um nomos10 10 NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2, vol. 5. Tradução de Peter Pál Pelbart e Janice Caiafa. São Paulo: Editora 34, 1997, p. 90. (1997: 90).

O mesmo pode ser dito da escrita. Esquecemos regularmente que o texto também é material. Devemos respeitar a materialidade de nossos textos. Não podemos simplesmente impor nosso eu iluminado a eles. Ouvir os nomos (isto é, o interno, regras) da materialidade, em vez de impor a lei sobre a matéria significa: use a matéria (a madeira, o texto), não submetendo-a a uma lei (de estrutura e conclusão predeterminadas), mas permitindo através dele uma emergência.

Ouvir o objeto e suas condições de emergência é nossa maneira, como escritores, de encarnar as tensões, marcas e feridas do próprio objeto: sua opressão de gênero, sua exploração colonial, sua persuasão heteronormativa, sua força paternalista, sua exclusão racial, seu deslize de classe, seu reflexo sombrio de nossos próprios pequenos mundos.

Ouvir o texto parece ser exatamente o oposto da maneira como somos ensinados (e da maneira como ensinamos) a escrever. A menos que você saiba exatamente o que deseja dizer, nem comece. Volte para a pergunta. Mas como saber para onde o texto te levará antes mesmo que entremos nele? Como deixar para trás a atmosfera consumidora de preconceitos, se não ouvindo outra coisa, uma coisa diferente?

Em muitos aspectos, isso é semelhante à sugestão anterior de deixar a escrita respirar – mas com um acréscimo importante: o “eu” precisa ser deixado de lado por um momento. Perder o “eu” significa render-se totalmente ao texto e à sua lei, aceitar a vulnerabilidade, enfrentar nossa fragilidade perante o direito e tomar consciência dela. Efetivamente, enfrentar a vulnerabilidade significa tornar-se mais forte, conhecer o contexto e lidar com ele.

Depois que isso acontecer, o “eu” precisará ser restabelecido. É necessário para canalizar os elementos do texto, trazer consistência e vincular-se à multiplicidade da comunidade do “eu”. Na realidade, é claro, o “eu” nunca deixa o texto – apenas permite momentaneamente uma prioridade diferente. Esse “eu”, agora coletivo, imerso no texto, retorna e assume sua responsabilidade.

9. A responsabilidade de escrever além das distinções

Neste ponto, como um resumo antes de passar para a parte final do texto, gostaria de oferecer uma lista de etapas sugeridas para escrever além das distinções com base precisamente nessas distinções. Esses não são apenas pronunciamentos de “o que se deve fazer”, mas lições emergentes da literatura atual que tenta fazer exatamente isso, ou seja, escrevem além das distinções padronizadas e passam para terrenos pouco conhecidos do pensamento sobre o direito. Geralmente, é uma literatura mais material, incorporada e espacializada, que costuma ser de persuasão feminista, queer ou ecológica.

Então, com as escusas pela inevitável violência da generalização:

  1. a

    escrever além das distinções não é ignorar as distinções, mas envolver-se ativamente com elas e questionar sua relevância o tempo todo.

  2. b

    a primeira distinção que precisa ser enfrentada é aquela entre o posicionamento crítico e sociolegal. Em sua versão mais pobre, essa distinção se refere à teoria versus estudos empíricos. Na sua forma mais sutil – e mais próxima da realidade –, essa distinção é sobre a maneira pela qual nossos escritos entram no mundo: um abraço ao potencial transformador do direito e uma problematização das desigualdades inerentes ao direito, e um agenciamento de uma frente comum, tanto teórica quanto empiricamente engajada, contra os vários desafios que estamos enfrentando.

