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Análises de revistas

As conexões dos lobos frontais. (The connexions of the frontal lobes of the brain). W. E. LeGros Clark. Lancet, 1: 353-356, 1948.

O A. considera como lobo frontal a porção cortical anterior às áreas 4 e 6. Assinala a importância do conhecimento anatômico preciso das vias associativas ou de projeção, para a interpretação correta dos achados da fisiologia. Ao contrário do que comumente se julga, sob o ponto de vista filogenético, o lobo frontal do homem não corresponde à estrutura mais evoluída na série animal, sendo enormemente ultrapassado pelos lobos parietal e temporal. Este fato vem abalar de algum modo a hipótese de ser o lobo frontal o órgão supremo das funções psíquicas. O lobo frontal não pode, por outro lado, ser considerado uma área associativa por excelência, pois faltam as provas anatômicas mostrando sua relação com todas as demais áreas corticais. Além disso, parte do córtex frontal recebe e emite fibras de projeção. Assim, foram verificadas em animais inferiores, e recentemente, graças ao material fornecido pela lecotomia pré-frontal em seus vários tipos, as seguintes correlações entre o córtex frontal e os diversos núcleos do tálamo: a) Do núcleo mediodorsal, a porção magnocelular projeta-se sobre as áreas orbitarias 11 e 12, enquanto a parte medial da porção parvicelular projeta-se sobre a área 11 e provavelmente 47; a parte dorsolateral sobre as áreas 45 e 46 em F3; a parte ventrolateral sobre a área 8 em F1; a parte central sobre as áreas 9, 10 e possivelmente 6, em F2. O núcleo submedial projeta-se sobre a área 8 em F1. A afirmação de Freeman e Watts de que a área 8 recebe um contingente de fibras da extremidade ântero-superior do núcleo ventral do tálamo, contradiz todos os conhecimentos existentes na anatomia e fisiologia nervosa. O núcleo mediodorsal representa uma estação intermediária entre o córtex frontal e o hipotálamo, com o qual se relaciona por meio do sistema de fibras periventriculares situado nas paredes laterais do III ventrículo. Este sistema foi demonstrado anatomicamente e neuroniograficamente. Pela neuroniografia, foi demonstrada a existência funcional de vias entre o hipotálamo e o núcleo mediodorsal, núcleo mediodorsal e o córtex frontal ipsi e contralateral, e do córtex frontal para o núcleo mediodorsal e para o hipotálamo. O hipotálamo está, portanto, em relação aferente com o córtex através do núcleo mediodorsal e em relação aferente direta córtico-hipotalâmica. Demonstrou-se ainda, por este método, uma via do núcleo ventrolateral do tálamo para o núcleo mediodorsal e outra para o hipotálamo. Estes achados fornecem a base necessária para se considerar os impulsos enviados ao córtex pelo núcleo mediodorsal como resultantes da fusão de impulsos talâmicos e hipotalâmicos. b) O núcleo anterior (parte anteromedial) projeta-se sobre as áreas 24 e 23. Este núcleo corresponde à estação terminal do feixe mamilotalâmico. O corpo mamilar recebe o sistema do fórnice. Temos, assim, uma via hipocampo-hipotálamo-tálamo-cortical. As áreas 24 e 23 podem, então, ser consideradas como projeções neopaliais do hipocampo. Devido ao desconhecimento reinante sobre as funções do hipocampo, o significado funcional destas projeções é ainda incerto. Foi apenas verificada a atividade supressora resultante do estímulo da área 24. A importância maior destas conexões tálamo-hipotálamo-frontais decorre da demonstração de que a maior parte do córtex frontal é uma área de projeção aferente, semelhante a outras, como a visual e a auditiva.

Merecem destaque certas experiências mostrando que o estímulo elétrico da lâmina medular medial do talamo repercute sobre o eletrocorticograma de toda a superfície cerebral. Desta maneira, ao lado de uma correspondência segmentar entre o tálamo e o córtex cerebral, haveria um sistema de conexões difuso entre os núcleos intralaminares e a superfície cortical.

Apesar da contribuição da neuroniografia, muito ainda existe para ser esclarecido no tocante às vias de associação intercorticais do lobo frontal. As seguintes foram bem demonstradas: Da área 6 para a área 8. Vias longas, da área 18 para a área 8 (no macaco) e da área 8 para a área 18, o que permite se relacionem os produtos resultantes das atividades frontal e visual. A área 47 (frontal orbitária agranular) relaciona-se, através do feixe unciforme, com a área 38, no polo temporal. A área 18 relaciona-se com a área 20, cm T3. Desta maneira, é possível conceber-se a existência de uma relação fronto-temporal por meio do circuito: áreas 8-18-20, além da relação direta 47-20. A área 8, ao contrário do que acontece com outras áreas supressoras, não tem conexões homólogas com a área 8 do lado oposto, mas com o córtex da área 18, do lado oposto. As áreas supressoras 19s, 2s, 4s, 8s, e 24s projetam para o cinturão cingular formado pelo conjunto de áreas 32 e 31. Este cinturão recebe impulsos de todas as áreas supressoras, não tendo por si mesmo atividade supressora. O seu significado exato é ainda desconhecido. As conexões eferentes subcorticais são: córtico-estriadas (áreas 8 e 24 para o núcleo caudado, fazendo parte do circuito supressor córtico-subcórtico-cortical); córtico-talâmicas (estabelecidas por meio de dados fornecidos pela eletrofisiologia e método de Marchi, em animais e no homem, mas não conclusivos); córtico-hipotalâmicas (o achado de sistemas aferentes e eferentes entre o córtex e o hipotálamo indica a estreita cooperação funcional existente entre ambos); córtico-pontinas (área 10-protuberância); córtico-tegmentais (áreas 6, 8, 9 e possivelmente 46-tegmentum e talvez substância negra e núcleo subtalâmico). O trabalho é ilustrado por esquemas bem elucidativos e deve ser lido por todos interessados no estudo da fisiologia do lobo frontal.

A. Sette Jr.

Patologia encéfalo-medular

Balismo e o núcleo subtalâmico (Ballism and the subthalamic nucleus). J. R. Whittier. Arch. Neurol a. Psychiat. 58: 672-692 (dezembro) 1947.

Balismos são movimentos involuntários realizados à custa das articulações proximais dos membros, especialmente superiores, semelhantes a movimentos de arremesso. Já haviam sido assinalados por Charcot em 1879, que os chamou hemicoréia; Kussmaul denominou-os balismos (do latim "ballista", do grego "ballein" - arremessar); von Monakow observou sua ocorrência em amolecimentos e tumores intracranianos, especialmente quando localizados na região posterior do tálamo ou na área lenticulo-óptica; Bonhoeffer admitiu que a lesão se situasse na região subtalâmica, tendo Touche (1901) localizado o processo patológico no corpo de Luys.

Durante muito tempo considerou-se o balismo como movimento involuntário semelhante à coréia, dela diferindo apenas quantitativamente. Ainda em 1942, dizia Bucy que "a definição de hemibalismo assenta primàriamente sobre a patologia e não sobre o quadro clínico". Outros autores insurgiram-se contra esta opinião, afirmando que o caráter do balismo não apresenta a menor semelhança com os movimentos coreiforme (Keschner). O A. cita a discussão a respeito de uma caso apresentado por Hallervorden como sendo de balismo sem lesão do núcleo de Luys, o que foi refutado por Bonhoeffer, que considerou a hipercinesia como uma coréia senil.

O A. visa, pela revisão de 60 casos da literatura, especialmente de 30 bem estudados clínica e patològicamente, estabelecer se o balismo constitui uma entidade nosologica e qual a sua relação com o núcleo subtalâmico. A idade média de aparecimento do balismo foi de 64 anos; o início foi em geral súbito (vascular), menos num caso de tubérculo subtalâmico; os movimentos limitam-se geralmente ao lado oposto à lesão, embora possam às vezes ser notados, menos intensamente, do mesmo lado; em certos casos, ha predominantemente um monobalismo braquial, outras vezes há propagação para a cabeça, com distúrbios da palavra e da deglutição. Prepondera a hipotonia. As hipercinesias se intensificam pela atenção ou emoção, cessam durante o sono e só momentâneamente e com grande esfôrço são dominadas pela vontade. Como tratamento, têm sido empregados o cloral, escopolamina, morfina, estramônio, curare e atropina, conseguindo-se apenas diminuir a violência dos movimentos e possibilitar o sono. Em certos casos, a natureza do processo permite o tratamento cirúrgico. Raramente há distúrbios psíquicos; nunca existem, nos casos de lesão bem localizada no corpo de Luys, alterações dos reflexos ou da sensibilidade. A morte ocorre em época variada, de dias até vários meses após o início da moléstia. O prognóstico é sempre grave.

