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Hábitos alimentares: que alimentos consomem as crianças dos 12 aos 36 meses?

RESUMO

Objetivo:

identificar os hábitos alimentares dos toddlers.

Método:

estudo transversal de análise quantitativa, com amostra de 808 toddlers que frequentavam creches do distrito de Viseu, Portugal, entre novembro de 2018 e setembro de 2019. Realizou-se coleta de dados com um questionário direcionado aos pais.

Resultados:

a prevalência de crianças que diariamente realizavam seis refeições era de 42,8%, e 42,5%, as que realizavam cinco refeições. Constatou-se que 2,0% das crianças consumia chocolates, 1,0%, sobremesas doces, e 0,4%, bebidas gaseificadas, diariamente. Em média, o consumo de laticínios (M=5,61; DP=2,62) e de carnes/peixes/ovos (M=4,80; DP=3,57) era superior ao recomendado, enquanto o consumo de gorduras (M=0,48; DP=0,40), leguminosas (M=0,49; DP=0,45), vegetais (M=1,18; DP=0,87) e de água (M=0,51; DP=0,29) era inferior.

Conclusões:

verificou-se um consumo superior ou inferior ao recomendado para alguns alimentos, salientando a necessidade de implementação de programas de intervenção de enfermagem que visam promover hábitos alimentares saudáveis nos toddlers e famílias.

Descritores:
Alimentos; Criança; Creches; Hábitos Alimentares; Enfermagem

ABSTRACT

Objective:

to identify toddlers’ eating habits.

Method:

a cross-sectional study of quantitative analysis, with a sample of 808 toddlers who attended day care centers in the district of Viseu, Portugal, between November 2018 and September 2019. Data were collected using a questionnaire directed at parents.

Results:

the prevalence of children who ate six meals a day was 42.8%, and 42.5%, those who ate five meals. It was found that 2.0% of children consumed chocolates, 1.0%, desserts, and 0.4%, carbonated beverages, daily. On average, dairy product (M=5.61; SD=2.62) and meat/fish/egg (M=4.80; SD=3.57) consumption was higher than recommended, while fat (M=0.48; SD=0.40), legume (M=0.49; SD=0.45), vegetable (M=1.18; SD=0.87) and water (M=0 .51; SD=0.29) consumption was lower.

Conclusions:

there was a higher or lower consumption than recommended for some foods, highlighting the need to implement nursing intervention programs aimed at promoting healthy eating habits in toddlers and families.

Descriptors:
Child; Child Day Care Centers; Eating Habits; Food; Nursing

RESUMEN

Objetivo:

identificar los hábitos alimentarios de los niños pequeños.

Método:

estudio transversal con análisis cuantitativo, con una muestra de 808 niños pequeños que asistieron a guarderías en el distrito de Viseu, Portugal, entre noviembre de 2018 y septiembre de 2019. La recopilación de datos utilizó un cuestionario dirigido a los padres.

Resultados:

la prevalencia de niños que hacían seis comidas al día fue de 42,8%, y de 42,5%, los que hacían cinco comidas. Se encontró que el 2,0% de los niños consumía chocolates, el 1,0% postres dulces y el 0,4% bebidas carbonatadas diariamente. En promedio, el consumo de productos lácteos (M=5,61; DE=2,62) y carne/pescado/huevos (M=4,80; DE=3,57) fue superior al recomendado, mientras que el consumo de grasas (M=0,48; DE=0,40), legumbres (M=0,49; DE=0,45), hortalizas (M=1,18; DE=0,87) y agua (M=0,51; DE=0,29) fue menor.

Conclusiones:

hubo un consumo superior o inferior al recomendado para algunos alimentos, destacando la necesidad de implementar programas de intervención de enfermería dirigidos a promover hábitos alimentarios saludables en los toddles y las familias.

Descriptores:
Alimentos; Enfermería; Guarderías Infantiles; Hábitos Alimentarios; Niño

INTRODUÇÃO

Os toddlers - crianças entre os 12 e os 36 meses - abrangem uma faixa etária particularmente desafiante do ponto de vista alimentar e do estado nutricional. Nessa fase, as mudanças inerentes ao desenvolvimento se relacionam diretamente com a ingestão nutricional.

