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Resenha

BIDASECA, Karina. 2016. Genealogías críticas de la colonialidad en América Latina, África, Oriente. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: CLACSO

O livro Genealogías críticas de la colonialidad en América Latina, África, Oriente, coordenado por Karina Bidaseca, é composto de contribuições de vinte autoras(es), na maioria latino-americanas(os). Dedicado à memória da artista feminista cubana Ana Mendieta, o livro apresenta textos que, nas palavras de Bidaseca, "habitaram" o II Congresso de Estudos Pós-coloniais e as III Jornadas de Feminismo Pós-colonial, realizados em Buenos Aires em dezembro de 2014. Dupla de eventos que, aliás, terá nova versão em dezembro deste ano, prometendo discussões igualmente interessantes em face de acontecimentos, movimentos e tragédias desses últimos dois anos, em diferentes latitudes, que continuam desvelando as marcas coloniais em múltiplas reconfigurações.

A partir de diversas perspectivas e disciplinas, os textos trazem incansáveis críticas aos saberes e às práticas intelectuais ocidentais, dando a conhecer uma série de elementos políticos, históricos, econômicos e culturais que provocam, instigam, encantam e deslocam. Todos os textos provêm de extensas e profundas trajetórias acadêmicas críticas e bem articuladas, oferecendo uma rica polifonia.

A publicação se apresenta em dois blocos de textos, de diferentes tamanhos, temáticas e contextos. Chama a atenção que a primeira parte, intitulada "Colonialidad del género. Cuerpos y territorios globalizados en América Latina, África, 'Oriente'", só tenha autoras mulheres, enquanto a segunda parte, "Genealogías de la colonialidad del poder. África, América Latina" só contemple contribuições de autores homens. Embora Karina Bidaseca mencione que a primeira parte provém de produções feministas situadas e imaginemos que os autores do segundo bloco não necessariamente se posicionem segundo estas perspectivas, parece importante convidar leitoras e leitores a conhecer a obra completa, entendendo que os feminismos críticos da colonialidade são medulares nas elaborações teóricas e políticas da colonialidade do poder, que o gênero é um eixo fundamental na matriz colonial do poder e que se enxergue a insistência das autoras dos textos na articulação que este tem com outros eixos. Igualmente, parece importante fugir da inegável hegemonia de referências masculinas das genealogias críticas da colonialidade, aspecto visível na maioria dos textos do segundo bloco. Do mesmo modo, pessoas interessadas em questões de gênero e corpo encontrarão importantíssimas discussões, conceitos e aportes na segunda parte do livro. Ou seja, da mesma forma em que em ambas as partes se encontram misturados textos de diversas disciplinas, latitudes e linhagens teóricas e políticas, textos da primeira e da segunda parte podem se entrelaçar em outros tipos de organização e diálogo.

Ao invés de resumir o que é apresentado na compilação, labor já realizado por Karina Bidaseca na introdução do livro, o que pretendo trazer aqui é um convite a pensar alguns eixos temáticos e analíticos que atravessam os textos em suas diversas texturas e abordagens. Mas, antes disso, gostaria de mencionar brevemente a importância de uma prática de escrita distinta da tradicional, no intuito de se contrapor às formas eurocentradas de produção e comunicação do conhecimento. Neste sentido, é muito interessante a forma com que Sabelo J. Ndlovu-Gatsheni apresenta os(as) autores(as) africanos(as) a que faz referência, indicando justamente o fato de eles(as) serem africanos(as) e, na maioria das ocasiões, a nacionalidade aparecer como importante reafirmação do universo de produções teóricas, políticas, literárias e acadêmicas que não pertence aos países colonizadores. Desta forma, o texto já se apresenta como dispositivo de provocação a pensar a "descolonização dos campos de saber".