Alterações patológicas isoladas do núcleo de Luys foram encontradas em 13 dos 30 casos revistos pelo A. A lesão, entretanto, pode afetar áreas circunvizinhas: alça lenticular, fascículos talâmicos, cápsula interna, substância negra. Apenas em 2 casos a lesão se localizava estritamente no corpo de Luys. Nos casos restantes (17), havia lesão concomitante de outros setores do sistema nervoso, porém a determinação da idade das lesões histológicas permitia relacionar sempre o balismo com o comprometimento do corpo de Luys. O A. assinala também que não foi descrito qualquer caso de lesão assintomática desta formação. Certamente, é necessário que permaneçam intactas outras estruturas, para que a hipercinesia se manifeste; há casos de lesão Iuysiana associada a hemorragias, seja de todo um hemisfério cerebral, seja da cápsula interna, seja do tálamo, estriado e substância branca, nos quais o balismo não se manifestou. Interessante notar que, em 1 caso, a movimentação cessou temporàriamente durante dois ataques intercorrentes de pneumonia.

Em 5 casos foram notados distúrbios neurovegetativos (hiperidrose, vasodilatação, edema, hipertermia), ora contralaterais, ora do mesmo lado da lesão. Porém, a associação de lesões em estruturas vizinhas ao corpo de Luys torna impraticável que se atribua a este núcleo uma função neurovegetativa.

- Vários autores admitem uma relação somatotópica no corpo de Luys, tendo a cabeça, os membros superiores, o tronco e os membros inferiores uma representação no sentido rostro-caudal.

O A. refere, depois, mais 30 casos de balismo, nos quais, ou havia apenas lesão das conexões luysianas, ou o processo patotógico era generalizado, ou ainda casos em que não foram demonstradas lesões do corpo subtalâmico (em 1, havia lesão do neostriado e núcleo medial do tálamo, em outro, atrofia da circunvolução PA, no 3.°, atrofia da insula e no 4.°, apenas lesão da cápsula interna e do neostriado). A propósito destes casos, o A. ressalta a dificuldade em se chegar a uma idéia precisa sobre o caráter das hipercinesias descritas como balismos, pelos diversos autores, se se levar apenas em conta a descrição escrita dos movimentos, sem a indispensável documentação cinematográfica.

H. Canelas

Demência pré-senil hereditária por atrofia cortical. Enfrmidade de Pick?. (Demencia presenil hereditaria por atrofia cortical. Enfermedad de Pick?). J. Bebin e V. Paredes. Rev. Neuro-Psiquiat., 10: 177-188 (junho) 1947.

Os AA. apresentam a observação de um paciente cujas mãe e avó tinham apresentado, alguns anos antes do falecimento, estados demenciais e no qual, a partir dos 52 anos, iniciou-se decadência mental progressiva, predominando deficiências da memória, compreensão, juízo e capacidade crítica. Ao exame havia ainda apraxia, paragrafia, agramatismo, tremores, porém nenhum sinal de localização. Chamam a atenção para o exame pneumencefalográfico, com o qual evidenciaram atrofia cortical de predominância frontal. Após comentarem as particularidades do caso e a dificuldade que há no diagnóstico diferencial entre as doenças de Alzheimer e a de Pick, optam por esta última, autorizados por uma série de argumentos convincentes. Os próprios AA. lamentam não ter sido feito o eletrencefalograma e a biópsia cortical, que assegurariam o diagnóstico.

J. A. Caetano da Silva Jr.

Epilepsia mioclônica do tipo Unverricht. Estudo genético. Verificações eletrencefalográficas. (L'épilepsie mioclonique de type Unverricht. Étude génètique. Constatations électro-encéphalographiques). J. Delay, H. Fischgold, P. Pichot e G. Verdeaux. Rev. Neurol., 79: 430-433 (junho) 1947.

São referidos 3 casos de epilepsia mioclônica de Unverricht, ocorrendo em irmãos, cada qual mostrando um estádio diferente: 1.º caso - Ana, com 20 anos. Esta doente aos 15 anos apresentou crises convulsivas, que, em pouco tempo, passaram a surgir em número de 2 a 3 por mês. Aos 19 anos, às crises se somaram mioclonias; três meses depois, o quadro clínico se resumia em mioclonias, ausências e crises comiciais. Finalmente, quatro meses depois, já se notava enfraquecimento mental, que progrediu até a data em que foi observada pelos AA. 2.° caso - Suzanne, com 17 anos. Ao mesmo tempo que a irmã, passou a exibir mioclonias e crises de ausências. 3.º caso - Bernard, com 15 anos; em toda sua história clínica evidenciou-se apenas uma ausência. Sob o ponto de vista eletrencefalográfico, constatou-se rigorosa identidade de traçados nos 3 casos, com desaparecimento de todo o ritmo alfa e aparecimento de ondas numa freqüência de 5 a 6 por segundo. Conclusão interessante e que contradiz toda experiência anterior é o fato do EEG ter apresentado alterações de igual gravidade, embora o estádio clínico da molestia se apresentasse diferente nos três doentes.

Também interessante é o estudo dos familiares, falando em favor de uma hereditariedade de caráter recessivo (pais indenes clinicamente e primos consangüíneos). Do lado materno constatou-se tara neuro-psiquátrica pesada, caracterizada por psicopatias de colorido depressivo, epilepsia, etc. A própria progenitora apresentou episódio depressivo em 1931, que curou espontaneamente, sendo que, dos 11 indivíduos de que se compunha a irmandade, apenas 6 foram normais. Do lado paterno, nada de neuro ou psicopatológico, a não ser nistagmo congênito do próprio pai. O EEG praticado nos progenitores foi normal.

Terminam tecendo mais algumas considerações gerais a propósito da ligação, na mesma árvore genealógica, de três afecções familiares - moléstia de Unverricht, perturbações psíquicas e nistagmo congênito - lembrando a possibilidade de ser feito o diagnóstico numa fase pré-clínica da moléstia, por intermédio do eletrencefalograma.

H. Montenegro Costa

Classificação da hidrocefalia. (clasificación de la hidrocefalia). e. d. rocca. Rev. Neuro-Psiquiat., 10: 189-195 (junho) 1947.

Após rápida e sucinta revisão de estudos e classificaficações propostas para as hidrocefalias, o A. sugere uma classificação baseada no fator anátomo-clínico. De acordo com esse critério, divide-as em dois tipos, obstrutivo e comunicante, cada um deles podendo ser congênito ou adquirido. Na hidrocefalia obstrutiva congênita os fatôres etiológicos seriam agenes'as e disgenesias, enquanto que, na adquirida, seriam as inflamações, neoformações e parasitas. Nas formas comunicantes congênitas, surgiram como causas a hipertrofia dos plexos corióideos, os transtornos da absorção do líquor e as atrofias das vilosidades coriódeas. Nas formas comunicantes adquiridas, haveria, além dos neoplasmas e processos inflamatórios, as doenças degenerativas, produzindo então hidrocefalias internas ou externas sem hipertensão. O A., relator oficial desse tema no Segundo Congresso Sul-Americano de Neurocirurgia, teve aprovada essa classificação, justificada por uma série de conclusões que destacaram as múltiplas causas determinantes das hidrocefalias e a dificuldade na adoção de uma classificação definitiva, ao mesmo tempo anatômica, patogênica e clínica.

J. A. Caetano da Silva Jr.

Sôbre a paralisia espasmódica familial (Sobre la parálisis espástica familiar). A. Escudero Ortuño e E. Varela de Seijas. Actas Españolas de Neurol, y Psiquiat. 5: 118-132 (abril) 1946.

Os AA. observaram três irmãos, portadores de enfermidade iniciada em redor dos 13 anos de idade, e caracterizada por amiotrofias nas mãos (tipo Aran-Duchenne), paraplegia crural espasmódica, pé cavo, distrofias cutâneas e debilidade mental. A propósito destes casos, que rotulam como de paralisia espasmódica familial, os AA. fazem considerações sobre o conceito unitário que engloba na mesma categoria nosológica as enfermidades de Strümpell-Lorrain, Friedreich e Pierre Marie. No diagnóstico diferencial, é afastada a hipótese de uma forma familial da esclerose em placas. A esclerose lateral amiotrófica é descartada, em vista da época de início da moléstia, da ausência de sinais bulbares e da presença de pés cavos. Entretanto, os AA. acreditam que as enfermidades de Charcot e de Strümpell-Lorrain possam ser aproximadas em patologia, constituindo os casos observados formas de transição entre elas e a moléstia de Friedreich. Os AA. discutem a freqüência da lesão dos feixes espinocerebelares (às vezes apenas verificada pela necrópsia) na paraplegia espasmódica familial, fato que a liga ainda mais às heredodegenerações espinocerebelares. Por fim, são referidas as observações de Schäffer, que verificou lesões degenerativas fibrilares e celulares no córtex cerebral da área motora, considerando secundária a degeneração dos tractos corticospinais na medula.

H. Canelas

Opsoclonia - raro sinal ocular na polioencefalite. (Opsoclonia - a raresign in polioencephalitis). D. E. Marmon e J. Sandilands. Lancet, 253: 508 (outubro) 1947.