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a obesidade mantém-se uma preocupação atual, sendo considerada a “epidemia do século XXI”(11 Merino-Godoy MÁ, Moreno-Sánchez E, Gago-Valiente FJ, et al. An App about Healthy Habits as an Educational Resource during the Pandemic. Healthcare. 2022;10(148):2-12. https://doi.org/10.3390/healthcare10010148
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). É um problema a se valorizar, considerando o perigo que representa para a qualidade de vida das pessoas. Nesse sentido, afigura-se primordial implementar ações políticas e educativas que visem atenuar esse problema. Através da educação para a saúde, tenta aumentar-se a informação sobre alimentação saudável na população, incidindo nas crianças e suas famílias(22 Fernandes CSG. Educar para a adoção de hábitos de vida saudáveis: uma estratégia de prevenção da obesidade infantil [Dissertação][Internet]. Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra: Coimbra 2018 [cited 2022 Feb 23]. Available from: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/21950/1/CARLA_FERNANDES.pdf
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). O papel do enfermeiro sobressai como veículo de informação compreensível e simultaneamente rigorosa, promovendo um crescimento e desenvolvimento adequados da criança e uma tomada de decisão consciente dos pais(33 Diogo PM, Freitas BH, Costa AI, Gaíva MAM. O cuidar em enfermagem pediátrica na perspectiva das emoções: de Nightingale à atualidade. Rev Bras Enferm. 2021;74(4):e20200377. https://doi.org/10.1590/0034-7167-2020-0377
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). Na educação para a saúde, desenvolvida nas consultas de saúde infantil e com foco nos pais, os enfermeiros assumem um papel fundamental, ao promoverem a capacitação e possibilitarem às famílias a aquisição de habilidades e competências que visem atender às necessidades da criança. Muitas dessas crianças passam longos períodos na creche. Embora a gestão dos refeitórios siga as orientações nutricionais da Direção Geral da Educação, levando em consideração os constituintes das refeições, das ementas e dos alimentos autorizados(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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), os educadores de infância também devem ser considerados foco de atuação dos enfermeiros, uma vez que também desempenham um papel importante no desenvolvimento de hábitos alimentares saudáveis entre as crianças pequenas.

A literatura e a evidência científica têm vindo a demonstrar que a obesidade infantil é um problema sócio-sanitário, influenciado por fatores de risco não modificáveis (fatores genéticos) e por outros fatores sobre os quais se pode e deve agir (hábitos alimentares pouco saudáveis, inatividade física, ou estilo de vida individual e familiar)(11 Merino-Godoy MÁ, Moreno-Sánchez E, Gago-Valiente FJ, et al. An App about Healthy Habits as an Educational Resource during the Pandemic. Healthcare. 2022;10(148):2-12. https://doi.org/10.3390/healthcare10010148
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,55 Koletzko B, Brands B, Grote V, Early Nutrition Programming Project. Long-Term Health Impact of Early Nutrition: the power of programming. Ann Nutr Metab. 2017;70(3):161-9. https://doi.org/10.1159/000477781
https://doi.org/10.1159/000477781...
-66 Zalewski BM, Patro B, Veldhorst M, Kouwenhoven S, Escobar PC, Lerma JC, et al. Nutrition of infants and young children (one to three years) and its effect on later health: a systematic review of current recommendations (EarlyNutrition project). Crit Rev Food Sci Nutr. 2017;57(3):489-500. https://doi.org/10.1080/10408398.2014.888701
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). Em Portugal, a Direção Geral da Saúde (DGS) afirma que “a esta influência precoce da alimentação na expressão futura da saúde chama-se “programação”, que, como se depreende, não é apenas metabólica, mas também comportamental”(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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). A inadequada alimentação nos toddlers pode ter consequências que se prolongam na idade adulta. A patogênese de várias doenças, como a doença cardiovascular, a obesidade, o diabetes mellitus, algumas formas de cancro, as doenças respiratórias crônicas e condições músculo-esqueléticas, tem estado associada, entre outros fatores, a doenças maternas e a uma alimentação infantil deficitária(66 Zalewski BM, Patro B, Veldhorst M, Kouwenhoven S, Escobar PC, Lerma JC, et al. Nutrition of infants and young children (one to three years) and its effect on later health: a systematic review of current recommendations (EarlyNutrition project). Crit Rev Food Sci Nutr. 2017;57(3):489-500. https://doi.org/10.1080/10408398.2014.888701
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).

Nos primeiros 1.000 dias de vida, período desde a concepção até o término do segundo ano, há uma grande vulnerabilidade face às influências do meio ambiente. É um período único de oportunidades para se estabelecerem as bases para uma boa saúde(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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-55 Koletzko B, Brands B, Grote V, Early Nutrition Programming Project. Long-Term Health Impact of Early Nutrition: the power of programming. Ann Nutr Metab. 2017;70(3):161-9. https://doi.org/10.1159/000477781
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), e a alimentação desempenha um papel determinante na evolução biológica e no desenvolvimento da criança. As recomendações nutricionais constituem valores de referência, em termos de energia e de nutrientes, estimados para indivíduos saudáveis. A DGS(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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) considera que as recomendações da European Food Safety Authority (EFSA) são as mais atuais e as mais apropriadas à população pediátrica portuguesa.

Nos primeiros anos de vida, como em todos os restantes períodos do ciclo vital, a qualidade da alimentação deve predominar sobre a quantidade de alimentos, sendo expetável que, em condições normais, o apetite da criança regule a quantidade. A variedade de sabores deve ser uma preocupação a manter constante ao longo dos primeiros anos da criança, incidindo em alimentos saudáveis, restringindo até aos 12 meses de idade alimentos ricos em açúcar, gorduras de má qualidade, sal e alimentos processados e consumindo-os posteriormente com moderação. A Roda da Alimentação Mediterrânica é um excelente guia para o que se deve oferecer às crianças(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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).