Vinculado a isso, um dos eixos temáticos/analíticos da compilação que gostaria de abordar é o lugar de enunciação, relevante para refletir sobre os mecanismos de produção de verdade nas ciências sociais. Já na introdução, a argentina Karina Bidaseca aponta que a primeira parte apresenta aportes dos "feminismos situados" a partir de "lugares de enunciação críticos do sul". No texto "El Movimiento de Mujeres Kurdas en Turquía", a autora curda Dilan Bozgan expressa que as mulheres curdas ocupam lugares muito limitados no âmbito acadêmico, o que faz com que os pouquíssimos trabalhos que existem sobre elas, inclusive os de pesquisadoras feministas turcas, as representem apenas dentro do "discurso nacionalista de victimización" ou, através de abordagens etnográficas, as caracterizem em um "marco de relativismo cultural, estático y a-histórico" (: 149). Neste sentido, inspirada na autora indiana Gayatri Chakravorty Spivak, discute a diferença entre a autorrepresentação - no sentido de falar e agir - das mulheres curdas e a forma com que elas são representadas - como simbolização - pelos nacionalistas curdos, os opressores turcos e as feministas turcas.

No texto "Notas preliminares sobre el archivo en contextos poscoloniales de investigación", o argentino Alejandro De Oto também destaca a importância de quem produz os materiais de pesquisa nas perspectivas, considerando a dimensão epistêmica de organização do conhecimento. Por sua vez, as argentinas María Rosa Lojo, María Eduarda Mirande e Zulma Palermo, em "De la des(de)colonialidad del género. Lugar social del decir", falam sobre uma "transformación del lugar de enunciación que va de la mirada radicada en la cultura occidental con base greco-latina a una raigalidad en el espacio otro de la cultura local en el tránsito de una migrancia física y cultural" (: 103).

Em uma análise histórica e literária plasmada no texto "Negro sobre Blanco. Genealogías Críticas Anticoloniales en el Triángulo Atlántico. El Concepto de Negritud en la Literatura", o argentino Eduardo Grüner cita exemplos da literatura que está "condicionada por lo que podríamos llamar el ventrilocuismo de los escritores blancos en general, incluidos los abolicionistas: puesto que los "negros" no hablan por sí mismos, deberán ser hechos hablar en los libros de los blancos" (: 232). Quer dizer, embora se denunciem os terríveis processos e as consequências do colonialismo, parece que a solução apenas pode vir de quem criou o problema, pois as vítimas são "incompetentes". O autor conclui que essa postura sugere que "así como no son capaces de hablar por sí mismas - por eso es el escritor europeo el que tiene que prestarles su voz - tampoco son capaces, para decirlo rápido, de hacer su propia política" (: 232).

Dialogando com estas questões, a chilena Alejandra Castillo, no texto "Feminismos de la (des)identificación poscolonial latinoamericana", no qual foca a escrita da feminista/historiadora Julieta Kirkwood, aponta que a questão política do feminismo consiste em fazer aparecer um sujeito que não é reconhecido como "locutor", especialmente, quando se responde à pergunta se esse sujeito é mesmo um "ser falante". Assim, ela traz a pergunta "¿puede hablar la mujer subalterna?" e coloca: "que se dude de la posibilidad de la mujer más allá de la trama escrituraria propuesta por el patriarcado, como lo hace Kirkwood, o que se enfatice la dificultad del habla de la mujer, como lo hace Spivak, no quiere decir que las mujeres no existan o no hablen como pudiese ser creído" (: 120).

O argentino Mario Rufer, no texto "Nación y condición poscolonial sobre memoria y exclusión en los usos del pasado", discorre sobre o "Estado-nação" como sustentado por um aparelho que lhe proporciona a palavra e a representação, e propõe que "lo que hay que desmontar siempre es ese lugar de enunciación que representa, legitima, habla por" (: 279), já que esta é a "clave del éxito político de esa usurpación". O camaronês Jacques Bertrand Mengue Moli, em "El postcolonialismo en África: un debate abierto", declara que um dos vestígios do colonialismo na África são os chamados "africanistas", intelectuais europeus que "a veces, pretenden hablar de África en lugar de los africanos mismos, como si ellos fueran subalternos que necesitan intérpretes" (: 210).