  3. c

    a segunda distinção que precisa ser enfrentada é aquela entre texto e contexto. É importante que entendamos o direito como material, incorporado e espacializado, e não apenas como textual, abstrato e histórico. É ainda importante lembrar que o texto participa da materialidade, é em si material. Um método de escrita que utiliza o “eu”, semântico e experimental, encarna a concretização do direito. A agência (jurídica) é uma composição do material e do discursivo e, nesse sentido, um ensaio que se envolve com ambos pode ser pensado como agente (jurídico) em si mesmo. Como agente jurídico, o ensaio deve se desdobrar, guiado por sua própria materialidade (incluindo seu desejo ocasional de permanecer incompleto e, portanto, decepcionante) e não apenas pela intenção do autor.

  4. d

    a terceira distinção é entre tecnicismos jurídicos e vida (veja também a seção a seguir). A natureza incorporada do direito significa que não há matéria sem direito e direito sem matéria. As distinções jurisprudenciais usuais entre normas/regras/leis são de uso limitado quando se trata de pensar o direito como um espectro. A contribuição de outras disciplinas, como antropologia, sociologia, geografia e assim por diante, é inestimável para repensar essa distinção.

  5. e

    a quarta distinção é aquela entre escrever e a ideia de escrever. É importante, é claro, ter posições fortes e ideias concretas ao começar a escrever. É muito importante expressá-las de maneira sucinta e clara. Ao mesmo tempo, no entanto, não devemos lidar com o texto de maneira adversarial, o tipo de coisa que deve ser combatida e conquistada para expressar nossas ideias. É necessário permitir que um texto se desdobre criativamente, sem a vigilância constante de nossas ideias preconcebidas e bem pesquisadas. Um texto precisa perambular para descobrir a si mesmo e as ideias (as que pensávamos ter e outras que não esperávamos) enquanto está sendo escrito.

  6. f

    a quinta distinção: o “eu” individual e o coletivo. Cada “eu” é múltiplo. Sempre faz parte de um corpo maior, o de uma coletividade que compartilha o mesmo desejo. A escrita do “eu” precisa ser totalmente pessoal e, ao mesmo tempo, ciente da conexão com outros “eus” que desejam que o direito se torne mais justo.

  7. g

    a sexta distinção é aquela entre direito e justiça.

Eu costumava desprezar marcadores ou listas de qualquer tipo quando os encontrava em um ensaio. Eles interrompiam o fluxo e introduziam um movimento staccato que geralmente não tinha nada a ver com a maneira como eu queria que o resto do texto fosse lido. Talvez eles fossem para mim um pouco daquela tradição doutrinária do texto seco da lei, um pouco teológico demais.

Recentemente, no entanto, comecei a listar as coisas. Comecei a apreciar o ritmo de leitura da respiração suspensa. Eu senti um senso de humor na promessa de completude, e de fato de educação, instrução mesmo, em termos de 1. 2. 3., seções e parágrafos, essa forma arquetipicamente jurídica. Talvez, pensei, estou me aproximando daquilo que todos parecem pensar que é o direito. Mas a brincadeira que eu achei mais atraente não era a promessa (até subversiva) de completude, mas exatamente o oposto. Dillon (2017Dillon, Brian, Essayism, London: Fitzcarraldo, 2017 Grabham, Emily, Brewing Legal Times: Things, Form and the Enactment of Law, Toronto: University of Toronto Press, 2016.: 27) coloca bem: “A lista, se estiver fazendo seu trabalho, sempre deixa algo a ser inventado ou lembrado, algo esquecido no momento de sua criação... algo a desejar”. Esse espaço de “desejar” também é o espaço de outros desejos que perturbam nossos melhores planos e um momento vanitatis de nossa suprema ilusão, também muito jurídica, que podemos listar e conter tudo ordenadamente.