Atualmente, sabe-se que a prevalência do excesso de peso aumenta com a idade após os cinco anos, mas, de acordo com Rodriguez-Martinez e colaboradores(77 NCD Risk Factor Collaboration (NCD-RisC). Height and body-mass index trajectories of school-aged children and adolescents from 1985 to 2019 in 200 countries and territories: a pooled analysis of 2181 population-based studies with 65 million participants. Lancet. 2020:396(10261):1511-24. https://doi.org/10.1016/s0140-6736(20)31859-6
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), são escassos os estudos que mostrem padrões de idade na prevalência de excesso de peso em crianças menores de cinco anos. Percebe-se, assim, a importância de estudar essa faixa etária, valorizando o potencial desta etapa para a promoção da saúde e a aquisição de hábitos de vida saudáveis, apresentando-se como um fator primordial ao nível da melhoria da saúde futura da população.

OBJETIVO

Identificar os hábitos alimentares das crianças entre os 12 e os 36 meses.

MÉTODO

Aspectos éticos

Este estudo é parte de uma investigação, no âmbito do programa doutoral, e teve o parecer favorável da Comissão de Ética (CETI) do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto, bem como dos responsáveis pelas creches envolvidas. Todos os pais assinaram um Termo de Consentimento Informado.

Desenho, local do estudo e período

Estudo exploratório de análise quantitativa, descritivo, em coorte transversal, realizado em Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) e creches privadas do distrito de Viseu, Portugal, entre novembro de 2018 e setembro de 2019. A coleta de dados ocorreu em 62 IPSS e em 6 creches privadas.

O estudo foi construído de acordo com a ferramenta STrengthening the Reporting of OBservational studies in Epidemiology (STROBE).

Amostra, critérios de inclusão e exclusão

Amostra foi não probabilística por conveniência. Foram selecionadas todas as crianças, dos 12 aos 36 meses, que à epoca frequentavam as IPSS e as creches privadas do distrito de Viseu, Portugal. A amostra foi estimada considerando um nível de confiança de 95% e uma margem de erro de 3% (Intervalo de Confiança, IC), sendo o seu tamanho (amostra teórica), de 701 participantes, considerado adequado, acrescentando-se 10% para falhas.

Incluiram-se no estudo crianças com idade entre os 12-36 meses, que não sofressem de doenças genéticas ou crônicas passíveis de interferir diretamente no seu estado nutricional, cujos pais aceitassem participar no estudo.

Foram entregues 2.036 questionários, obtendo-se uma amostra final de 808 toddlers, correspondente a 40% dos participantes.

Protocolo do estudo

O questionário englobava questões que permitiam recolher informação sobre os dados sociodemográficos dos pais e das crianças, dados antropométricos e clínicos das crianças e dados sobre a diversidade e a frequência alimentar das crianças. As questões sobre a frequência alimentar resultaram de uma adaptação do “Questionário de Frequência Alimentar e Hábitos Saudáveis dirigido a crianças dos 3 aos 7 anos”(88 Rito A. Questionário de frequência alimentar e hábitos saudáveis, dirigido a crianças dos 3 aos 7 anos. Plataforma contra a Obesidade. Direção-Geral da Saúde. 2007.). Os dados antropométricos foram recolhidos mediante consulta do Boletim de Saúde Infantil e Juvenil de cada criança. Recorreu-se à calculadora antropométrica da OMS (WHO Anthro v3.2.2), para calcular o percentil de IMC de cada criança, com base nos seus valores de peso e de comprimento.

Os dados referentes à frequência alimentar foram obtividos por questões abertas sobre a quantidade de consumo diário, habitual, de alimentos constituintes de cada um dos grupos da Roda da Alimentação Mediterrânica. Sobre a frequência do consumo de determinados alimentos doces e salgados, utilizou-se uma escala Likert.

Para que o instrumento atendesse à exigência de precisão e rigor, foi importante realizar um pré-teste, aplicando-se o instrumento a um grupo alvo de 30 pais, com características semelhantes à amostra em estudo, tendo-lhes sido explicado o objetivo do pré-teste. No final dessa etapa, foram alteradas algumas questões, de modo a facilitar o preenchimento e a compreensão, como a profissão dos pais, a idade da criança à entrada na creche, a ingestão de café da manhã antes de ir para a escola e a quantidade de ovos ingerida.