Os AA. relatam a ocorrência de vários casos de poliomielite com sinais oculares dominando o quadro clínico, destacando, para publicação, o quadro que lhes pareceu mais ilustrativo. Trata-se de um menino de 35 meses que, gozando boa saúde, subitamente passou a apresentar dificuldade e falta de firmeza na marcha. No dia seguinte, instalou-se estrabismo e foi notado que seus olhos se movimentavam de maneira estranha. Nas 24 horas subseqüentes apresentou-se febril, inapetente, tendo vomitado. Foi admitido ao hospital extremamente corado, palrador, com labilidade de humor, rindo e chorando sem motivo aparente. Os globos oculares apresentavam movimentos nistagmiformes, de amplitude decrescente, muito semelhantes ao nistagmo verdadeiro. Os movimentos se faziam usualmente no plano horizontal, mas foram observados, também, nos sentidos vertical e oblíquo e, ocasionalmente, um ou outro elemento rotatório. Os movimentos surgiam quase sempre antes que os olhos se fixassem a um objeto, intensificando-se com a emoção. Entre outros sinais neurológicos que acompanharam o quadro, assinalam os AA. tremor das pálpebras e da cabeça, tremor intencional dos membros superiores, marcha atáxica, com aumento da base de sustentação. Os reflexos, a força muscular, tono e temperatura eram normais. O quadro remitiu em 15 dias, ocasião em que foi concedida alta ao doente.

Os AA. fazem, a seguir, a revisão da literatura existente sobre o assunto, consignando maior importância aos dados fornecidos por Orzechowski (1927), que descreveu o sinal com a denominação de opsoclonia ou, também, ataxia mioclônica. Os casos estudados por Orzechowski enquadram-se perfeitamente nas características observadas pelos AA. O fenômeno seria causado pela lesão dos gânglios basais, com ou sem comprometimento do cerebelo e suas conexões. Fisiologicamente, classificam a desordem ao lado das mioclonias, considerando-a relacionada às várias desordens dos movimentos oculares, observadas durante e após a encefalite.

H. Montenegro Costa

A sarcomatose meníngea primitiva. Estudo clínico e histopatológico. (La sarcomatose meningée primitive. Etude clinique et histopathologique). S. Bronfman e M. Reumontt. J. Belge de Neurol, et de Psychiat., 47: 729-757 (dezembro) 1947.

Os AA. apresentam 2 casos de sarcomatose meníngea observados em um ano, fazendo, a seguir, revisão de 29 casos descritos na literatura. Eliminaram todos os casos de gliomatose e carcinomatose. Afirmam ser afecção rara com sintomatologia polimorfa. Apesar disso, tentam fazer uma classificação dos aspectos clínicos encontrados, com base nas 31 observações citadas. Sugerem a existência de forma espinhal, forma cerebral e forma polineurítica ou polirradiculoneurítica. Os próprios AA. acentuam a precaridade dessa classificação, por ser uma doença que se manifesta, cedo ou tarde, por sinais de comprometimento global do sistema nervoso. Na maioria dos casos, só foi possível o diagnóstico após necroscopia. Chamam a atenção para a hipoglicorraquia, sintoma presente em todos os casos, porém possível de ser encontrado em gliomatoses e carcinomatoses. Ocorre em crianças ou adultos e a sobrevida é pequena, em média até 5 meses. Apresentam o estudo aná- lomo-patológico de 2 casos; a sarcomatose apresenta-se macroscòpicamente sob três formas de infiltração: difusa, nodular e mista; microscopicamente, as leptomeninges apresentam-se infiltradas por células neoplásticas polimorfas.

J. A. Caetano da Silva Jr.

Meningite tuberculosa em crianças. (Tuberculous meningitis in children). E. M. Lincoln, T. W. Kirmse e E. de Vito. J. A. M. A., 136:593 (fevereiro-28) 1948.

Os AA., baseados no efeito benéfico do promizole no tratamento da tuberculose miliar e na sua ineficácia na meningite tuberculosa, resolveram empregar a associação estreptomicina-promizole. Esta associação tem por fim utilizar a ação imediata da estreptomicina, temporariamente, e, depois, continuar o tratamento com promizole, pois esta sulfona pode ser administrada com segurança e eficazmente por períodos de anos. A administração da estreptomicina não difere da empregada no tratamento clássico da meningite tuberculose com esse antibiótico, sendo a administração intramuscular continuada por um período de 6 meses. O promizole é administrado por via oral, com intervalos de 6 a 12 horas, sendo a dose total diária de meia a uma grama. Esta dose diária é gradualmente aumentada até que se obtenha no sangue uma taxa de 2 a 3 mgrs/cc. Alguns doentes toleraram até 5 grs. diárias. A dose de manutenção diária após os 6 primeiros meses de tratamento é, em média, 1 grama. O mais temível efeito tóxico da administração da estreptomicina é a surdez. Os efeitos tóxicos do promizole se relacionam principalmente com a tireóide e a maturação sexual.

Os AA. apresentam 7 casos em que empregam a associação do promizole e estreptomicina, tendo obtido 6 curas clínicas e apenas 1 caso letal. Os AA. do presente trabalho confessam que seus pacientes ainda não estão sob observação durante um tempo suficientemente longo para serem tidos como curados, ainda que não apresentem acentuados distúrbios neurológicos e sejam mentalmente normais.

Dante Giorgi

Actinomicose do cérebro (Actinomycosis of the brain). W. Lewin e A. D. Morgan. J. Neurol., Neurosurg. a. Psychiat., 10: 163-170 (novembro) 1947.

Um caso anátomo-clínico de actinomicose encefálica com lesão do esfenóide é relatado pormenorizadamente. Tratava-se de indivíduo de 31 anos, que apresentou moléstia febril prolongada (7 meses) com cefaléia, paralisia de pares cranianos e hemiplegia. O diagnóstico etiológico só foi feito post mortem. O caso ilustra muito bem diversas características clínicas da actinomicose, como sejam a cronicidade, a remissão de sintomas do sistema nervoso e estado geral mau devido à toxidez. Chama a atenção o fato de não haver alteração do liqüido cefalorraquidiano, a não ser poucos dias antes do falecimento, apesar das múltiplas lesões e sintomas apresentados, assim como a normalidade da prova de Queckenstedt, com trombose do seio venoso transverso dum lado (na autópsia foi encontrado um trombo que não aderia à parede do seio). A autópsia mostrou trombose do seio longitudinal superior, do lateral direito, do transverso e petroso superior; erosão no esfenóide; empiema subdural na região parietoccipital direita. Os AA. fazem extensa revisão bibliográfica a respeito da localização dos actinomicetos na região da sela turca, assim como a respeito dos modos de invasão do sistema nervoso. A via mais comum é a hemática (metástase); em seguida, a extensão direta da lesão dos ossos e cavidades do crânio e, por último, a lesão primária (rara).

J. M. Taques Bittencourt

Encefalopatia arsenical nas tropas indianas (Arsenical encephalopathy in Indian troops). L. Krainer, D. A. K. Black, R. J. Mcgill e N. V. Rao. J. Neurol., Neurosurg. a. Psychiat, 10: 171-182 (novembro) 1947.

Durante a última guerra, as tropas indianas mostraram-se mais susceptíveis que as outras para a encefalopatia arsenical. Este fato chamou a atenção dos encarregados da prevenção antivenérea e dos especialistas em neurologia. No presente estudo, os AA. revêm toda a questão, baseados em farto material. O trabalho está dividido em três partes: estatística, clínica e patológica. Na primeira parte, referem que a incidência de encefalopatia observada na tropa é a mesma da do povo indiano, a não ser duas tribos (Madrassis e Mahratas) que apresentam ainda maior incidência, que se deve, não à raça, mas ao fato de serem essas tribos mal alimentadas e sua dieta ter grande falta de vitaminas B e C. Verificaram também que as classes pobres apresentam maior incidência que as ricas. Referem ainda que a malária, antes ou durante a arsenoterapia, aumenta a incidência do acidente. Na segunda parte, dividem o quadro clínico da encefalopatia arsenical em quatro graus No primeiro, após início súbito (ataque epiléptico), o paciente apresenta leve torpor, mas responde às perguntas e coopera no exame, apresenta alucinações visuais e confusão mental. No segundo grau, o paciente se encontra mais obnubilado e não cooperativo, tem febre, hiperestesia, hiperreflexia e clono; as pupilas são pequenas, irregulares, mas reagem à luz. No terceiro grau, há estertor, respiração anormal, incontinência de esfíncter, ataques convulsivos, hiperreflexia, sinais de Kernig, Brudzinski e Babinski, pupilas dilatadas reagindo pouco ou nada à luz. No quarto grau, o paciente cai em coma, com grande hiperpirexia. O exame do liqüido cefalorraquidiano mostra pressão normal, citologia pouco ou nada aumentada e grande hiperproteinorraquia. Na terceira parte, relatam as lesões encontradas em 60 casos autopsiados (mortalidade 76%; não usaram o dimercaprol no tratamento). Os achados mais freqüentes são: hemorragia perivascular, exsudação viscosa de plasma, infiltração celular perivascular e leve edema intersticial. Estes fatos provam que a encefalopatia arsenical dos indianos é, patologicamente, idêntica à encefalopatia arsenical. Por último, os AA. se atêm na discussão da causa e do mecanismo da complicação, aceitando a teoria de que ela é resultado da toxidez do arsênico sobre as células. O arsênico lesa os vasos sangüíneos cerebrais, que perdem sua permeabilidade seletiva, facilitando a penetração do arsênico no parênquima nervoso, onde interfere no sistema de oxidação do tecido.

