VIOLÊNCIA E MODOS DE VIDA: "Os Justiceiros"

Fernandes, Heloisa Rodrigues

doi:10.1590/ts.v4i1/2.84910

Resumos

Apresentação das biografias familiares de dois "justiceiros" da PMSP organizadas pelo modelo do "chefe de familia" e dos seus efeitos: alienação social, cisão do espaço de reprodução das próprias classes trabalhadoras, concepção heroicizada da História.

modos de vida; família e identidade social; trabalho como significante mestre; alienação social; cisão do espaço social; violência; "justiceiros"

Presentation of family biographies of two "justiceiros" (those who take the law into their own hands) of the PMSP (Military Police of São Paulo) organized according to the standard of "head of the family" and of its effects: social alienation, splitting of the reproductive space of the working class itself, a heroicized conception of History.

ways of life; family and social identity; work as a significant master; social alienation; splitting social space; violence; "justiceiros"

Texto completo disponível em PDF.

*
Texto apresentado no Ia Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Universidade de Coimbra, em julho de 1990, o que se tornou possível graças ao financiamento do CNPq ao qual reconheço mais esse incentivo ao meu trabalho.
1
Por família de orientação, entendemos: pai, mãe, irmãos e irmãs do sujeito de referência.
2
Como permanecem presos, devendo responder a outros processos, não citar seus nomes foi uma condição que aceitei ao iniciar a pesquisa, em 1986.
3
Por família de procriação entendemos: o sujeito de referência, seu cônjuge e filhos.
4
"O tempo mítico implica uma ordenação teórica dos acontecimentos empíricos para explicar causalmente as vicissitudes do grupo familiar de acordo com alguma teoria explicativa, geralmente encobridora". "O tempo mítico, muitas vezes, pode estar marcado nos seus períodos por um membro familiar significativo: a mãe, a avó materna, o irmão materno, que se converte, desta forma, no encarregado de 'colocar' no tempo os acontecimentos ao qual irão se cercar todos os membros da família. O tempo mítico (...) está determinado pela confluência dos desejos e conflitos que unem seus membros". (Berenstein, 1988BERENSTEIN, Isidoro. Família e doença mental. São Paulo, Escuta, 1988., p. 194).
5
Teve cinco filhos, um dos quais falecido antes de completar um ano de idade.
6
Termos reiteradamente utilizados pelos três "justiceiros" entrevistados.
7
Na verdade, esta versão da "moralidade e civilidade" tem sua matriz na forma como as classes dominantes concebem e constroem a ordem pública produzindo a cidadania tutelada, diferenciada e excludente, questão que não pôde ser analisada neste trabalho. Para algumas manifestações contemporâneas dessa concepção de ordem pública no Brasil: Pinheiro, 1982PINHEIRO, Paulo Sérgio. Escritos indignados. São Paulo, Brasiliense, 1984.; Paixão, 1988PAIXÃO, Antonio Luiz. Crime, controle social e consolidação da democracia: as metáforas da cidadania. In: REYS, Fábio Wanderley & 0'D0NNEL, Guillermo (org.). A democracia no Brasil, dilemas e perspectivas. São Paulo, Vértice, 1988.; Ianni, 1989IANNI, Octávio. Autoritarismo e democracia. In: IANNI, Octávio. A formação do Estado populista na América Latina. São Paulo, Ática, 1989. e Fernandes, 1989FERNANDES, Florestan. A ditadura em questão. São Paulo, T. A. Queiroz Editor, 1982..
8
Concepção que, aliás, é uma das implicações possíveis do "modelo do chefe provedor": o destino familiar dependendo exclusivamente da sua tenacidade e boa-sorte.
9
Reconhece como outros heróis inspiradores Cristo, Robin Hood e Napoleão Bonaparte.
10
No Brasil, as classes trabalhadoras revelam sua criatividade e resistência ao produzir uma legalidade alternativa à legalidade burguesa que procura decidir por outras vias, que não a do "justiceiro", seus conflitos intraclassistas (Santos, 1989SANTOS, Boaventura de Sousa. Justiça popular, dualidade de poderes e estratégia socialista. In: FARIA, José Eduardo (org.). Direito e Justiça. São Paulo, Ática, 1989.).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BERENSTEIN, Isidoro. Família e doença mental. São Paulo, Escuta, 1988.
COSTA, Jurandir Freire da. Psicanálise e contexto cultural. Rio de Janeiro, Campus, 1989.
DUARTE, Luiz Fernando. Da vida nervosa nas classes trabalhadoras urbanas. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor/CNPq, 1986.
FERNANDES, Florestan. A ditadura em questão. São Paulo, T. A. Queiroz Editor, 1982.
FERNANDES, Heloisa Rodrigues. Rondas à cidade: uma coreografia do poder. Revista Tempo Social, Universidade de São Paulo, vol. 1, nº 2, 2º semestre de 1989, p. 121-134.
IANNI, Octávio. Autoritarismo e democracia. In: IANNI, Octávio. A formação do Estado populista na América Latina. São Paulo, Ática, 1989.
PARSONS, Talcott et alli. La Família. Barcelona, Península, 1970.
PINHEIRO, Paulo Sérgio. Escritos indignados. São Paulo, Brasiliense, 1984.
PAIXÃO, Antonio Luiz. Crime, controle social e consolidação da democracia: as metáforas da cidadania. In: REYS, Fábio Wanderley & 0'D0NNEL, Guillermo (org.). A democracia no Brasil, dilemas e perspectivas. São Paulo, Vértice, 1988.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Justiça popular, dualidade de poderes e estratégia socialista. In: FARIA, José Eduardo (org.). Direito e Justiça. São Paulo, Ática, 1989.
TELLES, Vera da Silva. Família, trabalho e modos de vida: notas de uma pesquisa sobre trabalhadores urbanos em São Paulo. ANPOCS, mimeo., 1988.
ZALUAR, Alba. A máquina e a revolta. São Paulo, Brasiliense, 1985.