A intervenção ocorreu em duas fases distintas. A primeira decorreu apenas no concelho Viseu, que, na época, possuía um total de 40 creches. Apenas 29 creches (72,5%) aceitaram participar no estudo. Foram entregues 980 questionários, o equivalente ao número de crianças com idade entre 12 e 36 meses que frequentavam as creches. Foram recolhidos 396 e validados 386, traduzindo um percentual de 39,38% do total dos participantes. Devido ao tamanho da amostra obtida, seguiu-se uma segunda fase, alargando-se o estudo a todo o distrito de Viseu, que englobava um total de 54 creches. Aceitaram a participar mais 39 creches, onde foram distribuídos 1.056 questionários, dos quais foram recolhidos 432 e validados 422, ou seja, 39,96% dos questionários distribuídos nessa segunda fase.

Análise dos resultados e dados estatísticos

Os dados foram processados com recurso ao IBM Statistical Package for the Social Sciences (SPSS), versão 25. A estatística descritiva possibilitou determinar as frequências absolutas e percentuais, algumas medidas de tendência central, nomeadamente as médias e as medidas de dispersão, como a amplitude de variação, o coeficiente de variação e o desvio padrão, bem como as medidas de forma, como assimetria e achatamento. Quanto à análise bivariada, utilizaram-se o Teste Qui-Quadrado e o Teste de Fisher-Freeman-Halton, aplicando-se o teste da percentagem residual (resíduos ajustados). Em toda a análise, a significância estatística foi aceita para valores de p < 0,05 e residuais ajustados ≥1,96.

RESULTADOS

A amostra foi constituída de 808 toddlers (46,5% com 12-23 meses; 44,1% com 24-35 meses; 9,4% com 36 meses). A idade das mães variou entre 16 e 47 anos (M=33,44; DP=5,03 anos), e a dos pais, entre 17 e 72 anos (M=35,53; DP=5,87 anos). Maioritariamente, os pais e as mães tinham idades entre 25 e 45 anos (adulto jovem) (91,3% vs. 94,8%, respetivamente). Em relação à escolaridade, 53,7% dos pais tinham o ensino secundário, e 46,9% das mães, o ensino superior. Na maioria dos casos, pais e mães encontravam-se empregados (92,6% vs. 85,6%, respetivamente). A maioria das crianças (85,8%) vivia em uma família nuclear.

Hábitos alimentares

A análise estatística, relativamente ao número de refeições realizadas por dia pelas crianças, evidenciou um mínimo de quatro e um máximo de sete refeições diárias, correspondendo à média de 5,39 refeições (DP=0,74 refeições). Constatou-se a prevalência de crianças que realizavam seis (42,8%) ou cinco refeições diárias (42,5%). Salienta-se que 11,1% das crianças efetuavam quatro refeições por dia, fato verificado sobretudo na faixa etária entre 24-35 meses (13,8%). Não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas entre o número de refeições diárias, em função da idade das crianças (Tabela 1).

Tabela 1
Número de refeições realizadas pelas crianças, por dia, em função da idade, em Viseu, Portugal, 2018-2019

Realizou-se a análise da frequência de consumo de determinados alimentos não saudáveis. Como se verifica na Tabela 2, 39,2% das crianças não comiam chocolates, 34,5% não comiam sobremesas, 78,0% não ingeriam fast food e 88,4% não ingeriam bebidas com gás. Todavia, uma vez por semana, 26,1% delas comiam chocolates, 22,9%, sobremesas, 1,4%, fast food, e 3,3%, bebidas com gás. Ocorria, ainda, um consumo diário de chocolates por 2,0% das crianças, de sobremesas, por 1,0%, e de bebidas com gás, por 0,4% das crianças.

Tabela 2
Frequência de consumo de determinados alimentos pouco saudáveis pelas crianças em Viseu, Portugal, 2018-2019
Tabela 3
Frequência de ingestão de alimentos pouco saudáveis em função do percentil do Índice de Massa Corporal das crianças em Viseu, Portugal, 2018-2019

Sabendo-se que a obesidade é, frequentemente, consequência de uma má alimentação, procuramos a relação entre o consumo desses alimentos e o percentil de Índice de Massa Corporal (IMC) da criança. Para a análise dos dados, a variável foi recodificada em: consumo semanal, que englobava todos os dias, uma vez por semana e duas ou mais vezes por semana; e consumo esporádico, que incluía uma vez por mês e duas ou mais vezes por mês, excluindo-se os que não consumiam esses produtos. Não foram encontradas associações estatisticamente significativas entre as variáveis em estudo. No entanto, observou-se que 21,0% das crianças com excesso de peso comiam chocolates (21,4% semanalmente e 19,9% esporadicamente), tal como 9,6% das crianças com obesidade (9,4% semanalmente e 9,9% esporadicamente). Em relação ao consumo de sobremesas, 21,4% das crianças com excesso de peso e 12,0% daquelas com obesidade o faziam semanalmente. O fast food era consumido por crianças com excesso de peso (22,5%) e com obesidade (10,1%). Quanto à ingestão de bebidas com gás, verificou-se que 26,6% das crianças que o faziam apresentavam excesso de peso e 14,9% obesidade (Tabela 3).