J. M. Taques Bittencourt

Enfermidade de Crouzon e crânio lacunar. (Enfermedad de Crouzon y craneo lacunar). J. Franco. Rev. Neuro-Psiquiat., 10: 50-96, 1947.

O A. apresenta 2 casos de deformidade craniana, sendo um de enfermidade de Crouzon, mas com quadro radiográfico correspondente ao crânio lacunar, e o outro um caso clássico de enfermidade de Crouzon. O primeiro caso é o que oferece margem a considerações de maior interesse, permitindo também ao A. admitir que seja a hipertensão craniana o fator determinante das impressões digitais, tanto no crânio lacunar como na disostose craniofacial hereditária.

Após tecer considerações gerais sobre as deformidades cranianas, o A passa a relatar as suas observações. No primeiro caso, tratava-se de criança de 7 anos, em cujos antecedentes familiares foi comprovado um caso frusto de disostose craniofacial, no pai. Clinicamente, a criança apresentava: proeminência óssea bregmática, exoftalmo bilateral pronunciado, estrabismo divergente esquerdo, nariz em bico de papagaio, prognatismo mandibular, redução do maciço facial superior, atrofia óptica secundária e hipometabolismo basal. A radiografia mostrava, porém, o quadro do crânio lacunar (Lückenschädel) e sinostose das suturas. Havia, pois, clinicamente, o quadro da enfermidade de Crouzon e, radiològicamente, o quadro do crânio lacunar e sinais de craniostenose.

O segundo caso era de um menino, também de 7 anos, em cujos antecedentes hereditários foram encontrados casos de perturbações neuropsíquicas e de disostose craniofacial, tendo, nos antecedentesapessoais, história de gestação e parto normais. Clínica e radiologicamente, apresentava alterações craniofaciais típicas da enfermidade de Crouzon. No primeiro caso, havia a conjunção de três entidades nosológicas: a disostose craniofacial hereditária, clinicamente; o crânio lacunar e a craniostenose, radiologicamente. Acha o A. que, sendo o fator hereditário fundamental na etiologia da enfermidade de Crouzon, enquanto que no crânio lacunar só há um fator congênito, não ligado à herança, houve nesse caso a ocorrência dos dois fatores. O fator congênito, provàvelmente intra-uterino (aumento da pressão; hidrâmnios, hipertonia uterina, etc.) explicaria a imagem radiográfica constante - impressões digitais com características especiais dependentes de hipertensão craniana. Do ponto de vista nosográfico, acha o A. que está frente a um novo tipo de malformação craniofacial, ainda não descrito na literatura, e que denomina de disostose craniofacial lacunar hereditária, em cuja patogenia cabem duas hipóteses: 1) Como fatores etiológicos haveria a herança e um transtorno congênito superajuntado, que seria responsável pela sinostose, a qual por sua vez originaria a hipertensão craniana; 2) O fator etiológico seria unicamente hereditário, estando condicionado à existência de dois ou mais gens produtores da aparente pluralidade de aspectos. A confirmação de uma dessas hipóteses só poderá ser feita durante um longo tempo, pelo estudo de novos casos e acompanhando as leis de herança através de várias gerações. O A. estuda detalhadamente as múltiplas variedades e anomalias do crânio estabelecendo as características de cada uma delas.

C. Pereira da Silva

Enfermidade de Sturge-Weber-Dimitri. (Sturge-Weber-Dimitri's disease). B. W. Lichtenstein e C. Rosenberg. J. Neuropathol. a. Exper. Neurol., 6: 369-382 (outubro) 1947.

O estudo anátomo-clínico detalhado de um caso abortivo de enfermidade de Sturge-Weber-Dimitri serviu de base aos AA. para uma revisão da etiopatogenia da afecção. No caso em apreço (menina de 7 anos, observada durante 7 anos), havia clinicamente convulsões e grande retardamento mental e, anatomicamente, deformação do polo occipital direito, apresentando-se ele recoberto por leptomeninges espessadas e com numerosas veias dilatadas e congestas, em contraste com o restante do encéfalo. O estudo microscópico revelou também alterações exclusivamente locais, consistentes em fibrose das leptomeninges, com largas e numerosas veias e proliferação de elementos mesoteliais, enquanto que, no parênquima cerebral subjacente, encontrava-se espessamento acentuado das paredes dos capilares e deposição pericapilar de pigmentos férricos (minucioso estudo histoquímico os levou a essa conclusão) e atrofia dos elementos neuronais. Tais alterações eram mais intensas e histologicamente mais antigas nas camadas superficiais do córtex, mais recentes na camada ganglionar e quase ausentes nas camadas internas. Analisando estes elementos e os discutindo em face de outros casos de concreções calcáreas e férricas da corticalidade, evidentemente secundárias, os AA. chegam à conclusão de que os vasos telangiectásicos e cheios de sangue das leptomeninges, determinando estase capilar crônica do parênquima cerebral, são os responsáveis pelas alterações deste (esclerose progressiva e concreções calcáreas e férricas finais). Por outro lado, o estudo comparativo e embriológico das displasias mesenquimais (enfermidades de Lindau, de Kufs, de Osler), os levou à conclusão que a enfermidade de Sturge-Weber-Dimitri é uma displasia hemangiomatosa mesenquimal da região cefálica, cujas lesões situam-se em áreas limítrofes do ectoderma-subcútis, mucosas da boca e fossas nasais, coróide e leptomeninges. O quadro radiológico tido como característico da enfermidade (calcificações de duplo contorno) não o é, representando a tradução de uma deposição calcárea secundária, tal como acontece com numerosos outros quadros mórbidos. Tais sombras calcificadas podem ser de vasos meníngeos ou de circunvoluções, e as enfermidades de Krabbe e de Sturge-Weber-Dimitri nada mais são que estádios cronologicamente diversos de um mesmo processo.

P. Pinto Pupo

Paraplegia espasmódica com extensa angiomatose cutânea. Forma baixa da moléstia de Sturge-Weber-Krabbe? (Paraplégie spasmodique avec vaste angiomatose cutanée. Forme basse de la maladie de Sturge-Weber-Krabbe?). D. Louis-Bar. Travaux de l'Institut Bunge (Anvers), vol. 4: 1947.

A A. apresenta o caso de uma criança de 5 anos, nascida de parto prematuro, que apresentara retardo da marcha e da fala, sendo portadora de máculas angiomatosas nos membros superiores e inferiores, paraplegia crural espasmódica, nítida hipermetria dos membros inferiores limitada por certa espasmodicidade, sendo os membros superiores igualmente rígidos, e menor desenvolvimento da metade direita do corpo. Nos antecedentes familiares foram notados vários casos de debilidade mental ou ligeiras psicopatias e malformações congênitas. Os exames do fundo de ôlho, liqüido cefalorraqueano, sangue e radiográfico de crânio nada revelaram de anormal. Baseada na presença de angiomas cutâneos, a A. admite a possibilidade de que uma angiomatose intra-raquidiana fosse responsável pela paraplegia. Revendo a literatura médica sobre o assunto, cita 6 casos em que foi possível encontrar lesões medulares por angiomatose associada a nevus vasculares cutâneos. Chama a atenção para o aspecto particular, em alvéolos, da imagem radiográfica do lipiodol parimedular, descrita por Guillain, Schmit e Bertrand, o que seria devido a irregularidades do tumor medular. Termina admitindo que não é possígel afirmar ainda a existência de uma forma baixa da moléstia de Sturge-Weber-Krabbe. Neste trabalho, infelizmente, não é feita qualquer referência â perimielografia, que poderia fornecer dados valiosos para confirmar a suposição da autora.

W. Brotto

Os tumores intrabulbares. Estudo crítico. (Les tumeurs intrabulbaires. (Étude critique). J. A. Chavany e M. Feld. Rev. Neurol. 79: 14-24 (janeiro) 1947.

Depois de recordarem os principais trabalhos publicados sobre os tumores bulbares, os AA. relatam as observações de 18 casos, estudados no Serviço do Prof. Clovis Vicent. Desses 18 casos, 9 eram tumores estritamente intrabulbares, 5 bulboprotuberanciais e 4 bulboventriculares.