Relacionado com isto e que aparece em vários textos é algo que podemos chamar de "tradução", com seus múltiplos sentidos. A brasileira Rita Segato, em "La norma y el sexo frente estatal, patriarcado, desposesión, colonialidad", traz instigantes questionamentos a partir de uma experiência com mulheres indígenas, na qual foi solicitado a ela que oferecesse um léxico que tipificasse os casos particulares de violência sofridos por elas. Aqui, podemos ver de que forma as mulheres acionaram a estratégia de colocar demandas específicas ao governo que naquela época se instaurava nos termos e nas classificações do discurso dos direitos humanos. O zimbabuense Sabelo J. Ndlovu-Gatsheni, no texto titulado "Genealogías y linajes de la colonialidad en África desde los encuentros coloniales hasta la colonialidad de los mercados", também menciona que revolucionários africanos estudaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 e seus "inventários linguísticos" com o intuito de "ejercer presión sobre Europa para descolonizar África" (: 194). Mario Rufer relata que um líder indígena disse a ele que: "Nosotros englobamos los Derechos Humanos dentro de lo que llamamos Derechos Cósmicos, es decir, los derechos de toda la naturaleza, de la cual somos parte" (: 281). Karina Bidaseca, em "¿Dónde está Ana Mendieta? Lo bello y lo efímero como estéticas descoloniales", faz referência a Spivak, ao apontar de que forma "el indígena se apropia de los significados del otro reescribiendo en ellos los signos de la propia marca" (: 87).

Por outro lado, o ato da tradução também pode representar obrigação, imposição ou usurpação. O poema de Kate Rushin, que inspirou o livro Esta puente, mi espalda. Voces de mujeres tercermundistas en los Estados Unidos, ao qual fazem referência os textos de Karina Bidaseca e Alejandra Castillo, expressa a imensa carga que implica o transitar entre fronteiras não apenas linguísticas, mas também territoriais, culturais e subjetivas. Destaco alguns trechos: "Nadie se puede hablar sin mí [...] Hago más traducciones que las malditas Naciones Unidas".

Igualmente, Alejandro de Oto indica que "hablar una lengua era soportar el peso de una civilización" (: 268), e que mesmo os vocabulários emancipatórios da crítica anticolonial não estão isentos de colonialidade, pois fazem parte de processos de subjetivação pertencentes a uma "língua colonial-civilizatória". Este apontamento é feito em vários textos, por exemplo, ao se referir à perspectiva dos direitos humanos, especialmente diante das contradições entre o discurso e a prática no que tange aos povos indígenas (Segato) e à população negra na África e na diáspora (Ndlovu-Gatsheni), revelando uma profunda hipocrisia.

Neste sentido, a espanhola Rocío Medina Martín, no texto "Agencia y Mujeres saharauis refugiadas. Identidades Colectivas y Subjetividades desde los feminismos descoloniales", fala sobre a constante tensão que implica o nomear as lutas de todas as mulheres como feministas, pois, assim como no caso das mulheres saharauis, nem todas se posicionam dessa forma, buscando se distanciar da carga eurocêntrica do termo. Ela entende como urgente a elaboração de pesquisas que abordem e ponham em evidência registros de lutas de "outras" mulheres que, mesmo pertencendo a sociedades que passam por processos de ocidentalização, como quase todas hoje em dia, se utilizam de outros códigos, formas de nomear, agir e negociar em contextos e culturas específicos. Para isto, é importante lembrar que as mulheres e os povos já se organizavam de múltiplas formas antes da chegada de discursos eurocêntricos, incluindo o feminismo branco urbano e eurocentrado, que muitas vezes desloca noções de gênero e sexualidade dos conjuntos de significados e relações de poder comunitários. Assim, várias autoras abordam a importância das elaborações feministas não hegemônicas (Bidaseca, Lojo, Mirande & Palermo, Castillo & Medina Martín). Rocío Medina, Rita Segato e Dilan Bozgan também assinalam que as lutas de mulheres curdas, saharaui, ameríndias estão totalmente imbricadas com a luta pela autodeterminação política dos seus povos, pelo que, mesmo reivindicando mudanças no interior das suas sociedades e comunidades, elas insistem em participar lado a lado com os homens na luta anticolonial.

Voltando ao eixo da tradução, outras violências são lembradas neste sentido, tais como a transformação do território do outro (Pachamama) na linguagem do usurpador exposta por Rufer, a proibição da língua materna (o curdo) mencionada por Goznag, e os abusos e as mentiras feitas por agentes europeus nos tratados com os(as) líderes africanos(as) que não dominavam a escrita, relatados por Ndlovu-Gatsheni. Por outro lado, Grüner também comenta que a língua créole, língua oficial do Haiti junto com o francês, mesmo tendo sido uma amálgama "em certo ponto inventada" pelos franceses para se entenderem com as pessoas escravizadas de diferentes origens, foi ironicamente uma das ferramentas mais úteis na revolução, pois facilitou a comunicação entre essas pessoas, junto com o vodu, também fruto do sincretismo forçado, que foi um suporte moral e simbólico na revolução. Para ele, a complexa noção de negritude é inaugurada no artigo 14 da Constituição Haitiana de 1805, fruto dessa revolução, no qual se afirma que "Los haitianos, de aquí en adelante, serán conocidos por la denominación genérica de negros".