De acordo com o consumo diário adequado para crianças entre 12 e 36 meses de idade, recomendado pela DGS(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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) para cada um dos grupos de alimentos da Roda da Alimentação Mediterrânica, apurou-se um valor máximo mais significativo (26 porções) para o grupo dos laticínios (M=5,61; DP=2,62 porções), seguido do grupo de carnes/peixes/ovos (24,43 porções) com uma média de 4,80 (DP=3,57 porções). Os valores mais baixos encontraram-se, em média, no consumo de gorduras (M=0,48; DP=0,40 porções), de leguminosas (M=0,49; DP=0,45 porções) e de água (M=0,51; DP=0,29 porções). Salienta-se que, em todos os grupos da roda, existiam crianças que não consumiam alimentos dos mesmos (Tabela 4).

Tabela 4
Ingestão de porções de alimentos de cada grupo da Roda da Alimentação Mediterrânica em Viseu, Portugal, 2018-2019

Com o intuito de verificar a relação entre a idade da criança e a porção de alimentos ingerida, realizou-se o Teste Qui-Quadrado. Os resultados (Tabela 5) evidenciam que a maioria das crianças mais novas (61,7%) come cereais abaixo do recomendado, assim como grande parte (47,3%) das crianças entre os 24-35 meses. Entre as crianças mais velhas, 47,4% comem o recomendado. Observaram-se diferenças estatisticamente significativas (X22 Fernandes CSG. Educar para a adoção de hábitos de vida saudáveis: uma estratégia de prevenção da obesidade infantil [Dissertação][Internet]. Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra: Coimbra 2018 [cited 2022 Feb 23]. Available from: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/21950/1/CARLA_FERNANDES.pdf
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=23,018, p=0,000), verificando-se a tendência das crianças mais novas comerem abaixo do recomendado, das crianças mais velhas comerem o recomendado e das crianças entre os 24-35 meses comerem acima do recomendado. Em relação ao consumo de hortícolas, não se verificou associação estatística, mas os dados revelaram que a maioria das crianças (94,4%) consumia abaixo do recomendado. O mesmo se verificou no consumo de leguminosas (84,4%), de gorduras (91,6%) e no consumo de água (89,3%). No que se refere ao consumo de carnes/peixes/ovos, observou-se um consumo acima do recomendado em 80,0% das crianças. O consumo de laticínios era em 67,1% dos casos superior ao recomendado, com diferenças estatisticamente significativas (X22 Fernandes CSG. Educar para a adoção de hábitos de vida saudáveis: uma estratégia de prevenção da obesidade infantil [Dissertação][Internet]. Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra: Coimbra 2018 [cited 2022 Feb 23]. Available from: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/21950/1/CARLA_FERNANDES.pdf
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=43,315, p=0,000), sugerindo que as crianças mais novas consumiam abaixo do recomendado e as crianças entre os 24-35 meses consumiam acima do recomendado. A fruta era ingerida como recomendado por 78,1% das crianças, enquanto 11,8% consumiam abaixo do recomendado. Observaram-se diferenças estatisticamente significativas (X22 Fernandes CSG. Educar para a adoção de hábitos de vida saudáveis: uma estratégia de prevenção da obesidade infantil [Dissertação][Internet]. Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Coimbra: Coimbra 2018 [cited 2022 Feb 23]. Available from: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/21950/1/CARLA_FERNANDES.pdf
https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.2...
=12,689, p=0,013), sugestivas de que as crianças mais velhas comiam fruta acima do recomendado.

Tabela 5
Porções de alimentos, de cada grupo da Roda da Alimentação Mediterrânica, ingeridas em função da idade da criança em Viseu, Portugal, 2018-2019

DISCUSSÃO

Como principais conclusões deste estudo, podemos dizer que se verificou a realização diária de refeições em número adequado, mas um consumo desadequado de determinados alimentos não saudáveis, como chocolates, bebidas ou fast food, por parte das crianças, onde se encontram incluidas, embora sem significância estatística, as crianças com excesso de peso e obesidade. Apurou-se, ainda, o consumo acima ou abaixo do recomendado de alimentos de alguns dos grupos da roda da alimentação mediterrânica.

De acordo com as evidências científicas, os primeiros três anos de vida são um período sensível para o desenvolvimento da perceção, cognição, comportamentos e experiências em relação aos alimentos(99 Mura Paroche M, Caton SJ, Vereijken C, Weenen H, Houston-Price C. How Infants and Young Children Learn About Food: a systematic review. Front Psychol. 2017;8:1046. https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01046
https://doi.org/10.3389/fpsyg.2017.01046...
). Alguns estudos(1010 Switkowski KM, Gingras V, Rifas-Shiman SL, Oken E. Patterns of complementary feeding behaviors predict diet quality in early childhood. Nutrients. 2020;12(3):810. https://doi.org/10.3390/nu12030810
https://doi.org/10.3390/nu12030810...
-1111 Gingras V, Switkowski KM, Rifas-Shiman SL. Associations of Early Parental Concerns and Feeding Behaviors with Child’s Diet Quality through Mid-Childhood. Nutrients. 2020;12(11):3231. https://doi.org/10.3390/nu12113231
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) revelaram o consumo de fast food, de alimentos de elevada densidade energética (como sobremesas doces, guloseimas/rebuçados, chocolates) e a ingestão de bebidas com gás, em uma amostra expressiva de crianças particularmente entre dois e três anos.