Concluem os AA. que o protótipo clínico dos tumores intrabulbares parece ser constituído pela associação de uma hipertensão moderada da fossa cerebral posterior com comprometimento disseminado dos nervos bulbares. A propósito dessas observações, acentuam os seguintes pontos: 1 - Os sinais de hipertensão craniana são constantes, mais ou menos acusados e precoces, mas a síndrome de dilatação ventricular é apenas esboçada; 2 - As paralisias nucleares incompletas, parceladas, dissociadas, não são proporcionais ao desenvolvimento do tumor, sendo digna de nota a grande tolerância dos nervos bulbares; 3 - A ventriculografia revela discreta dilatação ao nível da região infratentorial. Quanto à conduta terapêutica, assinalam os AA. que, embora os tumores intrabulbares não sejam curáveis, devem ser operados, justificando-se a intervenção pela imprecisão dos dados clínicos (que não permitem muitas vezes a distinção entre os tumores intra e juxtabulbares) e pela descompressão da fossa cerebral posterior. A radioterapta deverá ser utilizada como complemento à intervenção cirúrgica. A sobre-vida do paciente poderá ser relativamente longa.

O. F. Julião

Angiomatose encéfalo-trigeminal (Sturge-Weber) sem calcificações radiologicamente demonstráveis. (Angiomatose encéphalo-trigéminé; (Sturge-Weber) sans calcifications radiologiquement décelables). C. Haemerlinck, G. Myle e L. van Bogaert. J. Neurol., Neurosurg. a. Psychiat., 10: 93 (agosto) 1947.

Trata-se do caso de um paciente que apresentava crises convulsivas generalizadas desde 15 meses de idade; idiotia com a idade mental de 2 anos, angiomatose cutânea em toda hemiface direita e parte da hemiface esquerda, parte do hemicrânio, espádua, parte superior da região peitoral, metade lateral do braço, antebraço, mão e parte da superfície dorsal dos dedos da mão do lado direito, com hiperplasia dos maxilares superiores e inferiores e da hemilíngua e metade de abóbada palatina à direita. O exame neurológico revelou vivacidade dos reflexos tendinosos e abolição dos reflexos cutâneo-abdominais à esquerda.

O exame radiológico revelou crânio hiperplástico e abóbada espessada e mais vascularizada sobretudo à esquerda, discreta hipoplasia do hemicrânio direito, osteoporose difusa, maciço maxilomandibular fortemente hiperplástico. A verificação anatômica revelou numerosos focos de calcificação intracraniana, em virtude do que foi feito reexame das chapas, notando-se então, sob a sutura lambdóidea, uma sombra apenas perceptível que parecia corresponder a um precipitado de pseudocálcio nos lobos occipitais. O exame radiológico dos cortes frontais dos lobos occipitais evidenciou algumas placas de calcificação, mas sem o aspecto pseudovascular que se encontra habitualmente na moléstia de Sturge-Weber. Ao exame histológico foi encontrado: vascularização aumentada da dura-máter que recobria a metade direita da base do crânio, pequenos vasos que iam da face interna do crânio à dura-máter da base, rede telangiectasia muito desenvolvida, principalmente na parte que recobria a região parietoccipital direita, dilatação anormal das pequenas veias anastomóticas da rede venosa na face superior do cérebro (sobretudo da grande veia esquerda) e atrofia de todo o hemisfério direito.

O interesse do caso reside na participação maciça e bilateral da duramáter na angiomatose e na presença de pseudocálcio nos dois hemisférios cerebrais e ainda no fato de que numerosas placas de calcificação intracerebrais podem escapar ao exame radiológico intravitam.

W. Brotto

Bacilo da tuberculose no líquido cefalorraqueano em casos de demência precoce. (Tubercle bacilli in cerebrospinal fluid of dementia praecox) R. A. Darke. J. Nerv. a. Ment. Dis., 106: 686 (dezembro) 1947.

O A. estuda o velho problema da etiologia tuberculosa da demência precoce. Trazendo uma contribuição ao problema, estudou 19 doentes mentais livres de tuberculose e 7 esquizofrênicos com tuberculose pulmonar. Dos 19 doentes mentais, 17 eram dementes precoces. A pesquisa foi feita no liqüido cefalorraqueano, com a seguinte rotina: células, proteínas, açúcar, reação de ouro coloidal, reação de Wassermann, baciloscopia direta e inoculação em cobaio. O resultado foi negativo inteiramente nos doentes mentais livres de tuberculose. Entre os esquizofrênicos com tuberculose, houve um resultado positivo pela baciloscopia direta que, entretanto, não foi confirmado pela inoculação, deixando, assim, dúvidas sobre se se tratava de bacilo de Koch ou bacilo saprofita. Além disto, a necrópsia deste paciente não permitiu confirmação categórica deste achado. O A. conclui colocando-se entre os que pensam não haver relação etiológica entre bacilo da tuberculose e esquizofrenia.

J. Baptista dos Reis

Estudos sôbre traumas raquimedulares. II: Natureza e tratamento da dor. (Studies upon spinal cord injuries. II: The nature and treatment of pain). Loyal Davis e J. Martin. J. Surg., 6: 483-491 (novembro) 1947.

Continuam os AA., neste artigo, seus estudos sobre lesões medulares, abordando, agora, aspectos da sintomatologia dolorosa, ao lado das tentativas levadas a efeito para alívio dos pacientes. Foram observados 471 pacientes, dos quais 55 receberam seus ferimentos em ocupações civis e 416 em operações de guerra. Do total, 77 apresentaram lesões ao nível da coluna cervical, 288 torácicas e 106 lombo-sacras. Dos pacientes, 126 queixaram-se de dorês extremamente violentas, sendo 8 os portadores de lesões cervicais, 73 os de torácicas e 45 os de lombo-sacras. Esta observação está em desacordo com os estudos de Gordon Holmes, que verificou maior incidência de dores violentas, ao nível da região cervical. De maneira geral, as dores experimentadas pelos pacientes podem ser divididas em: radiculares; dores urentes, formigamentos, mal localizados; e dores viscerais, caracterizadas por câimbras com localização vaga. Houve preponderância de dores radiculares em pacientes com lesões da medula lombar e da cauda eqüina. As dores e sensações mais comumente descritas foram as de queimação, de choque elétrico, de formigamento, de agulhadas e de alfinetadas. O aparecimento das dores variou entre o dia imediato à lesão até vários meses após a data do traumatismo.

Foi realizada a cordotomia em 18 pacientes. Dois experimentaram melhoras durante 1 a 2 semanas, após o que tudo voltou ao que era. Quatro receberam completo alívio de suas dores radiculares e treze não acusaram a mínima melhora. Em dois doentes foi tentada a injeção paravertebral de álcool no tronco simpático lombar, sem resultados práticos. Também foram feitas injeções intravenosas de cloreto de tetraetil-amônio em 30 doentes, sem que se registrasse o menor efeito sedante. Da medicação analgésica, nada deu melhores resultados que a aspirina, a fenacetina e cafeína. Os sedativos e narcóticos usuais também foram usados rotineiramente na evolução de todos os casos observados. É desnecessário dizer que, em 90% dos casos, exceção feita da série de 126 doentes, as dores urentes desapareceram espontâneamente, ou o doente habituou-se à dor, preocupando-se com ela após momentos de emoção ou alguns minutos antes de adormecer.

As dores descritas com as características de queimação, de formigamento, de choque elétrico, nunca são bem localizadas pelos pacientes, como também, jamais se conseguiu traçar tipo padrão de nervo pariférico ou localizar algum dermatoma especial. Citam as idéias de Holmes, baseados em pacientes com Brown-Séquard, onde se admite a possibilidade de lesão ao nível do cordão anterolateral, como também, de lesões irritativas ao nível das colunas dorsais da medula. Os AA. combatem tal opinião com o relato do aparecimento destes tipos de dores em doentes com secção total da medula. Seguem-se os experimentos de Kuntz e Saccomano sobre simpatectomias realizadas em animais de laboratório. Slaugher confirmou os resultados com um doente que tivera secção completa da medula ao nível de L1 e que, em conseqüência, passou a apresentar dores nas pernas. Este mesmo paciente curou-se completamente com a remoção bilateral do tronco simpático lombar e secção dos nervos hipogástricos. As experiências de Kuntz e Saccomano se referem a secção da medula entre L2 e L3. Nestes animais, foram seccionadas as raízes anteriores e posteriores para prevenir qualquer condução aparente Em um grupo de animais, o tronco lombar simpático foi intêrrompido, de um lado, abaixo da L8 e, os ramos comunicantes, pela remoção de vários centímetros da cadeia simpática. As extremidades inferiores estavam assim insensíveis aos estímulos extero e proprioceptivos. Entretanto, comprimindo a perna ou a coxa, colocando-se um torniquete acima ou abaixo do joelho, ou ainda, excitando-se com uma corrente farádica os nervos femural ou ciático do lado que permaneceu íntegro o simpático, obtinha-se como resposta dilatação de ambas as pupilas, o que não se verificava do lado oposto. Acreditam os experimentadores que os estímulos aparentes são conduzidos à medula pelos nervos sensitivos que atravessam o tronco simpático e seus ramos comunicantes. Todavia, não há evidência anatômica de que existam fibras aferentes simpáticas. Por outro lado, é verdade que as fibras aferentes podem caminhar com o sistema nervoso autônomo e passar, por meio de ramos comunicantes, para a medula, seja para a substância cinzenta no caso das sensações viscerais, seja para a substância branca, no caso dos impulsos simpáticos. Concluem que os impulsos aferentes partidos do segmento distal da medula lesada, que normalmente produzem a libertação de substâncias H (substâncias semelhantes à histamina) na pele e nos músculos das extremidades inferiores, podem continuar sem qualquer influência inibidora de níveis superiores. Por outro lado, impulsos periféricos ordinariamente irreconhecíveis, agora tornam-se conhecidos num número grande de doentes e são transportados para níveis superiores por fibras existentes no sistema autônomo e daí, no interior da medula acima da lesão, até o tálamo.