Senti outra atração divertida pelas listas, que marcava uma outra ilusão. Dillon (2017Dillon, Brian, Essayism, London: Fitzcarraldo, 2017 Grabham, Emily, Brewing Legal Times: Things, Form and the Enactment of Law, Toronto: University of Toronto Press, 2016.: 24) novamente: “a aparição de uma lista em uma peça de prosa narrativa ou polêmica introduz – mais ou menos violentamente – uma verticalidade repentina no fluxo horizontal do texto”. Essa verticalidade, um sinal habitual de hierarquia autoral e anúncio oficial (Braverman, 2016a), estava brincando diretamente com meu próprio senso de autoridade como autor, sobre o qual nunca tive particularmente uma grande opinião ('morte do autor' etc.). Então comecei a apreciar o constrangimento com que aquele polo vertical de 1. 2. 3. se projetava em algum tipo de autoafirmação hipermasculina da horizontalidade e, ocasionalmente, até deliberadamente poética, seja o que for, no fluxo de alguns dos meus textos, lembrando um mastro do naufrágio saindo de um mar plano. As listas se tornaram minha própria nota de rodapé para a autoridade estranha que deveríamos sentir quando escrevemos ensaios sobre direito, destinados a instruir, educar, transformar, ajudar.)

10. Qual era mesmo a distinção final?

Escrever, das maneiras que tentei discutir até agora, é um experimento, potencialmente de exposição pessoal, pisando em um terreno incerto entre e acima das disciplinas, mergulhando em aspectos técnicos legais e ainda conhecedor da teoria, experimentando formatos, estruturas e instruções dadas, e em geral, contestando o direito, não apenas em termos de conteúdo, mas também em termos de formato do texto. A lei do texto ainda é uma lei: como escrever um texto jurídico geralmente é um exercício de diagramação depois que a pesquisa é concluída. Mas essa é apenas a lei que estamos acostumados a seguir – a lei que os revisores de periódicos exigem (mas quem são os revisores, se não nós), que os painelistas do Research Excellence Framework no Reino Unido desejam ler (e novamente, quem são eles se não nós), que os comitês internos de nossas universidades esperam e pedem explicitamente. Mas uma coisa devemos entender: que o direito não existe fora de nós mesmos, nossos olhos que leem e nossos dedos que digitam nossas críticas. Da próxima vez que pedirmos mais “consistência”, vamos pensar um pouco sobre o motivo de pedirmos isso. Não estamos incorporando uma lei (a lei da ortodoxia textual) que serve a uma técnica disciplinar específica e a um fechamento disciplinar que vai contra tudo o que realmente está acontecendo? Não apenas “lá fora” na vida “real”, mas também no direito: qualquer pessoa que tenha participado de um julgamento saberá que o direito é sempre um desvio interdisciplinar, passando da história à geografia, da biologia à psicologia, da economia à ética, da ciência aos estudos de mídia, dos estudos de gênero à teoria da raça (para citar apenas alguns exemplos), e tudo isso muitas vezes no âmbito de um único argumento.

Como escritores, precisamos fazer justiça à lei do ensaio. Precisamos permitir que ela revele as coisas que a ortodoxia, para recordar Adorno, quer manter invisível.

Montaigne, como vimos, acreditava que o direito não pode gerar justiça. No entanto, sabemos o contrário. Vimos, repetidamente, direitos entregando algo semelhante à justiça, que pode ser paz, fechamento psicológico, pertencimento, acesso ao que é importante para nós, e assim por diante. Vimos, no entanto, também que, muitas vezes, o direito não produz justiça – pelo contrário, fica do lado dos fundamentalmente injustos e serve como uma ferramenta de opressão. Ou talvez o que o direito promova seja justiça apenas no nome e, na prática, seja uma vitória amarga para todos os envolvidos. Isso, no entanto, não interrompe o continuum entre direito e justiça. Examinamos o direito para oferecer algo que parece justo; que tenta garantir que os mesmos crimes não voltem a acontecer; que as pessoas saberão o que podem reivindicar e terão o poder de reivindicá-lo. Nós escrevemos sobre essas instâncias porque elas são importantes.