Datas de Publicação

Publicação nesta coleção
Jan-Dec 1992

Histórico

Recebido
Maio 1992

Este é um artigo publicado em acesso aberto (Open Access) sob a licença Creative Commons Attribution NonCommercial, que permite uso, distribuição e reprodução em qualquer meio, sem restrições desde que sem fins comerciais e que o trabalho original seja corretamente citado.

[1] *
Texto apresentado no Ia Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Universidade de Coimbra, em julho de 1990, o que se tornou possível graças ao financiamento do CNPq ao qual reconheço mais esse incentivo ao meu trabalho.

[2] 1
Por família de orientação, entendemos: pai, mãe, irmãos e irmãs do sujeito de referência.

[3] 2
Como permanecem presos, devendo responder a outros processos, não citar seus nomes foi uma condição que aceitei ao iniciar a pesquisa, em 1986.

[4] 3
Por família de procriação entendemos: o sujeito de referência, seu cônjuge e filhos.

[5] 4
"O tempo mítico implica uma ordenação teórica dos acontecimentos empíricos para explicar causalmente as vicissitudes do grupo familiar de acordo com alguma teoria explicativa, geralmente encobridora". "O tempo mítico, muitas vezes, pode estar marcado nos seus períodos por um membro familiar significativo: a mãe, a avó materna, o irmão materno, que se converte, desta forma, no encarregado de 'colocar' no tempo os acontecimentos ao qual irão se cercar todos os membros da família. O tempo mítico (...) está determinado pela confluência dos desejos e conflitos que unem seus membros". (Berenstein, 1988BERENSTEIN, Isidoro. Família e doença mental. São Paulo, Escuta, 1988., p. 194).

[6] 5
Teve cinco filhos, um dos quais falecido antes de completar um ano de idade.

[7] 6
Termos reiteradamente utilizados pelos três "justiceiros" entrevistados.

[8] 7
Na verdade, esta versão da "moralidade e civilidade" tem sua matriz na forma como as classes dominantes concebem e constroem a ordem pública produzindo a cidadania tutelada, diferenciada e excludente, questão que não pôde ser analisada neste trabalho. Para algumas manifestações contemporâneas dessa concepção de ordem pública no Brasil: Pinheiro, 1982PINHEIRO, Paulo Sérgio. Escritos indignados. São Paulo, Brasiliense, 1984.; Paixão, 1988PAIXÃO, Antonio Luiz. Crime, controle social e consolidação da democracia: as metáforas da cidadania. In: REYS, Fábio Wanderley & 0'D0NNEL, Guillermo (org.). A democracia no Brasil, dilemas e perspectivas. São Paulo, Vértice, 1988.; Ianni, 1989IANNI, Octávio. Autoritarismo e democracia. In: IANNI, Octávio. A formação do Estado populista na América Latina. São Paulo, Ática, 1989. e Fernandes, 1989FERNANDES, Florestan. A ditadura em questão. São Paulo, T. A. Queiroz Editor, 1982..

[9] 8
Concepção que, aliás, é uma das implicações possíveis do "modelo do chefe provedor": o destino familiar dependendo exclusivamente da sua tenacidade e boa-sorte.

[10] 9
Reconhece como outros heróis inspiradores Cristo, Robin Hood e Napoleão Bonaparte.

[11] 10
No Brasil, as classes trabalhadoras revelam sua criatividade e resistência ao produzir uma legalidade alternativa à legalidade burguesa que procura decidir por outras vias, que não a do "justiceiro", seus conflitos intraclassistas (Santos, 1989SANTOS, Boaventura de Sousa. Justiça popular, dualidade de poderes e estratégia socialista. In: FARIA, José Eduardo (org.). Direito e Justiça. São Paulo, Ática, 1989.).

Brasil

Brasil

VIOLÊNCIA E MODOS DE VIDA: "Os Justiceiros"* * Texto apresentado no Ia Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Universidade de Coimbra, em julho de 1990, o que se tornou possível graças ao financiamento do CNPq ao qual reconheço mais esse incentivo ao meu trabalho.

Resumos

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Datas de Publicação

Histórico

VIOLÊNCIA E MODOS DE VIDA: "Os Justiceiros"^* * Texto apresentado no Ia Congresso Luso-Afro-Brasileiro de Ciências Sociais, Universidade de Coimbra, em julho de 1990, o que se tornou possível graças ao financiamento do CNPq ao qual reconheço mais esse incentivo ao meu trabalho.