H. Montenegro Costa

Patologia da coluna vertebral

Sôbre a etiologia da rotura do disco intravertebral. (A consideration of etiology in the development of the ruptured intervertebral disc). R. B. Raney e A. A. Raney. California Med., 2: 65-69 (fevereiro) 1948.

Os AA. dividiram as suas considerações do seguinte modo: introdução, revisão da literatura, análise dos seus casos, princípios básicos do tratamento cirúrgico, dados estatísticos, complicações. A dor lombar tem, como causa freqüente, alterações patológicas dos discos intervertebrais. Os AA. justificam sua opinião, considerando que os indivíduos, em algum período de sua vida, apresentam dores nessa região, mas que não chegam a necessitar de cuidados médicos, curando-se por si ou pelo menos não necessitando maiores investigações. A literatura a respeito é volumosa, embora recente. Os resultados operatórios são variáveis, assinalando uma média de 70% de bons resultados. Muitos fazem a simples remoção do disco comprometido, outros fazem a remoção e a fusão. A casuística dos AA. é de 200 pacientes, que sofriam suficientemente para ser indicada a operação. Os resultados mostraram que 80% tinham típicas hérnias do disco. Em muitos casos, a mieloprafia poderia ter sido dispensada, mas em outros ela tornou-se elemento diagnóstico preponderante, uma vez que a história e os achados clínicos não forneciam os elementos característicos. Julgam os AA. que a operação seria indicada quando um destes 3 itens fôsse presente: 1 - dor aguda, persistente e sinais físicos de hérnia do disco, não respondendo ao tratamento conservador; 2 - ataques recorrentes de dor viva, com sinais físicos de hérnia, não se podendo prever até quando se poderia experimentar o tratamento conservador por motivos econômicos; 3 - perigo de alterações neurológicas irreversíveis (indicação rara). Os princípios do tratamento cirúrgico são baseados nas fôrças externas que, atuando sobre o disco, fazem-no migrar para o ponto de menor resistência, no ligamento, com conseqüente rotura e comprometimento das outras estruturas. Freqüentemente, os fatores externos são ainda acentuados pelas manobras tendentes a examinar, tratar, etc. O tratamento cirúrgico visa suprimir esta ação das forças externas pela supressão da matéria anormal, ou seja, os discos afetados. Os discos 4.° e 5.° lombares são os mais freqüentemente comprometidos, devendo sempre serem examinados. Os AA. removem o núcleo pulposo e as placas gelatinosas, conservando todavia o anulus e preenchendo o espaço com fragmentos ósseos. As raízes devem sempre ficar libertadas da compressão. A operação visa dar uma condição tão normal quanto possível. Os dados estatísticos são os seguintes: Localização das lesões - múltiplas lesões, em L3 L4 e L5 - 3%; duplas lesões, em L4 e L5 - 29,5%; lesões simples em L5 - 36%; lesão simples em T12 - 1,5%. Fôsse em ocupações leves ou pesadas, 168 pacientes não podiam trabalhar, e, entre os últimos, 85,5% retornaram ao trabalho; 8,9% tiveram que voltar ao trabalho com ocupações mais leves. Ao todo, houve 94% de bons resultados; 3,5% foram aliviados, mas continuaram a queixar-se de seus sintomas; 2,5% passaram a apresentar espasmos musculares, não melhorando e sendo considerados como tendo "additional disk disease". Os resultados nos casos de medicina do trabalho foram, de um modo geral, ruins. A incidência por idade foi maior na 3.a, 4.ª e 5.ª décadas. A duração dos sintomas variava de 4 meses a 25 anos. O período de permanência hospitalar foi, em média, 1 semana e meia. As impressões gerais que os AA. assinalam são muito interessantes: quando a operação é feita para hérnias múltiplas dos discos, o alívio é pronto e duradouro; quando o disco L5 é removido e o L4 examinado e visto ser normal, há pequena recorrência dos sintomas; quando o disco L4 é removido e o L5 deixado intacto, há bem maior recorrência dos sintomas (alguns casos foram reoperados e o disco L5 permanecia normal; ainda assim foi retirado, com o que houve melhora; a articulação prèviamente operada mostrava-se sòlidamente constituída). Espondilolistese, espinha bifida, etc., não são responsáveis pela afecção, mas podem predispor. Como complicações são referidas; retenção urinária transitória, como em todo operado da pelve; fraqueza do quadrícipe (1 caso); paraplegia (2 casos).

J. V. Dourado

Fratura e luxações da coluna vertebral. (Fractures and dislocations of the spine). W. G. Crutchfield e E. C. Schultz. Am. J. Surg., 75: 219-226 (janeiro) 1948.

Os AA. fazem breve apanhado sobre o mecanismo das lesões da coluna vertebral, mostrando a seguir quais as deformidades do canal vertebral resultantes, onde são mais comuns, e a maior ou menor gravidade das lesões conforme o tipo e localização.

A seguir, são estudados os quadros clínicos das secções completas e incompletas da medula. Na secção completa há perda motora, sensitiva e reflexa, de modo total, abaixo do nível da lesão, havendo também incontinência urinária e prisão de ventre. Todo controle visceral é perdido; entretanto, estas funções freqüentemente, retornam em grau exagerado dentro de poucas semanas. São dadas as diversas formas clínicas dependentes do nível da lesão. Na secção incompleta, grande variedade de distúrbios neurológicos é observada.

Em relação ao tratamento, os AA. acentuam os cuidados no transporte do paciente para o hospital (necessidade de se usar tábua ou maca dura), tratamento conveniente do estado de choque, fazendo-se logo a seguir o exame neurológico, radiografias e punção lombar. Na discussão do tratamento, os AA. consideram separadamente as regiões cervical, torácica e lombar. Na região cervical, mostram os AA. os brilhantes resultados obtidos pela tração esquelética, evitando deste modo a laminectomia, a não ser quando há bloqueio que doutro modo não se reduz. A tração pelo aparelho de Crutchfield evita o abuso do aparelho gessado. Luxações nas porções inferiores da região cervical são freqüentemente associadas a fraturas de pedículos, tornando difícil a manutenção do alinhamento; nestes casos, tem sido feita a tração durante 4 a 6 semanas e, a seguir, é aplicado um aparêlho gessado. Na região torácica, em geral, a hiperextensão com aparelho gessado é suficiente para o tratamento. A laminectomia deve ser feita sòmente quando há necessidade de descompressão. Na região lombar, a hiperextensão é o tratamento adequado, a não ser que haja substância óssea comprimindo a cauda eqüina, nestes casos fazendo-se então a laminectomia. São indicados os cuidados para evitar escaras, infecções urinárias, etc. Salientam a necessidade de perfeita enfermagem e de centros especializados para a reeducação dos pacientes permanentemente paralisados, onde se façam exercícios apropriados, treinamento vocacional, etc, reabilitando o paciente para uma vida útil.

Roberto P. de Araujo

Eletrencefalografia

Eletrencefalografia ativada. (Activated electroencephalograpyh). Ch. Kaufmann, C. Marshall e A. E. Walker. Arch. Neurol, a. Psychiat., 58: 533-549 (novembro) 1947.

Este trabalho baseia-se no estudo sistemático de 97 pacientes com epilepsia pós-traumática. A eletrencefalografia ativada consiste em se ativar, durante a feitura do eletrencefalograma, as disritmias latentes. Para isso, foram utilizados métodos diversos, como hiperventilação pulmonar, hidratação, administração de álcool, trimetadione, eletrochoque, penicilina, cianeto de sódio, acetilcolina, sendo, entretanto, os melhores resutados obtidos com o cardiazol em doses sublimiares. Embora êste medicamento possa provocar crises convulsivas em indivíduos não epilépticos, em doses mínimas não as provoca, e sim simples disritmias nos indivíduos predispostos, sem determinar crises clínicas. Em seus casos usaram injeção venosa de 2 cc. de cardiazol seguida, depois de 30 a 60 segundos, de injeção de 0,26 grs. de uma solução de amital sódico, com o fim de prevenir uma crise clínica, quando as disritmias se mostravam intensas. Os resultados foram compensadores, pois evidenciaram disritmias em 60% dos casos, algumas generalizadas, mas na maioria predominante ou exclusivamente localizadas. Conhecendo-se a raridade com que se obtêm na prática essas descargas eletrencefalográficas focais, pode-se avaliar a importância de tais resultados.