Lojo, Mirande e Palermo apontam que as linguagens de diferentes "semiosferas" se entrecruzam, reconhecem e podem ser traduzidas nos espaços das fronteiras, dando forma a expressões pluriculturais. Segundo as autoras, a fronteira vai além do territorial, envolvendo registros sociais, culturais e históricos. Para elas, "es en la migrancia, en el nomadismo cultural, en el "cruce de fronteras", donde se asienta la posibilidad de definir las identidades al abrirse el horizonte del conocimiento de los "otros" desde su misma interioridad" (: 107). Isto traz à tona outro eixo que perpassa os textos: a noção e as implicações das fronteiras, invariavelmente constituídas nos processos de colonização. No entanto, vários textos trazem elementos que nos lembram que as fronteiras não necessariamente acarretam potência e reconhecimento, pois é nelas que muitas violências, perdas, cooptações e imposições de modelos acontecem. Por exemplo, Ndlovu-Gatsheni nos relata de que forma os líderes europeus se reuniram para delimitar as fronteiras da África, evitando conflitos entre as nações europeias sem se importarem com os conflitos entre povos e culturas africanos. De acordo com Rufer, "la frontera es siempre un imaginario con respecto a Europa: sólo existe desde un sujeto (político y territorial) que se expande" (:287). Bidaseca também nos lembra do exílio como um movimento que, embora possa confeccionar resistências artísticas, políticas e intelectuais, é um evidente desdobramento da violência colonial que pesa sobre os corpos.

Assim, a fronteira tem sido uma imposição colocada historicamente da forma mais violenta sobre os corpos, as vidas e os povos. Muitas vezes o questionamento que desde uma visão ocidental fazemos de certas vivências e ordenamentos simbólicos relacionados, por exemplo, com gênero e sexualidade, não nos permite enxergar que foi a imposição de um domínio cultural colonial que configurou a violência, justamente nessas fronteiras. Exemplificando: ao falar sobre as violências vividas por mulheres indígenas em diversas aldeias em contato com militares, religiosos, empresários e traficantes, Segato discorre sobre a imposição dos modelos, especialmente os de masculinidade, assim como sobre as formas particulares de agressão e despossessão que as mulheres vivem, as mudanças nos significados das subjetividades e das corporalidades e os modos novos com que estas são apropriadas.

Ao lado da noção de fronteira está a de híbrido ou hibridez, que vários(as) autores(as) nesta publicação entendem como problemática. Grüner indica que os "pensamentos pós" e um setor dos estudos culturais, embora tenham reagido contra as "monstruosidades" do século XX e XXI, têm valorizado "conexões", "hibridezes", "in-between", "encontro", "mestiçagem" que, além de serem acompanhados por uma rejeição à ideia de coletividade, não representam uma negociação criativa de identidades nem uma mistura cultural produtiva. Seriam produto de uma série de violências derivadas da escravização, tais como o estupro, a guerra e a captura, provocando, de acordo com Fanon e trazido por Brüner, sujeitos quebrados, divididos e desgarrados. Diante disso, discursos unificadores e identitários, como o proposto pela "negritude", permitem saídas e contrapontos. Isto, como apontado por Brûner, é complexo, pois, segundo a hipótese dele, a negritude é herdada da revolução haitiana, um acontecimento antilhano, ou seja, americano. Quer dizer, a reivindicação da negritude foi engendrada nesse contexto "impuro", nessa "mistura" de culturas.