Uma maneira de restabelecer nossa fé na conexão entre direito e justiça é ter um pé na realidade (criticar a lei, ser severo com suas falhas, detectar suas desigualdades fundamentais) e o outro pé na, em termos gerais, utopia (abraçar o potencial transformador da lei, ver seu poder retórico e real, pensar teoricamente sobre sua posição em relação ao resto do mundo, considerar o planeta em tudo que pensamos e fazemos). A lei que faz justiça não é uma garantia; nem também é uma utopia. A própria justiça não é utópica. Pelo contrário, a justiça está aqui – mas precisamos nos abrir à possibilidade de ver sua conexão com o direito e incentivá-la.

A justiça tem sido considerada um palavrão, especialmente em alguns círculos sócio-legais que já estavam fartos com as impossibilidades de desconstrução e a conversa confusa sobre as coisas por vir. Mas precisamos tirar a justiça de sua camada messiânica e focar em sua emergência cotidiana como algo que realmente ocorre. A justiça é um pouco mais que um posicionamento ético com relação às questões que temos em mãos – como escreve Jane Bennett (2010), é nossa responsabilidade afastar-se de agenciamentos nocivos que comprometam nossa ética. É isso que é ética: uma retirada e uma subsequente atenuação de agenciamentos nocivos, uma mudança para agenciamentos que têm o potencial de fazer justiça. Depois disso, nossa responsabilidade como escritores além das distinções não é apenas retirar-se e resistir a agenciamentos problemáticos, causando sua desestabilização; mas também abraçar esses momentos éticos em que a justiça emerge.

Ainda assim, não há descanso final para um escritor. Ao tornar algumas coisas visíveis, outras necessariamente se tornam invisíveis. O ensaio constrói sua própria atmosfera de controle, reunida pelo desejo coletivo da escrita dos “eus” continuarem (criticando, construindo, transformando, analisando). A heresia também pode se tornar ortodoxia. É difícil se afastar disso. É lamentavelmente confortável, é o que o REF (Exercício de Avaliação de Pesquisa das Universidades Britânicas) quer, é o que os leitores esperam e assim por diante. Mas, nesses momentos, quando o “eu” começa a ficar muito confortável, o “eu” precisa retornar e começar a ensaiar/tentar.

É aí que a lei do texto gera justiça: quando o texto nunca repousa e sempre são reveladas mais invisibilidades, especialmente as que foram geradas por nossas heresias anteriores e bem-intencionadas. É por isso que nossos textos não nos pertencem, mas aos leitores que veem as invisibilidades de nossos textos. O ensaio nunca deve descansar, o “eu” nunca deve ficar complacente. Esta não é uma estratégia de choque ou um esquema de marketing para manter seus leitores lendo. Essa é, simplesmente, nossa responsabilidade.

Leitura adicional

Em termos de redação interdisciplinar além das distinções, consulte:

Entre uma infinidade de excelentes trabalhos, alguns exemplos de redação jurídica além de distinções são:

  • * Este texto é uma tradução a partir do original “Writing beyond distinctions” de Andreas Philippopoulos-Mihalopoulos que foi publicado em um capítulo do “Routledge Handbook of Socio-Legal Theory and Methods”, editado por Naomi Creutzfeldt; Marc Mason e Kirsten McConnachie em 2019. O autor destaca que este texto é uma versão parcialmente extraída do texto de 2018 “To Have To Do With The Law: An Essay” – uma escrita consciente sobre o processo da escrita e sua primeira tentativa etnográfica.
  • 1
    Nota dos Tradutores (NT): a tradição da literatura jurídica brasileira consagra uma divisão entre a grafia de Direito com “d” maiúsculo, que designaria o direito objetivo, isto é, o sistema jurídico, e o direito com “d” minúsculo, que designaria o direito subjetivo. Entretanto, o presente texto não faz essa distinção ao entender o direito como matéria, um espectro normativo que está além da cisão entre “objetivo” e “subjetivo”. Portanto, mantivemos a grafia de direito com “d” minúsculo, que possui um sentido próprio – ao mesmo tempo em que banaliza a ideia de direito – e que se desenvolve ao longo do texto e obra de Andreas Philippopoulos-Mihalopoulos.
  • 2
    NT: Optamos nesta tradução por priorizar, quando disponível, as traduções já consagradas para o português dos textos de livros citados. Quando não houver menção dos tradutores em relação às citações é porque não há edição do livro em português e, portanto, realizamos uma tradução livre. No caso da presente citação existe tradução para o português, cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma. In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p.45.
  • 3
    “A sala de audiência não apenas simbolizava a independência entre o direito e o espaço político, comercial e social; mas servia para restringir o acesso, limitar o vandalismo, minimizar a interrupção do julgamento e, talvez acima de tudo, incentivar a deferência à administração da justiça em uma sociedade democrática perpetuamente preocupada com a autoridade da lei e dos advogados.” (Spaulding, 2012Spaulding, Norman, ‘The Enclosure of Justice: Courthouse Architecture, Due Process, and the Dead Metaphor of Trial’, 24 Yale Journal of Law & Humanities 311, 2012.: 316).
  • 4
    NT: na língua inglesa há um jogo de palavras, intraduzível de forma direta para o português, entre “trial” como julgamento de um tribunal e “trial” como tentativa e ensaio.
  • 5
    NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma (pp.15-45). In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p. 27.
  • 6
    NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma (pp.15-45). In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p. 31.
  • 7
    Quão jurídicos são todos os corpos do direito, o corpora juris que pulsa com “texto, território e terror” (Goodrich, 2006: 33), sempre canalizado através de seções e parágrafos. Goodrich nos mostrou repetidamente como o texto é corpo e como o que parece ser uma mera textualidade legal é uma explosão corporal. Afinal, a matéria é inescapável.
  • 8
    NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: ADORNO, Theodor W. O ensaio como forma (pp.15-45). In: ADORNO, Theodor W. Notas de Literatura. Tradução Jorge de Almeida. São Paulo: Editora 34, Coleção Espírito Crítico, 2003, p. 32.
  • 9
    NT: “Cenário jurídico” é a tradução que propomos para o termo “lawscape”, cunhado por Andreas Philippopoulos-Mihalopoulos, que seria a junção de “direito” com “cenário” ou “paisagem”. Para mais informações sobre o conceito de “lawscape”, cf.: PHILIPPOPOULOS-MIHALOPOULOS, Andreas. Spatial Justice: Body, Lawscape, Atmosphere. Routledge: London, 2015. No Brasil, chegamos a propor o termo “parangolei” como um correlato desdobrado/transformado da palavra “lawscape”, cf.: REPOLÊS, Maria Fernanda et al. Parangolei: como o espaço e o tempo revestem os sentidos de constituição, delineamentos de pesquisa (pp. 157-179). In: CATTONI DE OLIVEIRA, Marcelo Andrade et al (Orgs.). Corpos e a Produção do Sensível (Série Políticas da Performatividade). Belo Horizonte: Conhecimento Livraria e Distribuidora, 2019.
  • 10
    NT: Utilizamos, nesta tradução, a versão em português do texto citado. Cf.: DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia 2, vol. 5. Tradução de Peter Pál Pelbart e Janice Caiafa. São Paulo: Editora 34, 1997, p. 90.
  • Versão original:Philippopoulos-Mihalopoulos, Andreas. Writing Beyond Distinctions. In: Creutzfeldt, N., Mason, M. and McConnachie, K. (eds.). Routledge Handbook of Socio-Legal Theory and Methods. London: Routledge, 2019.
    Tradução Maria Fernanda Salcedo RepolêsUniversidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: mfrepoles@ufmg.brIgor Campos VianaUniversidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil. E-mail: icamposviana@gmail.com

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Abr 2022
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2022

Histórico

  • Recebido
    18 Dez 2020
  • Aceito
    13 Jan 2021
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