O. Pazzanese

Terapêutica

Uso de soralbumina em casos de edema cerebral. Nota prévia. (The use of serum-albulmin in cases of cerebral edema. Preliminary report). E. Gates e N. M. Craig. Proc. Staff Meet. Mayo Clin., 23: 89-93 (fevereiro) 1948.

Os AA. usaram uma solução de soralbumina a 25%, administrada intra-venosamente, em 30 casos após a retirada total ou subtotal de neoplasias e em 1 caso de traumatismo craniano. Em 11 dos 31 casos, os resultados não puderam ser avaliados convenientemente, em virtude de terem sido usadas, concomitantemente, outras terapêuticas. Nos 20 doentes restantes, houve melhoras definitivas e imediatas logo depois da aplicação da solução em 8 casos (40%); em 4 casos (20%), as melhoras sobrevieram tardiamente e nos restantes 8 doentes (40%), não foram verificadas melhoras de espécie alguma.

A solução de soralbumina foi bem suportada, sem dar lugar a quaisquer manifestações secundárias, e a dosagem empregada foi, em média, de 60 a 80 cc. da solução, num período de 8 a 10 minutos, não tendo sido permitido aos doentes a ingestão de líquidos nas 8 horas seguintes. Conquanto nada haja de definitivo sobre os méritos reais da medicação, a estatística obtida é encorajadora e por si só basta para aconselhar o seu uso nos centros neuro-cirúrgicos.

H. Montenegro Costa

A terapêutica intratecal é desnecessária na meningite a Hemophilus influenzae. (Intrathecal therapy not required for H. influenzae meningitis). A. L. Hoyne e R. R. Brown. J. A. M. A., 136: 597 (fevereiro, 28) 1948.

Desde 1939, com o soro de Alexander, o prognóstico da meningite por hemófilos- tornou-se menos sombrio. No início, o soro foi administrado tam- bém por via intratecal. Os AA. apresentam uma relação de trabalhos em que o soro de Alexander foi usado por via venosa e intratecal, mostrando que a mortalidade era maior nos pacientes que recebiam o soro por ambas as vias do que nos que o recebiam apenas por via intravenosa. Os AA. acreditam que a via intratecal é totalmente desnecessária. Citam, em abono de sua opinião, o trabalho de Smith e col., que apresentaram 28 casos com apenas duas mortes, sendo que, em 92,5% dos casos em que foi empregado o soro, êste foi feito quase que exclusivamente por via venosa. Concluem êstes autores que seus resultados, mesmo sem introdução intratecal, são devidos tanto à sorte quanto às grandes doses de soro empregadas. Citam ainda o trabalho de Hoyne: o emprego do soro antimeningocócico por via intratecal prolonga o tempo necessário para a cura. Outro argumento citado em favor de sua tese, é o trabalho de Blumberg, Tannenbaum e Gleich, que reduziram a mortalidade para 72%; em 2/3 de seus casos fatais, foi empregado o tratamento intratecal e, em mais da metade de suas curas, não foi utilizada a via intratecal.

Os AA. apresentam 28 casos de meningite por hemófilos, com sòmente 2 letais, dos quais um foi hospitalizado agonizante, sendo o outro uma criança de sete semanas de idade. Dos 26 curados, 21 não receberam terapêutica intratecal. Apesar de terem empregado o soro específico em 11 pacientes, é opinião dos AA. que esta forma de terapêutica não é necessária quando forem suficientes as doses de estreptomicina e sulfonamidas. Em quase todos os casos, a dose de estreptomicina foi de 100 mgrs. cada 3 horas. Todos os pacientes receberam um composto de sulfonamidas (em geral, sulfadiazina) sendo a dose inicial administrada na veia.

Da leitura do presente artigo, verifica-se que o problema da meningite se está tornando cada vez mais simples, comparado com os métodos iniciais pela penicilina e estreptomicina, quando se acreditava que êstes antibióticos só agiam convenientemente quando administrados diretamente no espaço subaracnóideo. Em nosso meio não temos ainda experiência alguma com o soro de Alexander sendo, entretanto, empregadas desde o início, como coadjuvantes do tratamento, as sulfonamidas.

Dante Giorgi

Novas experiências com a estreptomicinoterapia nos hospitais do Exército Norte-americano. (Further experiences with streptomycin therapy in United States Army Hospitais). E. J. Pulaski e S. F. Seeley. J. Laborat, a. Clín. Med., 33: 1-14 (janeiro) 1948.

Os AA. contam neste trabalho a sua experiência baseada na análise de 1200 casos. Após considerações gerais sobre a estreptomicina, apresentam uma relação de germes sensíveis. Em seguida, apresentam os resultados terapêuticos verificados em diversas circunstâncias clínicas, das quais destacamos aquelas que têm interesse neuropsiquiátrico. As meningites produzidas por bactérias sensíveis têm na estreptomicina a medicação de escolha. Os resultados obtidos são muito favoráveis, principalmente, quando aplicado o tratamento logo no início da moléstia. Dos 16 pacientes tratados, recuperaram-se 12. Aconselham o seguinte esquema de tratamento nas meningites por bacilos Gram-negativos: injeções intratecais de 50 a 100 mgrs. de estreptomicina diluída em 10 cc. de solução fisiológica, cada 24 horas, até resultados negativos da cultura. Além disto, 0,5 gr. de estreptomicina por via muscular, cada 4 horas. Não exceder de 7 dias o tratamento pela estreptomicina. Simultâneamente, associar à terapêutica a penicilina e sulfadiazina. Na terapêutica dos abscessos, a estreptomicina ocupa a mesma posição que a penicilina como agente auxiliar da drenagem cirúrgica. Em relação à tuberculose, os AA. acham a estreptomicina um agente valioso para o tratamento de certas formas. Na tuberculose pulmonar, administram, por via parenteral, 2 a 3 grs. diárias durante 4 meses. As fases exsudativas da moléstia respondem muito bem, enquanto que as formas fibrosas permanecem inalteradas. Associada à colapsoterapia, a estreptomicina oferece resultados muito bons em certos casos. Nas intervenções cirúrgicas, a estreptomicina deve ser empregada simultaneamente para evitar disseminação da moléstia. Os resultados obtidos nas faringites. laringites e tuberculose brônquica são geralmente animadores. Os resultados obtidos na meningite tuberculosa e tuberculose miliar não são definitivos, pois pode-se prever a recaída após a retirada da medicação. A estreptomicina empregada durante longo tempo, como se faz em relação à tuberculose, não é isenta de riscos. O efeito tóxico mais sério é aquêle em relação com o VIII par, particularmente com o ramo vestibular.

J. Baptista dos Reis

Farmacologia e uso clínico do curare (The clinical pharmacology and uses of curare). F. Prescott. J. Beige de Neurol, et de Psychiat. 47: 592-612 (outubro) 1947.

O A. faz, inicialmente, um histórico sobre a origem e obtenção do curare. O alcalóide mais importante do curare é a d-tubocurarina, a qual produz paralisia dos músculos esqueléticos, exclusivamente. A clássica ação da droga consiste na interrupção da condução neuromuscular na placa mioneural. O exato modo de ação é obscuro; provàvelmente, o curare impede que a substância muscular receba a ação da acetilcolina, embora o curare não interfira na produção desta substância, nem aumente a colinesterase; outros admitem que o curare eleve o limiar de excitabilidade. A paralisia dos músculos esqueléticos se processa na seguinte ordem sucessiva: região cefálica, membros, dorso, abdome, peito e, finalmente, diafragma. A paralisia completa se instala após injeção intravenosa de dose superior a 30 mgrs.; só a insuflação com aparelhos especiais ou o pulmão-de-ação pode evitar a morte por asfixia. A ação do curare é imediata, intravenosamente; dura 15 a 20 minutos, se injetado no músculo; não se manifesta, se a injeção fôr subcutânea (com as doses usadas na clínica). Em parte, é metabolizado no fígado, em parte eliminado em natureza. O efeito da droga começa a desaparecer meia hora depois, dependendo da dose e da extensão da paralisia; o restabelecimento completo é obtido dentro de 4 a 6 horas. A respiração deverá ser cuidadosamente atendida quando se usa o curare. Quando não há anoxia, a droga não afeta o sistema nervoso central, não atua sobre os influxos dolorosos, sobre o EEG, sobre a sensibilidade, não afeta a pressão arterial. Ocasionalmente, produz broncospasmo, vencido com injeção de pentotal ou mais um pouco de curare. As doses usadas na clínica não afetam a respiração do feto, nos casos de gravidez. Não deprime o fígado, nem os rins. O efeito das drogas curarizantes pode ser combatido pela prostigmina (1 a 2 mgrs.), eserina (fisostigmina), adrenalina, efedrina e guanidina. Estas são potenciadas pelos ions potássicos. Doses excessivas de prostigmina aprofundam, paradoxalmente, a paralisia. O A. lembra a mistura proposta por Maclntyre (eserina 0,7 mgrs., atropina 1 mgr. e efedrina 100 mgrs., dissolvidos em 1 cc. de água; injeta-se a dose de 1 a 2 cc, na velocidade de 10 a 20 cc/seg.), tida como o melhor antídoto do curare.