Por outro lado, Lojo, Mirande e Palermo, mesmo reconhecendo que as fronteiras não se constituem entre territórios iguais, mas entre territórios centrais - com projetos de expansão - e periféricos, e reproduzem os modelos de colonização, é possível, a partir da resistência, formular-se um "espaço outro", feito de "intersecções" e de "intercâmbios dialógicos", o que não apaga as contradições e as diferenças, mas que "con ellas y desde ellas puede hacer posible la construcción de nuevas utopías para dar forma a un mundo donde quepan muchos mundos" (:109). A argentina Laura Malosetti Costa, em "La seducción fatal: Imaginarios eróticos del siglo XIX en el Museo Nacional de Bellas Artes", propõe uma análise da produção de sentidos múltiplos sobre as mulheres e o erotismo no contexto de Buenos Aires, cidade perpassada por migrações e outros fenômenos históricos específicos que foram compondo certas possibilidades e criações.

Assim como os apresentados, outros eixos temáticos e analíticos atravessam os diversos textos, tais como memória, território, educação, diferença e agência. Eles vão revelando diferentes ângulos dos processos de exploração, exclusão e subalternização, mas também de resistência em face de um mundo capitalista, neoliberal e racista que não para de se expandir e se impor nos territórios e nas subjetividades. Da mesma forma com que se apresentam genealogias e linhagens da colonialidade que, na visão de Ndlovu-Gatsheni, é um esforço fundamental para escrever a "historia do presente", também são apresentados importantes elementos de contestação por autores(as) como Boznag, Grüner, Rufer e Medina.

Nos eixos mostrados e em outros, é constantemente abordado o debate entre as perspectivas descoloniais e as pós-coloniais. Algumas(ns) autoras(es) se posicionam em uma das perspectivas, enquanto outras(os), mesmo sendo conscientes das divergências, preferem não aprofundar o debate, priorizando os pontos em comum. Mengue Moli dá a conhecer parte do debate intelectual na África, indicando o perigo de que, ao proporem a abertura ao mundo e à mestiçagem das sociedades africanas, os discursos pós-coloniais façam com que elas entrem na "dinámica postmoderna y neoliberal cuyos efectos han sido hasta hoy nefastos para África" (: 213). O mexicano Guadalupe Gandarilla Salgado, em "Teoría poscolonial y encare decolonial. Hurgando en sus genealogías", assinala que os estudos pós-coloniais mais recentes tendem a carecer de uma postura contestatória definida, o que pode fazer com que acabem alimentando o capitalismo global e a normalização da vida. Desta forma, o que o autor e suas referências observam é um "sesgo despolitizador". Diante disso, ele propõe um "giro decolonial", que recupere "en el ámbito histórico-estructural todo lo que no está dicho por aquellos a los que Aimé Césaire se refería como "la voz de los sin voz"" (:315). Grüner também aprofunda esta discussão.

Mesmo esta publicação sendo uma compilação de textos fruto de uma dupla de eventos pós-coloniais, parece interessante que ela contenha severas críticas a esta perspectiva e sugira uma postura aberta a ser desestabilizada e provocada, ações necessárias em todos os campos de conhecimento. Assim, parece urgente que nos diferentes fazeres acadêmicos e políticos atentemos para os elementos que as perspectivas decoloniais e pós-coloniais oferecem, superando, nas palavras de Grüner, nosso "des-conhecimento", que não é o mesmo que "ignorância" (: 223).

O último texto da publicação, um manifesto coletivo chamado "Por una nueva imaginación social y política en América Latina", aponta que "reconocer que una gran parte de nuestros linajes teóricos, con epicentro en el viejo mundo, son a la vez indispensables e inadecuados para los mundos que vivimos, nos impulsa a multiplicar las redes latinoamericanas y a intensificar los esfuerzos para consolidar una geopolítica del conocimiento sur-sur" (: 319). Nesse sentido, Ndlovu-Gatsheni também enfatiza a "necesidad de completar los proyectos inconclusos de descolonización del sistema-mundo moderno y desimperialización del orden global/internacional" (:173), em alinhamento com o resto do "Sul Global". Para Grüner, "toda Latinoamérica - todas sus fracturas y complejidades - puede ser "iluminada" por esa luz negra" (: 258). O manifesto convida, como postura política, a contribuir com o desafio coletivo de "traspasar las fronteras instituidas, socavar los cimientos sobre los que se erigen las desigualdades contemporáneas" (: 319). Foi justamente com este objetivo que apresentei os eixos trabalhados neste texto, para usá-los como dispositivos de instigação nos nossos percursos de produção de conhecimento, sempre nos questionando de que forma estamos contribuindo, interrogando ou fissurando a matriz colonial do poder.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Ago 2016
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