Os dados do presente estudo corroboram com os encontrados por outros investigadores(1212 Liberali R, Kupek E, Assis MAA. Dietary patterns and childhood obesity risk: a systematic review. Childhood obesity. 2020;16(2). https://doi.org/10.1089/chi.2019.0059
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), em uma revisão sistemática da literatura sobre os padrões alimentares em crianças entre dois e cinco anos de idade, que constataram um consumo de alimentos potencialmente obesogênicos, aumentando o risco de a criança ficar acima do peso. O consumo desses alimentos não é proibido, mas tem de ser limitado em quantidade e frequência(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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). Cada vez mais, a mídia e o ritmo acelerado do dia a dia podem potenciar o consumo de alguns desses alimentos, sendo de primordial importância a educação familiar, para permitir que a criança e a família compreendam as vantagens de um correto comportamento alimentar.

A ingestão de açúcares livres ou bebidas adoçadas com açúcar como determinante do peso corporal, parâmetro avaliado no presente estudo, tem se tornado foco de pesquisas relevantes. Sendo as opções preferidas para os lanches, as bebidas e os alimentos açucarados são assumidos como a maior fonte de açúcares adicionados e contribuem com uma quantidade significativa de calorias para a dieta das crianças(1313 Liu Y, Qin S, Song Y. The perturbation of infant gut microbiota caused by cesarean delivery is partially restored by exclusive breastfeeding. Front Microbiol. 2019;10:598. https://doi.org/10.3389/fmicb.2019.00598
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). São vários os investigadores que abordam este tema nas suas investigações. Em um estudo transversal, com uma amostra de 4.839 crianças com idade inferior a dois anos, os autores constataram que a ingestão de bebidas açucaradas estava presente em 32,0% das crianças, revelando uma elevada prevalência do consumo de bebidas açucaradas por crianças com idade até aos dois anos(1414 Jaime PC, Prado RR, Malta DC. Influência familiar no consumo de bebidas açucaradas em crianças menores de dois anos. Rev Saude Publica. 2017;51(Supl 1):13s. https://doi.org/10.1590/S1518-8787.2017051000038.
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), fato igualmente verificado no nosso estudo.

De acordo com os nossos dados, o consumo responsável por essa ingestão incluía bebidas açucaradas, cereais de café da manhã açucarados, biscoitos, doces, chocolate e açúcar. Conclusões semelhantes às de outros investigadores(1515 Silva RS, Guedes AC, Damas BGB. Avaliação do consumo alimentar em residências de crianças usuárias de um centro de educação infantil. Enferm Brasil[Internet]. 2016 [cited 2022 Jan 30]:15(5):251-8. Available from: https://portalatlanticaeditora.com.br/index.php/enfermagembrasil/article/view/670/1569
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-1616 Murray R. Savoring sweet: sugars in infant and toddler feeding. Ann Nutrit Metabol. 2017;70(3):38-46. https://doi.org/10.1159/000479246
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), que relatam que o consumo de sucos de frutas, cereais de café da manhã, sobremesas e refrigerantes se inicia após o primeiro ano de vida, revelaram que, aos 30 meses de idade, 50,0% das crianças já tinham provado algum tipo de bebida açucarada(1515 Silva RS, Guedes AC, Damas BGB. Avaliação do consumo alimentar em residências de crianças usuárias de um centro de educação infantil. Enferm Brasil[Internet]. 2016 [cited 2022 Jan 30]:15(5):251-8. Available from: https://portalatlanticaeditora.com.br/index.php/enfermagembrasil/article/view/670/1569
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) e que 99,0% das crianças dos 6 aos 24 meses consumiam alguns açúcares diariamente(1616 Murray R. Savoring sweet: sugars in infant and toddler feeding. Ann Nutrit Metabol. 2017;70(3):38-46. https://doi.org/10.1159/000479246
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). Em um estudo realizado com 1.824 crianças americanas, desde o nascimento até aos 23 meses de idade, os autores concluíram que 58,9% das crianças entre 12 e 18 meses e 62,9% das que tinham entre 19 e 23 meses consumiam, habitualmente, leite aromatizado e bebidas adoçadas com açúcar(1717 Hamner HC, Perrine CG, Gupta PM, Herrick KA, Cogswell ME. Food Consumption Patterns among U.S. Children from Birth to 23 Months of Age, 2009-2014. Nutrients. 2017;9:942. https://doi.org/10.3390/nu9090942
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). Outros investigadores(1818 Devenish G, Golley R, Mukhtar A, Begley A, Ha D, Do L, et al. Free sugars intake, sources and determinants of high consumption among Australian 2-Year-Olds in the SMILE Cohort. Nutrients. 2019;11(1):161. https://doi.org/10.3390/nu11010161104-100
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) constaram que a mediana de ingestão habitual de açúcares livres aos dois anos de idade era de 22,5 g/dia, contribuindo com uma mediana de 8,0% na necessidade energética estimada.

O Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável (PNPA) da DGS(1919 Direção-Geral da Saúde (DGS). Programa nacional para a promoção da alimentação saudável. Lisboa: DGS; [Internet]. 2020 [cited 2022 Jan 30]. Available from: https://alimentacaosaudavel.dgs.pt/activeapp2020/wpcontent/uploads/2020/11/Relato%CC%81rio-PNPAS-2020.pdf
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) indica que as bebidas açucaradas têm vindo, cada vez mais, a ganhar destaque no padrão alimentar de crianças portuguesas, verificando-se que 22,0% das crianças consomem diariamente refrigerantes ou sucos (≥220 g/dia). Como se verificou nos estudos mencionados, as principais fontes de açúcares livres foram os alimentos não essenciais, tais como bebidas de fruta com gás, bolachas, bolos, sobremesas doces e guloseimas. Relativamente aos açúcares livres, a EFSA não estabelece um limite superior, todavia adverte que o elevado consumo de açúcar aumenta o risco de cáries(2020 EFSA (European Food Safety Authority). Protocol for the scientific opinion the Tolerable Upper Intake Level of dietary sugars. EFSA J. 2018;16(8):5393. https://doi.org/10.2903/j.efsa.2018.5389
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).

Em relação aos vários grupos de alimentos, conforme a Roda da Alimentação Mediterrânica, as crianças da nossa amostra revelaram o valor máximo e mais significativo (26 porções) no consumo de laticínios e carnes/peixes/ovos (24,43 porções). Os valores mais baixos encontraram-se, em média, no consumo de gorduras, leguminosas e de água. Segundo a DGS(66 Zalewski BM, Patro B, Veldhorst M, Kouwenhoven S, Escobar PC, Lerma JC, et al. Nutrition of infants and young children (one to three years) and its effect on later health: a systematic review of current recommendations (EarlyNutrition project). Crit Rev Food Sci Nutr. 2017;57(3):489-500. https://doi.org/10.1080/10408398.2014.888701
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), as crianças nesta faixa etária deveriam consumir diariamente 3-4 porções de laticínios; 1,5-2 porções de carne, peixe ou ovos; 4-6 porções de cereais, derivados e tubérculos; 3-4 porções de hortícolas; 2-3 porções de fruta; 1 porção de óleos e gorduras; e 1 litro de água, enquanto deveriam consumir 3 vezes por semana leguminosas. De acordo com essas recomendações, neste estudo, apenas o consumo de fruta se verificou adequado.

Um estudo(2121 Fox MK, Gearan E, Cannon J, Briefel R, Deming DM, Eldridge AL, et al. Usual food intakes of 2- and 3-year old U.S. children are not consistent with dietary guidelines. BMC Nutrition. 2016;2:67. https://doi.org/10.1186/s40795-016-0106-2
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), realizado a partir dos dados do Feeding Infants and Toddlers Study 2008 (FITS 2008), em uma amostra aleatória de 1.323 crianças na faixa etária dos dois aos três anos, encontrou uma prevalência na ingestão habitual de alimentos dissonante das recomendações, sendo as mais elevadas para os vegetais (91,0%), grãos inteiros (94,0%) e gorduras (>99,0%), ingerindo proteína e laticínios abaixo do recomendado (32,0% e 48,0%, respetivamente).

Nas crianças participantes neste estudo, o consumo de laticínios era acima do recomendado, e o de hortícolas, abaixo do recomendado. Isso corrobora as conclusões de outro estudo, realizado em Portugal, sobre os padrões alimentares dos toddlers(2222 Moreira T, Severo M, Pinto E, Nazareth M, Graça P, Rêgo C, et al. CO9: Consumo alimentar em crianças de 1-3 anos de idade: EPACI Portugal 2012. Nutrícias [Internet] 2014 [cited 2022 Jan 20];21:43. Available from: http://hdl.handle.net/10400.14/17670
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), que apurou um consumo de hortofrutícolas inferior ao recomendado e um consumo de laticínios consideravelmente superior. Esses resultados podem sugerir uma possível sobrevalorização do consumo de laticínios e uma não valorização do consumo de hortícolas pelos pais dos toddlers. O baixo consumo de frutas é um problema encontrado em crianças de vários países(2323 Brígido AE, Anjos CC, Nascimento GC, Menezes IBCD, Caldeira KTDS, Leite RGDC, Wanderley TCF, et al. Frequência do consumo de açúcar e bebidas açucaradas por crianças atendidas em um ambulatório de pediatria no Vergel do Lago em Maceió-Alagoas. Braz J Develop. 2020;6(12):99371-91. https://doi.org/10.34117/bjdv6n12-434
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-2424 Volger S, Sheng X, Tong LM. Nutrient intake and dietary patterns in children 2.5-5 years of age with picky eating behaviours and low weight-for-height. Asia Pac J Clin Nutr. 2017;26(1):104-9. https://doi.org/10.6133/apjcn.102015.02
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). Contudo, os resultados do nosso estudo não comprovam essa evidência, pois a maioria das crianças consumia uma quantidade de fruta adequada.