O curare favorece a intervenção cirúrgica, produzindo relaxamento muscular conveniente ou, mesmo, paralisação do diafragma nas operações torácicas. As vantagens da associação do curare aos anéstesicos comuns, são: o curare relaxa a musculatura, sem efeitos prejudiciais; possibilita intervenções prolongadas com um mínimo de choque; corrige as deficiências dos anestésicos; há menor número de complicações pós-operatórias; a volta do paciente à consciência é rápida.

Em neurologia, o curare é usado em suspensão ceroleosa, em doses que variam de 15 a 75 mgrs., injetados intramuscularmente. Tem sido usado nos espasmos musculares de origem não nervosa (artrites, fibrosites, miosites, etc), nas hipertonias por lesão piramidal e na rigidez parkinsoniana. É ainda utilizado na convulsoterapia pelo eletrochoque. Tem sido empregado, também, como teste, nos casos frustos de miastenia; basta injetar 5 a 10 centésimos da dose necessária para curarizar um adulto (1,5 a 3 mgrs.); é preciso ser cauteloso na realização do teste e injetar, imediatamente depois, uma dose intravenosa de prostigmina, para neutralizar o curare.

H. P. Vallada

As bases fisiológicas do emprego do curare em terapêutica. (Les bases physiologiques de l'emploi du curare en therapeutique). J. Titeca. J. Belge de Neurol, et de Psychiat, 47: 632-636 (outubro) 1947.

O A. cita o trabalho clássico de Claude Bernard, demonstrando que o curare bloqueia a transmissão do influxo nervoso ao nível da junção neuromuscular. Em 1927, o A., em colaboração com Bremer, demonstrou que a administração de doses fracas de curare poderia dissociar as contratibilidades clônica e tônica do músculo esquelético, em gatos decerebrados, o que depois foi verificado mesmo em animais intactos.

O trabalho atual do A. destina-se a evidenciar que esta particularidade do curare pode ser demonstrada em qualquer outra espécie de hipertonia reflexa, que não a provocada pela decerebração. Tomou para experimentação a rigidez tetânica primária provocada num coelho por injeção subcutânea na coxa de toxina tetânica; três dias depois, injetou subcutâneamente uma dose muito fraca de curare (0,25 mgrs de curare por quilo de peso). Uma hora depois da injeção do curare, o coelho, que estava em rigidez extrema de todos os músculos da coxa, tomou atitude e marcha normal, apenas com ligeira fatigabilidade muscular. Uma hora e meia após a injeção de curare, o animal entrava em atonia geral (corpo derreado e queda das orelhas), paresia acentuada, porém com deslocação ainda possível, respiração normal, reflexos tendinosos vivos. Uma hora e meia mais tarde, voltava ao estado de rigidez tetânica, idêntica à que tinha antes da injeção de curare.

O A. compara o efeito do curare com o processo de Wedensky no estado de intoxicação. A curarização ligeira, aumentando enormemente a fadiga neuromuscular, realiza a condição que permite a inibição de Wedensky das fibras em atividade tônica. A experimentação mostra que a dose que paralisa os movimentos respiratórios é duas vezes mais elevada que a requerida para determinar a paralisia do tono. O A. lembra que a adrenalina ou eserina, administradas intramuscularmente, fazem cessar imediatamente o efeito do curare, e, ainda, a possibilidade de utilizar doses fracas de curare para atenuar a energia das contrações musculares nos casos de convulsoterapia.

H. P. Vallada

Avaliação da terapêutica de choque. (An evaluation of shock therapy). L. Salzman. Am. J. Psychiat, 1J3: 669 (março) 1947.

O A., após longa e ponderada crítica dos estudos procedidos sobre as terapêuticas de choque, salienta os prejuízos possíveis de serem determinados pelas mesmas, citando os poucos trabalhos fisiológicos, biológicos e experimentais existentes sobre o assunto. Mostra as deficiências das estatísticas correntes sobre os resultados. Estuda 152 pacientes a fim de avaliar os efeitos da terapêutica de choque na freqüência e nos intervalos da readmissão; 74 pacientes tinham sido antes tratados e 78 não. No grupo tratado, 44 esquizofrênicos tiveram um intervalo de primeira readmissão de 1,6 anos e um intervalo de segunda readmissão de 1,57 anos; 30 maníaco-depressivos tiveram um intervalo de primeira readmissão de 1,4 anos e um segundo de 1,1 anos. No grupo não tratado, os números correspondentes eram de 4,8 e 4,86 anos para 45 esquizofrênicos e 4,36 e 3,17 anos, para 33 maníaco-depressivos. No grupo tratado, 17 esquizofrênicos e 10 maníacos-depressivos foram readmidos antes de um ano, enquanto no grupo não tratado sòmente 6 esquizofrênicos e 3 maníaco-depressivos foram readmitidos antes de um ano. Não havia relação entre o tipo de choque e a freqüência da readmissão. Quanto maior o número de choques, mais precoces as readmissões.

Foi também feito um estudo sobre os efeitos da terapêutica de choque sobre a personalidade. Os pacientes estudados eram de 20 a 30 anos de idade, não estiveram doentes além de 5 anos e haviam recebido tratamento de choque 6 meses a 3 anos antes. Foram estudados por meio dos testes psicométricos e pelo Rorschach, o EEG e a observação clínica. O quadro clínico observado foi de síndrome pós-lobotomia, de forma menos grave e dramática. Teve o A. a impressão de que o tratamento de choque produz deterioração e modificações da personalidade, que podem explicar o aumento da freqüência de readmissões.

Êste trabalho é baseado em bom e selecionado material, muito bem estudado e a crítica da literatura é referendada por 94 trabalhos. Mostra-nos muito bem o quanto é ainda incerta a opinião dos psiquiatras sobre a terapêutica de choque e o quanto tem sido descurado o estudo das possibilidades de perigos e conseqüências posteriores. Lembramos, por exemplo, entre nós, apenas o trabalho de Pinto Pupo sobre lesões anátomo-patológicas encontradas em autópsias de doentes que haviam sido submetidos a tratamentos de choque. Nenhum trabalho experimental tem sido feito entre nós. Mostranos ainda este trabalho o quanto é divergente a opinião dos autores americanos, a ponto de poderem ser os psiquiatras classificados em psiquiatras de "choque" e de "não-choque". Avisa-nos sobre o perigo de seguirmos opiniões trazidas de centros individuais por quem apenas visita determinados centros americanos, sem dar um balanço equilibrado sobre as opiniões gerais. É interessante, entretanto, a opinião discordante deste autor, em época em que a maioria dos trabalhos tendem a salientar o valor destas terapêuticas.

Joy Arruda

O uso do eletrochoque nas psiconeuroses. (The use of electric shock therapy in psychoneurosis). D. M. Hamilton. Am. J. Psychiat., 103: 665-668 (março) 1947.

No período entre 1942 e 1944 o A. tratou 50 psiconeuróticos cuja abordagem psicoterápica era bloqueada. Os pacientes mais beneficiados eram aqueles cujos sintomas predominantes eram ansiedade, tensão e depressão

Dos 50 pacientes tratados, 46% curaram-se, enquanto, num grupo de 200 não submetidos a tratamentos de choque, 39% também se curaram. Dada a diferença numérica dos grupos, consideram esta diferença percentual muito pequena; 80%, entretanto, do grupo tratado pelo choque elétrico e somente 59% dos não tratados voltaram ao lar ou curaram-se ou melhoraram muito; 48 dos tratados e 151 dos não tratados, tiveram algum benefício do tratamento. O período médio de hospitalização foi de 5,5 meses para o grupo tratado e 8,75 meses para o grupo não tratado.

O A. não se mostra entusiasta do tratamento em seus pacientes e usou-o como último recurso, comparando seus resultados com os obtidos na época que êle denomina "pré-choque". Parece acompanhar uma onda de relativo pessimismo contra o uso generalizado da terapêutica de choque nos Estados Unidos da América do Norte.

Joy Arruda

História do tratamento da poliomielite. (History of treatment of poliomyelitis). R. K. Ghormley. J. Iowa State M. Soc, agosto 1947.

O A. revê a bibliografia sobre a matéria, publicada nos últimos 50 anos sobre a paralisia infantil. A seguir, estabelece pontos comuns entre os diversos trabalhos consultados, desde os de Wickman aos de Elizabeth Kenny c, por último, externa sua opinião pessoal. O que resulta desse esfôrço é a comprovação de que a moléstia de Heine-Medin tem sempre início polimorfo e que o tratamento da enfermeira Kenny já era preconizado há mais de meio século. Trata-se, assim, de uma publicação de maior interesse histórico, como bem assinala o A., do que científico, já que nada de novo traz ao conhecimento dos estudiosos desse assunto.

H. Montenegro Costa

  • Análises de revistas

    Neuranatomia
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Fev 2015
    • Data do Fascículo
      Set 1948
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