A oferta alimentar aos toddlers deve se basear na variedade, justificando-se a escolha de alimentos que integram a cadeia alimentar e a Roda dos Alimentos ou a Roda da Alimentação Mediterrânica(2525 Rodrigues S, Franchini B, Graça P, et al. A new food guide for the Portuguese population: development and technical considerations. J Nutr Educ Behav. 2006;38(3):189-95. https://doi.org/10.1016/j.jneb.2006.01.011
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). Os resultados encontrados neste estudo reforçam que se deve privilegiar uma oferta variada em relação aos vários grupos alimentares e dos constituintes de cada um deles, levando sempre em consideração que importa a qualidade/variedade e não tanto a quantidade. É ideal que a oferta reiterada de cada novo alimento ocorra no contexto familiar e escolar, o que facilitará a sua aceitação por parte da criança, em consonância com as orientações do Ministério da Saúde português(44 Direção-Geral da Saúde (DGS). Alimentação saudável dos 0 aos 6 anos linhas de orientação para profissionais e educadores 2019[Internet]. Portugal. Ministério da Saúde. 2019 [cited 2022 Jan 30]. Available from: http://www.spgp.pt/media/1316/n-e-a-alimenta%C3%A7%C3%A3o-saud%C3%A1vel-dos-0-aos-6-anos-dgs-2019.pdf
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).

Limitações do estudo

Como possíveis limitações deste estudo, destaca-se o só se recolher informação sobre o consumo de horticolas cozinhadas, não especificando o consumo de sopa, muito frequente nesta faixa etária. A coleta de dados ter sido realizada através de um questionário de autorresposta é outra limitação, dependendo assim da sinceridade dos pais, podendo ser influenciados por condutas que reconhecem como socialmente preferíveis. Outra limitação prende-se com o facto de o estudo, não sendo longitudinal, não permitir avaliar as consequências futuras dos hábitos alimentares menos adequados nas crianças estudadas.

Contribuições para a área de enfermagem

Este estudo evidencia a necessidade de se realizar mais investigação sobre os comportamentos alimentares dos toddlers, para se obter informação que ajude a conceber intervenções de enfermagem e políticas de prevenção de doenças relacionadas com a dieta dos todldlers. Os enfermeiros assumem um papel primordial nessas intervenções, pois as ações de educação para a saúde são uma das intervenções basilares nas consultas de saúde infantil, contribuindo para o empoderamento dos pais através da conscientização e da melhoria dos seus conhecimentos.

CONCLUSÕES

Os resultados encontrados no presente estudo permitem dizer que, embora a maioria da amostra (85,3%) cumprisse as recomendações da DGS no que diz respeito ao número de refeições a realizar diariamente (42,5% cinco refeições; 42,8% seis refeições), a sua constituição pode não ser a mais adequada. Verificou-se um consumo insuficiente ou excessivode alguns alimentos dos vários grupos constituintes da Roda da Alimentação Mediterrânica, além do consumo de doces e fast food não recomendados para crianças nesta faixa etária.

Na promoção e na maior aposta na educação para a saúde alimentar dos toddlers, salienta-se a intervenção dos enfermeiros, seguindo os princípios gerais e orientadores da DGS no que diz respeito ao cumprimento das necessidades nutricionais nessa faixa etária. É uma fase de excelência para “aprender a comer” e estabelecer bons hábitos alimentares, prática encarada como fundamental e urgente. Assim, torna-se basilar que as intervenções incluam cuidadores (família e escola), para que haja uma corresponsabilização pelo rigor dietético e práticas alimentares mais saudáveis. As famílias exercem uma grande influência na saúde global das crianças, pois são o seu primeiro ambiente de aprendizagem, funcionando como modelos. Ao nível alimentar, os pais constituem-se os primeiros exemplos, com influência direta no comportamento alimentar das crianças, tornando-se importante a sua consciencialização sobre a evolução desses comportamentos ao longo dos primeiros anos de vida como processos biológicos e comportamentais orientados para a satisfação dos requisitos de saúde e de crescimento das crianças.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Antonio José de Almeida Filho
EDITOR ASSOCIADO: Priscilla Broca

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    05 Ago 2022
  • Aceito
    26 Dez 2022
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